Presente Complicado escrita por Shelley


Capítulo 1
Capítulo único


Notas iniciais do capítulo

Boa leitura, espero que gostem!



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Muitos autores têm problemas para pensar em enredos envolventes. Quando isso acontece, eles precisam encontrar um pouco de inspiração e, para isso, alguns ouvem músicas, outros vêem filmes e há aqueles que conversam com os amigos. Bonnie se encaixava na última categoria, estava sentada ao lado dos seus dois companheiros: Voide, um fantasma que, apesar de não sentir frio ou calor, usava um moletom azul e Zoth, um demônio misterioso com o rosto coberto pelo capuz da túnica comprida que havia sido amaldiçoado para falar apenas com perguntas.

— Nós temos um desfio, cambada – ela anunciou e, percebendo que nenhum dos dois parecia interessado o suficiente para perguntar do que se tratava, continuou falando: – a gente tem que fazer uma história para aquele grupo do Face, sabem? O café com...

— A gente sabe – interrompeu Voide – já ouvimos você falar sobre esse grupo umas vinte vezes, no mínimo!

— Mas dessa vez é importante, eu vou participar de um desafio – apesar da empolgação da garota, os outros dois não poderiam estar mais entediados – e vocês precisam me ajudar.

— E por que a gente te ajudaria? – perguntou Zoth.

— Porque eu sou amiga de vocês – nenhum dos dois pareceu convencido, então Bonnie resolveu tentar outra coisa: – porque eu vou pagar cinco contos pra cada um.

 – Tá bom, a gente te ajuda – Voide respondeu pelos dois.

Apesar de estar arrependida do que havia dito e de ter escolhido dois interesseiros para serem seus amigos – não que ela tivesse muitas opções, ninguém queria ser seu amigo –, Bonnie se levantou e começou a falar mais uma vez:

— Beleza – ela disse – a gente tem que escrever uma história bonitinha pra uma moça.

— E quem é ela? – Zoth questionou.

— Eu já estava achando que vocês não iriam perguntar – dizendo isso, ela abriu um sorriso um pouco maior do que deveria para que fosse considerado normal e fez um barulho estranhamente parecido com o dos velociraptors daquele filme dos dinossauros, então apagou as luzes, ligou um projetor que não sabemos de onde saiu e iniciou uma apresentação no PowerPoint— essa aqui é a Anelise, ela escreveu uma história pra cada desafio e nunca falhou com aquele grupo, então nós temos que escrever algo incrível pra essa moça porque ela merece, capiche?

— De que tipo de história ela gosta? – Zoth perguntou.

— Bom... – Bonnie pensou um pouco para se lembrar do que havia visto quando vasculhou as redes sociais de Anelise – ela curte yaoi, eu acho...

Pela cara que a garota fez, Zoth deveria ter um pouco de medo de perguntar o que era yaoi, mas ele já havia passado pelo inferno e enfrentado inimigos pelo menos quatro vezes maiores do que ela. O que ele poderia perder?

— E o que é isso?

— É um negócio muito louco – ela o encarou e, logo depois, olhou para Voide – vocês dois poderiam dar uns beijos aqui? Quer dizer, só para a inspiração vir mais rápido e tal...

— Cara, você não pergunta o que é yaoi pra alguém como ela, olha a cara da condenada – Voide tentou manter a calma, ele sabia que lá no inferno onde Zoth morava eles não tinham essas coisas – yaoi é, basicamente, uma história com dois caras se beijando.

— Do jeito que você fala, parece até que não gosta – apesar de gostar de provocar o amigo, Bonnie parecia chateada por eles não atenderem o seu pedido – e comédia? Eu gosto de escrever comédia.

— Quantas vezes a gente já conversou sobre isso, Bonnie? – Zoth parecia cansado por ter que tocar nesse assunto novamente.

— Você não é engraçada – Voide completou.

— Isso não é verdade – ela protestou – teve um monte de gente comentando na minha história sobre o Cebolinha!

— Não me venha falar da maldita história do Cebolinha de novo! Você sabe muito bem que aquelas pessoas foram obrigadas a comentar ali porque era outro desses desafios do grupo!

A garota soltou um suspiro derrotado, mas continuou falando:

— Tá, então o que você quer escrever?

— Escolhe você – o fantasma respondeu.

— Foi para isso que eu saí do inferno? – Zoth estava impaciente.

Depois de mais algum tempo pensando, Bonnie se lembrou:

— Ela também disse que gosta de romance, mas eu não sou muito boa com isso...

— Não deve ser tão difícil – disse Voide – a gente só precisa de um casal, algum acontecimento dramático e cenas melosas.

— Mas sobre qual casal nós podemos escrever?

Os três iniciaram uma discussão sobre isso que se estendeu por vários minutos. Eles conseguiam achar um defeito em qualquer casal: não sabiam o suficiente sobre a personalidade de Anelise para saber que tipo de personagem fictício ela gostaria de namorar, não sabiam se ela gostava de fulaninho com fulaninha ou se havia assistido a série em que cicraninho e beltraninho apareceram. De repente, já estavam contando causos um para o outro.

— Então, meu pé estava preso ali, eu estava completamente desesperado, o cachorro estava tendo um ataque e eu ainda tinha metade da torta...

Foi só então passou pela cabeça de Bonnie que eles deveriam estar tentando escrever. Ela interrompeu a história de Voide com um barulho estranho e desesperado e puxou um computador que saiu de sabe-se lá onde para perto de si.

— A gente precisa escrever! Eu preciso dessa história pronta até o fim do mês! – ela parou de falar por um momento e arregalou os olhos – Ferrou muito! Me ajuda, senhor!

Enquanto Zoth tentava contar até dez para não atirar raios lazer nela, Voide segurou os ombros da garota e a chacoalhou sem dó ou piedade.

— Se acalma, mulher! O que aconteceu?

— Ela postou no grupo do Face que quer saber quem a tirou no amigo secreto! Sabe o que isso quer dizer?

O fantasma e o demônio trocaram um olhar preocupado.

— O que isso quer dizer? – Zoth perguntou.

— Que eu tô demorando com a história!

— A gente consegue fazer uma história rápido, não é Zoth? – Voide olhou para o demônio, que apenas concordou com a cabeça – a gente ainda pode usar aqueles dados da quinta dimensão que aquele ornitorrinco alado deu pra gente e fazer um romance original.

— Aquele dia foi louco... – Bonnie murmurou.

Para os leitores desinformados, os dados da quinta dimensão contêm todas as opções de tudo quanto é coisa neles. Quando são jogados, eles mostram as alternativas mais sem sentido e quem estiver por perto corre o risco de não entender nada.

— Beleza, vai ser uma história sobre –  Voide jogou o primeiro dado – uma garota que gosta de poesia escocesa e... – ele jogou outro dado – um garoto que gosta de se vestir de panda – mais um dado – que se conhecem em um hospital psiquiátrico.

— Quê? – aparentemente, no inferno não existiam histórias de romance.

— Eu não vou escrever isso aí não! Que treco bizarro...

— Quem tá perdendo é você – Voide deu de ombros.

— Mas eu estou preocupada porque ainda não sei o que escrever pra esse desafio.

Bonnie suspirou, sentindo-se derrotada. Ela não conseguia pensar em nada que chegasse perto de ser um enredo decente, mas já havia dito que participaria do amigo secreto. Se não conseguisse entregar uma história, com certeza se sentiria muito mal por saber que havia alguém sem um presente naquele grupo. De repente, uma voz pareceu vir de algum lugar naquela sala:

— Não desiste da história não, vai escrever.

— Que desgraça foi isso? – ela olhou para os lados procurando alguém que pudesse ter dito aquilo. Era uma voz feminina, e a única garota ali era ela – Eu tenho certeza de que não foi a minha consciência.

Depois de alguns segundos de silêncio constrangedor, uma garota saiu de trás do vaso de plantas mortas que Voide tinha ali ironicamente.

— Gente do céu, é ela! – Bonnie pareceu esquecer que estava triste em menos de cinco segundos – é a Anelise! Vou ter um troço, me segura!

— Tá tudo muito legal, tudo muito bonito – Voide interrompeu – mas como foi que você entrou na minha casa?

— Eu estava curiosa pra saber quem tinha me tirado no amigo secreto do grupo – ela explicou –, então eu vi a Bonnie passando e reconheci ela da foto do Face e a segui até aqui.

— Você invadiu a minha casa? – Voide estava indignado.

— Eu não! Essa casa aqui é abandonada, eu não sabia que tinha um espírito morando aqui.

— Faz muito sentido... – Bonnie ponderou.

— Olha, esse encontro entre vocês foi muito bonito, mas a gente precisa terminar de escrever uma história pra você – Voide lembrou.

E foi o que eles tentaram fazer, mas apenas pelos primeiros vinte minutos. De repente, foi iniciada uma discussão sobre o assunto da história, sobre qual personagem iriam escrever, o motivo de Zoth apenas poder fazer perguntas, como ninguém havia reparado a presença de Anelise na casa antes e outros assuntos aleatórios.

No final, Bonnie escreveu uma história bem mais ou menos, mas ainda espera que Ane tenha gostado.


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Notas finais do capítulo

Por hoje é só, pessoal :)
Eu espero que vocês tenham gostado ♥