Pov Bella

100 anos depois…
    

    Eu não era capaz de me arrepender de nenhuma decisão que me trouxe até aqui. Cada acerto e cada erro me apontaram para o meu destino; o meu verdadeiro eu. Não era apenas o fato de ter encontrado a alma gêmea que todos procuram - embora essa seja uma parte colossal -, mas era sentir-se pertencente, enfim, ao lugar que era predestinado a ser seu. 
E a gratidão... Ah, ela era sentida tão forte em meu ser que era quase embriagante. 
    Ao passar de todos esses anos pude ver tanta coisa mudar. Novas tecnologias foram inventadas, curas e pesquisas surgiram para ajudar cada vez mais os humanos e a sociedade como um todo evoluiu muito positivamente. Visitei lugares no mundo que jamais imaginei pisar, conheci realidades diferentes e me enriqueci intelectualmente de uma forma assustadora; era impossível um ser humano saber tanto, mas é deveras fácil para quem tem a eternidade. 
    Sei que agora a pior parte já passou, mas foi doloroso ver todas as pessoas que conheci morrendo um a um. Meu pai já havia falecido há sessenta anos, mas ainda parecia muito recente. Pelo menos consegui vê-lo algumas vezes antes de ele partir, assim como minha mãe. Por incrível que pareça ninguém notou alguma diferença em mim, tirando a falta de melanina proporcionada pelo “Alasca”. Nunca pude contar a verdade sobre o meu sumiço ou dar a eles um neto. Espero que, onde quer que estejam, me perdoem.
    Com a ajuda dos nossos parentes, os Denali’s, consegui adaptar e expandir o meu poder. Kate foi uma professora dedicada e com o passar dos anos eu entendi do que minha habilidade era capaz; eu era um poderoso escudo mental. A minha cabeça era protegida o tempo inteiro - desde humana, por isso Edward não conseguia me ler - e com alguma prática comecei a expandi-lo, sendo capaz de proteger outras pessoas ao mesmo tempo. Nunca precisei usa-lo de fato, mas era bom me sentir útil caso houvesse alguma necessidade. 

    Jasper e eu continuamos extremamente apaixonados. Era como se nenhum dia tivesse passado desde que nos entregamos a esse amor. 

— O que acha de fazermos uma reunião? Podemos convidar os nossos parentes do Alasca! - Exclamou Alice, batendo palmas com empolgação. Era adorável, porém não o suficiente para dissolver meu marido. Ela não mudou absolutamente nada em sua personalidade.
— Nada disso. - Respondeu Jasper, tomando a minha frente. - Esse lugar é muito pessoal para mim e, por mais que eu goste deles, só quero minha verdadeira família aqui. - Depois de muitos anos eu consegui fazer com que ele deixasse o resto dos Cullen conhecer o rancho no Texas. Todos estavam passando férias aqui antes de começarem o ensino médio de volta a Forks. Graças aos deuses eu e ele não fazíamos mais essa encenação. O único lugar que gostamos de repetir é a faculdade; eu já era formada em pelo menos dez cursos diferentes, com mestrado e doutorado. Nunca era demais. 
— Você deixou Tanya vir, oras. - Ela cochichou, olhando para os lados. 
— É diferente, ela está com o Edward agora. - Ele murmurou, baixo o suficiente para que eu tivesse que me inclinar para ouvir com clareza. 
    Seu irmão passou muito tempo longe de nós. Ele realmente demorou para se reconstruir e passou cerca de trinta anos vagando sem rumo fixo, porém ainda se mantendo fiel ao nosso estilo de vida. Após dez anos ele começou a visitar a mansão com frequência, mas eu e Jasper sempre estávamos viajando pelo mundo.
Quando Edward decidiu voltar de vez, Tanya e Kate estavam muito próximas de nós pois estavam me ensinando a expandir meu poder. Apesar da certa distância que ele mantinha de mim no começo, as coisas estavam tranquilas. 
    Quando percebi que Tanya era apaixonada por ele, chamei-o para conversar a sós. 

“Era um belo dia de sol e mesmo temerosa, sugeri que fossemos a clareira; ainda era um lugar especial para nós. 
— Olha Bella, eu não tenho nenhuma intenção de atrapalhar seu casamento. Minha volta foi totalmente despretensiosa e…
— Ei, calma. - Levantei as mãos em sinal de paz e ele assentiu. Sentei-me no meio das flores silvestres e ele fez o mesmo, esparramando-se em minha frente. Seu joelho tocou o meu de leve e ele se encolheu automaticamente; eu ri. - Sei que suas intenções são puras, Edward. Não é sobre isso que eu quero falar. - Ele sorriu sem graça e inclinou a cabeça, me dando a deixa para continuar. - Demorei um tempo para começar a trabalhar a minha habilidade, mas agora sou capaz de coisas que nem imaginava.
— Carlisle comentou. Pelo menos não era o meu poder com defeito. - Rimos juntos, relaxando a tensão entre nós.  
— Eu gostaria de te mostrar algo que aprendi com ele, se me permitir. - Edward franziu o cenho por um segundo, mas assentiu. Fechei os olhos, expandindo o escudo para além de mim, e me concentrei nas memórias nubladas de quando eu era humana. 

A primeira vez que eu o vi e como me senti; o dia em que ele salvou minha vida; nosso primeiro beijo; todas as noites que passamos em claro conversando em minha cama; o meu aniversário… E mudei o arco para Jasper; a curiosidade que pulsava em mim sobre ele e a nossa primeira conversa; nossas mensagens; o primeiro final de semana sozinhos e como ele me fazia sentir; o declínio do meu namoro com Edward; a dor que senti quando neguei o seu irmão; o momento em que percebi que Jasper era tudo para mim…

Sua respiração parou abruptamente, mas não me interrompi. Continuei mostrando com delicadeza todos os momentos decisivos em minha antiga vida, como foi a transição de sentimentos dentro de mim e como tudo aconteceu inteiramente sem intenção e sem maldade. Era Jasper. Queria que Edward compreendesse esse fato; não era questão de culpa, era destino.
Quando me dei por satisfeita, senti o elástico do escudo me envolver novamente. Edward estava de olhos fechados e sua expressão não entregava a realidade dos seus sentimentos. 
— Ual. - Ele murmurou alguns minutos depois. - É bastante coisa para absorver. 
— Você entendeu o propósito disso tudo? Desculpa se te feri, mas precisava te mostrar a minha explicação. 
— Doeu um pouco, mas cada vez dói menos. - Ele forçou um sorriso e eu suspirei. - E sim, eu entendi o seu propósito. Não foi algo sujo ou intencional, apenas… aconteceu. Hoje entendo que nada do que eu fizesse mudaria o fato de você e Jasper pertencerem um ao outro. Só preferia que o destino não tivesse me feito de ponte. Quer dizer, eu não me arrependo de nada que vivi com você, Bella. - Ele esticou a mão, levantando meu rosto pelo queixo. - Você me fez sentir vivo novamente e sempre serei grato por isso, mas não posso negar que não queria ter sentido tanta dor por tanto tempo. 
— Me desculpa... perdão. Acho que não serei capaz de me redimir nem na eternidade. 
— Quem tem que se desculpar aqui sou eu. Você sempre foi perfeita comigo! Atenciosa, compreensiva… mesmo no meu pior, não me deixou. Já eu, fui um canalha. Menti para você, machuquei a todos, perdi o controle diversas vezes… me envergonho tanto daquela época. Eu estava completamente cego de ódio pelo Jasper e de possessividade por você, embora não fosse apenas isso. Eu te amei, Isabella Swan. Muito. E não sei se posso afirmar com todas as letras que não amo mais, mas sei que a cada dia esse sentimento se posiciona onde sempre teve que estar. Você é minha… irmã. - A palavra “irmã” saiu um pouco estrangulada por sua boca, mas conseguia sentir a sinceridade por trás de suas palavras. Seus olhos enormes - que eu sempre vou amar - transmitiam todo o afeto puro que ele sentia por mim. Me inclinei pela relva e o abracei com força. 
Ficamos um tempo assim, até que eu me afastei e aproveitei a saída perfeita para o assunto que estava rodando em minha mente. 
— E Tanya? - Perguntei, erguendo a sobrancelha.
— Uhm?
— Ah, para. Você lê mentes. Não me diz que não sabe. - Ele balançou a cabeça e eu revirei os olhos. - Ela é apaixonada por você, seu idiota.
— Sei disso. Mas… - Ele deu de ombro, deixando as palavras sumirem pelo ar.
— Mas o que? 
— Ele sempre demonstrou interesse por mim, antes mesmo de eu te conhecer. Nunca me interessei.
— Você deu ao menos uma chance a ela? 
— Não. 
— Qual é o seu problema? Ela é linda! 
— Sim, eu sei… 
— Ela não é só linda, isso foi algo bem óbvio de se dizer. Tanya é inteligente, dedicada, carinhosa, vegetariana… Acho que você deveria pelo menos tentar olhar para ela de uma maneira diferente. Esquecer essa coisa de vampiro e olha-la como uma pessoa, porque ela ainda é. Quer dizer, todos nós somos. Não seja literalmente essa pedra fria para o resto dos tempos, Ed. Dê uma chance para ela e dê uma chance para você. 
— Quer que eu finja? 
— Não! - Exclamei, espalmando as mãos na grama. - Quero que jogue limpo com ela sobre o que você realmente sente. Ela sabe dos seus traumas, entende? Não é certo que vocês realmente fiquem juntos, mas pelo menos mostre que você está tentando dar uma chance real a ela. - Edward olhou para as mãos, parecendo pensativo. - Vai por mim, nem sempre o amor verdadeiro chega tão fácil como nos filmes. As vezes você precisa abrir bem os olhos e ignorar os clichês.”

Após nossa tarde na clareira ele começou a se aproximar e tentar dar uma chance a Tanya. Alguns anos mais tarde eles assumiram o relacionamento para a família; Edward aprendeu a amar o que era realmente bom para ele e eu não poderia estar mais feliz por sua felicidade. 
— Jazzy! Preciso de você! - Gritou Emmett, correndo em nossa direção como uma criança desajeitada. - Quero que use seu poder para eu conseguir andar a cavalo! - Ok, ele era uma criança grande. Seu entusiasmo nos fez gargalhar e percebi que Rosalie estava parada atrás de nós. 
— Por favor, irmão. Ele falou sobre isso a viagem inteira. - Ela implorou, fazendo beicinho. Meu marido revirou os olhos e me deu um beijo rápido nos lábios antes de levantar.
— Quando você vai crescer? - Ele perguntou a Emmett, que o respondeu dando a língua. Rose olhou para mim e sorriu ternamente antes de voltar para a sua leitura.
Nosso relacionamento melhorou bastante depois que Edward retornou definitivamente para a mansão. Ela não tinha mais motivos para me odiar e começou a se esforçar para ser próxima; até conversávamos sozinhas por aí. Nunca seríamos amigas de fato, mas sabíamos que podíamos contar uma com a outra. 
    Carlisle e Esme estavam radiantes. Toda a sua família estava unida, feliz e segura. Eles sabiam que eu não iria conseguir chama-los de pais tão cedo, mas isso nunca fez com que eles não me considerassem uma filha. 
    A única coisa que me incomodava era Alice. Apesar de estar sempre conosco e não sozinha, ela nunca mais tentou encontrar um companheiro. E, no fundo, sei que incomodava a Jasper também. Ele se sente muito mais responsável do que eu, assim como me sinto pelo Edward. Porém, de uns anos para cá, ela deu a entender que havia tido uma visão chocante. 

“Todos estavam no meio da sala esperando uma resposta, enquanto Alice estava caída no chão, de olhos fechados. Seu rosto estava franzido, como se algo muito forte tivesse atingido-a. 
Ajoelhei em sua frente, colocando as duas mãos em seu rosto.
— Irmã? Fala comigo! - Implorei, sacudindo-a levemente. Esme colocou a mão em sua cabeça, aflita.
— Ele… nasceu. - Ela murmurou. 
— O que? Quem? - Perguntou Carlisle, igualmente preocupado. Ela ficou imóvel por minutos e ao abrir seus olhos, um lampejo de amor transbordou deles. Durou apenas segundos, mas o suficiente para que eu captasse. Alice piscou várias vezes até retomar o foco e sorriu para mim; a felicidade explodindo pelo seu pequeno corpo. 
Ela levantou em um pulo, gritou um ‘estou bem’ por cima do ombro e correu para a floresta. Jasper queria ir atrás dela, mas não deixei. Eu havia entendido.”

Não compartilhei minha teoria com ninguém, nem mesmo Jasper; não era meu segredo para contar. Se eu estivesse correta, em pouco tempo a verdade se revelaria e Alice encontraria a sua verdadeira alma gêmea. 
    Levantei com leveza e me encostei no tronco da árvore, observando Emmett andar a cavalo com Jasper em seus tornozelos. Edward e Tanya estavam abraçados na cerca enquanto aproveitavam a paisagem. Carlisle e Esme estavam debatendo sobre uma nova tese na medicina, enquanto Alice dava pitacos. 
Cem anos se passaram e eu sentia como se ainda tivesse começando a viver. Eu era a pessoa mais sortuda do mundo.

Olhei para cima e sorri, deixando a gratidão fluir por mim. 
A quem quer que seja responsável por tudo isso, muito obrigada.