A Herdeira do Olimpo escrita por Nogitsune Walker


Capítulo 23
A volta




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Maya

 

Três dias haviam se passado desde que eu fui na cidade. Desde que Pietro havia me beijado. E três dias que eu não conseguia dormir. A todo tempo, eu treinava. Precisava treinar. Precisa pensar. Não sabia especificamente em qual ordem. No momento, estava me desligando de todos, mas apesar disso, nunca estava completamente sozinha.

Estava sentada no cais, observando as ondas batendo la embaixo nas pedras. Em minha mão, treinava uma pequena chama, passando-a entre meus dedos, serpenteando entre eles, criando pequenas formas…

“Você está muito aérea hoje.” Alhia fala e sinto um pequeno comichão quando assume o lado direito do mei corpo. Não luto contra ela. Durante os últimos três dias, treinava nossa sincronia. Éramos bem mais fortes juntas, apesar de ainda não confiar completamente nela. A chama se tornou negra e suspirei, fechando a mão e estinguindo a chama.

“Não consigo pensar. Estou travada há três dias…” Suspirei, coçando meus fios com certa violência. Nem mesmo o som do mar estava conseguindo me acalmar. Ainda era de madrugada, não havia quase ninguém acordado e as constelações ainda eram visíveis no céu.

“Sabe que seu prazo está acabando, né?  Não pode se dar ao luxo de perder tempo.” Ela me lembra. Acenei e levei a mão ao bolso de minha jaqueta, pegando o pequeno vidrinho com água da fonte de mnemosine. Não conseguira beber desde aquele dia. Tinha medo do que poderia acontecer. Se poderia ferir alguém caso saísse de controle. Olhei outra vez pro mar. Nos últimos dias, sonhos sobre meu pai estavam me atormentando. Mordi meu lábio inferior.

“Tem razão.” Me levantei e olhei pra baixo, pro mar. Sem hesitar, saltei para a água, mas assim que atingi a superfície da água, foi como se a mesma fosse sólida como cimento. Calmamente, me levantei, andando sobre a água. Caminhei até a costa, aproveitando que tudo estava calmo e levei meus pensamentos até Poseidon, fechando os olhos. Era hora de ter uma conversa que adiava  desde que soube quem era meu pai. Sentia que precisava disso, precisava falar com ele. “Pai, eu sei que o senhor está aí. Se quer falar comigo, por favor, seja direto, e breve.”

Falei calma. Após alguns segundos, uma brisa quente passou por mim. Senti o cheiro da maresia e os pêlos de minha nuca se eriçaram. Quando tudo acabou, abri os olhos e não me surpreendi quando a minha frente, o mesmo homem moreno de antes apareceu. Ele trajava as mesmas vestes. Bermuda de praia, sandálias, camisa de botão com estampa havaiana. Seus cabelos negros com poucos fios grisalhos estavam desgrenhados. Ele permanecia com os braços cruzados e uma expressão calma no rosto. Seus olhos verde-mar me encaravam com um misto de sentimentos que não consegui identificar. Respirei fundo. Não conseguia me acostumar com a ideia dele ser um deus.

“Não pensei que fosse me chamar tão cedo.” Falou. Sua voz entonada em um tom calmo, levemente surpreso. O encaro com a expressão suave, nas fechada, um pouco triste, mordendo o lábio inferior.

“Por quê não fez nada?” Perguntei. Uma pergunta que me incomodava a anos. Ele suspirou, fechando os olhos e seus ombros penderam pra frente em uma expressão cansada.

“Isso é realmente tão importante pra você?” Perguntou, sem tom arrgonte, mas eu não me contive. Fechei a cara, sentindo meus olhos se encherem de lágrimas e apertei meus punhos, os sentindo esquentar.

“SE ISSO É TÃO IMPORTANTE PRA MIM?!” Gritei, sentindo as lágrimas quentes cortando meu rosto. Solucei. “EU ERA UMA CRIANÇA, PORRA! UMA CRIANÇA! DESESPERADA! E ENQUANTO VOCÊ FICAVA LÁ SENTADO NO SEU TRONO, OBSERVANDO TUDO, VENDO SEU FILHO MAIS VELHO VENCENDO BATALHAS, TE TRAZENDO ORGULHO, EU ESTAVA NAQUELA CASA! COM ELA FAZENDO AQUELAS COISAS! ESTAVA COM AQUELA GENTE, LUTANDO PELA ÚNICA FAMÍLIA EU CONSEGUI. ESTAVA TOMANDO DECISÕES SOZINHA, PORQUÊ NÃO PODIA PEDIR AJUDA A NINGUÉM!”

Vomitei cada palavra, sentindo minha cabeça latejar. Meus olhos estavam castanhos um pouco avermelhados, mistura devido a raiva e a tristeza por estar soltando tudo. Ele não se pronunciou, se bem que nem dei tempo. Continuei.

“Eu rezei tantas vezes! Pedi tanto por algum sinal! Uma ajuda! QUALQUER COISA! Mas não, não recebi nada. Só resolveu aparecer quando o peso disso tudo estava sobre minhas costas! E pra quê? Só pra trazer mais um problema que foi essa porcaria de Herdeira do Olimpo!” Eu não conseguia mais diferenciar o ódio da dor de minhas palavras. Meu rosto já estava encharcado. Funguei. “Eu quero saber, por quê não fez nada todos esses anos?”

As lágrimas não parariam mais. Eu o encarava com o rosto fechado. Ele baixou a cabeça, com expressão tanto culpada.

“Nós deuses não podemos interferir na vida dos mortais. E não podemos mudar o que o oráculo proferiu.” Apertei as mãos, ainda incrédula, sentia meu olho enegrecer enquanto Alhia vinha à tona. Poseidon observou calmo tudo, como se soubesse. Desviei o olhar pra baixo, sentindo meu rosto encharcado e solucei.

“O quão diferente teria sido, se você tivesse ido até lá?” Perguntei entre soluços. Ouvi quando suspirou e senti sua mão em meu queixo, quando delicadamente ergueu meu rosto pra cima. Seus olhos verde-mar encaravam-me com um misto de solidariedade e culpa. Eu sabia que Alhia tambem estava ali, ela emanava ódio, eu só queria ceder a ela e descontar fisicamente toda a minha raiva em Poseidon. Ele segurou meus ombros.

“Você não teria forças pra enfrentar isso se eu tivesse interferido, filha.” Começou e pensei ter sentido a dor em suas palavras. “Lorena teria continuado com seu plano, prepararia Matthew. E viria atrás de você, como veio agora. Mas se eu tivesse interferido, você já estaria morta a muito tempo.” Ele apertou meus ombros. “Eu sinto muito por tudo o que você passou. Eu te observei. Eu senti sua dor por todos esses anos. Eu...eu pedi que Héstia cuidasse de você, de uma maneira que eu nunca conseguiria.” Poseidon solta meus ombros. “Se eu tivesse interferido, você teria morrido ha muito tempo. E talvez...talvez esse acampamento nem existisse mais.”

Ele tentou se explicar. Solucei e me afastei um passo dele, limpando as lágrimas.

“Maya. Controle.” Alhia falou em minha mente. Respirei fundo algumas vezes, mas não a reprimi.

“Você sabe...que eu vou ter que fazer uma escolha, não sabe?” Perguntei, meus olhos estavam vermelhos. O encarei. “Cedo ou tarde, eu vou precisar escolher. Não tem medo...que eu estrague tudo?”

Minha voz foi trêmula, engasgada. Nem conseguiria dizer a dificuldade que foi pra mim pronunciar aquelas palavras no meu estado. Ele negou.

“Você fará a coisa certa.” Disse calmo. Funguei e limpei o nariz com a manga da minha camisa. Ele une as sobrancelhas. “O que mais te aflige?”

Olhei pra ele como se perguntasse: como você sabe? Mas suspirei e comecei a girar os aneis em meus dedos.

“Pietro.” Falo com a voz um tanto cansada. “Quer dizer...ele é legal, mas…” Abro os braços. “Estamos vivendo praticamente uma guerra, e ele me beija?!” Pus as mãos na cabeça, massageando as têmporas. “Eu estou confusa.”

Poseidon me encarou sério e em seguida, deu uma gargalhada alta. Olhei pra ele com uma sobrancelha erguida, claramente confusa com a situação. Ele olhou pra mim ainda com o sorriso aberto.

“Às vezes eu me esqueço que você ainda é uma adolescente.” Ele ri. “Não fique tão preocupada com isso. Só tenho um conselho pra você: Siga seu coração.”

Torci o nariz.

“Isso é tão clichê e meloso que espero que seja uma piada.” Falei junto com Alhia. Novamente Poseidon ri. “Qual a graça? Meu coração não vai sair do meu peito e ficar dando voltinhas por aí.”

“Olha filha…” ele fala depois de um tempo rindo, enxugando uma lágrima do olho. “Muitas coisas do tipo acontecem durante a guerra. Se você sente que não quer algo sério com ele...fale. Ou... você sente algo por ele?”

Ele questionou em tom curioso. Franzi o cenho e refleti sobre aquelas palavras por alguns segundos. Eu sentia sim algo, mas não sabia o que era... não comseguia discernir.

“Eu sinto...mas acho que não é a mesma coisa.” Ergui os olhos pra ele. “Eu sinto como se ele fosse importante, sinto como se realmente fosse precisar dele, mas não sei se é a mesma coisa…”

Eu estava confusa, nunca havia lidado com esse tipo de sentimento antes. Não sabia exatamente do que se tratava o desejo carnal…ou a simples vontade de depositar em alguém afeto ao ponto de querer me relacionar intimamente com essa pessoa. Mesmo com Kye...com Rachel, era uma coisa tão de amizade, mas quando o assunto Pietro vinha à tona...eu não sabia responder. Poseidon sorriu pra mim, como se soubesse de algo que eu não sabia e pôs as mãos em meus ombros.

“Vai saber quando chegar a hora. Agora... você precisa treinar.” Ele sorriu largamente. “Espero que goste da surpresa.”

Olhei pra ele confusa e estranhamente, senti um comichão ao mesmo tempo de uma sensação calorosa. Estranhamente sorri, como se alguém fizesse cócegas em minha mente.

“Surpresa…?” Perguntei. Ele acenou e pôs a mão em minha cabeça, balançando meus fios, como um pai pela primeira vez.

“Lembre-se... três dias.” Falou antes de desaparecer, deixando pra trás uma névoa com cheiro de maresia. Atrás de mim, consegui ouvir um tumulto, uma agitação, gritos. O sol finalmente mascia, iluminando o acampamento e olhei por cima do ombro.

“Vá logo! Estou curiosa!” Tremendo, comecei a correr pela areia, subindo as dunas. Via campistas saindo dos chalés, curiosos com a movimentação, se aglomerado no centro da área dos chalés. Ouvia murmúrios, monstro? Dentro do acampamento? Problema com a barreira? Senti algo no meu estômago, um formigar e comecei a empurrar campistas. Não estava vendo quem estava empurrando, até que senti mãos me segurarem pelos ombros e me afastei instintivamente, olhando pra grandes olhos verde-mar.

“Percy, o que está acontecendo?” Perguntei, tentando transpor meu meio-irmao, antes de perceber que ele sorria, quase com lágrimas nos olhos. Ele abriu os braços na minha frente, impedindo minha passagem e bufei, batendo o pé. Ele gargalhou.

“Espere um pouco.” Falou e segurou meus ombros, olhando por cima do ombro. Olhei em volta, ansiosa e vi o momento que campistas arregalavam os olhos e embainhavam espadas, alguns poucos vom sorrisos no rosto. Olhei pra Percy, que sorria de canto, ainda olhando por cima do ombro, até que ele voltou seu rosto pra mim e soltou meus ombros. “Agora pode ir.”

Ele se afastou e engoli em seco, com medo. Com as mãos trêmulas, ultrapassei as ultimas pessoas. Arfei, não conseguia acreditar. Imediatamente, minhas mãos pararam de tremer, quando vi que sentava no meio daquela toda, um homem alto, musculoso, ruivo e usando apenas uma calça de algodão, estava apoiado pelos joelhos e mãos, tossindo poeira dourada.

“Não pode ser…” Falei com a voz trêmula. Meus olhos marejaram e sorri, pondo as mãos na frente da boca. Vi sua orelha se mover em minha direção e ele levantou os olhos caramelados pra mim, parecendo confuso. Não aguentei, corri até ele, me jogando e abraçando seu tórax, jogando a nós dois na grama, chorando desenfreadamente e o molhando no processo. Seu peito tremeu quando ele soltou uma risada sonora e me abraçou, puxando pra cima e beijando minha testa.

“Achou que eu ia deixar você sozinha?” Perguntou e senti quando suas lágrimas molharam minha cabeça. Solucei.

“Não me assuste assim cérebro de passarinho.” Pedi entre soluços, chorando igual uma criança. Ele bagunçou meus fios com carinho.

“Desculpe princesa. Vou tentar não fazer mais besteiras.” Ri e fiquei ali abraçada com ele, não acreditando que meu grifo, meu melhor amigo, meu irmão...estava de volta. Parecia um sonho que naquele segundo, eu estava abraçada com Kyetrus, e eu só sabia uma coisa: eu não iria me separar dele tão cedo.

 

Kyetrus

 

Poucas palavras podem descrever a sensação de morrer. É estranho quando se é um monstro. Você sente seu corpo se desintegrar, lutar pra se reconstituir, ao mesmo tempo em que sua essência é puxada para o tártaro.

Lembro claramente dos olhos de Maya quando ela voltou ao normal. Senti que nela, havia outra presença. Uma presença cruel, que estava confundindo sua mente. Talvez aquilo sempre estivesse dentro dela, mas era difícil acreditar que aquilo, que exalava uma aura de puro ódio, rancor, sede de sangue...pudesse estar recluso em uma menina tão doce e carinhosa quanto Maya. Esses foram meus pensamentos, enquanto meu corpo tornava-se inteiro novamente no grande abismo que era o tártaro.

Tossi várias vezes a poeira dourada, até perceber que estava novamente na minha forma de grifo. Piei e tentei voltar ao normal, mas parei e pensei melhor... não seria bom um “humano” caminhando entre monstros. Suspirei e abri as asas, estralando vários ossos das penas. Estava a tanto tempo no mundo humano que mal me lembrava como era aqui. Penhascos, um breu, e um calor literalmente infernal, e eu precisava achar uma saída. Não sabia quando retornaria, quando mais cedo melhor.

Levantei voo e comecei a procurar o lugar por onde retornavamos. Sempre haviam muitos em direção aquele lugar. Eu não queria ficar ali por mais de um dia. Aquele lugar mexia com a cabeça, corrompia o que um dia fpra bom e transformava no mais cruel. Olhei pra baixo, ciclopes, dracaenaes, empousas, harpias...lutando por comida, território, qualquer coisa que fosse de valor. Eu não suportaria ficar ali, mas algo parecia me puxar pra baixo.

Estranhamente, vi em um penhasco, uma faísca meio verde água. Não sabia quanto tempo havia se passado no mundo mortal, o tempo era diferente no mundo mágico. Planei até aquela faísca e abaixei a cabeça. Era uma pequena concha, minúscula em comparação com os pedregulhos em volta, e emitia um brilho fraco. Farejei aquilo, e quando meu bico tocou a superfície morna, a luz estranhamente aumentou, crescendo até que ficasse com intensidade igual a de um farol e aqueceu de forma que a sensação era como se estivesse a poucos metros do sol. Senti meu corpo ser desintegrado e sugado pra dentro daquela luz e gritei, um grito agudo de agonia, aos poucos sentindo minha existência deixar o tártaro.

Quando comecei a me formar novamente, era um humano, e todo o meu corpo doía. Sentia friο em comparação ao calor de segundos atrás. Minha cabeça latejava com o lugar claro e eu estava zonzo. Caí apoiado em meus braços e joelhos e forcei a abrir os olhos. Minhas mãos, assim como meus braços e tórax ainda não estavam completamente formados. Conseguia ver a poeira dourada se erguendo magicamente do chão e constituindo meu corpo.

A minha volta, pessoas começaram a aparecer, em sua maioria adolescentes com lanças e espadas. Em um instinto de proteção, senti asas meio diaformes se porem entre mim e eles, e foi quando notei que estas se desintegravam pra dar material pra formar meu corpo. Sinceramente, eu não estava entendendo mais nada ali. As pessoas pareciam confusas, lançando murmúrios, talvez receosas se atacavam ou não, mas logo um moreno se pôs a frente e arregalou os olhos, se pondo entre mim e o círculo, erguendo as mãos e pedindo calma.

Tossi um punhado de poeira, o corpo pouco a pouco terminando de se formar, ainda dolorido, e é quando escuto uma voz… não qualquer voz, a voz. Imediatamente ergui a cabeça e a vi. Maya parecia perplexa, mas além de tudo, feliz. Ela corre até mim, se joga em meu peito em um abraço e eu sinto suas lágrimas quentes molharem meu tórax. Entendi naquele segundo onde estava, mas me preocupei mais com a adolescente aos prantos em meus braços. Ri e lhe abracei, não contendo eu mesmo as lágrimas. Ela me abraçava como se tivesse medo que a qualquer segundo eu fosse me desfazer novamente e voltar ao tártaro. Ela soluçou.

“Pensei que nunca mais iria ver você!” Falou com a voz trêmula, com o nariz afundado em meu peito. Pus a mão em sua cabeça, fazendo um carinho ali e pensei sobre a névoa esverdeada e o cheiro de maresia que havia visto. Sorri pra ela.

“Agradeça seu pai por isso.” Falei e a puxei um pouco mais, começando a me levantat com ela no colo. Enquanto fazia esse mínimo movimento, senti uma energia estranha em maya, seguida de uma voz que dizia:

“Pode parar de me culpar agora?” Olhei pra baixo por um instante e falei em sua mente.

“Maya, quem é essa?” Perguntei em sua mente. Ela soltou a respiração quente em meu peito.

“Alhia.” Respondeu com um misto de nervoso e medo. “Precisamos conversar, ok? Só nós dois.”

Assenti com a cabeça olhando pra ela e a pus no chão. Ela fungou e enxugou o rosto com a manga da jaqueta, ainda soluçante. Olhei pros outros semideuses, estes já estavam se dispersando, provavelmente vendo que nada mais poderiam tirar daquela cena, todos exceto uma figura alta e pálida e encarava Maya fixamente com uma feição preocupada. Limpei a garganta e olhei pra baixo, captando o momento que seus olhos verde-mar se viravam para encontrar os azuis tempestuosos do filho de Macária. Ela parecia cansada, ao mesmo tempo que confusa. Pietro pareceu receoso, mas se aproximou e pôs um sorriso tímido no rosto.

“Você está bem?” Ele pergunta pra ela, em um tom gentil. Ela acenou e forçou um sorriso fraco. Sei que foi forçado pois a conhecia, ele pareceu não notar.

“Estou Pit.” Falou e pôs as mãos nos bolsos da jaqueta. “Obrigada.”

Ele sorriu pra ela e depois olhou pra mim, que até então estava com uma puta interrogação na cara, mas resolvi fazer igual Maya e sorri pra ele. Dei um passo, tomando a dianteira e pus a mão em seu ombro.

“Obrigado por cuidar dela. Cumpriu sua promessa. Estou em débito.” Falei verdadeiramente. Lembrava do pedido que havia feito a ele, e ver que Maya estava ali, e não tinha feito nenhuma besteira, já eram suficientes. Ele acenou e trocamos um olhar fraco. “Agora dê a ela um tempo...ok?”

Ele abriu a boca pra contestar, mas pareceu pensar melhor, então simplesmente acenou, deu meia volta e saiu andando com as mãos nos bolsos pra arena. Olhei pra baixo quando Maya soltou um longo e pesado suspiro e se apoiou em meu peito, levando ambas mãos ao rosto e massageando as têmporas.

“Por onde eu começo?” Perguntou a si mesma em tom baixo. Sorri solidário e a virei na direção da praia, começando a caminhar com ela.

“Vamos pra um lugar mais calmo.” Falei. Sabia que ela ficaria melhor na praia. La pelo menos, ela poderia me contar o que eu havia perdido.

(•••)

Fiquei encarando seu rosto, incrédulo. Não sabia exatamente o que pensar. Ela estava a minha frente, abraçando os joelhos com o queixo apoiado neles e tudo o que eu conseguia pensar era…

“Como assim ele te beijou?!” Perguntei com um toque de surpresa. Ela ergueu a sombrancelha que era cortada pela cicatriz.

“Eu te falo que tenho uma personalidade sádica, que temos um prazo de três dias porquê os lobos estão de luto e você fica assim porquê ele roubou um beijo meu?” Perguntou quase com um toque cômico. Cruzei os braços e fechei a cara pra ela.

“É exatamente isso.” Falei. “Quem ele pensa que é pra sair beijando minha maninha? Ah mas eu vou lá dar uns tabefes nele. Onde ja se viu...mal se conhecem e já ficam trocando beijos por aí.” Comecei a soltar. Maya encarou e depois soltou uma risada alta, segurando meu braço antes que eu me levantasse.

“Kye, foi só um beijo.” Fala calma. Olhei pra ela de sobrancelha erguida. O sorriso dela até podia ser sincero mas seus olhos, mesmo estando no tom normal, eram confusos.

“Hum…” Falei enquanto me sentava de novo a frente dela. “Então por quê eu sinto que você está desconfortável?”

Ela olhou pra baixo e pegou o colar, começando a esfregar os aros. Reconheci o hábito de quando ela ficava nervosa.

“Porque não acho que o que sinto por ele seja o mesmo que ele sente por mim.” Ela falou com uma certeza que julguei que ela deve ter pensado por horas a fio até chegar naquela conclusão. Suspirei e levei a mão a nuca, esfregando-a.

“Adolescência é muito complicada pra um grifo de quase duzentos anos.” Resmunguei. Ela ergueu uma sobrancelha.

“Você tem duzentos anos de idade?!” Exclamou como se a ideia fosse absurda.

“Quase cem anos.”Corrigi. Ela não mudou a sua expressão. “centobe noventa e oito, princesa.”

“PORRA VOCÊ NASCEU NA ERA VITORIANA KYETRUS? QUANDO IA ME CONTAR ISSO?”

“Ué, achei que não fosse importante. O tempo não passa pra nós.” Falei. Ela ainda não parecia acreditar. Me olhava como estivesse me imaginando se outra forma.

“Eu não consigo ver duzentos anos em você.” Constatou depois de quase um minuto inteiro analisando meu corpo. Ri.

“A questão é: essas confusões são passageiras. Você precisa pesar. O que é mais importante? Um romance adolescente incerto ou a guerra iminente?” Perguntei a olhando nos olhos. “Desculpa ser tão direto, mas a realidade é essa.”

“Eu sei eu sei…” ela falou dando um longo suspiro e respirou fundo, massageando as temporas. Por um segundo, apertou os olhos com firmeza e pude sentir quando o ar ao redor dela pesou um pouco. Quando abriu o olho, seu direito me lembrava o olho de um Ghoul.

“Você sabe o que tem que fazer Walker.” A voz, mesmo tendo saído da boca de Maya, era um pouco mais grave. Senti meu corpo gelar por um segundo.

“Foi você…” Saiu da minha boca antes que eu me contesse. Maya ergueu o olho. O esquerdo ainda estava fechado, pensativo.

“Foi muito heróico de sua parte se jogar na minha frente. Teve sorte de reviver rápido.” Senti meu corpo ferver de ódio.

“Ora sua…”

“Não pode me atacar, grifo. Você sabe que não.” Ela falou de maneira debochada. “Só pode me machucar, ferindo Maya. Não pode fazer muita coisa.”

“Saia do corpo dela!” Ordenei. Ela deu um sorriso ladino e riu.

“Quer que eu saia? Não tem como. Se eu sair, ela morre também.”

“Só por cima do meu…”

“Monte de pó de enxofre?”

“VOCÊS DOIS QUEREM PARAR?!” Dessa vez foi Maya a gritar, o que foi uma confusão na minha cabeça duas vozes distintas saindo do mesmo corpo. Maya suspirou. “Ela tem razão Kye. Não posso me livrar dela, e mesmo se pudesse, ainda não pretendo.”

Franzi o cenho.

“Por quê não?”

“Por que ela me faz mais forte. De um jeito ruim, mas você viu o que só ela foi capaz de fazer.” Acenei. Ela parecia não gostar da ideia de se unir a uma personalidade assassina, mas parecia que aquela era a única forma. “Ela é minha carta na manga contra Lorena. Ela e...meus poderes.”

“Que você não sabe como conseguir.” Lembrei. Ela negou.

“Eu sei como conseguir. Eu preciso fazer algum tipo de reclamação mas...o problema é que não existem textos escritos sobre o que eu preciso fazer ou dizer pra reclamar. A única coisa com uma pista seria…”

“...a memória que Poseidon roubou de você…” Completei, começando a ligar os pontos. Agora parecia que os fios soltos estavam começando a se encaixar. O porquê de Hestia ter ido atrás dela, ter deixado ela ali… Meus olhos se fixaram nela, que acenou. Limpei a garganta. “Mas se foi roubada, como vai recuperar? É algum tipo de armário de pensamentos que você coloca em uma penseira?”

Pude ver um vislumbre de sorriso dela quando fiz a referência.

“Quase isso.” Respondeu e de dentro do bolso da jaqueta ela tirou um pequeno frasco de vidro, contendo uma água tão limpa e clara que parecia até invisível, e eu sabia muito bem o que era. “Isso é a água da fonte de Macária.”

“É eu sei.” Falei com um ar cansado. “Por quê ainda não a bebeu?”

“Por que depois que eu descobri Alhia, tenho medo que algo aconteça quando eu descobrir. Tenho medo que ela se aproveite de um momento de fraqueza e ataque novamente…” Explicou, girando o vidrinho na mão direita. “Mas agora, com a profecia tão perto de se cumprir, tenho mais medo de o que tem nessa memória, confirmar que vai dar tudo errado, e se der, tenho medo que a única saída seja…”

Ela parou de falar e vi quando seu nariz ficou avermelhado. Ela engoliu em seco e usou a manga do casaco para enxugar o nariz. Estendi a minha mão, tocando a sua.

“Princesa, pode me falar…” Ela apertou os olhos e soluçou.

“Kye, se seu plano não der certo, e eles conseguirem me capturar, eu não tenho outra escolha.” Ela levantou os dois olhos inchados. “Eles precisam de mim viva pra conseguir usar do meu poder. Se não, eu seria só mais uma casca vazia. Então...se eles me capturarem, por favor, não deixe que me levem viva.”

Ela pediu entre soluços. Senti meu estômago desabar ao tártaro quando terminou de falar e por um segundo, pareceu que meu coração parou de bater por longos segundos. Franzi o cenho, incrédulo.

“M-Maya, eu não posso…”

“Você pode Kye! É a única forma se o plano der errado…” Ela soluçou. “Eu estou há três dias em claro, pensando, re-pensando, revendo cada possibilidade de falha… Ela vai me torturar de novo Kye, ela vai fazer questão de fazer isso. E eu não vou suportar…” Maya fungou, os olhos estavam azuis quase cinza. “Se ela conseguir, acabou tudo. Esse acampamento, o olimpo, Percy, Rachel, você, Jonathan, Evelyn…” Ela se encolheu e tremeu, segurando a cabeça entre as mãos, soluçando. “Eu estou com tanto medo de errar, tanto medo de matar todos se fizer algo de errado...e não tem outro jeito se as coisas piorarem.”

Eu não sabia ao certo como reagir. O mundo dela estava desabando ali, na minha frente, e eu não sabia o que fazer, que palavras dizer, como agir...Alhia pareceu recuar para o fundo da mente de Maya, como se não suportasse essa verdade. Engoli o bolo de minha garganta e cheguei pra frente no píer, a abraçando.

“Maya, você não precisa morrer para que tudo fique bem…” Doía falar devido ao bolo. Ela encostou sua testa em meu ombro e acariciei seus fios. “Vamos encontrar uma forma.”

Ela fungou.

“Prometa pra mim que vai fazer isso se não tiver outro jeito.” Ela pediu com a voz abafada, embargada. “Jure pelo Rio Estige Kye, que se as coisas não estiverem indo como planejamos, você vai dar um fim.”

Ela moveu seu rosto, me olhando com um lapso de esperança. Suspirei, beijando sua testa.

“Juro pelo Rio Estige, que vou fazer o meu melhor para que não precise fazer isso.” Falei. Ela fechou os olhos e suspirou. “Não vou jurar que tirarei sua vida Maya, sempre tem um jeito…”

Ela passou a mão nos olhos, enxugando as lagrimas.

“Obrigada Kye.” Falou fungando e ficou abraçada a mim por mais algum tempo. Depois, tirou de dentro do bolso da jaqueta o vidrinho e o abriu, o aproximando da boca. “Seja o que os deuses quiserem.”

Falou, antes de dar um gole único na agua.
(...)

Caminhava para a casa grande com a postura séria, depois de ter deixado Maya no chalé de Poseidon para que descansasse. Ela havia chorado muito, acho que havia acumulado tudo o que estava sentindo e só conseguiu soltar quando voltei, mas agora, tinha algo mais importante.

Quando entrei, todos os que havia convocado estavam la. Pietro, Percy, Luana, Jonas, Rachel, Gina, os Gêmeos, e todos os outros. Limpei a garganta.

“Serei breve, já que a maioria de vocês já sabe.” Pus as mãos na mesa de ping pong. “Os lobos estão reclusos pelo que me soube, restam só mais tres dias de prazo da profecia e tres dias para que a semana de luto acabe. Vamos agir no sétimo dia. Não queremos feridos, é uma missão de resgate. Luana, preciso que você e Jonas atraiam os lobos pra longe, ao menos o suficiente para entrarmos na mansão. Nico pode fazer a viagem nas sombras e nos por dentro, mas pelo numero de reféns que temos, não deve conseguir sair com todos, é quando vocês entram. Os que Luana e Jonas não distraíram, preciso que afastem da mansão, deixem o caminho livre. O carro não estará muito longe, mas ainda assim é uma alcateia inteira contra nosso pequeno grupo.” Cruzei os braços. “Eu e Maya vamos entrar, libertar e sair com todos. E vamos precisar de cobertura. Novamente: queremos evitar o maximo numero de feridos, mas se for necessário, não exitarei em no minimo nocautear aqueles lobos.” Olhei para Luana e Jonas quando disse essa parte. Eles apenas acenaram. Suspirei. “Não sabemos se Lorena ou Mathew estarão lá, mas se estiverem, as prioridades são: Tirar os reféns de lá a QUALQUER CUSTO e em hipotese alguma, deixar Maya pra trás. Ela é o que eles querem, sei que é arriscado, mas ao mesmo tempo é nossa melhor chance de concluir isso.” Olhei para eles. “Todos entendidos?”

Senti uma certa onda de energia percorrer meu corpo quando todos acenaram e relaxei os ombros, passando a mão por meus fios.

“Certo. Vamos fazer um estrago.”


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