Cidade dos Ossos - Vista por Outros Olhos escrita por Ann Wolf


Capítulo 13
Confusão no Paraíso


Notas iniciais do capítulo

No ultimo capitulo:
O clima ficou tremido entre Lauren e Briana mas Raphael conseguiu quebrar o gelo. No entanto, Lauren está bastante séria sobre este encontro, embora se sinta tentada a deixar as coisas fluirem. Será ela capaz de descobrir o que necessita? E os outros? As respostas serão finalmente descodificadas?



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O Raphael volta a sentar-se ao meu lado e a fixar-me olhos nos olhos, como se isso possa provocar uma maior sinceridade por parte dos dois.

                - Desde daquela noite no Pandemonium que fiquei um pouco interessado em ti. – Mantenho-me impassível mas no meu interior, sinto os meus batimentos cardíaco a enfurecerem-se. – Houve algo que me chamou á atenção. Mas depois reparei no Damon a olhar na direção em que tu saíste naquele dia da discoteca.

                Os punhos dele cerram-se quando ele acaba de proferir a frase anterior e vejo-me na responsabilidade de apaziguar a sua raiva, colocando as minhas mão em volta das suas.

                - Ele não me observava a mim. – Explico. – Eu estava acompanhada por uma outra rapariga.

                - Eu notei. – Os olhos dele pareciam mais compreensivos do que eu me lembrava, talvez um vestígio muito presente da sua vida de humano. – No entanto, tu também lhe captaste a atenção. Foi por isso que mandei um contato meu vigiar-te para me assegurar que estavas segura.

                Lembro-me da presença estranha que senti de manha, enquanto percorria a rua das Avenidas, juntamente com o Alec, em busca da Briana e em quanto isso me pareceu desconfortável e não assustador.

                - Hoje de manhã… - Começo, querendo pôr tudo em pratos limpos. – Era esse tal contato, que eu tenho uma breve suspeita de ser um escravo de sangue.

                - Bem, hoje de manhã, de facto, ele esteve a observar-te. – Confirma ele, para depois coçar a nuca. – Mas estás errada ao pensares que é um escravo de sangue. Na verdade, foi um feiticeiro.

                Olho instintivamente para onde se encontrava o Magnus e o nosso grupo, para perceber logo de seguida que este havia sido ocupado por outros Habitantes do Mundo-à-Parte. Uma certa aflição atinge-me e faz erguer-me para ter um maior campo de visão da festa, esperando que desse modo os possa encontrar em algum canto.

                Quando tal não acontece, inicio o princípio de passo para ser impedida pela mão do Raphael que me segura o pulso esquerdo. Ele fixa-me nos olhos e sinto-me um pouco mais calma graças a isso, embora, por alguns segundos, os seus olhos fiquem de uma tonalidade mais esverdeada.

                Sento-me novamente ao seu lado e, desta vez, ele coloca um dos seus braços gélidos no meu ombro, aproximando-nos ainda mais e, mesmo que eu não sinta nenhuma onda de calor vinda dele, tenho a sensação de estar a ser aconchegada por um cobertor macio.

                - Eles estão bem. Eu vi-os a irem na direção daquela porta. – Acalma-me o Raphael. – E o Magnus é de confiança. Talvez um pouco extravagante mas pode-se confiar nele.

                - Certo. – Replico sendo que depois me encosto no seu peito, puxando as pernas para cima da almofada do banco. – Então descobriste o meu nome e onde eu vivo graças a esse feiticeiro?

                Ele percebe o tom de brincadeira que acabei de usar e lança-me um sorriso divertido que eu corresponde da mesma maneira. Acho que se ambos não soubéssemos as nossas origens, e não estivéssemos numa festa infestada de várias criaturas do Mundo Inferior, poderíamos ser um casal como qualquer outro. Mas nada acontece como muitas vezes desejamos.

                - O Enri disse-me quando o Damon vos preparou uma armadilha. – O clima estraga-se um pouco quando ele diz aquele nome. – Fiquei lixado quando ele me comunicou que ele estava á espera de uma Caçadora das Sombras loira e muito bonita, ou pelo menos, foi o que ele disse.

                A frase dele faz com que me sinta lisonjeada e no entanto um pouco divertida por me terem confundido com a Briana, que na minha opinião consegue ser muito mais esbelta para os rapazes que eu, tal e qual como o irmão em relação ao sexo oposto. Mas então o meu dilema volta: devo dizer isso á Briana e esquecer o modo irritante com que anda ou não falar com ela para que esta se aperceba em como tem estado a agir incorretamente e corrija os seus erros. Suspiro pesadamente ao começar a debater isso novamente, no interior da minha mente.

                - Lauren, pensas que o Damon estava sob o meu comando?

                - Eu tenho a certeza de que não. Ele parecia ser indisciplinado demais para pertencer ao teu grupo.

                Ele esboça um sorriso aberto que desaparece logo a seguir e lhe escurece o olhar.

                - Tu estás com repugnância de mim?

                Franzo o sobrolho e engelho a testa olhando para o Raphael, que entretanto adotou uma expressão mais soturna e magoada que me provoca um aperto horrível no peito. Agarro-lhe numa das suas mãos gelada entre as minhas e fixo-lhe os olhos como se através deles o Raphael pudesse descobrir o que eu verdadeiramente sinto.

                - Não digas isso. – Digo, calmamente. – Eu não me vou afastar de ti. Não quero e ninguém me pode obrigar a faze-lo.

                Ele leva a mão livre dele, que repousava no meu ombro, ao local onde as garras e os dentes do vampiro hoje de manha me atingiram e onde está agora marcada uma cicatriz.

                - Hoje foste atacada por um grupo de vampiros que quase te mataram. – Afirma, para depois retirar a sua mão do meu pescoço mas não sei antes fazer uma breve caricia na minha bochecha: o sítio onde me tinham arranhado de manha. – E esperas que eu acredite que não sentes nenhum nojo sobre nós, vampiros?

                Fico com algo entalado na garganta, pois o que ele diz faz sentido. Eu nunca houvera sofrido um ataque tão agressivo como aquele vindo de vampiros e, de facto, eu fiquei mais apreensiva quanto a proximidade em relação a estes, mas tal não me ocorreu com o Raphael. Para mim, ele não era como os outros. O Raphael é mais humano.

                - Acertaste num ponto. – Na minha cabeça a explicação já está ensaiada e neste momento sai de livre e espontânea vontade. – Mas tu não és igual a eles. Julgas que eu também não reparei na cruz que trazes pendurada ao pescoço?

                Ele leva a mão ao peito onde repousa o formato de uma cruz e fica um pouco tenso.

                - Raphael…mesmo que não acredites no que te vou dizer que fique claro que nunca te mentiria. – Respiro fundo e tento ignorar as picadas que me atingem o coração. – Nunca me passou pela cabeça odiar-te ou ter nojo de ti. E na vida de um Caçador das Sombras é completamente normal ser atacado por um vampiro e acredita que não será por isso que os vamos passar a tratar do mesmo modo em geral.

                O moreno esboça um sorriso fraco e a minha mente só pensa em arranjar uma solução para a infelicidade dele. E é claro que arranja uma bastante boa e simples.

                Levo os meus dedos á sua face e acaricio-lhe as bochechas, algo que o faz fechar os olhos e voltar a sorrir, e depois beijo-o. Sinto eletricidade a percorrer-me as veias em vez do sangue, como se a adrenalina estivesse a tomar conta de mim de tal maneira que acabo por lhe colocar os braços ao redor do seu pescoço e puxa-lo para mim. Mas em vez disso, ele põe um dos seus braços á volta da minha cintura, diminuído o espaço entre os nossos corpos e depois coloca a sua mão direita atrás da minha nuca, empurrando mais em direção á sua cara.

                Os meus pulmões parecem estarem a entrar em combustão espontânea da maneira como os sinto a queimarem-me o peito. No entanto, não paro de juntar a minha boca com a do Raphael. Só, e unicamente, faço pequenos intervalos para poder recuperar folgo, e mesmo assim estes são relativamente pequenos. O meu corpo estão tão quente que sinto vários arrepios quando ele me toca os pedaços de pele ao ar livre.

                Um ruído ensurdecedor magoa-me os ouvidos e também causa um incómodo ao Raphael que faz uma careta.

                - Acho que alguém está muito irritado. – Afirma o Raphael.

                Espreito por cima do ombro dele para procurar a origem do som de há pouco. Não vejo nada de diferente até me deparar com uma cabeleira loira a caminhar bastante depressa pelos convidados da festa, arrancando muitos comentários e insultos da parte deles. No entanto, a rapariga parece estar determinada o suficiente a ignora-los e a seguir em frente. Há um momento em que ela olha para trás mas depressa volta a seguir o seu trajeto.

                O Raphael observa-me enquanto eu vejo a Briana a encostar-se na porta de saída do apartamento.

                - Queres ir ter com a tua amiga? – Aceno-lhe que sim. – Ok, vai lá.

                Ele não está zangado nem ofendido mas duvido que se ponha aos pulos por eu estar a abdicar do meu tempo com ele para ir socorrer aos problemas da Briana. Por tanto seguro-lhe as mãos e ergo-o ao mesmo tempo que eu, embora com grande esforço já que ele não está muito disposto a sair das sombras.

                - Vens comigo. – Digo, num tom um pouco mais imperativo.

                O Raphael abana negativamente a cabeça mas, mesmo a negar, levo-o comigo. Entrelaço os meus dedos nos deles e mostro-lhe um sorriso encorajador. Ele não faz o mesmo mas os seus olhos já não parecem tão soturnos, no entanto, noto um tom esverdeado a tomar-lhe o negro dos olhos assim como algumas a feições da cara a transformarem-se noutra embora eu consiga ignorar isso com muito esforço.

                Algo como a imagem de um rato castanho passa-se pela cabeça e sou obrigada a abrir e a fechar os olhos algumas vezes para que ela se disperse.

                Quando ao mundo atual apercebo-me que estamos a cerca de um metro da Briana, esta está com a cabeça baixa e ouço alguns fungos. Ao meu lado, o Raphael pigarreia e, por causa disso, dou-lhe uma cotovelada no flanco direito que, embora não o magoe, o faz dobrar-se um pouco por causa dos reflexos. Ele mira-me um pouco ofendido e apenas coloco o dedo sobre os lábios para que ele me deixe tratar disto.

                - Briana. – O meu dilema sobre perdoa-la deixa de ter qualquer sentido para mim.

                Eu não consigo deixar a minha melhor amiga impulsiva, que se está sempre a colocar em sarilhos ou com rivalidades, com problemas ou triste. Acho que isso é pior do que ser ferida por um demónio. Nós as duas sempre estamos prontas para ajudar uma á outra e duvido que por causa das discussões que estamos a ter nestes dias venham a mudar isso de algum modo.

                - Então, miúda. – Ela cerra os punhos ao lado do corpo e permanece cabisbaixa. – O que aconteceu lá dentro? Briana, eu não gosto de te ver assim.

                Ela relaxa os punhos e abraça-me. O Raphael ergue a sobrancelha ao deparar-se com isso, pois se calhar não contava que a Briana pudesse ter uma parte fraca, mas eu repondo-lhe com um abanar de cabeça. Volto a minha atenção para a loira que, embora não esteja a chorar, precisa de desabafar com alguém que a compreenda e a possa reconfortar ou chamar a atenção.

                - Está tudo bem. – Faço-lhe cafune no cabelo para que ela se acalme. – Podes falar.

                - Eu estou farta! – O grito dela é abafado pela banda musical que sobe ao palco flutuante que se encontra atrás de nós. – O meu irmão, o Alec…todos eles me estão a abandonar!

                Suspiro. Foi o que eu já estava a desconfiar. Só poderia ser isso ou então algum desentendimento com a Clary em que o irmão a tivesse repreendido.

                - Eu estou aqui. Não te vou abandonar. Afinal de contas, em breve serás a minha parabatai e por isso devemos estar sempre unidas. – Ela acena afirmativamente a cabeça e compões a postura.

                Os olhos dela estão um pouco vermelhos, talvez porque ela quer conter todos os indícios de lágrimas que possam se soltar. Ela leva a mão até ao pulso esquerdo e mostra-nos o que ali carrega. Embrulhado em três voltas, encontra-se uma medalha com a letra W inscrita com uma estrela no cimo: a medalha da mãe dela.

                Pelo que a Briana e o Jace me haviam contado, a medalha era uma recordação da mãe deles, oferecida pelo seu pai: Michael Wayland. De cada vez que a loira estava mais depressiva, o colar dava-lhe coragem para seguir em frente e não baixar os braços face a um desafio. Já o Jace carrega um anel com a mesma inicial e a estrela mas pouco fala sobre este.

                - Eu não quero estar a ser um incómodo para vocês as duas se quiserem falar. – Diz, calmamente e sem medo, o Raphael. – Afinal, eu não tenho nada a ver com os vossos assuntos.

                - Não faz mal. – Responde a Briana com um sorriso maléfico no rosto que me incomoda. – Eu não sei é se devo pedir desculpas de vos ter interrompido. Tenho a certeza que a Lauren não é nenhuma “santinha” quando se trata do vampiro de quem ela gosta.

                - Bri! – A minha face ferve e o meu coração acelera a velocidade do meu sangue, de tal modo que sinto a adrenalina a percorrer-me as veias novamente.

                O Raphael solta bastantes gargalhadas divertidas a custa do comentário da loira e da minha timidez até me colocar o braço em volta da cintura, gesto que me coloca ainda mais nervosa, embora não tanto quanto quando ele me sussurra ao ouvido e me arrepia o corpo todo:

                - Não tens de ficar envergonhada.

                - É claro que não. – Replico enquanto ele me sorri. – Até parece que o comentário da Briana é algo comum para se dizer.

                - Mas tens de concordar que ela tem razão. – Provoca-me ele.

                Ótimo, Raph, nunca mais tomo a iniciativa de te beijar.

                - Wow, Lauren, o que vocês andaram a fazer enquanto estávamos na missão? – A expressão da cara dela altera-se para algum pervertido e curioso e volto a sentir as maças do rosto a queimarem.

                - O típico do que os namorados fazem. – O Raphael compõe uma resposta mais depressa do que eu consigo dirigir a mensagem.

                Assim que compreendo o que ele acabou de dizer, o meu peito dá um solavanco e a Briana sorri-me divertidamente.

                - Um momento. – Coloco as mãos ao ar mas, em vez de ser um sinal de arrependimento, é de uma ordem. – Eu não me lembro de termos falado algo em relação a esse tema. Não podes decidir tudo sozinho.

                Ele ri e aproxima-se da minha cara até estarmos prestes a roçar a ponta dos narizes.

                - Cierto, mi chica. – Diz ele. – Aceitas ser minha compañera?

                - Hum, deixa-me pensar. – Tento fazer uma cara pensativa mas logo começo a gargalhar ao olhar para os olhos de cachorro abandonado do moreno. – Tu já sabes a minha resposta.

                Ele coloca os dois braços em redor da minha cintura e iça-me no ar enquanto compartilhamos mais um beijo. A sensação de estar rodeada por estes braços, mesmo eles sendo um pouco rígidos e frios, é uma sensação inimaginável e indescritível para a minha pessoa. Basta que quando ele me coloca no chão, sinto-me tão zonza que quase tropeço nos saltos dos sapatos.

                - Ai, pombinhos, só para a vossa informação: “Não quero fazer de vela”. – Resmunga a Briana com os braços cruzados ao peito. – Já acabaram. Só falta fazerem amor. Há muito lugar por aí.

                - Não creio ser má ideia. – O Raph volta a brincar com os comentários da Briana e julgo perceber um certo começo de amizade entre os dois. – Vamos, Lauren.

                - Ganha juízo, tonto. – Cutuco-lhe a testa e então ele parece estar mais atento. – Está tudo bem, Raph?

                - Acho que tenho problemas a resolver. – Ele iça a cabeça como a farejar o ar e depois volta a baixa-la com um certo esforço que não é muito discreto.

                - Raphael, se precisas de tratar de algum assunto está tudo bem. Não te sintas preso. – Ele segura-me a mão e dá me um beijo na bochecha e em seguida nos lábios. – Depois combinamos um encontro, ok?

                - Está bem. – Ele começa a recuar em direção das sombras antes de me voltar a falar. – Buenas noches, mi princesa.

                Aceno-lhe uma última vez enquanto o vejo a ir-se embora, fundindo-se com a escuridão dos lugares não iluminados pelas luzes fluorescentes da festa. A Briana pigarreia ao meu lado e sinto-me magoada comigo mesma por quase a ter esquecido.

                - Desculpa, Bri. – Desabafo. – Tiveste de fazer de vela.

                - Bem, tenho de admitir, o Raphael nem é um mau…vampiro. – A loira fica cabisbaixa novamente, suponho que devido ao que aconteceu hoje de manha, mas logo volta a sorrir. – Até gostei de vos ver juntos. Só da próxima vez pensa mais nos amigos. Eu fiz de vela e nem pensaste em me arranjar um par.

                Abano a cabeça negativamente com um sorriso no rosto. A Briana é incapaz de mudar no que toca aos rapazes. No entanto, ainda me pende uma questão, a razão pela qual a loira terá saído da companhia do nosso grupo num estado tão revoltado. E também, se ela não estará magoada pelo meu comportamento de alguns minutos atrás.

                - Lamento, Lauren. – Como se me lesse os pensamentos, a Wayland começa a responder-me. – Já deves ter ouvido isto vezes demais hoje, não?

                - Sim, ouvi.

                Ela encosta-se á parede ao lado da porta e suspira pesadamente. Para ela, abdicar do orgulho que sente por si mesma, é algo que lhe custa um pouco e, portanto, é muito raro de acontecer. Mas, quando ela percebe que magoou seriamente as pessoas de quem ela gosta ou que estão sempre ao seu lado, toma a decisão de o fazer. Isso é algo que admiro nela.

                - Eu só…sinto-me sobrecarregada agora que a Clary chegou. – Quase que deixo o queixo cair, mas evito-o para que a Briana não se irrite, já que ela falou normalmente da ruiva sem lhe lançar nenhum insulto. – Eu tenho a sensação de ter de chamar mais a atenção dos meus amigos. Tenho medo que me troquem por ela.

                Já calculava.

                - Briana Wayland, não sei se já te disse isto hoje mas digo-te agora. – Gesticulo com os braços e as mãos para que ela me ouça com atenção. – Nós nunca te trocaríamos. És nossa amiga e és como uma irmã para mim. E eu nunca, mas nunca abdicaria da minha própria irmã.

                - Mas tu tens o Raphael. – Replica ela com a voz um pouco mais irritada. – O Jace está a começar a gostar da Clary e o Alec…ele…

                Apenas duas palavras surgem na minha mente e julgo-as mais certas do que qualquer outra coisa neste momento.

                - Magnus Bane. – Adivinho eu. – O Magnus e o Alec estão, de algum modo, interessados um no outro, é isso?

                Ela desvia o olhar para um aglomerado de homens e mulheres que se encontram a beber álcool e outro tipo de bebidas.

                - Ao princípio achei o Magnus interessante e até achei que poderíamos namoriscar mas depois… - A Briana faz uma pequena pausa, como se as palavras custassem a sair e lhe ferissem o coração como facas, antes de voltar a explicar-me os seus sentimentos e receios. – Os olhares, os gestos…tudo parecia ser com a intenção de impressionar o Alec. E tenho a certeza de que ele não é indiferente ao Magnus.

                A dor dela comove-me. O Alec e ela sofrem da mesma dor: o amor não correspondido, no entanto, cada um arranjou maneiras para se abstraírem dele. O Alec apenas guardou o que sente por outro lado, a Briana, decidiu esquecer-se disso literalmente.

                - Sabes que já há muito tempo que tu devias ter contado ao Alec o que sentes? – A minha questão faz com que os seus olhos verdes se façam destacar mais e que se alterem para um verde mais vivo. – Sentir-te-ias melhor. E quem sabe se não te ajudaria a esquece-lo.

                - O problema é esse. – A voz da Briana está mais embriagada. – Não tenho a certeza se o quero esquecer. Às vezes sinto que isso é o mais correto mas depois…não sei…acho que tenho esperança.

                Praticamente as mesmas palavras que o Alec havia-me dito no dia anterior antes da chegada dela.

                Ponho uma das minhas mãos no seu ombro, num gesto de conforto. A Briana não pode ficar deprimida como quando descobriu que o Alec gostava do Jace, iria sentir-me muito mal se não conseguir impedir isso.

                - Olha, podes sempre contar comigo. – Digo, ao mesmo tempo que pisco o olho. – Hás-de superar esta, miúda. Vences sempre uma batalha e esta não será diferente. Confia em mim.

                A Briana não me responde, mas sei que ela tem um pouco de receio de não ser forte ou corajosa o bastante para enfrentar este desafio que se encontra no seu dia-a-dia.

                - Vais-te ofender mas… - Ela faz um pouco beicinho antes de sorrir com a minha expressão a quando fazem alguma asneira e eu já sei qual é, e por acaso julgo saber. – O Damon foi um dos melhores rapazes que comi.

                Ponho a língua de fora e sons de vómito. Ela não tem mais nenhum assunto para falar se não nesse estúpido, tarado e bruto. Felizmente o aviso já tinha sido feito e tão cedo ele não se iria aproximar de nós.

                - Não te aproximes de tipos como eles. – Ela bufa um pouco mas isso não me faz qualquer diferença. – Eu sei que estou a ser mãe galinha mas o Damon quase te magoou.

                A Briana não diz nada mas tenho a certeza de que me quer responder algo. Felizmente, parece que a sua impulsividade está mais contida que o usual e ela apenas observa os Habitantes do Mundo-á-Parte com uma certa curiosidade.

                - Sabes que mais? – Diz ela, sem sequer olhar para mim quando me agarra o pulso. – Isto está muito monótono. Estamos numa festa e o suposto é nos divertirmos e não estarmos a falar sobre o passado, então vamos dançar.

                Ela puxa-me para a pista de dança, onde se encontram uma multidão de nixies, fadas e outros submundanos, e começamos a dançar uma música qualquer. Eu não estou muito nesse espirito e também não estou disposta a embriagar-me para que tal aconteça. Um mau pressentimento atravessa-me a espinha enquanto danço ao lado da Briana e então um grito irrompe pelo meio do aglomerado de convidados na pista de dança.

                - Simon! – É uma voz feminina que reconheço pertencer á Izzy.

                Troco de olhares com a Briana que acena afirmativamente com a cabeça e saltamos, literalmente, da pista de dança na direção do grito. Ao princípio, custa-me colocar-me direita com os saltos enquanto corro, pois os meus pés parecem estar a dobrar-se completamente, mas, finalmente, consigo chegar até á Izzy sem nenhuma quedo ou sinal de entorse no tornozelo.

                - Izzy, está tudo bem? – Adianta-se a Briana.

                A Izzy está completamente bêbada ou pelo menos, é o que conseguimos perceber pelo seu olhar distorcido e o cheiro incomodante a álcool que o seu hálito emana, e está com as maças do rosto coradas. Eu não me quero aproximar muito por conta do cheiro mas tenho de o fazer.

                - O Simon. – Diz ela. – Ele é um rato.

                - Rato? – A loira e eu falamos ao mesmo tempo e depois trocamos olhares que explicam a nossa confusão.

                Lembro-me da imagem que me assombrou quando estava com o Raphael: um rato castanho com uma expressão mais inteligente que o comum. Agora percebia o que isso queria dizer.

                Levo a minha mão á testa e dou uma chapada a mim própria. Não é usual eu conseguir utilizar as minhas visões para impedir que acontecem mas já aconteceu uma ou outra vez, por causa disso é que naquela noite em que o Jace, a Izzy e o Alec foram caçar um demônio no Pandemonium e eu avisei da probabilidade de uma mundana os poder ver, o que se revelou ser em parte verdade já que a Clary não é uma mundana e sim uma caçadora.

                - Tu sabias? – Pergunta-me a Bri ao observar a minha reação.

                - Não sabia que o Simon se ia transformar num rato mas uma imagem dessas passou me pela cabeça. – A Izzy mira-me um pouco inquisidoramente e entendo o porquê. – Ei, eu não disse que adoraria que ele ficasse assim, o que por acaso não adoro mas não me faz qualquer diferença.

                - O que vou dizer aos outros? – Pergunta a Izzy, recuperando um pouco apostura, se é que é possível já que ela está com um nível alto de álcool no sangue. – Eles vão se zangar comigo.

                - Não creio que isso aconteça com o Jace. – A Briana olha na direção do comodo que suponho ser o quarto do Magnus. – A Clary é que se vai passar.

                Um sorriso rasga-lhe os lábios e abano negativamente a cabeça com a expressão de divertimento que está estampada na sua face.

                - Izzy, vamos procura-los e vais contar-lhes o que se passou. Briana, tomas conta do Simon rato antes que ele tenha a estúpida ideia de sair do balcão para ser pisado.

                - Estúpido já ele é, portanto não admira que todas as ideias dele sejam estupidas. – Resmunga ela atrás de nós pois estávamos já a caminhar em direção ao quarto.

                Muitos Habitantes do Mundo-á-Parte olham apreciativamente para nós mas os avisos visuais que lhe lanço mantêm-nos afastados, até mesmo as bichas que com o meu respeito, deviam contratar um conselheiro de moda mais experiente.

                - Estamos aqui. – A voz elevada do Alec faz com que descontraia um pouco a minha postura. – E cuidado com esse filho-da-puta.

                Franzo o sobrolho e observo ao meu redor a quem ele se referia como o “filho-da-puta”. É me difícil, ao inicio, encontrar sinais de alguém que possa ser denominado dessa maneira mas, finalmente, consigo ver um homem com um colete verde que degustava a Izzy com o olhar.

                Ignoro-o assim como a Izzy, e volto a minha atenção para o grupo. O Magnus permanece atras deles sem que ninguém se aperceba até ele comentar algo, fazendo com que uma expressão de desdém invadisse a cara do loiro, o que me provoca um risinho divertido.

                - Ainda estás aqui? – A pergunta dele carrega um pouco de azedume.

                O asiático está prestes a responder-lhe quando a Izzy os interrompe, com o cheiro a álcool á sua volta a colocar-me um pouco maldisposta. E agora a revelação: nunca me cheguei a embriagar completamente já que apenas o cheiro das bebidas me coloca tonta e maldisposta, nem sei bem porquê, acho que talvez eu seja fraca no que toca a isso.

                - Ajuda, pessoal. – Suplico, bem baixinho para que a Isabelle não se irrite comigo.

                - Jace! Alec! Eu procurei-vos por todo o lado. – Ela inclina-se um pouco para o lado e tenho de servir de suporte para que ela não caia.

                A Clary estuda-nos um pouco, dando me a entender que a confusão está prestes a iniciar-se.

                - Onde se meteu o Simon?

                - É um rato. – Diz a Izzy um pouco mais em si, o que lhe agradeço embora o cheiro ainda a rodeie.

                O Alec adota um expressão rancorosa no rosto, demonstrando a irritação que está a tomar conta de si devido a sua teoria incorreta acerca do significado da frase da irmã.

                - Fez-te alguma coisa? – A sua preocupação fraternal comove-me mas também faz com que o ache um pouco idiota. – Tocou-te? E a Briana? Ele fez-lhe algo?

                - Alec, conta até dez e respira. – Digo ficando um pouco mais impaciente. – E o Simon, pelo que a Izzy disse, agora é um rato.

                O Jace afasta-se um pouco de nós, torcendo o nariz, e aproximando-se da Clary.

                - Estão bêbadas, só pode. – Resmunga ele.

                - Não estou nada. – A Izzy parece querer espetar-lhe um murro na cara e eu aproveito-me disso para me afastar para uma distância segura. – Bem, talvez um pouquinho mas não é essa a questão…

                Ela soluça um pouco e eu termino a explicação por ela.

                - O Simon não devia ter sido convidado para esta festa, na minha honesta opinião. – A Clary fixa-me com a testa enrugada e um pouco ofendida com a minha afirmação, no entanto isso não me incomoda. – Ao que parece o Simon bebeu uma dessas bebidas azuis, mesmo sendo aconselhado pela Izzy a não o fazer, e agora transformou-se num rato. A Briana está de olho nele.

                - Um rato? – A cara da Clary demonstra toda a sua incredulidade. – Não estão a dizer…

                - Quero dizer um rato.- Insiste a Izzy. – Pequenino, castanho e com a cauda coberta de escamas.

                A descrição dela é quase tão perfeita que me chego a arrepiar só de pensar em ratos.

                - A Clave vai gostar disto. – O tom duvidoso do Alec leva-me a desconfiar da sua afirmação. – Tenho a certeza de que andar por aí a levar humanos no meio de uma missão e transforma-los em ratos é contra a Lei.

                - Tecnicamente não foi bem assim porque ela não o obrigou a nada. Pode ser é acusada de negligência na pior das opções. – Opina o Jace. – Mas a minha irmã ficou mesmo a tomar conta do mundano?

                - Bem, ela apenas se está a certificar que ele não é pisado por ninguém, mas duvido que ela tenha muita paciência para nos esperar.

                - E vocês agem como se isso tivesse piada? – O berro da ruiva interrompe-nos e não sei como me contenho para não lhe elevar a voz pois ela agarra no pulso da Isabelle como se o quisesse arrancar. – O meu melhor amigo é um rato?

                - Ai. – A Isabelle começa a debater-se para que a Clary a solte e eu, ignorando os avisos que se começam a impor na minha mente avanço na direção delas.

                - Clary, estás a agir como uma miúda mimada. A Izzy pode ter sido irresponsável mas se ela avisou o Simon, ele só tinha que a ouvir. – A minha voz sai mais rígida que o costume quando falo com a Clary. – Por isso é que ele não devia ter-se intrometido nos nossos assuntos.

                - Mas ela deixou-o! – A pressão no pulso da Isabelle está a aumentar pela maneira como as mãos da Clary começam a ficar brancas nos nós dos dedos. – Ele deve estar aterrorizado.

                - Eu não o deixei. Ele escondeu-se debaixo do balcão. – Protesta, inutilmente, a Izzy. – Larga-me!

                - Cabra! – A Clary grita-lhe como um animal selvagem enfurecido e prega-lhe uma grande bofetada na cara, pondo-se depois a correr sem esperar pela reação de nenhum de nós.

                - Izzy, estás bem? – Pergunto, tentando observar a marca que agora começa a aparecer-lhe na pele.

                Ela não me responde e segue igualmente com os outros, em direção do balcão onde já se encontra a Clary agachada e com o braço estendido por baixo do balcão improvisado, com a Briana ao lado a resmungar qualquer coisa. Assim que ela me vê, afasta-se discretamente deles para se colocar ao meu lado.

                - Eu acho que a ruiva está a ter algum ataque. – Supõe ela, com a pontaria certeira. – Mal chegou ao meu lado, pôs-se a chamar pelo amiguinho e nem me agradeceu por tomar conta dela.

                - Ela está a ser um pouco emocional demais. – Não comento acerca da bofetada para que a Briana não fique novamente de mau génio mas pouca diferença faz pois logo que a Izzy aparece atrás do Alec, a loira repara de imediato na marca de uma mão que torna a pele da Izzy mais avermelhada.

                Ela esbugalha os olhos e foca a Clary. A sua iris parecia estar a tornar-se cada vez mais laranja e temia que essa cor fica-se igual ao doirado das chamas. Enquanto isso a ruiva permanência com o braço estendido e a suplicar para que o Simon saísse do seu esconderijo. Eu, por outro lado, apenas queria por as mãos naquele estupido rapaz e dar-lhe pancada até que ele fugisse a sete pés e nunca mais se aproxima-se de nós. Se era para fazer estragos, já tinha feito demais.

                A ruiva solta uma expressão de alívio e reparo no rato que agora se encontra encolhido nas suas mãos e que guincha tristemente. Não era para mais, ser transformado num rato não é nada agradável, mas é muito bem feito para ele aprender que quando não se é experiente num mundo não se pode agir e falar como se se conhecesse tudo e todos.

                - Pobre, Simon. – Diz a ruiva. – Vai ficar tudo bem.

                - Eu cá não teria assim tanta pena dele. – Disse Jace. – Provavelmente nunca esteve tão perto de marcar um golo.

                - Pronto, já viemos buscar o rato. Podemos ir embora agora? – Digo, sem paciência para mais comentários ou aventuras malucas.

                - Como podes ser tão insensível, Lauren? – Resmunga a Clary. – Eu e o Simon sempre fomos teus amigos. Aposto que se fosse o Jace, a Briana ou algum dos irmãos tu irias ficar preocupada como eu.

                - Primeiro; o Simon não sente qualquer vínculo de amizade por mim. Segundo; eu ficaria tal e qual como tu se te acontecesse o mesmo. E terceiro; mundanos não se devem intrometer no Mundo das Sombras e se precisas de alguma prova em como isso dá problemas basta olhares para o Simon. – A Clary aproxima-se um pouco de mim e penso ter falado de mais mas não recuo.

                Quando a Clary já está quase a um passo de mim, com o Simon encolhido ao seu peito e com vestígios de um pequeno e doentio sorriso no rosto, alguém coloca-se á minha frente.

                - É que nem penses que vais tocar na Lauren como fizeste com a Izzy, Clary. – A voz da Briana soa muito imperativa e surpreendo-me por ela tratar a ruiva pelo nome, algo que também afeta o resto do grupo. – Se o tentares fazer vais ter que passar por mim e acredita, não será nada agradável e tu já estás a dever-me uma por ter estado a tomar conta desse rato que não tem qualquer responsabilidade.

                 A Clary para e fecha os olhos ao mesmo tempo que respira fundo.

                - Muito bem. – Diz ela, um pouco mais calma. – Alguém pode ir buscar o Magnus. Temos de inverter o feitiço.

                - Nada de pressas. – O Jace esta a sorrir, divertindo-se da situação, embora antes estivesse bastante sério a observar a irmã que entretanto se impunha. – É giro assim. Olha para o seu nariz rosado.

                Ouço um guincho irritado do rato e logo a seguir o loiro retirou a mão bruscamente, demonstrando que o Simon lhe devia ter mordido pela sua afirmação divertida e insultuosa.

                - Izzy, vai buscar o nosso magnífico anfitrião.

                - Porquê eu? – A cara de Isabelle ainda está um pouco avermelhada e o seu tom de voz parece ter ficado mais arrogante.

                - Talvez porque o mundi se tornou um rato por tua culpa, idiota. – Respondeu a Briana, adiantando-se ao irmão que também se preparava para ripostar.

                - E não o podemos deixar aqui. – O Jace sempre consegue arranjar uma maneira de também irritar a Briana às vezes, e desta vez fá-la bufar irritada.

                - Terias muito prazer em deixá-lo se não fosse por causa dela. – E com isto a Izzy saiu á procura do Supremo Feiticeiro de Brooklyn, deixando a Clary a comunicar-se com o rato ao seu colo.

                Eu e a Briana apenas digiramos o que tínhamos acabámos de ouvir, suponho que o facto de o Jace estar preocupado com Simon não era nada mais, nada menos do que um simples sacrifício para o bem-estar da Clary. A Briana, que ainda se estava a habituar a essa ideia, acabou por não reagir tão mal como nas últimas horas mas também ficou ofendida, enquanto eu apenas os observo com mais atenção. A fúria que á pouco tinha sentido começava agora a diluir-se nas veias, que removem quaisquer vestígios de que alguma vez eu tenha estado furiosa com a ruiva.

                O Simon continua a guinchar até aparecer o Magnus, que debruça ao seu lado para observar o rato, com a Isabelle ao seu lado, bastante irritada pelo que eu posso observar.

                - Rattus norvegicus. – Ele estuda o Simon mais um pouco antes de dizer o nome da espécie de rato em que ele se transformou. – Um rato castanho comum, nada de exótico.

                - Não me interessa que espécie de rato ele é. – Barafusta a Clary. – Quero que volte ao estado normal.

                O Magnus coça a cabeça pensativamente e um grito, que mais ninguém ouve, ecoa pela minha mente, obrigando-me a levar as mãos aos ouvidos e fazendo a Briana olhar para mim. Presto atenção ao grupo a tempo de ouvir a resposta do Magnus e de me prevenir.

                - Não vale a pena. – Assim que ele diz isto, faço sinal á Briana para tapar os ouvidos.

                Conseguimos ainda ouvir um murmuro vindo do Jace e a seguir um berro com origem na Clary mas que acaba por ser um pouco abafado pelas nossas mãos. Ela termina de falar dando a vez ao Magnus e ao seu humor impassível e voz como seda. Nós retiramos as mãos nesse momento e o Alec ainda está a esfregar as têmporas por causa do grito estridente da Clary, que chegou a assustar o Simon.

                - O efeito dos cocktails é temporário. Não vale a pena fazer um feitiço para o transformar. Iria traumatiza-lo. Demasiada magia prejudica os mundis, pois o sistema deles não está habituado.

                - Também duvido muito que o seu sistema esteja acostumado a ser um rato. – A ruiva não está nada animada e só me está a apetecer sair dali o mais depressa possível. – Na medida em que és um feiticeiro, não podes inverter o feitiço?

                -Não. – Respondeu o asiático.

                - Estás a dizer que não vais faze-lo.

                Assisto ao diálogo entre a recente descoberta caçadora e o feiticeiro em silêncio.

                Tanta confusão por causa de um rato. Penso comigo mesma. Se eu fosse outra pessoa a esta hora o Simon experimentaria a sensação de ter asas.

                - Não de borla, minha querida. E tu não podes dar-te ao luxo de me pagar.

                - Não posso ir de metro para casa com um rato. – Afirma ela, quase como um lamento. – Vou deixá-lo cair ou a polícia prende-me por transportar animais nocivos no sistema de trânsito.

                O Simon voltou a guinchar e a Briana aproximou-se do meu ouvido para sussurrar algo.

                - Eu acho que estou a desejar que aquele rato ganhe asas e vá para muito longe. – Abano a cabeça afirmativamente com um sorriso a estampar-se no meu rosto por ela ter pensado o mesmo que eu.

                Os gritos estridentes de uma rapariga pareciam agora ter aumentado de volume e tem mais alguém a acompanha-la, fazendo tal algazarra que os meus ouvidos estão a tinir. Muito provavelmente deviam ser banshee e alguém deve estar com a morte já assinalada.

                 O Magnus revira os olhos e vira-nos as costas.

                - Desculpem. – Diz ele, começando a abrir caminho á sua volta, por entre a multidão, que logo a seguir volta aos seus lugares na festa, ignorando-nos completamente.

                Suspiro. Espero que agora estejam todos dispostos a ir-se embora pois estou a ficar com umas dores de cabeça insuportáveis que desconfio na serem provocadas apenas pelo som abafado da banda musical que se eleva no ar da festa.

                - A ajuda dele não serviu de nada. – Diz a Isabelle enquanto andava de um lado para outro lentamente.

                - Quero lá saber. – Digo, levando as mãos á testa, estou a ferver mas não entendo o que se está a passar. – Acho que preciso de ir dormir.

                A Briana olha-me preocupada e os olhos dela possuem uma cor mais clara ao estudar-me as feições.

                - Estás muito pálida e a suar muito. – Afirma ela.

                As luzes fluorescentes incomodam-me a visão e concordo com a Briana.

                - Vamos embora então. Sabes uma coisa… - O Alec aponta para a mochila da Clary. – Podes colocar o rato aí dentro.

                A Clary olha-o friamente mas acaba por concordar com a ideia dele e coloca o Simon rato dentro da mochila, apesar dos seus guinchos incomodados e dos pedidos de desculpa da Clary. No fundo, estou me pouco a importar com esta situação. Só penso na minha cama suave e confortável.

                O Jace, por outro lado, ainda goza com a situação do Simon. Penso que se estivesse mais enérgica, iria provavelmente ter um pouco de divertimento em assistir a isto.

                 A ruiva levanta-se e faz a exclamação do dia:

                - Vamos sair daqui. Já não aguento este sítio.

                Eu e a Briana somos as primeiras a sair para o exterior. A loira permanece ao meu lado, talvez por causa do receio que eu desmaie como aconteceu hoje de manhã. No entanto, temos de esperar pelo resto dos nossos amigos que se encontram mais atrás a passar por um grupo de vampiros que resmungam acerca das motas, estragadas pelo Jace e o Alec, e também acerca dos seus companheiros bêbados e desaparecidos.

                O Magnus começava a perder a paciência com os vampiros quando a Clary e o Jace começam a mexer os pés atrás do Alec e da Izzy. Infelizmente, por uns bons minutos, perco a Clary de vista e não sou a única, o Jace também parece um pouco preocupado quando se separa da Clary.

                - Acho que estão a começar mais problemas. – Murmuro para a Briana.

                Ela observa com atenção o que se está a passar para depois apontar para um canto onde se encontra uma cabeleira laranja cor de cenoura. Aproximamo-nos mais um pouco mas não precisamos de muito pois o Jace reaparece ao lado da Clary a tempo de mandar passear um vampiro.

                Quem aparece pouco tempo depois é o Magnus que conversa um pouco com os dois e a seguir fala para o Alec que fica muito envergonhado e sem reação. Nem me esforço por tentar saber o que é mas a Briana não precisa de o fazer e isso deve-lhe custar um pouco porque baixa a cabeça e fecha-se a copas, virando as costas ao resto do grupo.

                O Jace, finalmente, acaba por agarrar no cotovelo do Alec e leva-o atrás dele como se o moreno tivesse perdido a capacidade de pensar e caminhar. A Clary fica um pouco para trás, comentado algo com o Magnus mas eu decido permanecer ao lado da Briana. Esta está um pouco desanimada mas não mo demonstra, em vez disso fica com um sorriso sarcástico colado na cara.

                Acabo por me cansar disso e decido por tudo a pratos limpos. Parece que a minha paciência esta noite decidiu descansar.

                - Bri, o que o Magnus disse ao Alec que te pode ter colocado assim? – As palavras saem-me com um pouco de dificuldade pois a minha garganta parece estar um pouco seca.

                - Nada demais. – Responde-me ela, naturalmente. – Apenas acho que vou seguir o teu conselho.

                A minha expressão altera-me para uma mais confusa. A Briana diz que vai seguir o meu conselho mas agora não me estou a lembrar de qual deles pode ser. Uma luz parece indicar-me o caminho no interior da minha mente e acabo por finalmente chegar á resposta da minha questão.

                Fico muito surpreendida por ela, ao fim de tanto tempo, tomar a iniciativa. E também um pouco curiosa devido às causas que a poderão ter motivado para tal coisa.

                - Eu vou parecer tagarela mas esta é a ultima pergunta, da minha parte: por que só agora decidiste fazer isso?

                - Porque agora é me obvio. – Diz ela olhando para o céu encoberto de nuvens. – O Magnus gosta do Alec e eu não posso perde-lo tão facilmente. Mesmo que ele me rejeite…talvez seja melhor libertar-me deste segredo.

                Estou orgulhosa dela mas tão orgulhosa que lhe dou um abraço improvisado.

                - Ai. – O nosso abraço é interrompido pelo meu gemido.

                Levo as mãos as minhas têmporas e pressiono-as com força para disfarçar a dor que estou a sentir. Nenhuma visão me está a atingir mas sinto que esta noite vai ser agitada e com muitos pesadelos. Duas mãos frias agarram-me em cada braço e sinto alguém a colocar-se ao meu lado segurando-me o corpo.´

                - Lauren, fala comigo, o que se passa? – A voz da Briana está um pouco trémula e vejo que é ela que me está a suportar.

                - Eu estou bem. – Minto. – Só estou um pouco tonta.

                Abro um pouco mais os olhos e consigo distinguir o brilho dos olhos vermelhos da Izzy, ao lado do irmão, que me observa um pouco preocupada.

                - Alec, o Jace e a Clary disseram para continuarmos a andar. – Avisa ela. – Acho melhor continuarmos a andar e levarmos a Lauren ao Hodge. Ela pode estar a ficar doente.

                - Ei, eu estou aqui e caso não saibam eu disse que estou bem. – A dor volta a assombrar-me mas contenho-me para apenas fechar os olhos para que desapareça.

                Eles não me dão ouvidos e continuam a caminhar ao meu lado, talvez para se certificarem-se de que eu não caio ou desmaio, no entanto isso incomoda-me um pouco porque tenho o pressentimento de estar a dar-lhes mais trabalho que devia.

                Felizmente chegamos depressa ao metro e apanhamos o primeiro que aparece que segue em direção da 5ª Avenida, já que desse modo ficamos perto de casa. A Briana senta-se ao meu lado e fala comigo de vez em quando. Pouca ou nenhuma atenção presto ás palavras dela e isso faz-me sentir horrível mas a minha cabeça parece querer explodir.

                Várias teorias surgem na minha cabeça do que pode ser isto: talvez um vestígio de Bloody Mary que estivesse no hálito do Raphael mas isso não me colocaria com dores de cabeça mas num estado de alucinação, não podia haver nenhuma substancia no ar porque senão os meus amigos sentiriam o mesmo o que não é o caso já que todos se encontram bem, exceto o Alec que ainda está um pouco amuado, e eu não bebi nem comi nada de estranho durante a festa.

                Uma pequena imagem desfocada começa a aparecer-me bem devagar na minha mente. No entanto, por alguma razão, ela começa-se a desvanecer quando eu tento ignora-la. Só quando tal acontece, tenho a possível razão destas dores. Durante a festa, eu evitei a visão do Simon a muito custo e agora isso estava a ter efeitos comigo pois eu nunca tinha tentado fazer algo igual. As consequências da minha ação estavam agora a ter efeito e sem dúvida, prefiro ter uma visão dolorosa que ter que as conter dentro da minha cabeça, como o vapor numa panela de pressão que começa a ficar completamente cheia por não puder sair.

                - Briana. – Ela olha para mim e eu, com muito custo, consigo avisa-la a tempo. – Não te assustes.

                - O quê? – A voz dela começa a esmorecer-se quando eu decido deixar as imagens subirem á tona como a flutuar na água.

                Num momento estou num metro e no outro já me encontro num lugar pouco iluminado e de onde tenho vista para o exterior onde se encontra o East River e para Turtle Bay. Não sei onde estou mas calculo estar na ilha de Roosevelt por causa da localização e da vista que tenho. Olho ao redor do comodo em que me encontro até que um raio de luar me ilumina a visão.

                A minha frente, ligada a um número que nem conto de tubos, deitada numa cama de dossel e presa com algemas, encontrava-se uma mulher muito bonita a dormir com o cabelo ruivo espalhado pela almofada branca.

                - Jocelyn Fray.


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Notas finais do capítulo

Surpresas, surpresas e mais surpresas. Agora tudo poderá mudar? O dom de Lauren terá alguma ajuda importante? E o que será que mudou para ela agora conseguir vaguear pelas suas visões?



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