O despertar escrita por Tha


Capítulo 7
VII – Brincadeira de criança


Notas iniciais do capítulo

IAEEE MEU POVO



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Ga.to.so: sf. Jake Miller

Antes

Pela segunda noite seguida, a névoa do meu sono é perturbada por uma imagem: dois olhos flutuando na escuridão. Então eles viram discos de luz, faróis se aproximando. Estou paralisada no meio da rua, descalça, com um vestido branco como todas as vezes, cercada pelo cheiro intenso de lixo e escapamento de carro, imóvel, incapaz, no calor de um motor a rugir...

Hoje, quando os faróis me acertam, sou jogada em uma lembrança como um acidente.

“Clove me mostrou o celular com um sorriso conspiratório. Uma bola e um taco de lacrosse com um código de barras ocupava a tela.

— Vai ao jogo comigo dessa vez?

— Você sempre me chama, e eu sempre digo não, então pode chamar um cara, sabe, para você ‘não perder o ingresso’ – Faço aspas com os dedos na última frase e volto a olhar para a tela do computador.

— O que? Não, eu... sei que vai dizer sim hoje – Ela disse, como se a possibilidade de ela chamar sua paquera da semana ao invés de mim e usasse isso como desculpa a ofendesse profundamente – E eu ia de qualquer jeito, isso não tem nada a ver com... Ei, o que houve com a sua cabeça?

Claro, o dia que conheci...

— Foi a bola de Jake – Voltei a passar a mão na testa.

— Você falou com Jake?

— Não exatamente, mas a bola dele e eu tivemos uma conexão.

De canto de olho, vi o dito cujo passar. Sua perna encostou na beirada da minha carteira e meu estômago deu um nó. Eu nunca disse a ninguém, mas estava de olho em Jake Miller já há algum tempo, Clove me mataria se soubesse. Tentei ignorar e fingir que não o vi.

Não deu muito certo.

— Oi Allyson, estava pensando se... – Ele se atrapalhou nas palavras e coçou a nuca – Se você vai ao jogo essa sexta.

— Ah ela vai – Clove me interrompeu e fiquei na dúvida se a socava, ou me afundava na cadeira.

— Ótimo, ótimo – Ele nem olhou para ela – Então, quando acabar, podíamos tomar um sorvete, ou sei lá.

— Eu amo sorvete – Respondi antes que minha amiga entrasse no meio de novo.

— Que bom! Então... a gente se vê?

— A gente se vê – Jake sorri e volta para o seu lugar.

Clove encostou na cadeira e soltou um suspiro pensativo, como se a imagem mental de estar na companhia de Jake Miller passasse pela sua cabeça.

— Gatoso.

— O que?

— Gato e gostoso. No dicionário estaria listado como substantivo e nem precisaria de definição, só uma foto de Jake.

— Ah, faça-me o favor. Quer dizer, também poderia ser listado como egocêntrico. E além do mais – Sorri para disfarçar o coração acelerado – gatoso seria um adjetivo.

— Meninas – Disse o Senhor Caston – Não estou vendo ninguém estudando aqui nesse canto.

Clove apontou para o monitor

— Já localizamos o rim, senhor.”

Acordo pouco antes da meia-noite, suando. Isso não pode estar acontecendo. Não comigo.

Eu me levanto e vou cambaleando até o banheiro, mas no caminho chuto o cesto de roupa suja no escuro, que no momento está ainda mais cheio com as roupas que aquela vadia usou. Ainda não sei como tudo isso é possível, e não saber está me deixando louca.

No banheiro, jogo água fria no rosto, tentando afastar a lembrança da minha normal, de como era fácil me preocupar apenas com convites de garotos bonitos. Digo a mim mesma de que aquilo não quer dizer nada. Mas no fundo sei que é por causa do que Clove me contou, do que minha outra eu disse a ela.

Do lado de fora da janela, a lua redonda é de um brilho quase irreal. Aperto o nariz no vidro gelado. Do outro lado da rua há um dormitório quase idêntico ao nosso, e, ao lado, um idêntico. E assim por diante, dezenas de réplicas: os mesmo telhados triangulares projetados de forma a parecerem antigos.

Sinto necessidade de me mexer, mas não sei para onde ir. Estou quase pegando o casaco e a touca quando Clove me chama.

— Ally? Tá fazendo o que acordada?

— Não sei – Suspiro e me afasto da janela, volto para a cama e me deito de forma que fico de frente para ela, com as mãos em forma de concha abaixo da cabeça.

— Queria poder fazer alguma coisa – Ela me imita – Quer dizer, fui tão idiota com você.

— Você achou que ela fosse eu, tá tudo bem, mesmo.

— Fui estúpida porque você nunca falaria uma coisa daquelas para mim.

Fico um tempo em silêncio. Houve uma época em que eu já falei, uma época em que o meu coração foi tomado e eu quase me afoguei na minha própria escuridão, cega pelo desejo de justiça, cega pelo Adam. Cega por Darko.

— Ei, tenho uma ideia – Ela sorri.

♕♕

— Hoje é o início de uma nova era, e esse é o primeiro estágio da nossa metamorfose para a terra das bravas e solteiras – Clove diz animada quando nos sentamos na grama.

— Eu não estou solteira – Franzo as sobrancelhas.

— Suas melhores amigas estão, isso te torna solteira adjacente. A lei é a lei.

Ava me joga um olhar conspiratório por cima do ombro, e quando bufo em concordância, Clove continua:

— Vai ter um baile fim de semana que vem, e nós vamos. Sozinhas.

— Baile da amargura? – Rio ao segurar o panfleto e percebo que é a primeira vez que um riso verdadeiro me escapa desde que alguém decidiu roubar a minha vida – Esse é o nosso recomeço? Não podemos ir no Holland e encher a cara de graça?

— Você não fica bêbada sendo uma Jaguar e Ava está dando em cima do dono do bar.

— Eu protesto – Ava levanta a mão.

— E eu não ligo – Clove sorri e puxa o panfleto de volta das minhas mãos – Enfim, esse não é um recomeço, é um expurgo. Vamos dançar, flertar com uns caras gatos por diversão e ser humanas por uma noite, sabe, esquecer o quanto nossas vidas podem ser perturbadoras e...

— Mas você é humana.

— Ava, por favor.

— O que? Esse vai ser o meu bordão agora?

Não consigo mais acompanhar a conversa pois vejo Jason andando até mim com um sorriso pequeno nos lábios, aquele sorriso quando ele sabe que as meninas estão destruindo meu resto de juízo, aquele sorriso que me faz sentir ciúme de qualquer outra garota que chegue perto dele. Era o meu sorriso.

Mas lá no fundo, bem lá no fundo, eu tinha medo que aquele sorriso significasse que minha Persuasão não tivesse dado certo e ele veio tirar satisfações do porque eu ter o espancado depois de o beijar. Ou ele está apenas constrangido já que o convenci que tinha reagido a um assalto.

Estávamos felizes e seguindo a vida normalmente como Hazel me disse para fazer, eu não podia estragar tudo, não podia deixar aquela pequena chama de esperança que guardei se apagar contando que suas ex-namoradas estavam vivas e me chantageando. Pode falar que sou egoísta.

— Vou brindar com certeza – Clove ri – E você, Ally? Tá dentro? Allyson?

— É, vai... vai ser divertido.

Dizer sim aquele dia foi provavelmente a decisão mais ridícula que já tomei, mas quem poderia adivinhar o que aconteceria em uma noite tão inocente com as amigas?

— Qual é, Hale, não deixa essa garota ficar te colocando para baixo.

— Não vou – Suspirei e sorri sem mostrar os dentes – Jason está vindo, mudem de assunto. Oi amor!

— Flor, quanta animação – Jason se senta com um pouco de dificuldade e solta um gemido de dor antes de me beijar – Nossa, como sinto falta de ser imortal.

— Mais uma vez, eu sinto muito.

— Você salvou minha vida, Flor, e além do mais, agora posso envelhecer com você.

— Claro – Engulo em seco.

— Eles são tão fofos que me dá nojo – Ava sussurra e volta a folhear a revista.

Fiquei o observando enquanto ele discutia com de brincadeira com a minha amiga e quase tive vontade de contar toda a verdade bem ali. Mas não consegui. Pensei no que houve ontem e em como ele não deixou Kaleesa ou Holland curá-lo, mas pedi que dessem um jeito no corte abaixo da sobrancelha. Pelo Anjo, como eu posso ser tão superficial enquanto ele só pensa se estou bem?

— Então, qual o assunto da vez?

— Baile a fantasia do solteiros amargurados! – Clove diz um pouco animada demais de novo – Nós vamos e você não.

— Do que ela tá falando?

— Um baile bobo no dia de São Valentim, a universidade tá patrocinando, parece que vai ser um evento grande, embora idiota.

— É muito gratificante ver que minha namorada ver minha namorada indo a uma festa de solteiros sem mim – Ele diz apontando a caneta de Clove para mim e sorrindo daquele jeito.

— Janta lá em casa hoje?

— Sua mãe vai cozinhar? – Sorrio em resposta – Então eu vou.

Vejo Ayla em um canto nos encarando e o beijo para atrair sua atenção. Isso vai ser mais difícil do que eu estava imaginando.

Agora

— Você tá viva?! – Gritei desabando ao seu lado, tocando seu rosto e as mechas do cabelo. Só então a abracei forte – Ah Adi.

— Sim, estou viva, e devo dizer que é muito bom ver você.

— Tá de brincadeira? É muito bom abraçar você. Por que não te vi antes? Junto com as outras.

— Acordei em Riverland ao mesmo tempo que todas, estava meio zonza e sem entender nada quando...

— Ally? Ally, ainda tá aí? Merda, mandou bem, Ian.

— Ai meu Deus – Percebo que ainda estou com o celular na mão e me sento direito – Ian, oi, não posso falar agora, foi mal.

— Tá tudo...

Desliguei.

— Não era importante – Adi apontou para o telefone, sorrindo.

Deus, como aquilo era estranho. Quer dizer, uma coisa era vê-la em suas lembrança, ou a voz em minha cabeça me dizendo para trocar de sapatos ou hidratar o cabelo. Outra era tê-la bem ali na minha frente, em carne e osso.

— Hale?

— Oi, não, não era importante. Agora me conte.

— Então, Riverland. Acordei na areia, com as roupas da batalha. Estava tudo tão silencioso e calmo, que cheguei a pensar tudo não tinha passado de um sonho, que eu desmaiei depois de ser atingida pela flecha e Jason tinha conseguido fugir. Uma esperança me invadiu, de que ainda poderíamos ficar juntos. Então eu... levantei e vi as ruínas. Corri até o castelo e encontrei as Bruxas e os Nephilins, eles me ajudaram por uns seis meses, me contaram histórias. Estava andando pelo meu quarto certo dia, quando vi um pedaço daquela fita que você sempre usava no braço presa em uma fenda nas pedras. Vim até Ellicot para te encontrar, mas você tinha acabado de partir. Tenho ficado aqui desde então, escondida dos seus amigos, mas tendo algumas aulas.

— Adi, se eu soubesse que estava aqui, teria voltado – Pego sua mão, tentando me acostumar com sua pele.

— Voltaria para uma vida de dor? Merece ser feliz, merece fugir daqui e encontrar outro destino.

— Não posso deixar meus amigos para trás de novo.

— Nem precisa, não estará mais correndo de alguém quando isso acabar.

— Eu não sei, talvez, venha comigo, posso te mostrar Nova Iorque.

— Não vamos nos separar mais – Adina sorri – Somos uma só, lembra?

— Tudo bem – Rio e ouço um grito da minha mãe – Onde posso te encontrar de novo? Vamos ao Billiards hoje a noite.

— Eu apareço por lá.

Minha mãe grita de novo e eu me levanto, a encontro parada na frente do restaurante com as mãos na cintura e uma cara não muito boa. Ri com a cena e me aproximei.

Bater na porta de David depois de tanto tempo pela segunda vez ainda me deixava intrigada e assustada. Sei que nos despedimos numa boa dessa vez, mas eu ainda não sabia o que ia encontrar atrás daquela porta.

— Sim? – Ele apareceu arrumando o cabelo, e quando me viu, arregalou os olhos – Ally? Quando voltou?

— Cheguei hoje de manhã – O abracei e encostei a cabeça em seu peito, me aproveitando da sensação de paz que seus braços sempre me traziam – Mas tenho que ser rápida, e preciso de um favor, que vá até o Fosso levar um recado para mim.

— O que? Você passa quatro anos viajando e é isso que me diz? Não era essa as boas-vindas que eu esperava.

— Também senti sua falta, Barney.

— Cara, eu odeio esse nome.

— Eu sei.

Era estranho marcar uma reunião com a galera e nem metade da galera realmente aparecer. Mas eu seria pouco realista se esperasse mais que isso, as coisas mudaram, mudaram bastante. Nick e Jake estão com a alcateia Lupa em algum lugar na Europa. Kaleesa veio de cara amarrada, mas Kyla nem isso, ainda acho que ela guarda certa mágoa de mim.

Então somos eu, Clove, Holland, David e Ka, e agora Cameron, que entrou para o grupo. Adina ainda não chegou e é isso que me preocupa. Bom, e quem eu não citei... eu disse que as coisas mudaram depois daquela festa.

— Tudo bem – Cruzei as mãos sobre a mesa e tentei abrir um sorriso – Eu declaro aberta nossa rodinha, quatro anos depois.

Apenas David coloca a mão no meu ombro e sorri.

— Já devem saber por que voltei, Jason foi sequestrado por... vocês sabem por quem.

— Ele não foi sequestrado – Kaleesa cruza os braços, ainda de pé – Foi de boa vontade, e quanto a nós, Allyson? Voltaria por nós?

— Ka, sabe que...

— Olha, eu sei que tem as melhores intenções, mas se ponha no nosso lugar, você sumiu sem dar notícias por quatro anos, e agora volta esperando que tudo permaneça normal? O Jason que conhecemos não existe mais, nenhum de nós existe mais. Então não ache que pode me pedir...

— Ana? – Ouço a voz de Adina e levanto a cabeça, quase esquecendo que ela não estava mais aqui dentro, e sim na minha frente, que todos podiam ouvi-la – Quer dizer, aqui você é Kaleesa, certo?

Todos a beira da mesa ficaram de boca aberta, sem saber o que dizer para a primeira Nephilim guerreira da Terra, a filha original de Darko. Exceto por Kaleesa, que vai ao seu encontro de braços abertos.

— Achei que nunca mais veria você – Ela murmura.

— Dê um tempo para Allyson – Adina sussurra em seu ouvido, e acho que esquece que posso escutar o que eu quiser no raio de 1 km – Eu sei que os nervos de todos estão à flor da pele – Ela diz para nós – Mas podemos fazer isso. Conheço Jason, o suficiente para dizer que ele merece uma chance de ser salvo. E eu sei de algo que pode ajudar.

— Recomendo tequila – Holland se levanta e Cam vai com ele.

— Achei que ele nunca iria oferecer – David murmura.

Hermie, cala a boca – Clove dá batidinhas em seu ombro.

— Pronto, estamos ouvindo – Cam se senta novamente.

— É uma joia, um colar, mas está bem escondido. Digo, muito, muito bem escondido, e você também vai precisar da espada de Darko. Tá afim de ouvir algumas histórias de terror sobre Riverland?


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