Foclore Oculto. escrita por Júlia Riber


Capítulo 10
Capítulo 9


Notas iniciais do capítulo

Gente, as falas do André escritas erradas, são propositais, ok?



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 No jantar, Noite voava pela casa revigorado, Núbia sorriu ao sair do quarto e ver o corvo tão feliz.

Edgar, na sala, viu Núbia no andar de cima e fez sinal para que ela se aproximasse.

— Gosta de picanha? _ perguntou ele

— Gosto _ respondeu Núbia descendo as escadas.

— Ótimo _ disse Edgar com um sorriso torto, caminhando em direção a sala de jantar e Núbia foi logo atrás.

— Noite parece realmente bem melhor.

— Obrigada _ disse Edgar convencido e Núbia revirou olhos. _ O feitiço foi realmente bem sucedido.

— Meu sangue diz de nada _ ironizou Núbia.

Edgar revirou os olhos. Ele puxou a cadeira para Núbia depois sentou-se. Núbia estranhou a gentileza, mas ao lembrar que Edgar tinha mais de um século, considerou que aquilo devia ser natural para ele e assim sentou-se.

Na mesa havia picanhas suculentas e uma vasilha com Arroz de Carreteiro. Núbia sentiu sua boca salivar e qualquer receio que tinha sobre a comida feita por Edgar passou.

Os dois começaram a jantar e logo Edgar fez algo que era raro da parte dele, puxou assunto.

— Tu me disseste que queria fazer perguntas.

Núbia o fitou, lembrou-se de Thayna, do pedido que fizera sobre nunca comentar com Edgar sobre ela e agora que Núbia tinha um fantasma para mostrar cenas passadas, achou que sequer seria necessário fazer pergunta alguma.

— Ah, não é nada.

Edgar a observou e Núbia tentou comer e evitar olha-lo, mas notou que ele não esqueceria aquilo tão rápido, então fez outra pergunta qualquer.

— Aquele prefeito e filho dele não vão mais vir aqui, ne?

Edgar pareceu estranhar a pergunta.

— Não sei, por quê?

Núbia cogitou se devia ou não falar o que ocorreu naquele dia.

— hum... Nada de mais, eu só não gosto daquele André.

Núbia fez cara feia e Edgar passou a mão no queixo, pensativo.

— Ninguém gosta, para dizer a verdade, mas o pai dele, apesar de impertinente, é útil.

— Imagino, deve ser bom poder fazer o que quiser num lugar sem ninguém poder falar nada _ murmurou Núbia.

— Exatamente _ disse Edgar natural. _ Então, infelizmente, devemos tratar bem os Montes.

Núbia baixou o olhar.

— Não me peça para tratar bem André.

Edgar franziu os olhos.

— O que está escondendo? _ Núbia iria falar algo, mas Edgar a interrompeu _ lembre-se, se não me contar agora, mais cedo ou mais tarde vou descobrir de qualquer forma.

Núbia suspirou.

— Quando eu estava voltando da vila... depois de ter visitado a Ângela,  encontrei André, ele veio com aquele papo besta, de que devíamos ficar juntos, fez varias insinuações, é um narcisista chato, mas eu o ignorei, tentei me afastar, ele me perseguiu e eu perdi a paciência, o xinguei e ele não gostou.

— O que ele fez? _ disse Edgar levantando uma sobrancelha.

— tentou me agarrar, mas... eu chutei a barriga dele, não aconteceu nada porque eu fugi, mas não quero ver a cara dela, nunca mais, pois se ver, dou um soco _ admitiu Núbia.

Edgar ficou pensativo.

— Não verá mais. Não se preocupe.

Núbia não entendeu aquela afirmação, mas assentiu mais tranquila e voltou a comer, Edgar também fez o mesmo.

Após o jantar, Núbia foi para o quarto e leu um pouco. A todo momento ela sentiu-se não estar sozinha, mas concluiu que era somente sua Tia Bisavó fantasma ensanguentada, nada de mais.

Ela leu um dos livros sobre bruxaria e notou que nada é como nos filmes, ao menos, não se você for um iniciante. Núbia já lera sobre a Bruxaria Moderna, sempre gostou da Wicca, mas nunca tomou iniciativa sobre isso, agora ela sentia-se ansiosa, mas segura para começar fazer feitiços, estudar ervas, manipular energias... No pouco que leu, a garota já sabia qual rumo tomaria, magia branca, ou, somente magia natural. Ela não queria sacrificar ninguém, não queria ser como Edgar, se soubesse usar bem a energia e estudasse muito, não precisaria usar sangue de ninguém para ser uma grande bruxa.

Logo decidiu deixar o livro sobre bruxaria de lado e pegou o de história, o que mais lhe causou estranhamento.

Primeiramente observou o sumário, procurando algo interessante, ou que explicasse qual era o objetivo de Edgar, mas não havia nada de especial.

Ela então somente folheou o livro com tédio, fitando as imagens.

Negros enfileirados e acorrentados; navios negreiros que mais pareciam a realidade do inferno, eram sujos, com pessoas de corpos magos e olhares que refletiam histórias de profunda dor.

Núbia franziu o cenho, como alguém podia achar algo assim normal? Como podiam tratar um ser humano de maneira tão nojenta e cruel, por uma simples diferença étnica?

Ela respirou fundo, tentando não sentir repulso de ser humana e prosseguiu folheando as páginas, mas não viu nada além de mais sofrimento.

Logo se deparou com uma orelha na ponta de uma página especifica, ela desfez o amaçado imaginando ser só um acidente, quem sabe ela mesma tenha causado aquilo e nem viu, porém ao ver a imagem contida na página em questão franziu os olhos.

Mostrava um escravo idoso virado de costas, com cicatrizes profundas, provavelmente causadas pelos castigos com açoites. Ao lado havia um texto intitulado “as cicatrizes da escravidão”.

Núbia pensou em ler aquele texto, mas logo bocejou, estava morta de sono.

Ela decidiu não lutar contra o cansaço, teria bastante tempo para ler tudo aquilo, somente fechou os livros, os colocou no criado mudo e se deitou.

...

Edgar descia uma escada em caracol com um cajado na mão e uma lanterna negra na outra. O ar era úmido e frio, as paredes feitas de pedras cobertas por musgo, o que fez o Cabrall concluir que já estava na hora de fazer uma boa faxina naquele lugar, não era por que ali era um cativeiro que precisava ser tão sujo.

Em compensação, a sala principal, no final das escadas, era limpa e confortável, dependendo da situação, é claro.

O local também era de paredes de pedras, mas sem tanta umidade, e era constituído de um corredor e várias celas ao longo deste. As celas estavam na maioria vazias. Ha um bom tempo Edgar parara de colecionar monstros, primeiro porque dava trabalho mantê-los e segundo, porque quando escapavam davam mais trabalho ainda. Porém, havia uma criatura que Edgar não conseguia se desfazer.

Ele caminhou com cautela até a última cela, de onde já conseguia ouvir o barulho de água.

O interior da cela em questão era amplo, bem organizado, uma suíte tão bem que podia ser comparada as celas onde corruptos brasileiros costumam “cumprir sua penas”.

Do lado contrário onde ficava a cama, havia uma piscina pequena de diâmetro, mas funda o suficiente para um mergulho.

Edgar observou a cela aparentemente vazia com atenção, ele então focou na piscina, com suas águas calmas, o que ele sabia não significar estar vazia.

— Iara _ chamou ele, já segurando seu cajado com mais firmeza.

E logo, da piscina erigiu ela, linda como sempre, com seus cabelos negros molhados para trás, corpo nu, e seus olhos verdes brilhando mais que o comum.

Iara fitou Edgar do outro lado da cela e nadou para o canto da piscina se apoiando no piso.

— Olá gaúcho maldito, veio ver minha lastimável vida sem liberdade _ disse ela com um sorriso forçado.

— Ainda está furiosa comigo suponho.

— Não... Só fui presa como um animal de zoológico pelo meu próprio marido! _ berrou ela, e como se as águas sentissem a raiva de sua deusa, se atiraram para fora da piscina em direção a Edgar.

Ao receber aquela onda de água com cloro, Edgar somente virou a cara e fechou os olhos, mas não pareceu sentir-se afetado por estar com a roupa encharcada, provavelmente porque já estava acostumado.

— Poderia parar de tentar me afogar? _ pediu Edgar regendo os dentes

— Olha o que você fez, esvaziou minha piscina _ reclamou Iara olhando em volta.

— Eu, claro _ resmungou Edgar.

Iara saiu da piscina, nua mesmo e foi em direção ao registro de água, para encher a piscina vazia.

Edgar revirou os olhos, mas não resistiu em olha-la de cima a baixo, ela era linda de mais.

Iara mesmo virada de costas, mexendo no registro fincado na parede, disse:
— Continue me olhando dessa forma que eu arranco seus olhos azuis com as unhas _ avisou ela.

Edgar tentou desviar o olhar.

— Iara... Se continuarmos nos tratando dessa forma jamais entraremos em um acordo.

— Quem disse que quero entrar em algum acordo? _ disse ela o fitando com cara feia.

— Quer sair daí, certo?

— Sim e também quero te matar, e duvido muito que você me deixe fazer as duas coisas.

Edgar riu roco e se aproximou da cela.

— Você não quer me matar Iara... Não seria capaz.

Iara levantou uma sobrancelha depois foi caminhando em direção a Edgar. Ela segurou a cela e sorriu sedutora ficando frente a frente com Edgar.

— Eu tenho mais de um milênio de idade Edgar, não há como você ter uma mínima ideia do que sou capaz.

Ela colocou os braços entre as grades e pegou o rosto de Edgar, que não demonstrou expressão, somente se deixou levar. Iara então passou a língua sobre os lábios dele e sorriu maníaca.

Edgar também colocou a mão para dentro da cela e a pegou pela cintura.

— Pode ser impossível te conhecer por inteira, mas sem dúvida, fui o que chegou mais perto desse feito _ disse Edgar _. E eu sei que não é me matar teu desejo. Tu quer me ajudar.

Iara riu.

— Oi? Está maluco?

— Não _ disse Edgar subindo as mãos pelas costas dela, com a pele molhada e macia que o fazia querer bem mais do que só aquilo _ estou completamente lúcido; hoje á noite, por exemplo, você adoraria me ajudar em algo.

Iara franziu as sobrancelhas.

— E no que seria?

— Digamos que é um acerto de contas.

Iara sorriu radiante.

— Eu adoro acertos de contas.

Edgar sorriu daquela forma cínica e começou a acariciar o rosto dela.

— Eu sei meu amor... Mas infelizmente, tu não queres aceitar meu acordo, sendo assim, não posso liberta-la e de consequência, tu perderá toda a diversão. Lamento.

Edgar deu de ombros e se foi tranquilamente de volta as escadas, enquanto Iara o seguia com um olhar sanguinário.

— EU TE ODEIO, EDGAR!

Edgar somente sorriu maldoso e foi fazer o seu “trabalho”.

O casarão da família Montes ficava a um quilometro da vila e a dois do sítio de Edgar.

O filho de Jorge Montes levou uma surra e tanta naquele dia, foi encontrado por um morador da vila desmaiado e ensanguentado no chão, e levado imediatamente ao hospital pequeno da região. Depois de horas de soro, transfusão de sangue, pontos e curativos, ele havia voltado para casa, mas por ordem do prefeito, um médico teria que cuidar de André mesmo este estando em casa.

O rapaz agora estava deitado em sua cama, com a cara enfaixada deixando abertura somente para os olhos e nariz. Seu pai e a esposa, Clara Montes, estavam de um lado da cama e o médico, Doutor Tavares, do outro.

— Ele vai ter que ficar de repouso por uma semana e cuidar dos ferimentos diariamente. Somente após esses procedimentos poderemos iniciar o tratamento odontológico.

— Ele quebrou muitos dentes? _ perguntou Jorge fazendo expressão preocupada.

— Todos da frente _ disse o doutor entortando a boca.

— Isso é horrível _ exclamou Clara colocando a mão contra o peito e olhando o filho com pena.

André rosnou e tentou falar mesmo as palavras saindo erradas e abafadas pelas ataduras na cara e a anestesia:

— tuto graxas aquele temonio

— Sim, temos de achar a pessoa que cometeu tal atrocidade e fazê-la pagar _ disse Jorge, _ Como é o nome do rapaz mesmo, Cícero?

— Sim _ disse André ainda com dificuldade.

— Cícero Akilah? _ perguntou o doutor e o casal montes assentiu _ conheço esse rapaz, ele era pupilo de um amigo meu, Francisco.

— O bibliotecário _ lembrou Jorge.

— Exato.

— Lembro vagamente dele _ comentou Clara _ mas... Esse garoto, Cícero, apareceu do nada, ninguém nunca soube onde Francisco o achou.

— Ninguém sabe muita coisa sobre aquele rapaz, mas Francisco confiava nele. E... Sinceramente não consigo imaginar porque Cícero faria algo assim com André, com qualquer um, aliás.

Clara fez cara feia e fungou.

— O que quer dizer? Está culpando meu filho por algo Tavares? André é a vitima!

— Sim, mas...

— Mas nada _ disse Jorge. _ O senhor já fez trabalho, agradecemos por isso, já pode ir.

O medico suspirou, definitivamente o casal Montes não conseguia e nem queria enxergar o grande idiota que o filho deles era.

Tavares pegou sua maleta e se despediu.

Os pais de André deram boa noite ao filho e se foram também, deixando o rapaz sozinho com seus pensamentos vingativos. Ele já imaginava mil e uma formas de acabar com a vida de Cícero e Núbia. Sua imaginação estava cruelmente fértil naquela noite, sem dúvida.

Ele então sentiu o clima do quarto ficar frio,  o vento balançou a janela e repentinamente a luz de seu quarto apagou. André tentou pensar positivo, quem sabe tivesse sido somente uma queda de energia, isso era costumeiro na região. Ele então olhou em direção a janela, que permitia a luz do luar entrar e notou uma silhueta encostada na parede.

André teria se levantado e corrido naquele mesmo instante, mas a dor e os sedativos que haviam lhe dado não o permitiram. Ele então somente arregalou os olhos e tentou gritar.

— Pai! _ disse ele como se tivesse uma batata quente na boca.

Uma risada roca percorreu o quarto.

— Jorge, nem ninguém pode fazer algo por ti, agora.

As luzes voltaram e André se deparou com Edgar a beira de sua cama o que fez ficar sem ar.

— O que aconteceu com tua cara, tchê? _ perguntou Edgar fazendo cara feia.

André gemeu, mas não conseguiu responder.

Edgar suspirou, sentou-se na cadeira ao lado e apoiou o braço no cajado.

— Diga-me, de onde veio a genial ideia de agarrar Minha neta? Que tu eras burro eu já sabia, mas não imaginei que fosse tanto _ disse Edgar com tranquilidade mordaz.

Tesculpa— disse André choramingando.

Edgar franziu os olhos.

— Não é a mim que tu devias pedir desculpas.

Pexo tesculpa a Nupia tampem.

Edgar o encarou com uma sobrancelha levantada.

— Dizem que Núbia é parecida comigo, se isso for verdade, duvido muito que ela aceite suas desculpas. Seja como for, ela está sobre minha proteção e eu me sentiria um homem inútil se não defendesse a honra da minha própria neta.

Um arrepio percorreu a costela de André.

— Me-meu pai fai ficar fu-furioso _ gaguejou André.

— Ele devia ter pensado nas consequências quando decidiu te mimar e te transformar nesse homem sem escrúpulos, covarde e incrivelmente burro _ disse Edgar cerrando os dentes.

— O que fai fasser comico? _ disse André desesperado se debatendo na cama tentando se levantar sem sucesso.

— Já deve ter ouvido boatos sobre mim, sobre no que me transformo, no que posso fazer, minhas peculiaridades _ Edgar deixou os olhos totalmente negros e presas afiadas começaram surgir em sua mandíbula _ pois bem, não são só boatos.


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Notas finais do capítulo

Admito ter uma queda básica por Edgar. kkkk. Esse capitulo foi mais cenas aleatórias, mas ok. O que acharam?



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