CASTELOBRUXO - O Início de Uma História escrita por JWSC


Capítulo 9
CAPÍTULO 9 - Duelo entre Alunos




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O Sr. Ernaldo e a Sra. Mariana eram os responsáveis pela biblioteca. Ele era um bruxo magro e alto, com óculos pequenos, cabelo cor de palha seca e o nariz curvado, o que lhe rendeu o apelido entre os alunos de O Gavião. Andava pelos corredores da Biblioteca como se fosse um apreciador de arte, admirando os livros, e era severo com todos aqueles que demoravam a devolver os livros em tempo ou que falavam alto. A Sra. Mariana era igualmente rígida, mas costumava ser mais propensa ceder caso a fizessem rir. Era uma mulher bonita, com alguns quilos a mais, óculos em formato de meia lua e cabelos vinho escuro.

Naquele momento, ambos estavam sentados atrás do balcão, contando a quantidade de livros recebidos e a quantidade emprestada. Um trabalho monótono, mas que os deixava satisfeitos, ambos gostavam de estar no controle.

Todo os alunos de Castelobruxo possuíam uma carga de tarefas a serem executadas na escola. Ia desde ajudar os professores a arrumarem as salas de aula até trabalharem na organização da escola.

Os alunos da sala C possuíam uma quantidade limitada de vagas nas palestras e cursos dos alunos do primeiro ano B e eram proibidos de se inscreverem nas atividades destinadas aos alunos da sala A, as quais apenas os da sala B tinham vagas limitadas para participarem. Em contrapartida, a sua quantidade de atividades na escola era menor e menos trabalhosa do que a dos alunos das salas D e E, que geralmente tinham que limpar excrementos dos animais do Mini-magizoo, fertilizar as plantas das estufas e ajudar os Guardiões em suas tarefas.

Os jovens estavam finalizando de arrumar os livros da Biblioteca, sendo esta a última tarefa que tinham antes de dormir. A Biblioteca, localizada no terceiro andar do Prédio Principal, junto as salas de aula de Teoria da Magia, Arquitetura Mágica e a Sala dos Troféus, estava esvaziando-se, conforme as horas passavam e o toque de recolher aproximava-se.

— Você já contou para eles? — Eduardo questionou Roberto.

— Não. Acho que não vou contar.

— Por quê? Não seria melhor se eles soubessem?

Roberto ficou pensativo. A ideia de que a história se espalhasse o fazia gelar de medo. Se as gozações e apelidos que fizeram com que sua mãe e ele se mudassem da cidade natal ocorresse na escola, ele não saberia o que fazer.

— Por enquanto, acho melhor ficar só entre a gente.

— Tudo bem. Mas mantenha o plano congelado até lá.

— Não posso. Logo vão trazer e se for verdade...

— E se não for? Nem sabemos se é verdade que estão trazendo essa criatura para a escola. Seria muito perigoso para você ir sozinho.

— Você podia vir junto.

— Só nós dois? Não teríamos a menor chance de entrar no Mini-magizoo.

— Podíamos tentar. Quem sabe...

— Quem sabe não somos expulsos? Roberto, pensa bem. Somos dois alunos do primeiro ano, o que poderíamos fazer? — Após encostar um dos livros na parede e aguardar até que ele levitasse e se encaixasse no lugar vago acima, Eduardo virou-se. — Está decidido. Como maneira de protesto contra sua atitude, eu não vou com você e nem você vai. Combinado.

Roberto concordou com a cabeça. Mas por dentro, se sentia mal por estar mentindo para o amigo. A chuva começava a cair, os pingos começaram a surgir nas janelas. Olhou de relance para a janela e pensou ter visto um lampejo ao longe, perto do Mini-magizoo, mas a chuva começou a ficar mais forte e acabou por ignorar, pois arquitetava seu plano na mente.

 

Miguel e Hugo saíram da Biblioteca mais rápido do que os outros alunos da sala. Haviam terminado suas tarefas na Biblioteca e, após receberem uma análise criteriosas do Sr. Ernaldo e da Sra. Mariana, lhes foi permitido sair.

— O que vai fazer amanhã? — questionou Hugo.

— Me inscrevi em uma palestra de Feitiços Eficientes Para Problemas do Dia-a-Dia — disse Miguel. — Acho que vou assistir o jogo de quadribol depois. E você?

— Não sei ainda. Acho que vou para a Cabana dos Guardiões, fazer uma visita. Não os vejo desde a última vez. Quem sabe veja o jogo também. Vão jogar os Presas de Capelobo contra o Voo do Alicanto, certo?

— Sim. Os dois times do quinto ano. Ano que vem será o campeonato entre escolas e eles tem que se qualificarem entre os quatro melhores da escola. Esse é o último jogo das eliminatórias. Quando as aulas voltarem, eles vão competir com os campeões dos outros anos escolares e apenas os quatro melhores da escola vão para o campeonato.

— Você sabe muito. Parece uma enciclopédia ambulante.

Ambos sorriram. Estavam passando pelo Saguão Principal, praticamente vazio, apenas com o zelador que limpava uma poça de um líquido amarelo vívido que emitia um som baixo e agudo. Ao saírem do Saguão, em direção aos dormitórios, foram surpreendidos por uma lufada forte de vento e a garoa que começava a cair.

Cobriram as cabeças com a touca da blusa da escola, verde com o símbolo da Vitória-Régia bordado no peito e nas costas, e atravessaram o corredor. Hugo empurrou com força o portão do dormitório, mas este não se moveu.

— Mas o quê... — praquejou e tentou novamente. — Ainda não é hora de trancar, falta uma hora, mais ou menos.

— Afaste-se, deixa que eu abro — disse Miguel e puxou a varinha das vestes. — Aloho...

— Ora, se não são os branquinhos — disse uma voz debochada.

Hugo e Miguel já imaginavam quem encontrariam. Júlio Garcia estava parado, alguns passos depois do portal que dava acesso ao corredor entre o Dormitório e o Prédio Principal. Estava acompanhado de seus dois amigos, um alto e outro meio roliço.

— Meio tarde para dois branquinhos estarem por aqui, não acham? — disse Júlio com um sorriso grande.

— Não foram eles que te desrespeitaram, Júlio? — disse o garoto alto, com grandes olhos castanhos e dentes proeminentes que o fazia ficar de boca aberta involuntariamente.

— Sim, Frederico e acho que merecem ser punidos por isso, não acham? — O sorriso de Júlio cobria seu rosto de ponto a ponto. — Pelo jeito, ter sido trancado para fora pelas meninas vai ter algo de bom afinal.

— Eu disse para esperarmos — disse o garoto roliço, com cabelos negros lisos e uma cicatriz feia no queixo.

Hugo aproximou-se de Miguel e retirou a varinha do bolso interno.

— Conhece algum feitiço? — Falou o mais baixo que conseguiu.

— Alguns, mas nenhum que vá vencer todos eles — respondeu Miguel.

— Não queremos problemas — disse Hugo. — Só queremos entrar antes que a chuva piore.

— Olha só, eles não querem problemas — zombou Frederico, o sorriso expondo os dentes de coelho.

— Com medo de derreter branquinho? — Provocou Júlio. — Até onde eu sei, vitórias-régias adoram água. Não é, Paulo?

— Parece que esses aí são as plantas mais fracas da escola — respondeu Paulo, sorrindo e segurando sua varinha de modo despreocupado ao lado do corpo.

— Não se preocupe, eu aqueço vocês dois — disse Júlio. — Invocatio Ignis!

Da ponta da varinha de Júlio surgiu um brilho e houve o disparo de uma pequena esfera de fogo, do tamanho de seu punho fechado. A esfera voou na direção de Hugo que estava surpreso e paralisado.

Flipendo! — Miguel chamou o feitiço que basicamente servia para empurrar objetos, como uma extensão do braço do bruxo que o proferia. O feitiço chocou-se com a bola de fogo em pleno ar, fazendo ambos desaparecerem. Rapidamente virou-se para o garoto maior, Frederico, enquanto este retirava a varinha do bolso. Apontou a varinha e gritou: — Locomoto Mortis!

O garoto assustou-se e tentou afastar-se da linha de frente da varinha de Miguel, mas acabou se estatelando no chão ao tentar mover-se, pois suas pernas estavam unidas pelo feitiço lançado.

Flipendo! — Hugo chamou e em resposta Paulo apontou a varinha, proferindo o feitiço de impulsionar.

Depulso!

Os feitiços chocaram-se no ar com um som de impacto e se anularam, sem fazer maiores estragos.

Confundus!— berrou Júlio na direção de Miguel.

Reflectum! — Invocou Miguel e o feitiço de Júlio chocou-se com uma parede invisível e explodiu, lançando resquício de magia para os lados. O efeito do impacto atirou Miguel para trás. Júlio tombou ao ser atingido por parte do feitiço refletido.

Ambos permaneceram deitados no chão. Enquanto Hugo e Paulo apontavam a varinha um para o outro, sem saber bem o que fazer a seguir e aguardando que o outro ou que alguém tivesse alguma ação.

— O que está acontecendo aqui? É uma festa de guarajas? — berrou o professor Luís do portal.

Paulo e Hugo relaxaram e abaixaram as varinhas, sentindo alívio, pois o conflito havia acabado. Júlio ainda tentava levantar-se, conseguindo ajoelhar-se, enquanto tudo no seu campo de visão girava. Miguel rolava para os lados devagar, enquanto o mundo rodopiava diante de seus olhos. Frederico ainda tentava levantar-se, apoiando-se no arco do portal com as pernas juntas.

— Alguém pode me dizer o que houve aqui? — perguntou o professor. Como nenhum dos garotos respondeu, o professor levantou a varinha: — Finite Incantatem!

As pernas de Frederico soltaram-se, a cabeça de Júlio voltou ao normal e Miguel parou de girar no chão.

— Todos, agora! Na minha sala! — berrou Luís e apontou para o corredor de acesso ao Prédio Principal.

 

Maria aguardava os dois amigos na pequena sala do dormitório. Havia terminado as atividades pouco depois de Miguel e Hugo. Saiu junto com Elizabeth, a melhor aluna da sala, e seu pequeno grupo de meninas. Haviam conversado durante todo o caminho até o dormitório. Ao chegarem no portão de entrada, repararam na porta bloqueada por algum feitiço. Prontamente Elizabeth retirou a varinha e realizou três feitiços que destrancaram o portão.

Subiram para os quartos, mas Maria decidiu aguardar Roberto e Eduardo. Os dois haviam se tornado confidentes e passavam a maior parte do tempo sussurrando segredos um para o outro. Naquela manhã de sexta-feira, haviam quase arrumado problemas na aula de Transfiguração, por não prestarem atenção no que a professora Ana Catalina dizia.

Maria teve que socorrer os dois, falando baixo para que a professora não reparasse.

— O que pensam estar fazendo?

— Nós... é... — tentou se explicar Eduardo, que raramente não sabia responder a algo.

— Não é para balançar a varinha para os lados, mas de baixo para cima e de cima para baixo, como a professora mostrou — demonstrou o movimento com calma para que aprendessem. — E qual o nome do feitiço?

Os dois garotos se olharam com preocupação, tentando encontrar no olhar do outro a resposta.

— Francamente — Maria aproximou-se e sussurrou próxima a Eduardo, já que a professora voltava para ver o progresso dos garotos.

Na biblioteca, ambos decidiram trabalhar longe dos demais, o que soou ainda mais estranho para a garota.

As horas se passaram e ela acabou por desistir de esperar. O som do sinete que indicava que todos os alunos deviam retornar aos seus dormitórios tocou fazia quase vinte minutos. Levantou-se da cadeira e ia entrar no corredor quando a porta atrás de si se abriu. Roberto e Eduardo entraram com calma, como se tentassem fazer silêncio.

— O que andavam fazendo até essa hora? — ela questionou.

— Arrumando os livros, você estava lá — disse Eduardo.

— Estava? Porque parecia que não estava. Vocês só estavam de cochichos o tempo todo.

Roberto corou um pouco e abaixou a cabeça, mas Eduardo não ia desistir sem lutar.

— Não estávamos cochichando, você que estava muito longe.

— Inacreditável — ela disse e riu para si mesma.

No instante seguinte a porta abriu-se e Hugo e Miguel entraram cabisbaixos, olhando para o chão assim que viram Maria.

— E vocês dois? Estavam arrumando livros também? — disparou ela.

— Não quero falar disso — disse Hugo e passou pelos garotos, mas antes que pudesse passar por Maria ela segurou sua mão para lhe dar mais broncas.

— O que é que...? Pegaram detenção? — Ela segurava a mão direita do garoto, onde havia um símbolo, como um carimbo vermelho com os números 6, 12 e 12.2 destacados. — Vocês infringiram três normas da escola?

— Me deixa — disse Hugo e puxou a mão, entrando no quarto dos meninos, sendo seguido por Miguel.

— O que houve? — perguntou Maria, mas Eduardo e Roberto estavam tão surpresos quanto ela.

— Não faço ideia — respondeu Eduardo e Roberto limitou-se a balançar a cabeça.

— Vão dormir. Amanhã quero falar com vocês, todos vocês! — disse Maria e abriu passagem para os dois garotos passarem.

Algo estava acontecendo e ela não sabia o que era. Isso a incomodava. Eles pareciam estar com problemas ou que iriam entrar em problemas. Foi deitar-se pensando no que podia estar acontecendo e como ajuda-los.

 

Algumas horas antes...

Bernardo estava quase terminando a ronda. Se sentia grato de que não teria que realizar a fiscalização pelos arredores do Mini-magizoo por muito mais tempo. Logo os aurores e os patrulheiros chegariam e fariam as devidas averiguações em seu lugar.

Não que seu trabalho fosse difícil. Essencialmente verificava se não haviam rachaduras ou passagens por onde as criaturas poderiam sair ou os alunos entrarem. Verificar se todas as portas de saída estavam devidamente trancadas e vez ou outra assustar alguns alunos que se atreviam a andar as escondidas por ali. Geralmente era um trabalho metódico e calmo, pois horas antes Marcus e Magda já haviam feito a vistoria interna, se certificando que nenhuma criatura iria sair e que ninguém havia ficado para trás.

A lua estava meio encoberta de nuvens e havia chovido durante o dia, de modo que o manto frio da noite havia descido com força na escola. Estavam no meio do recesso de meio de ano, compreendendo o período entre a primeira semana de julho e a primeira de agosto. O que de certa forma diminuía a necessidade de fazer fiscalizações muito criteriosas, pois a escola estava com menos da metade dos alunos normais. A maioria havia retornado para suas casas, para aproveitar com suas famílias.

Desejava retornar para a Cabana dos Guardiões, onde podia se aquecer com uma xícara de café preto e talvez alguns biscoitos. O frio era cortante e maltratava o rosto descoberto. Mesmo deixando a barba crescer para aliviar o frio, ele ainda sentia as lufadas fortes e cortantes sempre que o vento soprava.

Após dar a última volta, recostou na parede e suspirou. Abriu o pequeno cantil para descobrir que estava vazio, a bebida havia acabado.

— Ótimo. Agora realmente preciso voltar.

Dirigiu-se até a entrada do Mini-magizoo, a fim de se certificar que estava trancada e encerrar seu trabalho da noite. Os cadeados estavam intactos, assim como o feitiço que os mantinha no lugar. Os outros feitiços estavam ativos, precisou apenas realizar uma versão simples e menos habilidosa do feitiço Ostende Defectum para ter certeza que seu dia havia acabado.

Guardava a varinha nas vestes, quando reparou em um movimento súbito com o canto do olho. Parecia uma pessoa andando rápido pela lateral do prédio.

Bernardo ficou curioso e seguiu a figura. Reparou que ia na direção de uma das saídas dos fundos do Mini-magizoo. Algum aluno espertinho havia saído na calada da noite para aprontar e Bernardo já imaginava quais castigos ia usar para ameaçar o aluno. Talvez ameaçar pendurá-lo pelo tornozelo na Torre Carmen, ou prendê-lo pelas orelhas no Saguão, ou ainda fazê-lo limpar o museu da Torre Anexa de Estudos por uma semana. Mas logo todas as suas ideias sumiram quando ele sentiu o arrepio passar pelo corpo.

Bernardo podia não ter sido o melhor aluno de sua turma na escola, mas ele conseguia discernir quando entrava em uma área sob o efeito de um feitiço abafador de som. Logo que passou pelo feitiço, o som distante da escola tornou-se um zumbido. Por precaução retirou a varinha das vestes.

Aproximou-se mais, com calma, até conseguir ver o que a pessoa fazia. Estava parada em frente a parede do Mini-magizoo, recitando algum feitiço e balançando a varinha de um lado para o outro. Era da altura de uma pessoa adulta, vestido dos pés à cabeça por um manto escuro que arrastava no chão.

— O que pensa estar fazendo? — Gritou Bernardo.

A pessoa virou-se de forma ágil e, seja pelo movimento rápido que fez ou pela agilidade de Bernardo, errou o feitiço que lançou. O feitiço passou raspando pelo ombro de Bernardo que se atirou no chão. Ainda deitado ele revidou, disparando um feitiço de confusão, mas foi bloqueado pela figura negra. Ela apontou a varinha e um jorro de luz azulada atingiu Bernardo no peito, fazendo-o ser empurrado para longe do Mini-magizoo e ficar deitado no gramado, inconsciente.

Logo, a garoa fina começou a cair, anunciando a chuva que se seguiria durante a noite até ao amanhecer.


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