50 Tons de Mentiras escrita por Carolina Muniz


Capítulo 11
Capítulo 10


Notas iniciais do capítulo



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♥ Capítulo 10 ♥

"Você não sabia o que estava fazendo, eu te digo que não era o certo. Tão confusa, eu estava quebrada. Mas agora eu cresci e sei como é ser adulto. Eu cresci e sou forte o bastante para te superar. Eu cresci e você não pode mais me machucar. Era uma parte feia de mim, a garotinha que você destruiu, e agora ela não está mais aqui. Minha vida está longe de você hoje, posso entender que tenha palavras de arrependimentos de um cara que não sabia o que fazer, mas não há nada que tenha a dizer para mim."

— Aut

➰➰➰

O voo de Anastasia apareceu no enorme telão do aeroporto, e Mia não podia estar mais ansiosa. Desde que a garota havia mandado mensagem dizendo que estava entrando no avião, na noite anterior. Mia queria que tudo fosse perfeito para a estadia de Ana, tão perfeito a ponto de ela querer ficar.

Tudo bem que não eram mais as mesmas, afinal, não eram mais crianças. Mas queria que voltasse a ser como era antes.

Mia nunca havia entendido muito bem o porquê de Ana ter ido embora, sua mãe, Elena, nunca havia explicado direito. Só sabia que Ana havia ido para a Inglaterra, para um internato, para aprender etiquetas e ser uma menina "comportada". Mia sabia o quanto a amiga podia ser respondona às vezes, mas não era nada acima do limite de ser uma pré-adolescente. Em todo caso, ela não pôde fazer nada, e nem mesmo sua mãe, Grace.

Uma cabeleira loira dispersou os pensamentos da Grey.

Ana.

Mia ainda se surpreendia com o quanto a garota tinha mudado. Ela mesma, aliás, não havia mudado tanto assim, nada espantoso. Era a mesma de sempre, só que agora tinha seios e mais altura.

Já Ana, era totalmente outra pessoa. Seus longos cabelos continuavam longos, os olhos azuis penetrantes... As curvas, que mesmo com apenas treze anos, todo mundo já podia ver que ela teria. Mas havia algo que a deixava diferente mesmo enxergando de longe, deixando-a irreconhecível: o jeito.

De longe, qualquer um podia ver a malícia, não havia como defini-la como uma menina doce e inocente. Mia, com vinte e três anos, ainda tinha aquela cara de menininha, aquele jeito meigo e puro. O que Ana tinha era totalmente contrário, não havia como vê-la de outro modo que não fosse um mulherão capaz de deixar qualquer homem implorando por pelo menos o nome. A garota tinha aquele senso de "você pode olhar, mas nunca vai tocar". E parecia gostar daquilo, até demais. A agora loira adorava provocar o quanto podia e até não podia, para depois apenas dizer um sonoro e quase inocente "não".

Ao lado dela, estava Kate, a loira séria que Mia havia conhecido como amiga de Ana. Não tinha nada contra ela, mas a loira pareceu ter contra a Grey.

— Ana - Mia chamou, quando as meninas já estavam perto o suficiente.

A garota a encarou e abriu um sorriso, apressando o passo enquanto Kate apertava mais do que o suficiente a própria mala.

— Oi, Mia - Ana disse, abraçando a morena de chanel. - Você lembra-se da Kate, né?

— Claro. Oi, Kate - Mia cumprimentou simpática.

— Oi - Kate disse, dando um aceno mínimo com a mão e mudando o peso do corpo.

— Hã, então... - Mia começou, um pouco desconfortável com a reação de Kate. - Ah, é, mamãe mandou um beijo. Ela não pôde vir, teve que fazer plantão hoje.

— A mãe da Mia é pediatra - Ana disse à Kate, que encarava as duas confusas.

— Ah - a loira suspirou.

— Enfim, papai também mandou. Eles queriam muito vir, mas trabalho é trabalho, né? E vai ter muita oportunidade pela frente - Mia riu.

— Claro. Não se preocupe – Ana disse.

— Então, vamos?

— Uhum.

Já no carro, com um motorista particular dirigindo, as três garotas engajaram na conversa, até mesmo Kate dando opiniões e esquecendo que não gostava de Mia.

— Hoje teremos um jantar - a Grey anunciou.

— Um jantar? – Ana questionou.

— É, para a sua volta, sabe? Todo mundo está louco para te ver.

Aquela frase fez Ana pensar.

Todo mundo? Todo mundo queria dizer todo mundo mesmo?

Odiou-se por pensar em Christian.

No fundo, ela sabia que não estava pronta para vê-lo. Mas na superfície, era tão ridículo ainda se sentir daquela forma. Ela era só uma criança naquela época, agora era uma mulher confiante o suficiente para saber lidar com tudo aquilo.

Mas na realidade só conseguiu parar de pensar quando viu a rua em que entravam.

— Ué, você não disse que era jantar? – Perguntou à Mia.

— Sim.

— Então por que estamos indo para sua casa agora?

— Não, é para a sua. Ainda moramos na mesma rua - Mia esclareceu.

— Ah. Não, eu não vou ficar na casa da E... Da minha mãe.

— Ué, por quê?

— Nada demais. Kate não ficaria muito confortável e tal. Enfim, nós vamos ficar num hotel, no Atlas.

— Ah, bom, tudo bem - Mia disse, mesmo que sua cara ainda denunciasse toda a desconfiança. Inclinou-se um pouco para frente e falou com o motorista. - Jeffrey, para o Atlas.

— Sim, senhora - o homem disse e virou na primeira esquina, de volta para a interestadual, saindo da Boulevard.

O caminho foi regado a conversas novamente, aos poucos ficando relaxadas depois da situação desconfortável.

— Vamos estar lá às 19h00min, não se preocupe - Ana dizia enquanto Mia a lembrava novamente do horário do jantar.

A Grey sorriu e logo entendeu que estava sendo repetitiva.

— Okay, é melhor não se atrasarem.

Ana e Kate riram.

Logo a morena foi embora, deixando as duas sozinhas no quarto de hotel.

— Sabe o que eu acho? - Ana começou.

— O quê? - Kate perguntou, abrindo sua mala em cima da cama de casal que ela ficaria.

— Que você está começando a gostar da Mia - Ana acusou, rindo da cara de tacho da loira.

— Quê? Fala sério, eu só não ia ser antipática, né? Ela até nos trouxe aqui.

— Pois é... E ela é super legal.

— Também não precisa ficar exagerando. Para mim, ela ainda é uma patricinha.

— É, ela é uma patricinha. Eu sou uma. E se depender de mim você será em breve também. Sem contar que logo vai começar a adorar a Mia - Ana declarou, antes de entrar no banheiro.

Após sair do banho, a garota se jogou na cama de Kate - ainda de toalha - ao lado da loira, olhando o que a mesma fazia em seu celular.

— Vou tomar um banho também. Estou cheirando à avião, e à comida de avião - disse a outra.

— Okay. Vou dormir. Temos que descansar para o jantar de hoje - Ana disse, bocejando como se para constatar que estava com sono.

— Ah, não, eu não vou.

— Por que não?

— Porque é sua família, não minha.

Ana revirou os olhos enquanto se sentava na cama de pernas cruzadas.

— Não é minha família, Kate. São meus amigos apenas. Amigos que eu não vejo há muito tempo, aliás. Você é minha família. E você vai e pronto. Não vou ficar lá sozinha aguentando as perguntas. Você precisa me salvar hoje.

— Ah, nem conheço ninguém de lá.

— Os Grey são supertranquilos, vão te adorar e você vai adorá-los. Olha, vamos passar muito tempo com eles nas próximas semanas, então...

Kate mordeu o lábio inferior e encarou Ana.

— Por favor - Ana pediu, juntando as mãos uma na outra. - Vai conhecer outras pessoas. Precisar sair dessa zona, lora' – ela suspirou. - Sabe, existe um mundo mágico fora da sua zona de conforto, precisa expandir os ares se não vai acabar nunca vivendo.

— Vivendo do seu jeito? Eu prefiro não viver.

Ana mordeu o lábio inferior.

— Eu não sou essa pessoa, você tem razão. Mas eu não estou falando disso, estou falando de você conhecer o mundo porque ele é maravilhoso e tem algumas nele que vale a pena.

— Conhecer o mundo?

— Isso aí.

— Mais?

— Sim – ela declarou em voz e sorriu, aproximando-se da amiga. - Muito mais.

— Mas o mundo é enorme - reclamou Kate.

Ana pegou suas mãos.

— Então, vamos reduzi-lo a hoje, ao jantar. E apenas isso - prometeu. - Vamos jantar com pessoas legais e teremos uma ótima noite, depois vamos voltar para cá e dormiremos, como sempre, apenas nós duas e o mundo lá fora nos esperando.

— Aos poucos?

— Aos poucos - Ana concordou.

Kate não gostava de conhecer pessoas, não gostava de conhecer lugares, nem nada que fosse fora de seu limite. Por ela, ainda estaria no colégio interno de freiras, na Inglaterra, provavelmente ajudando-as a cuidar dos novos alunos.

Então - para Kate - as últimas semanas haviam sido um grande avanço. A loira havia aceitado, finalmente, viajar com Ana, ir na maioria das festas em que amiga a metia, até mesmo falar com garotos a loira tinha falado. Mas talvez, estar num jantar chique com pessoas que ela nem conhece fosse ultrapassar demais seus próprios limites.

Mas faria aquilo... Por Ana.

Kate havia perdido sua mãe muito cedo, tinha apenas nove anos, e seu pai não podia cuidar dela. Então, a levou para sua avó, que era quase uma mãe para si. Só que sua avó era uma das freiras do colégio, e quando ela morreu, foi para lá que o pai de Kate a levou.

A loira não teve uma vida fácil, mas também não foi nada tão difícil. Tudo bem que ela não teve todas as roupas da moda, ou os aparelhos eletrônicos do ano. Mas ela era feliz, sabia que era e foi muito amada por sua família. E isso era o essencial, ela soube disse depois de conhecer Ana.

No primeiro minuto ela percebeu: Anastasia Lincoln tinha tudo. Tudo mesmo. Era até tratada com mais especialidade no colégio por ser filha de quem era. Mas ela não se sentia amada. E aquilo sim era tudo para a garota. Ela não se importava com o dinheiro, mas também não era hipócrita o suficiente para dizer que não gostava. Era como algo superficial na vida dela, claro, algo que ela nunca viveu sem, e achava que era natural para qualquer um. Aquilo moldava tanto quem ela era, que quem conhecesse as duas - a história das duas - com certeza preferiria ser a Kate, em vez de Ana.

A noite já estava quase caindo, Kate e Ana haviam dormido boa parte da tarde, e naquele momento estavam decidindo que roupas usariam no jantar dos Grey.

Era claro que Ana estava extremamente nervosa, assim como era claro que ela iria disfarçar até o fim.

Kate decidiu por um vestido verde água, que ia um pouco abaixo do joelho, combinando com um salto agulha, deixando suas madeixas loiras a mostra caindo por suas costas, num penteado improvisado por Ana. Agora a garota estava sentada na ponta da enorme cama de casal, esperando a amiga terminar de se arrumar.

A outra estava apenas de toalha no meio do quarto, com as malas abertas e as roupas espalhadas ao redor de Kate.

— Eu não tenho roupa - Ana declarou.

— É, não tem - Kate ironizou, passando a mão por alguns vestidos em cima da cama. - Caramba! Isso ainda está com a etiqueta? - falou, surpresa, pegando um vestido totalmente novo. - Por que não vai com esse? É bonito. E olha esse preço! Esse vestido merece ser usado pelo resto da vida.

— Eu não gostei dele. Comprei, mas depois eu não achei bonito.

— Como assim? Ele é lindo.

— Mas em mim fica horrível, você com certeza pode ficar com ele.

A loira revirou os olhos e tratou de ajudar a amiga "sem roupa" a encontrar alguma roupa, após concordar com a cabeça que com certeza ficaria com aquele vestido maravilhoso.

— Tudo bem, que tal esse? - Kate levantou um vestido vermelho longo com um decote em v.

Ana fez careta.

— É muito "cheguei!". - Ana falou, e Kate até teve que concordar: o vestido realmente era demais.

A loira caminhou pelas malas e então olhou de relance para a cama. Havia um vestido debaixo de uns outros três. Parecia ser tão simples, tão casual, que Kate nem cogitou ir vê-lo, mas depois de dar mais uma olhada, o resgatou.

— Uau - exclamou. - Você tem que ir com esse.

— Qual? Ah, esse. Nem lembrava mais dele.

— Também está com a etiqueta? Como você compra um vestido desses, e não usa? Ou esquece que ele existe e que você o tem!?

Ana suspirou e pegou o vestido da mão de Kate, analisando-o. É, era realmente bonito. E simples. Mas era uma simplicidade elegante. Que valorizava.

— Acho que vou com ele - falou.

— É claro que você vai. Se não o colocar por bem, eu o faço em você. E sem amarrotá-lo.

Ana revirou os olhos, jogando a toalha logo em seguida em cima da cadeira da escrivaninha.

— Garota, esse vestido nasceu para você, é o seu vestido!

— Também não exagera, Kate.

— Fala sério!

— Você não viu muitos vestidos na vida, não é?

— Ah, qual é? Ele é lindo.

— É, ele é mesmo.

— E você está linda - elogiou, assim que Ana terminou de pôs o vestido.

— É... Sabe, eu até tentei não ficar, mas é automático.

Kate revirou os olhos. Sempre esquece que não pode elogiar a amiga, se não a menina se empolga demais.

Ana finalmente ficou pronta, assim como o táxi as esperando na frente do hotel. Pegou sua bolsa e saiu do apartamento com Kate em seu encalço.

A mansão dos Grey não havia mudado em nada, tudo era exatamente como há oito anos. Até mesmo o castelo cor de rosa de Mia ainda estava no jardim, mesmo que agora num canto mais afastado.

— Ana, querida - Grace saudou, abraçando a loira de surpresa, quando a mesma nem havia a visto. – Está tão diferente que quase não a reconheci.

— Grace - Ana disse, retribuindo o abraço apertado. - Essa é a Kate, minha amiga - apresentou.

— Olá, é um prazer conhecê-la, Sra. Grey - a loira disse, estendendo a mão.

— Ah, para com isso. Me chame de Grace. Se é amiga de Ana, é nossa também - Grace disse, ignorando a mão de Kate e lhe puxando para o abraço apertado.

A loira se sentiu confortável na hora, aquele frio na barriga se dissipando rapidamente.

— Venham, entrem meninas - a mulher disse, abrindo espaço para as duas.

— Ana, finalmente - foi a vez de Carrick cumprimentar a morena. - Estávamos ansiosos para vê-la.

— Olá, Carrick - Ana respondeu. - Eu também estava.

— E você deve ser a Kate, Mia nos falou de você. É muito bem-vinda.

— Obrigada - a loira disse.

— Ana gatinha - Elliot disse em voz alta, descendo as escadas junto de Mia.

A morena revirou os olhos para Elliot, mas o abraçou quando o loiro a pegou pela cintura e a girou no ar.

Elliot estava diferente. Muito diferente. Ele estava... Bonito? Se bem que pensando agora, em retrospecto, o outro sempre fora bonito. A implicância dele que talvez não deixasse Ana ver aquilo.

— E quem é essa? - perguntou o outro, lembrando a Ana sua irritação, olhando para Kate, depois de finalmente colocar a menina no chão.

— Essa é a Kate - Ana disse, arrumando o cabelo.

— Olá, Kate - Elliot falou, pegando a mão da loira sugestivamente.

A garota corou e Ana bufou.

— Elliot! - repreendeu-o e todos riram.

Os dois pareciam os mesmos de sempre, nada de oito anos terem se passado e agora serem dois adultos. Ainda tinham a mesma sintonia de implicância.

— Tudo bem, vamos para a sala de estar, o jantar está quase pronto, e temos muita conversa para colocar em dia - Grace disse.

Já na sala, Mia se sentou ao lado de Ana no enorme sofá, junto com Kate, e Elliot logo se esgueirou para o lado da garota.

— E seu noivo, Mia? - Ana perguntou.

— Ah, ele não vai pôde vir, teve uma reunião de última hora - Mia suspirou.

— Que pena. Hã, o que ele faz?

— Ele faz faculdade, publicidade. E faz estágio no jornal no Seattle Times.

— Uau, isso é bem legal. Kate fez jornalismo, é parecido, não é, Kate?

Kate sabia - conhecia a amiga bem o suficiente para saber - que Ana estava tentando fazê-la se enturmar.

E ela odiava se enturmar.

A loira franziu a testa e explicou que ela trabalhando num jornal não faria o mesmo que o noivo de Mia.

E Grace abriu a boca para falar algo, para entrar na conversa também, porém foi interrompida pelo som da campainha.

Gretchen passou por eles rapidamente, indo direto para o hall de entrada.

— Deve ser Christian - Mia disse, claramente irritada. - Ele prometeu que não iria se atrasar.

O coração de Ana disparou, e Kate pôde sentir o corpo da menina se tencionando.

— Christian é o nosso filho do meio, Kate - Carrick disse, levantando-se quando todos escutaram Gretchen dizendo "Boa noite, Sr. Grey".

O coração de Ana já estava quase saindo do lugar.

— Filho, que bom que chegou - Carrick disse, indo até Christian.

— Já estávamos preocupados - disse Grace indo em sua direção.

— Eu me enrolei com a empresa - Christian disse, logo após dar um beijo em sua mãe.

— Você prometeu - Mia reclamou manhosa.

— Eu estou aqui, não estou? - retrucou o mesmo, desfazendo os braços cruzados da irmã e beijando-a na bochecha.

— Quero ver se vai chegar depois de mim no dia do meu casamento – ela reclamou mais, dando espaço para o irmão passar o que o fez olhar diretamente para Ana.

Porém, o momento foi interrompido quando a campainha tocou novamente.

Ana nem conseguiu começar a pensar em quem podia ser, pois logo seu coração deu um solavanco, parou e voltou a bater novamente quando ouviu o "olá, Sra. Lincoln".

Mia não havia lhe dito que Elena estaria ali.

— Elena, querida, que bom que pôde vir - Grace disse quando a mulher apareceu na sala.

— É claro que não deixaria um jantar tão importante por causa de trabalho - Elena saudou, retribuindo o abraço da Dra. Grey. – Me desculpe pelo atraso.

Elliot se levantou em meio àquela cena, quebrando o contato de Ana e Christian para cumprimentar o irmão.

— Você estava em Portland? - perguntou, apertando a mão do mesmo.

— Voltei rápido - disse o outro.

— Sabe que ficamos preocupados toda vez que você anda naquele helicóptero - Mia resmungou.

— Mia, não tem como nosso irmão "andar" naquele negócio - Elliot disse, e Christian sorriu.

— Ah, não enche - Mia se irritou.

— Aquela libélula só voa - Elliot teve de irritar o irmão também.

— É helicóptero! - Christian disse dando ênfase.

Ana expirou o ar que nem percebeu que prendia e se levantou.

Precisava ser educada. Não passou quatro anos num colégio de freira para dar mancada.

Mas era complicado não reagir aquele jeito... o sorriso, o olhar... A voz. Ele!

Sentiu raiva de si mesma.

Qual é? Ela tinha treze anos de novo?

— Anastasia - Christian a cumprimentou.

— Christian - Ana devolveu, enquanto ele se inclinava e lhe dava um beijo na bochecha.

— É bom ver você de novo – ele murmurou.

Ana balançou a cabeça.

— Uhum – murmurou.

De relance a garota viu a mãe se aproximando dela. O Grey deu um passo para o lado para que Elena pudesse abraçar Ana.

Era fácil ter Christian cumprimentando-a, era fácil tê-lo falando com ela, tão perto, era mais fácil do que ela imaginou que poderia ser. Mas com Elena não. Com Elena era impossível.

Disfarçadamente, a agora loira mexeu no cabelo, impedindo sua mãe de abraçá-la, puxando Kate para sua frente.

— Essa é a Kate - Ana apresentou.

— Olá, Kate, como vai? - Elena disse, abrindo um sorriso genuíno.

Ana engoliu em seco.

— Vou bem, sra. Lincoln - Kate devolveu. - Sr. Grey.

— Kate, é um prazer conhecê-la. E pode me chamar de Christian – ele sorriu para ela.

Ele sorriu!?

Kate concordou com a cabeça e retribuiu o sorriso, sem saber o que fazer enquanto permanecia na frente de Ana.

— Bom, o jantar está pronto. Vamos? - Grace disse, juntando uma mão na outra, com um sorriso no rosto, alheia a toda a situação.

— Claro - Ana sussurrou e virou-se, contornando o sofá com Kate em seu encalço.

Logo todos a seguiram para a sala de jantar.

A cabeça de Ana girava. As perguntas vinham em dúvidas.

Como Elena podia ser tão cínica?

E Christian?

A morena bufou antes de se sentar ao lado do mesmo.

Merda, ela estava sentada ao lado dele?

— E então, querida, como você está? - Grace perguntou.

— Bem - Ana respondeu após tomar um gole do vinho.

— Ah, e como anda as coisas? Mia nos disse que acabou de se formou em Literatura, e bolsa na Grécia?

Ana riu, parecia que Mia havia feito o trabalho e casa.

— É, eu estava por isso, e fiquei bem feliz quando recebi, mas agora eu estou de férias, só viajando, gastando o dinheiro do papai.

Grace sorriu.

— É a melhor época - Carrick encorajou.

— Deve estar orgulhosa de Ana, Elena, ela é uma garota talentosa, eu vi alguns trabalhos de tradução que ela fez, foram publicados por jornais famosos - Grace comentou.

— Não podia estar mais – Elena respondeu.

Ana sabia que a mulher estava era surpresa pela garota ter feito faculdade de Literatura, ela não sabia nem que a menina havia feito faculdade, muito menos que havia terminado tão cedo.

Ana queria explodir, dizer tudo o que vinha a cabeça, mas apenas pegou o garfo da mesa e tratou de dar a primeira garfada sem nem mesmo ver o que exatamente era a comida.

Foram muitas perguntas, mas nada constrangedor ou que Ana e até mesmo Kate - que já era considerada amiga da família - não soubessem lidar. Com uma pergunta comum, Ana conseguiu tirar o foco de cima das duas e todos começaram a falar do casamento de Mia. Christian não dizia uma palavra, apenas quando lhe perguntavam algo. Ana não conseguia ficar muito tempo sem encarar Elena, e a loira tentava esquecer que a garota estava ali, a centímetros dela.

Em determinado momento, quando já estavam na sobremesa, Ana se levantou dizendo que ia ao toalete, a tensão entre ela, Christian e Elena estava demais, mas era como se ninguém percebesse. Talvez Kate, mas a mesma estava mais absorta na conversa com Elliot, que sentou ao seu lado.

— Com licença – Ana pediu, saindo da sala.

A garota entrou no banheiro e se olhou no enorme espelho moldurado na parede. Suspirou e passou a mão pelo rosto, ajeitou o vestido e colocou o cabelo de lado. Podia já sentir chegando a mesma sensação de sempre, odiava aquilo cada vez mais, não havia como se acostumar. A bile subiu, seu estômago doeu, e ela fechou os olhos, inspirando o ar profundamente.

Não podia aquilo ali.

Não podia.

Passaram alguns segundos sem ela se mexer, até que se olhou no espelho, lavou as mãos, ajeitou os ombros e saiu do banheiro.

Assim que virou no corredor, Elena vinha seguindo em sua direção. Ana se viu tentada a virar as costas e voltar para o banheiro, mas não o fez. Seria ridículo. Se não queria falar com a mulher, era só passar por ela sem dizer nada e pronto.

É, isso aí.

Ela estava pronta para fazer exatamente aquilo, porém Elena não estava a fim de deixá-la ir.

— Minha querida - disse a loira, tocando seu braço.

O sangue de Ana ferveu.

Em um movimento quase brusco, a garota se afastou.

— Elena, já pode parar com o teatro - vociferou, deixando transparecer toda a irritação.

— Não posso ficar feliz em ver minha filha depois de tantos anos?

Indignada, Ana revirou os olhos e balançou a cabeça.

— A sua frase deveria ser redigitada: "Não posso fingir ficar feliz em ver minha filha até mesmo quando ninguém está olhando?" – ela provocou, cruzando os braços em petulância.

— Nossa - a mulher deu um passo para trás - eu te ensinei a ter mais classe. Mas... É, com certeza deveria ser assim - disse Elena, passando a mão pelo cabelo curto.

— Aí está, a Elena que eu conheço.

— Ah, que isso, meu amor. Estamos aqui agora, depois de tantos anos, não vamos fazer essa ceninha de dramatização da filha abandonada, não é?

— Dramatização?

Elena não existia, não era possível aquela mulher ter parido Ana.

— É, já se passaram tantos anos... – Ana murmurou. – E você não muda.

— Diferente de você. O cabelo loiro combinou, devo dizer, combinou com toda essa mudança – ela fez um gesto para todo o corpo de Ana. – Confesso que não imaginei que ficaria tão bonita, achei que seria a garota gorda e abandonada da escola. Mas não, está aqui na minha frente, uma mulher linda e elegante como criei.

Ana abriu a boca em espanto.

— Criou? Elena, você nem deve ser saber meu nome completo, ou a data do meu aniversário...

— São coisas banais, não é importante – a mulher desdenhou, claramente porque não sabia, se não ela não perderia a oportunidade de jogar um erro na cara de Ana.

A garota os lábios um no outro e descruzou os braços.

— Sabe, o que é pior? Eu me lembro de passar noites e noites esperando você voltar – ela confessou. - Acho que de alguma forma, eu achava que você se arrependeria. Afinal, eu sou sua filha. Mas você não voltou. E quando eu percebi isso, até que não foi tão ruim.

Elena passou a língua pelos lábios vermelhos e mudou o peso do corpo, desconfortável.

— O que foi ruim - Ana continuou - foi quando eu fui embora com o papai, e você nunca ligou, você nunca quis nem saber onde eu estava.

— Eu sabia onde você estava e que estava com Linc...

Ana riu sem humor e olhou para baixo, suspirando.

— Não, Elena, você não está entendendo, eu estou feliz por isso. Estou feliz porque isso me fez não ter mais nenhuma ligação com você. Eu entendo agora o quanto você é tóxica para alguém e eu nem quero imaginar como seria você influenciando na minha vida durante a adolescência – ela declarou. – Sabe, eu não sei exatamente se foi você quem não soube ser mãe, ou eu não soube ser filha. Mas alguém errou em algum lugar aqui, e isso destruiu a minha vida por um tempo. Mas não me afeta mais. Eu já não me importo. Então vamos esclarecer uma coisa: vou ficar em Seattle por alguns meses, eu vou frequentar essa casa e vamos acabar nos encontrando, mas você pode esquecer que eu existo, você já vem fazendo esse trabalho há um bom tempo, é só continuar. Eu não pretendo ficar perto de você, com a mesma proporção que você não pretende ficar perto de mim.

Elena a encarou claramente surpresa.

— Nem de você, nem de Christian – a garota completou.

A expressão da mulher mudou com a menção do nome.

— Eu só não quero que... Você sabe, Christian e eu...

— Eu não sei o que vocês são agora, nem sei o que eram antes...

— Anastasia, na verdade...

— E eu também não me importo - Ana se impôs mais ainda, tentando manter o tom de voz. - Mesmo. Assim como também não vou me meter nisso. Mintam para quem vocês quiserem. Se tem uma coisa que eu aprendi, é que pessoas são passageiras, até as que você ama. Então, elas não valem realmente a pena - a garota disse e suspirou alto. - Você não faz ideia do que eu tive que passar para poder olhar para você e não sentir nada, Elena. Não vou voltar nisso, okay?

De repente, seu mundo trincou e ela pôde sentir o peso cair sobre ela. Mas não tombou. Pelo contrário, se sentiu mais forte. Verdadeiramente pronta para seguir em frente. Foi como se tivesse tirado o peso de céu de cima de si e devolvido a Atlas.

— Agora eu vou voltar para lá - falou, já seguindo o seu caminho, deixando Elena parada no meio do corredor.

Chegou a mesa e se sentou em sua cadeira, sentindo o olhar de Christian sobre si. Ele sabia que Elena havia ido atrás da menina, e agora a mesma já voltou e parecia bem. O que era estranho pelo fato de ter com certeza rolado uma discussão entre as duas.

Já na sala de estar novamente, todos voltaram à Ana, porém a garota estava totalmente aérea.

— Está tudo bem, Ana? - Mia perguntou.

— Claro. É que... Eu tenho que ir... Isso. E Kate tem que acordar cedo amanhã, não é, Kate?

A garota já não estava mais aguentando seu estômago.

— Ah, claro, claro - Kate falou.

O celular de Ana tocou, impedindo o que Mia iria dizer em seguida.

— Eu já volto, com licença - a garota disse, saindo com o celular já nas mãos.

Ana andou até os fundos da casa e passou pela porta que dava para o jardim.

— Pai? - falou após atender, andando pela ponte que dava para as flores.

— Ana, onde você está?

— Em Seattle – respondeu logo.

— Você não estava em Amsterdã?

— Sim, mas eu vim aos Estados Unidos para o casamento de Mia.

— Ah. E então?

— Então?

— Você e sua mãe.

— Ah, Elena. Bom, não tem nada.

— Ana – ele insistiu.

A garota revirou os olhos.

— Não se preocupe. Sério.

— Tudo bem – Linc concordou com um suspiro cansando. – Você sabe o que faz, mas tente não fazer nada.

— Não farei. Depois do casamento de Mia com certeza estarei longe daqui.

— Pelo menos me diga para onde vai.

— Quando eu chegar lá, eu te digo.

— Ótimo.

— Tenho que desligar agora.

— Tudo bem. Se cuide.

— Eu vou.

A menina ainda olhou para as flores por alguns segundos, parada no começo da ponte. O lugar estava escuro, quase um breu.

Puxa, havia mesmo dito todas aquelas coisas para Elena e nem havia gaguejado? E ainda teve Christian ao seu lado durante todo o jantar.

Tudo bem, foi incrível conseguir passar por tudo aquilo, mas já era hora de um descanso, estava mentalmente exausta,

Se virou para voltar para a casa, louca para ir embora, porém, deu de cara com Christian.

— Christian - sussurrou.

Ele estava a sua frente, o terno bem cortado o deixava mais bonito ainda. A garota se repreendeu por ficar pensando naquilo.

— Tudo bem? - ele perguntou.

— Ah - ela levantou o celular. - Claro. Não era nada demais, só... Coisas.

— Hum, que bom – ele murmurou.

— É. Eu tenho que ir... Me despedir da Mia e tal... É que eu vim por causa dela... - ela começou a tagarelar.

—  dela?

— Ah, bem, não. Do Elliot também, da Grace, do senhor Carrick.

— Claro.

— De você - completou.

— De mim?

— Por que não? Você está bonito - murmurou engraçada.

Ele riu.

— Mais rico - acrescentou.

Ele gargalhou.

— É um ótimo partido - falou.

— Tenho a impressão de que eu já era antes – ele foi convencido.

— Com certeza, mas agora está melhor. Parece... Mais confiante.

— Confiante? Sério, essa é a palavra?

Eu sorri.

— Você esperava algo como... Incrível? - ela questionou, se recostando na grade do jardim.

— Na verdade, sim - ele respondeu.

— Talvez algo mais a minha cara.

Ele levantou uma das sobrancelhas.

— Gostoso - declarou a loira e ele abriu a boca.

— Isso com certeza é a sua cara - falou.

— E com certeza é como você está - rebateu.

— Não aprendeu muita coisa no colégio, não é? – ele rebateu.

— Até parece que você se importa com isso em particular.

— É, você tem razão, não me importo - ele disse rindo.

Deus, eles estavam flertando?

O coração da garota disparou só de pensar naquilo.

Bem, ela não queria flertar com ele.

Christian estava bem bonito - sempre fora - e diferente, ela não iria cair naquela.

O que dera nela?

Mordeu o lábio.

— Tudo bem, já foi estranho o suficiente para mim – declarou.

— Idem - ele não falou em voz alta, foi mais um sussurro, e Ana acompanhou os lábios dele formando a palavra de forma hipnotizada.

A garota percebeu o que fazia e desviou o olhar, mirando o chão.

— Você e Elena discutiram? - ele foi direto.

Ela voltou a encará-lo.

— Mais ou menos isso – foi sincera.

— E está tudo bem? - ele perguntou com sarcasmo.

— O que quer que eu diga? Que eu estou uma droga por mentir para todo mundo lá dentro, fingindo que eu e Elena estamos numa boa? Ok: está tudo uma droga. Por que acha que eu quero ir logo embora?

— Você não precisa se sentir assim.

— Só por que vocês estão acostumados a mentir para eles, não quer dizer que eu também me sinta bem em fazer isso.

— Não foi o que eu quis dizer. Só estou dizendo que você não tem culpa, então não tem porque se sentir culpada.

Ana cruzou os braços e o olhou com raiva. Sabia que ele só estava querendo fazê-la parar de se sentir desconfortável com a família dele, mas era totalmente o contrário.

— Agora você diz que a culpa não é minha? Já parou para pensar que isso era tudo o que eu queria escutar quando tinha treze anos? - sua voz não era alta, nem irritada, mas tinha um quê de decepção. - Vocês partiram a porra do meu coração e ainda fizeram parecer como se a culpa fosse minha... E agora estão tentando me manter na de vocês. Para quê? Para que eu guarde esse segredinho sujo? Como eu disse para Elena: não me importo com isso. Então, pode ficar tranquilo - ela disse e tentou passar por ele para voltar para a casa, mas o mesmo segurou seu pulso.

Não era certo, para Ana era como um alerta de perigo, mas ela sentiu seu coração acelerando porque ele estava tocando-a, porque estava tão perto.

— Não estamos mais juntos - ele confessou em voz baixa.

— O quê?

— Fala sério! Acha mesmo que ainda estaríamos juntos até hoje? – ele murmurou, soltando-a.

— Eu não duvido - ela disse, em tom de desafio, não se afastando.

— Obrigado - ironizou.

— De nada - igualou a ironia, cruzando os braços.

Nenhum dos dois perdeu o olhar de Christian indo direto para o decote da garota, fazendo Ana bufar.

— Olha, só para você saber: eu me esqueci de você, okay? Quando a gente se esbarrar por aí e eu sorrir para você, será por pura educação. Agora... Eu vou indo, por que... Porque eu tenho que ir, tá?

Ele levantou uma das sobrancelhas, confuso com a garota que há poucos segundos estava o desafiando, e agora só faltava dizer que o odiava. A menina piscou três vezes antes de olhar para ele com petulância, indicando que ele estava em seu caminho.

Christian deu um passo para o lado e a garota foi embora sem nem mesmo olhar para trás.

Ana respirou fundo antes de entrar na casa novamente. Havia sido duas tacadas numa noite só, ela se sentia mais do que exausta. Precisava ir para um lugar calmo, em que ela pudesse ficar, sem manter a pose de "não ligo para nada disso" de sempre.

Por isso, logo que entrou na casa, se despediu de todos de forma simpática e foi embora com Kate. A loira sabia que algo havia acontecido, mas achou melhor deixar a amiga respirar antes de começar seu interrogatório.

Kate abriu a porta do quarto de hotel e deu espaço para Ana passar, trancando-a em seguida.

— Vamos acordar um pouco mais cedo amanhã, e ver um apartamento para alugar, tudo bem? O casamento de Mia é daqui a praticamente três meses - Ana disse casualmente. - Não podemos passar três meses num hotel.

— Claro. Podemos ver no Piket Place Market – Kate comentou.

— Uhum - Ana concordou, tirando os saltos.

— Amiga, você está bem? Você não parece nada bem - finalmente falou.

— Eu estou bem - Ana respondeu.

— Não, você não está. O que houve? – perguntou, segurando a mão da outra.

Ana olhou para a mão das duas e então soltou a sua, voltando a desviar o olhar.

— Olha, não foi nada demais - falou, amarrando o cabelo em um coque totalmente mal feito para poder encontrar o botão do vestido.

— Você quer conversar?

Ana se virou para a amiga, mordeu o lábio e então desviou o olhar novamente.

Que merda!

— Se eu começar a falar, vou chorar... E eu nunca choro, com certeza não vou chorar por causa deles. Então eu vou dormir.

— Tem certeza?

— Sim. Amanhã nós conversamos, okay?

Kate balançou a cabeça e Ana se trancou no banheiro para fazer o que precisava fazer.

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Notas finais do capítulo

Vestido Ana e Kate: https://d.wattpad.com/story_parts/660877017/images/156bff9239235be8267411611985.jpg

Xoxo



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