A Herdeira de Zaatros escrita por GuiHeitor


Capítulo 17
Capítulo 16




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Octogésimo primeiro dia do segundo mês, ano 7302.

 

Cena I – De Predador a Presa.

03 horas e 43 minutos. Reino Anão – Ruthure. Taberna e Alambique dos Javalis.

 

Os Guardiões passaram a noite e o início da madrugada arquitetando um plano. As Bruxas Siamesas foram acordadas para ajudar.

No fim das contas, optaram por mandar General Urak e Cícero à taberna para que pressionassem os irmãos Javali a entregar o esconderijo do homem invisível. Enquanto isso, Hilda, da fortaleza mesmo, procuraria o rastro astral de Darius. Feito isso, se encontrariam todos no local que Cícero indicaria para então encontrar o ladino raptado.

Não iriam apenas os três. Manu se sentia responsável por falhar com o amigo; Kira, que possui um grande instinto protetor, também quisera ir para ajudar o tio.

 

—Responda! -Gritou Urak na cara dos irmãos Javali logo após Cícero perguntar quem era o híbrido invisível.

—Eu já lhes disse que não sabemos! -Respondeu o mais velho, Torno Javali.
—Quem fala alto aqui sou eu! -Bradou Urak, segurando o anão pela cabeça com duas mãos superiores enquanto usava as duas inferiores para socar-lhe as costelas.
O general deixou o homem cair no chão, como se fosse um saco de farinha. Cícero se voltou ao outro anão, ao mais jovem, Movror Javali, repetindo a pergunta:
—Quem era o homem que levou nosso amigo e o que vocês têm com ele?

—Nós não o conhecemos.

Urak perdeu a paciência e esmagou o crânio de Movror com sua marreta. Ossos e vísceras cerebrais mancharam o chão e a parede, empapando os arredores com sangue. Torno se controlou, porém o desespero era visível em seus olhos. Cícero também estava surpreso com a atitude repentina do kvarbrakoj.

—É melhor dizer antes que também perca sua cabeça. -Arrematou o feiticeiro.
—Droga, não precisava disso! -Falou Torno com uma voz que mascarava um medo cada vez maior da figura com quatro braços a sua frente.

—Diga! -Explodiu Urak.

—Tudo bem, tudo bem! -Rendeu-se tremendo. -O homem que vocês procuram veio de Oroada. Seu Nome é Miguel.

—Qual o sobrenome? Onde fica o covil dele? -Indagou Cícero, encarando-o firmemente.
—Existe uma porta secreta atrás dos sacos de carvão nos fundos da cozinha. Ela dá para um túnel. No fim dele, vocês encontrarão o esconderijo de Miguel. -Confessou o Javali. -O sobrenome ele não nos disse.

—Cícero... -Urak deu a deixa.

—O feiticeiro franziu o cenho, se concentrou nos olhos do Javali e disse: -Ele diz a verdade, general.

—Muito bem. -Falou Urak. -Terminamos por aqui. -E um novo giro do martelo massacrou outro crânio. Torno não teve nem chance de gritar.

—Por que fez isso? -Chocou-se Cícero. -Ele estava colaborando!

—E ainda poderia avisar o tal Miguel. Foi melhor assim.

—Entendi…

 

Enquanto isso, na fortaleza:

 

—Sinto a presença de Darius no subterrâneo. Em algum ponto abaixo dos armazéns. Próximo ao porto. - Disse Hilda.

—Perfeito. -Comemorou Manu. Avise Cícero.

—Já foi avisado. Eles confirmaram a posição do esconderijo com os Javalis. Vamos logo, iremos nos encontrar em frente à taberna, mas antes vistam os trajes de proteção.

Os trajes consistiam em uma camada espessa de couro reforçada com esporas de metal. Tudo para aumentar a defesa contra as perfurações de sai. Para a cabeça, infelizmente, não houve tempo de confeccionar proteção.

 

Reuniram-se no local combinado e seguiram juntos pelo túnel. Enquanto caminhavam, ficou decidido que Cícero enfrentaria Miguel, fazendo uso da visão privilegiada de Hilda. Ela funcionaria como os olhos do feiticeiro, pois é a única capaz de ver o ninja e, por sorte, possui a conexão com o Feiticeiro Âmbar. Devido a isso, Cícero seguia na frente do grupo.

Atrás dele, Kira, Manu, Hilda e, fechando a fila, Urak. O general caminhava de costas, vigiando a retaguarda com o martelo bem firme nas mãos.

O caminho era pontilhado por fungos bioluminescentes e deles provinha a única fonte de luz. A terra era avermelhada, úmida e escura. As paredes e o chão estava cheio de vinhas que se enroscavam nos sapatos e dificultavam a caminhada. Havia muitas teias de aranha, besouros e fadas no percurso e também goteiras.

Ao passarem por um declive acentuado, o túnel se bifurcou em duas trilhas.

—Temos que nos dividir. -Falou Manu.

—Não, pode ser perigoso. -Repreendeu Urak.

—Não será preciso, sinto a presença do elfo no caminho da direita.

—Hilda, como consegue detectá-lo? -Cícero quis saber.

—Lembra do que eu disse sobre ele ter algo antigo e nebuloso dentro de si? -indagou. -Nesse momento ele está impregnado com isso… é como se eu sentisse a escuridão dentro dele em dobro. A aura de Darius tem uma presença muito marcante.

—Isso é mau? -Perguntou Manu.

—Com certeza, mas, por enquanto, tem facilitado meu trabalho.

 

No fim da estrada, o caminho se alargava em uma câmara de teto baixo, apoiado por toras de madeira. O mesmo fungo do túnel lançava sua luz baça e azulada no local.

Ali estava Darius, algemado com as mãos para trás. O ferimento em sua coxa havia sido tratado, limpo e enfaixado com muitas bandagens. Estava acordado, mas distraído.
Em um átimo, dois brilhos prateados riscaram a semi escuridão, em direção ao grupo. Cícero, com um gesto, os transformou em fumaça.

—É uma armadilha, ele está aqui! -Avisou-os o prisioneiro.

—Sei disso e posso vê-lo. -Respondeu Cícero calmamente. -Manu, cubra a mim e a Hilda. Urak, cubra os demais. Kira, use Garras para farejá-lo e me ajudar no ataque. -Instruiu o feiticeiro de olhos âmbar aos demais, assumindo a postura de líder.

Garras se valeu de sua forma de hidra. A pele impenetrável serviu bem à causa e mais de uma vez ela se atirou na frente dos sais para defender alguém.

Cícero levou tempo, mas conseguiu fazer Miguel tombar para o lado, completamente visível, ao roubar o controle de seu corpo. Seria mais rápido derrubá-lo com um tiro de energia, porém Miguel era muito ágil e não era nada fácil fazer mira.

—É melhor dizer o porquê de nos atacar ou o feiticeiro ali vai entrar na sua mente e fazer uma bagunça lá dentro. -Ameaçou Urak.

Enquanto isso, Manu libertava o elfo prisioneiro.

—Não vai falar? -perguntou o general. -Kira, remova a máscara e desentupa os ouvidos dele, por favor.

Kira arrancou o capuz e o lenço com um movimento bruto, rasgando-os. Olhou para o pai agradecendo a ordem para machucar o elfo-duende e deu-lhe um tapa forte e simultâneo em cada orelha. Miguel gritou e a híbrida o levantou e, usando os dois braços direitos, atirou-o aos pés de Urak com a mesma facilidade com a qual alguém lança uma bola de papel para cima.

—Você vai levar uma surra daquela bruxa e depois será entregue à Guarda de Ruthure. -Disse o general indicando a filha ao falar.

É bom começar! -Disse Darius pisando na mão de seu raptor propositalmente ao passar por ele, parando ao lado do General Urak depois.

Ninguém notou a cigana remexendo suas pulseiras e olhando de Darius para Miguel. Falando sozinha e agindo de forma estranha. Ela disse telepaticamente para Cícero:

“Descubra o sobrenome dele.”

O feiticeiro a encarou e, sem fazer perguntas, pôs-se a navegar nos pensamentos do ninja.
—Não vai dizer? -Perguntou, maliciosamente, Urak. -Kira, por gentileza…

A garota estendeu um dos punhos e descarregou um raio de luz roxa no rosto de Miguel. Ele rolou para trás e ela o apanhou. Ergueu-o do chão com as duas mãos inferiores e descarregou uma sequência de murros no rosto de sua presa com as superiores.

—Chega. -Pediu o general. -Quer me contar alguma coisa agora?

Miguel cuspiu sangue na terra e começou a se explicar:

—Eu queria o dinheiro do resgate ou da recompensa. E isso, de quebra, me livraria das investigações de Eyrell. -Admitiu. -Mataria duas serpes com uma paulada só.

—Que investigações? -Quis saber Manu.

Miguel se demorou, mas, depois de ver Kira estalando os nós dos dedos, terminou dizendo:

—Sobre a suspeita de cumplicidade. Pensavam que eu ajudava esse aí. -Falou indicando o elfo.

—E por que levantaram essa suspeita se nós nem ao menos nos conhecemos? -Perguntou Darius.

—Darius! -Chamaram Cícero e Hilda ao mesmo tempo. -Qual é o nome do seu pai?

—Monaro Quendra, mas por que isso agora?

—Darius… você e esse homem são meio-irmãos!

—Impossível! -Gritou o elfo. -Não acredito.

—É verdade. -Confessou Miguel. -Por isso escondi meu sobrenome, por isso as suspeitas.

Hilda o interrompeu e falou:

—Por isso eu sentia a aura de Darius mais forte. Eram, na verdade, duas auras doentes do fim do túnel... não era a de Darius mais intensa e sim a dos dois irmãos: Darius e Miguel Quendra.

—Isso também tem explicação. -Disse Miguel.

—Não! Mais um não! -Gritou o elfo.

—Eu tenho vinte e um anos recém-completos. Sei que Darius tem vinte a beira dos vinte e um. Nossas idades são parecidas, o que indica que houve duas traições muito próximas.

Urak, por precaução, segurou Darius. O ladino espumava de raiva, lembrando dos insultos que dirigiam a ele e a sua mãe quando criança.

—Sei que me querem morto, porém eu tenho informações sobre a tal “aura doente” que a cigana mencionou. Eu não conseguirei curá-la sozinho e tampouco você, irmãozinho.

Darius rosnou ao ouvir o deboche do ninja.

—E como você pretende curá-la? -Perguntou Manu, antes que o amigo xingasse o ninja.

—Duas palavras: Aço Voador.

—A nova Chefe de Segurança de Ramavel? -Perguntou Urak.

—Precisamente e, já que não terei mais o dinheiro, pensei em me juntar a vocês e tentar me livrar dessa maldição. E, Darius, antes que recomece a berrar, entenda que o ódio que sente por mim faz parte da maldição. É o que impede toda a linhagem de se unir contra a maldição e contra a fiscal.

—Maldição?! Fiscal?! -Exclamaram todos, menos o ladino.

—É um blefe! -Bradou Darius, enfurecido.

—Não é. Há uma maldição que afeta todos os homens da linhagem Quendra. Era pra ser eu o alvo principal. Sou o mais velho desta geração.

—Era? E não o é por quê? -Perguntou Hilda.

—Darius e eu fomos concebidos quase em dias próximos, e o círculo da maldição foi danificado. Suponho que esses eventos tenham desestruturado a herança da marca e que agora nós dois dividamos seu peso, embora meu irmãozinho carregue mais peso do que eu.

—Você não é meu irmão! -Darius avançou sobre o elfo-duende, mas Urak o impediu de continuar.

—O que seria esse círculo que mencionou? -Perguntou a cigana.

—Literalmente um círculo, neste caso. É a escritura da maldição, feito de diamante. Indestrutível por vias condicionais, tornando, portanto, mais difícil parar a praga.

“Azar” surgiu sobre a cabeça de Kira.

—Eu possuo um pedaço… -Disse Darius um pouco mais calmo, mas ainda cuspindo as palavras.
—Ótimo! Eu também encontrei um. Quando o círculo estiver completo, poderemos destruí-lo para sempre. Vejam:

De um bolso interno, Miguel retirou um novo fragmento de diamante e, como o de Darius, o dele também continha uma runa gravada.

—Chega! -Interpelou Urak. -Algemem-no agora. Ezerk e Darius decidirão o fim que darão ao híbrido invisível quando voltarmos à fortaleza.

—Darius, essa maldição faz a gente odiar uns aos outros para que não nos unamos para destruí-la. -Disse Miguel. -Fez-me te sequestrar por dinheiro, mesmo sem precisar. Deve ter causado algo assim com sua, digo, nossa irmã Tamires.

—Eu ainda não acredito em você e, como sabe tanto sobre isso?

—Mas precisa acreditar. Aço Voador é nosso algoz e precisa ser detida. -Disse, deixando a pergunta morrer no ar.

 

***

 

Cena II – Distribuição de Cargos.

Meio dia. Reino Elfo – Eyrell. Pátio dos Charmes.

 

Era mais um dia movimentado para a Salvaguarda Legítima. Depois de tantos dias de treinamento para uns e estudo para outros, era chegada a hora de anunciar o cargo que cada voluntário ocuparia.

Agora ocorre a divulgação oficial em Eyrell e, as dezoito horas, a subsequente em Oroada e Feltares. Algumas pessoas viajaram até o Reino dos Elfos para assistir em primeira mão.

 

O orador levantou a mão e o público fez diminuir as vozes até o silêncio quase completo. Então ele disse:

—É com imenso prazer que torno a lembrar-vos que as inscrições foram mais que um sucesso. -O homem aparentava ter por volta de quarenta e cinco anos, os cabelos parcialmente grisalhos. Era dono de uma voz grave e bonita de se ouvir. -Foi preciso paralisar o cadastro para que não houvesse um excesso de contingente. Saibam que o cargo para o qual foram designados, com exceção dos de chefia, são transitórios. Sendo assim, podem mudar de acordo com a vontade de seus capitães ou supervisores, bem como por transferência de localidade para suprir as carências de outras áreas.

Ele pigarreou e continuou:

—Primeiro, o anúncio dos cargos de comando. -E remexeu nos papéis sobre a bancada. -Para diplomata oficial da Salvaguarda Legítima, Nyra Anthe. Indicação direta dos reis e rainhas envolvidos em tal aliança, sob justificativa da atuação da referida nomeada na última assembleia da União Real.

Aplausos sucederam a fala. E o arauto continuou:

—Para curandeira e enfermeira chefe, Tamires Zeto.

Muitos vaiaram. Era compreensível, Tamires é irmã do foragido e Lume Antigo Darius Quendra e esposa de Urak Zeto, o General dos Guardiões das Chamas.

O arauto esperou novamente o silêncio.

—Por ser a voluntária de maior experiência em cura espiritual e grande conhecedora dos clericatos.

Procurou entre as linhas do pergaminho o próximo nome e continuou:

—Para chefe de resgate, instrutor de combate, comandante tático e chefe de distribuição de recursos, César Iros. -Quatro cargos foram confiados ao Capitão da Guarda de Eyrell, sendo que ele se inscrevera apenas para instrutor de combate.

—Duas vagas foram abertas para espiões, porém, como manda a regra, as identidades dos nomeados serão mantidas em sigilo.

O público se queixou, mas, se um espião tem seu nome divulgado, fica difícil trabalhar.

—Para planejamento tático, Ônix Ladelu. -A duende da Cúpula da Intelecção. Além de ajudar a distribuir os recursos entre as pessoas e áreas afetadas, Ônix transmitirá informações em primeira mão para o restante da Cúpula. César Iros seria subordinado a ela.

Poucos conheciam a mulher, mas aplaudiram com ânimo sua nomeação.

 

Em seguida, vieram outros cargos de chefia com nomeações de pessoas desnecessárias para a narrativa desta história. E, após eles, vieram os cargos menores:

Rita integrava o grupo dos seguranças armados. Mesmo a Salvaguarda Legítima não participando do combate, há a necessidade de resguardar alguns lugares como os acampamentos de enfermagem, por exemplo.

Catarina ficou muitíssimo orgulhosa ao ser selecionada para a divisão de produção de antídotos e medicamentos. Velma Cann recebeu o mesmo cargo que a outrora assassina. Vívian, filha de Velma, chateou-se por não ser designada para nada. Foi dispensada meramente por “inadequações no cadastro” e convidada para um chá na corte.

Ruth e Laura ficaram, cada uma, com um posto no planejamento tático. Serão subordinadas de Ônix. Laura, no caso, seria; terminou desistindo ao saber que o avô que tanto ama estava muito mal de saúde, preferiu cuidar do pobre velho.


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