Go Rogue! escrita por Dani Tsubasa


Capítulo 32
Capítulo 32 – Coração de kyber




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Capítulo 32 – Coração de kyber

                - Eu estou nessa luta desde os seis anos de idade! – Cassian quase rosnou com raiva para Jyn – Você não é a única que perdeu tudo que tinha. Alguns de nós... Decidimos fazer algo a respeito.

                - Você não vai se livrar dessa assim – ela respondeu, sem perder o olhar magoado e penetrante.

                - E nem quero – disse a encarando com frieza.

Emitiu algumas ordens à K-2, e após mais uma consideração irritada, deu as costas a todos e subiu as escadas para o compartimento superior da nave imperial roubada.

                Um silêncio pesado se abateu sobre todos. Nenhum deles além de K-2SO podia afirmar que conhecia Cassian bem, mas como Baze dissera, ele tinha o rosto de um amigo. E a expressão de raiva e descontrole vista em seu rosto antes dele sair provavelmente era vista com muita raridade. Para até mesmo K-2 ficar em silêncio, Cassian devia estar realmente nervoso. Os olhares dos homens se voltaram para Jyn, que fitava qualquer ponto entre a parede e o chão. Dor e mágoa se misturavam no brilho em seus olhos. A nave imperial não era muito grande, mas tinha outros cômodos. Jyn também subiu as escadas e discretamente Bodhi e Baze olharam para cima, vendo que ela tinha seguido a direção oposta de Cassian.

                - Estou preocupado com Cassian – K-2 finalmente se pronunciou.

                - Também estamos com Jyn. É ela que está sofrendo agora – Bodhi falou.

                - Ela é perigosa. E Cassian não tem reagido corretamente a isso desde o começo. Embora eu não entenda porque.

                Chirrut sorriu.

                - Ficou doido de vez? O que é engraçado? – Baze perguntou.

                - A força está com eles também, mesmo que não saibam disso ainda. Tudo vai ficar bem. Por enquanto devemos deixá-los.

******

                Várias horas se passariam até estarem em Yavin. Cassian estava sentado no chão do dormitório com os joelhos dobrados e os braços apoiados neles, olhando pela janela, perdido, sem realmente ver as estrelas que passavam por eles. O frio de suas roupas, ainda um pouco molhadas, incomodava, mas estava tão distante que nem o sentia mais.

                - Você não precisa carregar sua prisão com você pra onde vai. Nem trancar todas as janelas – ele reconheceu a voz de Chirrut e olhou para a porta, vendo o monge de pé.

                Não sabia o que responder, então ficou em silêncio. Tinha tirado o casaco e a jaqueta e os colocado para secar em uma máquina num cômodo pequeno ao lado do quarto.

                - Há uma secadora ao lado se quiserem secar suas roupas. Diga a Jyn se a vir.

                - Você mesmo pode dizer.

                Cassian ficou em silêncio de novo.

                - Eu sei o que está acontecendo com você. É algo que parece ruim no meio de uma guerra, mas não precisa ficar com medo. Você não acredita na força, mas ela também está com você.

                - Não sei do que está falando.

                - Você sabe. Você é um bom homem, tomou a decisão certa no momento em que teve a chance, embora isso não apague sua intenção anterior. Eu conversei com seu droid. Jyn não é mais útil, mas você tentou impedir o ataque dos rebeldes quando soube que ela estava lá e voltou para buscá-la. Por que?

                - Eu não sei... Porque ela é minha responsabilidade.

                - Não seria a maior ordem que você quebraria, seria até mesmo irrelevante.

                O monge conseguia sentir a força sombria guerrear com a luz dentro de Cassian e pouco a pouco desaparecer e ser substituída por muitas emoções misturadas, emoções que Cassian mantinha trancafiadas há muito tempo, e que apesar de boas, o assustavam.

                - Você não precisa ter medo do que está acontecendo. É algo benigno. E não importa que não pareça certo aos olhos dos outros. Há quanto tempo tem permitido que outros comandem sua vida, decidindo mesmo as coisas mais simples e pessoais, capitão?

                - Chirrut...

                - As estrelas mais brilhantes tem coração de kyber. Ela brilha. Eu tenho certeza que ela entende tudo o que você passou, talvez bem mais que o suficiente. Eu e Baze temos um ao outro para lidarmos juntos com a dor de também termos acabado de perder o que nos restava. Mas Jyn está sozinha.

                “Jyn está sozinha”, três palavras numa frase pequena, mas que atingiram o coração de Cassian como chumbo, fazendo o restante de sua raiva começar a se dissipar. Ele também estava sozinho, mas tinha a Aliança, tinha Yavin 4, tinha companheiros de trabalho, e K-2. O que Jyn tinha antes de ser enviada a Wobani e desde que perdera seus pais?

— As pessoas lutam guerras diferentes em suas vidas. Mas guerras são todas guerras. E o sofrimento mostra a mesma face cruel para todos. Ela está chorando na sala de planejamento do outro lado.

                - Por que está me dizendo?

                - Eu fiz eu acredito. O que você vai fazer com a informação cabe a você decidir. Que a força esteja com você – o monge falou antes de sair e Cassian ouvi-lo descer as escadas.

                Passou mais alguns minutos sozinho com sua confusão interior. O que diria a ela? Como ajudá-la? Como olhá-la nos olhos depois de brigar com ela daquele jeito? Por que tinha brigado com ela para começar? Não importava que ela estivesse ou não em choque, ela tinha acabado de perder o pai, e estava certa em culpá-lo, mesmo que ele tivesse tomado a decisão certa no último segundo. Acima de tudo, Jyn era uma pessoa justa, sem permitir que seus sentimentos interferissem em seu senso de justiça, e ele já tinha percebido isso. Voltou a pensar nas palavras de Chirrut. Até que ponto poderia auxiliar a Aliança sem ferir inocentes? Já tinha feito isso tantas vezes... E esse dia seria mais um para sua extensa lista de arrependimentos. Levantou-se e seguiu para o corredor.

******

                Uma sala de planejamento. Uma mesa, cadeiras, estante e um projetor. Isso não era importante, Jyn só queria ficar sozinha. Tirou o casaco, a jaqueta e parte do equipamento que carregava, deixando as coisas molhadas em cima da mesa e percebendo que nem mesmo a última camada de roupa que usava tinha escapado completamente da chuva. Sentou-se no chão por trás da mesa. Pegou o cristal em seu colar e as mortes de sua mãe e agora de seu pai fizeram seus olhos transbordarem no mesmo instante.

Jyn estava tão cansada... De estar sozinha, fugindo, lutando, sem dormir, muitas vezes sem comer também por longos períodos de tempo, sem poder confiar em ninguém, sem um lugar ao qual pertencer ou para onde voltar, cansada de ser perseguida, de usar nomes falsos, de ser deixada para trás, de ser tudo, para os que sabiam sua identidade, ou de ser nada. Não se importava com a briga com Cassian, tinha total consciência de que a vida dele fora tão triste quanto a dela, e de qual era o peso da culpa de mil acontecimentos horríveis pesando em seus ombros, e ela não se importar com a Rebelião e ele sim, não mudava isso. Cobriu os olhos com as mãos e chorou sem se importar se alguém lá embaixo ouviria. Jyn queria chorar, estava mais do que cansada de engolir suas lágrimas, então ela iria chorar. E agora pouco lhe importava o que o capitão Andor pensaria sobre isso. Teve a sensação de ser observada, mas ignorou, e logo sumiu. Olhou pela janela e a visão das estrelas a fez chorar mais quando a voz de seu pai veio a seus pensamentos. Eu te amo, Estrelinha.

Jyn chorou por mais meia hora sozinha até conseguir se acalmar um pouco. Puxou os joelhos para o peito e cruzou os braços sobre eles, escondendo o rosto ali e soluçando enquanto tentava parar o choro.

— Papai... – o sussurro escapou de seus lábios, sem ideia de que tinha sido ouvida.

Só quando ouviu a porta sendo fechada devagar Jyn notou que não estava mais sozinha. Os passos que ela não queria ouvir, e que acabara de perceber que conseguia reconhecer, se aproximaram lentamente, mas ela não ergueu o rosto para olhar. Soluçou mais um pouco e um murmúrio baixo de tristeza e frustração lhe escapou.

Cassian olhou para a pequena figura encolhida no chão, ainda com as roupas e os cabelos um pouco molhados. Ela ficava ainda menor daquele jeito. Suas palavras rudes voltaram a atormentá-lo ao ver aquela mulher forte encolhida e abalada, quase irreconhecível. Ele já tinha vivido uma cena parecida antes, muitos anos antes, um garotinho de seis anos encolhido do mesmo jeito num canto de uma nave depois de ser encontrado sozinho pela Aliança, chamando por mamãe e papai, e tentando sobreviver à dor. Jyn tinha perdido tudo uma vez, provavelmente numa idade não muito diferente de quanto aconteceu com ele, e quando algo lhe era devolvido, era imediatamente arrancado dela outra vez, e definitivamente de agora em diante. Como podia ter sido tão insensível só para evitar mais um item em sua lista de arrependimentos? Se ajoelhou ao lado dela e tentou tocar seu ombro, mas Jyn se afastou, ainda sem olhá-lo.

— Me perdoe – sua voz não passou de um sussurro – Jyn.

Uma inspiração cansada foi a única resposta que ouviu.

— Não pensei no que estava dizendo. Eu também fiquei assustado, e não percebi que você estava obviamente pior do que eu.

A rebelde tentava avaliar o nível de sinceridade daquelas palavras. Cassian tinha mentido para ela, mas tinha desistido de seu ato cruel. Ele não parecia realmente um assassino, e apesar de ainda não confiar nele, alguma coisa lhe dizia que podia, ao menos naquele momento. Talvez sua dor a estivesse enganando, ou lá no fundo ela apenas estivesse inconscientemente buscando qualquer tipo de conforto. Ela não tinha ganhado muito, ou nada, por confiar nas pessoas durante sua vida. Ela nunca ia saber se não olhasse em seus olhos, então ergueu o rosto apenas o suficiente para vê-lo. Aqueles olhos castanhos pareciam verdadeiramente tristes, e sinceros, e tudo que ela queria era ao menos dessa vez não estar enganada.

A vermelhidão, a dor, e as lágrimas nos olhos verdes cortaram o coração de Cassian. Ele sabia que não era inteiramente sua culpa, mas ele fora o gatilho a disparar aquela reação. Jyn levantou a cabeça completamente. Seu rosto também estava levemente vermelho e algumas gotas de tristeza ainda corriam por ele. Ela assumiu uma expressão de concordância e desviou o olhar para o chão. Cassian pegou seu casaco, já seco e o colocou em volta dela, ficando surpreso por Jyn não tentar empurrá-lo. Os olhos dela se estreitaram e ela começou a chorar de novo, receber aquele cuidado num momento daqueles fazia seu coração se apertar. Somente seus pais e Saw tinham lhe mostrado atos de amor e cuidado parecidos com aquele. Cassian hesitou por um instante, mas sentou-se mais perto dela e a puxou para ele, surpreendendo-se novamente quando Jyn se inclinou contra ele e se enterrou em seu abraço.

— Me perdoe, Jyn – repetiu, a deixando chorar.

Afagou suas costas quando, alguns segundos depois, ela soluçava e tentava retomar o controle, até que o ritmo de sua respiração começou a diminuir e ela ficou em silêncio.

— Por que voltou?

Aquela pergunta de novo. Ele sabia, depois de conversar com Chirrut, ele tinha admitido, mas não estava pronto para dizer a ela.

— Sou sua responsabilidade, sua missão... Não precisa falar.

— Não. Você é muito mais do que você pensa. Cada um na galáxia é importante de alguma forma, Jyn. Com você não é diferente. E de um jeito muito melhor e mais digno do que você está pensando.

Jyn não pediu para que ele se explicasse, porque se Cassian perguntasse porque estava aceitando a afeição e o acolhimento que ele estava lhe oferecendo, ela também não saberia responder.

— Você também... Não é o monstro que pensa que é.

Quando ele olhou para Jyn novamente ela estava dormindo. Se posicionou melhor e a fez deslizar para seu colo. Seus dedos secaram as lágrimas no rosto adormecido e antes que pudesse perceber estava afagando os cabelos castanho claros.

— De todas as mulheres da galáxia... É logo você... E logo agora. E nessas circunstâncias.

O capitão sorriu ainda assim. Estava feliz com ela. O momento para contar a ela ainda não era aquele. E se ela não o quisesse? Apesar de que a confiança que ela estava colocando nele enquanto dormia em seu colo era uma grande evidência de reciprocidade. Tinha dado o primeiro passo, não precisava ter pressa agora.

— Eu te amo, Jyn Erso – falou baixinho, só para saber o que sentiria pronunciando aquilo.

Um pouco estranho e assustador, mas bom, como se finalmente houvesse algo que ele se importaria em perder, algo que completava o vazio que sentia constantemente.

— Por isso eu voltei.


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