Cidade dos Ossos - Vista por Outros Olhos escrita por Ann Wolf


Capítulo 7
As lembranças do passado voltam


Notas iniciais do capítulo

No último capitulo:
Lauren foi capaz de contar o que se andava a passar e, mesmo isso tendo irritado Briana, ambas estão a caminho de um pouco de diversão. Mas o que será que as espera na discoteca? Será algo bom? Ou terá consequências?



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Assim que entramos naquele espaço, o ambiente á nossa volta muda completamente. A brisa fresca com o cheiro do rio e do carvão transforma-se completamente, dando lugar ao calor, suor e álcool. Torço o nariz ao distinguir o último no meio de tanta gente, apesar de ainda não ser exatamente noite, já há muitos adolescentes, e outras coisas mais, a acumularem-se na entrada e no seu interior.

A Briana parece estar adorar, não tenho a certeza se é a música ou o rapaz que a olha fixamente. Reviro os olhos. Os vampiros não podem ver ninguém como a Briana que ficam logo a babarem-se e é, especificamente disso, que eu medo.

— Briana. Sossega, não te deixes levar por eles. – Ela continua com o sorriso colado no rosto mas mão mesmo tempo acena a cabeça afirmando que ouviu. – Não tens remédio. Eu não vou arriscar e ser dominada pelo encanto de um vampiro.

Ela solta uma gargalhada abafada e tenho vontade de lhe dar um soco mas, em vez disso, presto atenção aonde ela está a olhar até reparar num rapaz, por volta dos 15 anos, com os olhos e o cabelo preto aos cachos que se estendia até á nuca e a pele bronzeada. O meu coração deu um solavanco ao reconhecê-lo das reuniões que muitas vezes havia em Alicante e para as quais muitas vezes me esgueirava para entender as decisões da Clave. Só o vi uma vez mas foi o suficiente para ficar fascinada.

— Olha quem está ali. – Ela dá-me uma cotovelada. – O teu grande amor espera-te e está a olhar demasiado para ti.

Sinto as bochechas a ferverem mas controlo a minha postura para não o demonstrar.

— Já te disse que isto não é amor. É só uma paixoneta. – Entro no meio da multidão, que me empurra de todos os lados. – Briana!

Ela já não se encontra comigo. Em vez disso, está a cerca de 7 metros agarrada a um rapaz com os seus 19 ou 20 anos com o cabelo e os olhos castanhos e, tenho de admitir, um corpo perfeito. Não demoro muito para desviar o olhar já que alguém tem a excelente ideia de me dar um empurrão que cambaleio para o lado. Por pouco não caio ao chão mas só porque alguém me segura o braço e me iça para cima.

Ao ver quem é, quase me esqueço de respirar. Rafael Santiago encontra-se á minha frente, na verdade a pouco centímetros do meu nariz, e está a agarrar-me no braço e na minha cintura.

— Estás bem? – A voz dele é rouca mas por alguma razão isso só me faz querer olhá-lo nos olhos, o que é um perigo para qualquer pessoa.

— Sim. Apanhaste-me a tempo. – Lanço-lhe o meu olhar mais angelical e ao mesmo tempo provocador e ele parece entender o recado.

Retira a mão das minhas costas e eu sinto logo a diferença da sua ausência. No entanto não dura muito tempo, porque ele entrelaça os seus dedos finos nos meus, que fazem contraste com a sua pele.

— Queres dançar? Não conseguia encontrar uma companheira certa mas acho que estarás á altura. – Ele sorri-me, disfarçando um pouco as presas por baixo dos lábios.

— Não me subestimes, Raphael.

Por momentos ele fica confuso. Depois começa a olhar fixamente para a mão que agarra e vê a marca da Visão que eu recentemente fiz. O sorriso dele alonga-se um pouco mais, chego até a pensar que ele me está a provocar, mas não é o caso. Os olhos dele carregam uma energia que se demonstra na maneira como parecem claros.

— Ainda melhor. Mostra o que vales, Caçadora. – Ele puxa-me para o meio da pista, onde já se encontra Briana e o seu companheiro de dança.

A loira faz-me sinais de encorajamento disfarçadamente e quase lhe digo para parar com isso.

O DJ Bat coloca uma das músicas que eu mais gosto, nem muito barulhenta nem muito calma e é aí que eu e o Raphael entramos em cena, dançando como dois rivais competindo pelo título de melhor companheiro mas ao mesmo tempo como parceiros inseparáveis.

Recordo-me de que a melodia já está no seu refrão e aproximo-me mais do moreno que, aproveitando a sua chance, volta-me a puxar de encontro seu peito.

O contraste entre o calor acumulado na discoteca e o corpo frio dele encostado ao meu, provocam-me arrepios pela espinha acima de uma maneira agradável e embriagante, fazendo com que o meu corpo não me obedece-se.

— Suponho que já tenhas ganho, embora eu recuse a admitir isto para quem quer que seja. – Tento falar qualquer coisa mas ele encosta um dos dedos nos meus lábios. – Se alguém preguntar, nunca digas que conseguiste a minha atenção.

Pisco várias vezes os olhos até que o ar sério, que ele tinha acabado de colocar, se desvanece dando lugar a um sorriso maroto. A aproximação da cara dele era visível a olhos vistos, sentia as minhas pernas a fraquejar mas, graças ao Anjo, ele prendia-me a cintura com um dos braços como se fosse uma estátua enquanto com o outro me pendia o queixo, fazendo-me mirar-lhe os olhos negros cor de carvão a aproximarem cada vez mais de mim.

Ao princípio, foi como se tudo á minha volta deixasse de existir, exceto a pressão na minha cintura e nos meus lábios. O barulho tinha sido substituído por um ruido que se tinha fixado nos meus ouvidos e calculei que fosse a adrenalina a tomar conta de mim. Não me lembro como o faço, só sei que num momento estou com as mãos entre o meu corpo e o do Raphael e no outro estas já se encontram no seu cabelo, despenteando-lhe os caracóis negros e suaves.

Permaneço de olhos fechados, sentindo apenas os gosto da boca dele e as mãos geladas a causarem me arrepios pela espinha que lhe causam alguns risos abafados no beijo. A temperatura do meu corpo começa a aumentar consideravelmente tal como os batimentos do meu coração. Relutantemente, afasto-me ao de leve, não me sendo permitido mais.

Ele mantém os braços dele á minha volta como se eu lhe pudesse escapar á mínima descaída, o que eu não nego ser uma ideia interessante mas impossível de se concretizar com ele. Os seus olhos estão completamente negros já não lhe sendo possível distinguir a pupila ou o seu antigo brilho.

Só tenho tempo para respirar fundo antes de ele repetir o processo anterior mas de uma maneira mais feroz e desejosa. Apercebo-me de que no fundo até estou a gostar de estar assim. É como se me esquece-se dos problemas ou dos deveres que tenho a cumprir e não me importaria nada de continuar desta maneira. Nada mesmo.

Não sei quando tempo ficamos agarrados um ao outro ou quantos beijos trocamos, mas é então que uma voz me ressoa aos ouvidos. Não é como se estivesse presente naquele espaço, mas sim na minha mente. É a voz de alguém quase igual ao Raphael com a única diferença sendo os olhos, já que o vampiro, que está agora comigo tem-los negros enquanto o da minha voz os tinha de um verde oceano que completava o céu dos meus olhos.

A lembrança que me sobe á cabeça faz com que eu recue drasticamente para longe do moreno que franze a neta e me fita os olhos, que começam a ficar embaciados.

— Caçadora? O que aconteceu? – Ele está preocupado comigo, mas algo me faz afastar dele como se fosse venenoso.

A minha visão engana-me e já não lhe vejo os olhos pretos mas verdes, o que me causa uma pressão insuportável no coração e mais lágrimas.

— Desculpa. – Digo, colocando a mão á frente da boca para que não se ouçam os meus soluços. – Tenho de ir. Desculpa.

Saio a correr dali, distribuindo cotoveladas e encontrões para abrir espaço para o exterior. Ao lá chegar, sou obrigada a inspirar golfadas de ar sem um ritmo certo.

Por quê? Por quê tinha de me lembrar dele? Caraças, sou tão estúpida! Distribuo murros no ar e chego a dar um valente pontapé numa lata de refrigerante que, infelizmente estava no lugar errado na hora errada, com a força com que é projetada passa a rasos centímetros da minha bochecha.

Ouço passos suaves atrás de mim e coloco-me tensa. Temo que seja o Raphael pedindo por explicações. No entanto a voz que ouço é mais aguda e suave que a dele.

— Lauren? Vem aqui. – Não penso duas vezes e abraço a Briana inspirando o cheiro a perfume de rosas juntamente com o cheiro do suor. – Pronto. Calma. O que te aconteceu?

— Ele. Voltei a lembrar-me dele. – Sinto-lhe a mão a afagar-me a cabeça e é quando desabo.

O passado de cada Caçador das Sombras nem sempre é fácil e muitas vezes assombra-nos para o resto das nossas vidas. Um em cada três caçadores já sofreu quando criança um trauma ou uma morte, como aconteceu com a Briana e o Jace. A mim o que me assombra são as memórias da minha vida mundana, que de tão boas e agradáveis que são me fazem ter saudades. Especialmente de uma pessoa que eu á muito tinha pensado ter superado a ausência.

— Shh. Vamos para casa. Tu não estás bem.

Aceno que sim com a cabeça e afasto-me um pouco dela pra lhe observar os olhos ternos e o batom um pouco esborratado tal como alguma desordenação no cabelo. Não ligo para isso, embora se estivesse em boas condições já teria lançado um comentário ao ar, mas não o faço.

— Desculpa. – Digo entre soluços. – Estraguei tudo.

Ela dá uma gargalhada fraca e esfrega-me os ombros como se com a fricção das nossas peles me pudesse aquecer, mesmo não sendo esse o problema. Ela encosta depois os cabelos loiros nos meus e só depois fala.

— Não te preocupes. – Conforta-me ela. – Assim que te vi a afastar-te do Raphael, depois de todos aqueles beijos, fiz questão de perguntar ao Damon se poderíamos encontramos nos noutra altura, e ele aceitou. É um cavalheiro para além de muito bonito.

A conversa dela distraí-me um pouco mas não o suficiente para esquecer a ferida que parece estar-se a abrir no meu peito, como se milhares de facas se tivessem reunido para me retirarem o coração do seu lugar mas estivessem a ter o maior prazer de me ver a sofrer com toda a dor desnecessária que elas me infringiam.

Apanhamos o metro e quando devem ser cerca de oito ou nove horas já estamos de volta ao instituto. Durante o caminho, consegui convencer a Briana a apenas me preparar uns aperitivos para comer porque queria descansar um pouco esta noite. Depois de muitos resmungos e protesto ela acabou por aceitar, embora eu tenha a breve suspeita de que foi graças aos rapazes que apareceram mais tarde na nossa carruagem e que a fixavam minuciosamente.

Mal passamos a porta de entrada, começo a caminhar a passos largos para o elevador antes da voz da Briana de fazer ouvir:

— Eu já vou buscar-te a comida mas ficas a dever-me uma.

O que solto não é uma gargalhada. Parece-se mais com um suspiro pesado e monótono.

Já no primeiro andar passo às pressas pelo Alec, não dando a mínima atenção ao que ele me grita. Estou demasiado ocupada a tentar chegar ao meu quarto. Quando o faço, retiro a roupa enquanto caminho para o duche. Sinto a água a lavar-me o pensamento, fazendo-me sentir um pouco mais leve no entanto não o suficiente para que a mágoa despareça.

Assim que me seco, não tendo o trabalho de secar mesmo como deve ser o cabelo, visto a minha T-shirt de dormir e os meus calções e enfio-me debaixo dos cobertores, observando a lua a içar-se no seu e as luzes de Nova Iorque a começarem a aparecer cada vez mais frequentemente no céu.

A voz dele já não me é capaz de alcançar mas ainda sinto um peso estranho na consciência o qual não consigo identificar mesmo remoendo até os mais profundos dos meus pensamentos. É a Briana que me traz de volta á terra como uma luz que guia o caminho de volta ao lutar aonde pertenço.

Ela trouxe-me biscoitos e um copo de sumo.

— Disseste que querias algo leve. Isto foi o que pode trazer da cozinha antes que a Izzy se colocasse com as suas receitas. – Deito a língua de fora e a loira ri-se pondo logo a seguir uma expressão séria na cara, dando-me um pouco de receio. – O Alec está ali fora numa pilha de nervos. Ele diz que tu passaste por ele e não estavas bem mas eu consegui proibi-lo de entrar aqui até que ficasses melhor.

— Obrigada, Briana. A minha reação também foi muito estupida. – Fico cabisbaixa ao lembrar-me como lhe estraguei a noite. – Penso imensa desculpa.

— E lá estás tu. – Ela dá me um leve murro no braço e continua a falar. – As amigas ajudam-se umas às outras. Ninguém tem culpa se sentes saudades desse tipo.

Saudades é pouco para o descrever mesmo o esconda de mim mesma.

— Agora dorme. E para de pensar nisso.

Faço como ela me manda, assim que termino de comer. Ouço vozes do outro lado da porta mas as minhas pálpebras insistem em se fechar e acabo por deixar de os ouvir. Sonho com o Raphael com o seu irmão gémeo de olhos verdes. Ambos estão a olhar para mim mas o vampiro estende-me a mão enquanto o outro abana a cabeça, negativamente, com os olhos cheios de reprovação. Opto por me afastar dele e agarro a mão que me é estendida. A minha recordação solta um suspiro e desaparece enquanto o Raphael apenas se dissolve em pó nos meus braços.


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Notas finais do capítulo

Lauren nunca se livra de fantasmas, nem mesmo por uma noite de diversão. Quem é o rapaz? O que será que aconteceu no passado com eles? E o por quê de isso ser tão doloroso para ela?



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