Progênie Maldita escrita por MarcosFLuder


Capítulo 2
Retorno ao antigo lar


Notas iniciais do capítulo

E como prometido, aqui está o segundo capítulo. O próximo será postado daqui a 15 dias, no exato dia de natal. Até lá para quem se dispuser a acompanhar essa história.



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PENITENCIARIA DE LEICESTERSHIRE – HORAS ANTES DA BATALHA DE HOGWARTS

            Adam Campbell está naquela prisão a décadas. Ele sabe que morrerá nela. Sem família, sabe que será enterrado no humilde cemitério anexo. Uma lápide bem simples será tudo o que lhe restará. Com o tempo esta será esquecida, abandonada, tal como as outras no local. Nos primeiros anos da prisão ainda soube impor a sua presença, mas agora era apenas mais um prisioneiro, que de tanto tempo preso, nem saberia mais como seria viver do lado de fora desses muros. As visitas do homem que se preparava para ir embora era tudo o que tinha agora. Era tudo o que lhe lembrava de tempos mais felizes, de quando acreditava ter o mundo inteiro em suas mãos. Por conta disso, um estranho sentimento de desespero toma conta dele, ao ver o homem de aspecto horripilante se preparando para ir embora.

— Vai embora tão rápido? Você costumava demorar mais.

— Eu sei meu caro, mas eu preciso ir – ainda de pé ele olha novamente para o prisioneiro – assim que Harry Potter estiver morto eu voltarei e lhe contarei as novidades.

— Você parece tão confiante Tom – Adam não se levantou, mas o encarou firmemente, sem qualquer sinal de medo em seu rosto – esse sempre foi o seu problema, sempre subestimando as outras pessoas. Eu me lembro de ter alertado você varias vezes sobre isso.

— Essa é um tempo que se foi a muito, Adam – Voldemort se volta rapidamente, praticamente se chocando contra o vidro, mas o efeito que queria causar no homem diante dele não se deu – você nunca teve medo de mim não é?

— Nunca Tom – Adam mantém a face tranquila, quase serena – algo em mim sempre disse que você nunca me faria mal, pelo menos não o mal que você se acostumou causar às outras pessoas. Vá para a sua batalha Tom, eu ficarei aqui, torcendo por esse Harry Potter. É verdade que nunca o conheci, mas não posso evitar o apreço que sinto por ele.

— Quando eu voltar, prometo que trarei a cabeça dele para que você finalmente conhecê-lo – Havia ódio no rosto de Voldemort, curiosamente, uma expressão que o tornava menos assustador do que a de alegria.

— Tome cuidado Tom, volto a dizer que subestimar os outros sempre foi a sua fraqueza. Lembra-se de como nos conhecemos?

            Um silêncio tenso toma conta do ambiente. A tensão, no entanto, era exclusiva de Voldemort. Da parte de Adam, este ainda se mantinha calmo e sereno. Aos poucos o bruxo foi se acalmando. Ambos os homens voltam a se sentar, ainda em silêncio. Voldemort olhava para o homem diante dele, imaginando o que seus Comensais da Morte diriam se soubessem do relacionamento que manteve com alguém como ele por décadas. Não que se importasse com a opinião de alguém, era apenas uma breve curiosidade, que, tal como surgiu, logo se dissipou.

— Eu me lembro do dia em que o conheci, Adam – a voz de Voldemort tinha um tom ligeiramente suave; um novo brilho surgindo no olhar mortiço – lembro como se fosse hoje, quando conheci você e Ivy.

ORFANATO SAINT PATRICK – LONDRES TROUXA – 1939

            Tom Ridlle Jr. tinha uma sensação de decadência e desconforto quando se viu diante da fachada daquele edifício. Ele nascera ali, mais de 12 anos atrás, mas nunca vira aquela construção decadente e melancólica como um lar de verdade. Preferia ter continuado em Hogwarts, mas não houve possibilidade de convencer alguém de permitir que isso acontecesse. Um breve sentimento de raiva toma conta dele ao lembrar, principalmente de Dumbledore. Não fosse por ele talvez tivesse tido sua vontade atendida. Mas nada ganharia mergulhando em lamentações. Ele estava de volta e teria de lidar com isso.

— Ora, ora, quem eu vejo depois de tanto tempo? – Tom reconheceu a senhora Cole de imediato, o ligeiro odor de álcool podendo ser sentido, de leve, embora ainda estivesse longe do meio-dia – vamos entrar Tom.

— Como vai senhora Cole – Tom Ridlle Jr. empregou um tom bem suave e educado em sua voz – está tudo bem por aqui?

— Tudo normal meu rapaz – ela caminhava com surpreendente firmeza, algo que sempre intrigara Tom, pois o hábito da bebida não mudara em nada na mulher – recebi uma carta do tal professor Dumbledore. Ele me disse que posso confiar que os incidentes que ocorreram com você antes de ir para a tal escola não voltarão a acontecer.

— Não senhora, peço desculpas se ainda são motivo de incômodo – o tom de voz continua o mesmo, fazendo a senhora Cole se virar e olhar para ele com um nítido interesse, como a tentar decifrá-lo.

— Fico imaginando se aquela escola realmente conseguiu concertar as suas esquisitices – a senhora Cole nunca foi conhecida pela sutileza, Tom até gostava disso nela.

            Ambos caminharam pelos corredores da casa, até chegarem a um salão. Tom olhava o local, o rosto sem qualquer expressão, ocultando totalmente o sentimento de grande desprezo pela humildade do local, pelo menos em comparação com Hogwarts. Tudo fazia com que sentisse ainda mais falta de estar na escola. Não havia nele qualquer sentimento emocional, apenas a lembrança da grandiosidade do castelo, de tudo o que aprendera; do sentimento de pertencimento que nunca experimentara antes de ir àquele lugar. Se ao menos pudesse continuar com seus “experimentos”, mas Tom sabia que não seria possível. As advertências que recebeu em Hogwarts foram muito claras, principalmente as de Dumbledore. Ele sabia que não tinha autorização para utilizar tudo o que aprendera fora da escola.

Em verdade, ainda estava fresca na memória dele a conversa com Dumbledore; a ameaça, disfarçada em conselhos e gentileza, despertando nele uma fúria ainda maior do que já tinha sentido antes. Tom ardia em desejo pela chance de utilizar seus conhecimentos no lugar. Olhava para aquelas crianças e as via como pequenos animais, cobaias prontas para algum experimento. O desejo era enorme, mas ele se conteve. A ideia de um tipo de punição que o afastasse de Hogwarts, de todo o conhecimento que ansiava por se apropriar, o deixava apavorado. Medo era um sentimento que experimentou quando esteve com Dumbledore pela última vez. Ele sabia que o velho professor não confiava nele, que sempre o vigiara. Tom ainda se lembrava dos modos gentis do velho bruxo, da sua voz suave. Ele não se deixava enganar por nada disso; aquele homem era um inimigo. O jovem aluno da Sonserina sabia que não poderia enfrentá-lo tão cedo. Tudo isso o deixava furioso. Uma fúria que manteve para si.

            Os rostos que via no salão foram sendo reconhecidos aos poucos. Os olhares também. Amanda Benson e Denis Bishop olharam para ele desconfiados, mas Tom estranhou ao não ver o medo que havia naqueles olhares antes. Como se os meses que esteve em Hogwarts tivessem apagado neles as sensações da experiência na caverna. Carlinhos Stubbs lhe dedicou apenas um breve olhar, a lembrança do incidente com o coelho de estimação parecendo ter se perdido no passado. Tom tratou de ignorá-los, junto com a ruidosa conversação dos outros garotos e garotas no salão. Ele seguiu o seu caminho, ocupando uma cadeira vazia, num canto afastado de todos. Era como se o passado ressurgisse de volta, como se os meses em Hogwarts não tivessem acontecido. Um segundo de pânico tomou conta dele ao constatar isso, foi a voz da senhora Cole que o trouxe de volta a realidade.

— O almoço será servido em uma hora – ela falava para todos no salão, ainda que não se dirigisse a ninguém em particular, saindo rapidamente.

            Tom já ia se levantar, pensando em se dirigir à sua antiga cama, quando a viu entrar. Ela era alta e esbelta, os cabelos ruivos caindo em cascata pelas costas, lisos e brilhantes, quase alcançando a fina cintura. O rosto de uma simetria que nunca vira antes. O andar delicado, mas ao mesmo tempo confiante. Era um andar típico de alguém com plena consciência do efeito que causava em torno de si. O que Tom vislumbrava, com uma fascinação que nunca sentira antes, era uma adolescente com um corpo já praticamente formado. Ela usava um vestido relativamente simples, mas que nela parecia incrivelmente elegante. Os olhares em volta mostravam, fascinação por parte dos meninos, inveja da parte das outras meninas, não deixando dúvida de que ele não era o único afetado por sua presença.

Tom a viu sentar-se numa cadeira próxima, praticamente de frente a ele. Ela cruzou as pernas elegantemente, o olhar revelando duas piscinas azuis, varrendo o local como se este não fosse digno de sua presença. Uma sensação que lhe era desconhecida toma conta dele, algo que o irritou profundamente, pois não conseguia entender o que era. Estava incomodado pelo fato de não conseguir tirar os olhos daquela figura, mais ainda por constatar que deixou de tomar uma decisão pela mera visão dela entrando na sala. O que mais o incomodava, no entanto, era a atitude dela, indiferente, superior, sem sequer notar a sua presença, e o efeito que essa mesma atitude causava nele.

            Tom ainda estava imerso no encantamento, que simples a presença da jovem mulher sentada à sua frente lhe causava, quando se deu conta de uma nova mudança no ambiente. As conversas ruidosas, que diminuíram bastante quando ela entrou, simplesmente cessaram de vez. Ele notou no olhar de Amanda Benson e Denis Bishop, refletido neles, o medo que esperava lhe ser dirigido. O som de passos apressados o fez ver quando Carlinhos Stubbs saiu, com uma pressa visível, por uma outra porta. Seus olhos percorreram o salão, até o momento em que o notou. Era um rapaz de grande estatura, os cabelos eram cortados bem curtos, as sobrancelhas finas. O rosto tinha um aspecto duro. O nariz parecia amassado, a boca torta. O olhar tinha uma mistura de frieza, astúcia e determinação, parecendo esquadrinhar todo o ambiente, como se esperasse uma emboscada em cada canto. A pele tinha um tom ligeiramente mais escuro do que Tom estava acostumado a ver.

O jovem, que devia ter a mesma idade daquela que fascinara a todos com sua entrada na sala, olhou em volta. Tom viu quando o olhar dele voltou-se para o local onde estava; colocando-se em alerta ao vê-lo se dirigindo em sua direção. O jovem parecia crescer em altura a cada passo que dava. Uma paralisia intimidante tomava conta dele, fazendo seus pensamentos se perturbarem ante a sua aproximação. Nunca imaginou que alguém, além de Dumbledore, pudesse ter esse efeito sobre ele. O mesmo ódio que tinha do seu antigo professor começou a sentir por alguém que estava vendo pela primeira vez. Tom já se preparava para enfrentá-lo, até se dar conta de que é a jovem sentada à sua frente que tem a atenção do outro jovem.

            Ele a vê se levantando. Uma nova impressão dela surgia diante da visão de Tom. Toda a confiança demonstrada em sua entrada anterior mudara para uma mistura de medo e fascinação, além de outro sentimento, que Tom tinha dificuldade em decifrar. A linguagem corporal dela havia mudado completamente, isso ele notou. O ligeiro tremor, a respiração acelerada, o que Tom notara pelo subir e descer dos seios, já ligeiramente proeminentes. A cabeça não estava levantada, como no momento de sua entrada no salão, mas ligeiramente inclinada para baixo. Os olhos, por sua vez, seguiam fixos na figura que se aproximava. Tom sentiu uma ligeira pulsão no baixo ventre ao vê-lo agarrar a cintura dela, puxando-a com firmeza em sua direção, fazendo com que os corpos acabem se chocando. Ele a ouve suspirar, ainda que ensaie um ligeiro protesto, colocando as duas mãos sobre o peitoral dele, buscando afastá-lo, embora não empregasse muito esforço nesse sentido.

— Calma aí Adam – ela disse, sua voz soando como música nos ouvidos de Tom, deixando-o momentaneamente encantado em ouvi-la. Ele queria ouvi-la mais, ao mesmo tempo em que a odiou por despertar nele essa necessidade. – a senhora Cole não gosta desse tipo de contato.

— Ainda bem, porque eu não pretendo ter esse tipo de contato com ela – Adam respondeu, provocando um ligeiro riso da parte dela.

— Seu bobo – ela deu um suave soco no ombro dele, a risada logo se transformando num sorriso. Tom ficou chocado ao se dar conta de que sorrira espontaneamente, diante dessa visão.

— Ela está na cozinha querida – a voz dele era firme, confiante, como se o mundo a sua volta não lhe oferecesse qualquer perigo – senta aí.

            O tom de voz dele. ao dizer isso, chamou de imediato a atenção do jovem aluno da Sonserina. Era uma autoridade que Tom sentia muito raramente. Ele ainda lembrava de vislumbrar algo parecido consigo mesmo na caverna, com Amanda e Denis; ou quando fez o coelho de Carlinhos se colocar diante da corda que o enforcou. A reação da garota também o deixou fascinado, além de intrigado. Ela se manteve em pé durante alguns breves segundos. O rosto pareceu ligeiramente contrariado com o tom de voz empregado. A cabeça ergueu-se, como no momento de sua entrada no salão. O olhar dos dois se cruzando, mas ela não o sustentando por muito tempo, pois a cabeça voltou a abaixar-se, com ela finalmente se sentando.

O rapaz se senta também, o braço esquerdo se colocando em volta dos ombros dela, enquanto a mão direita lhe acaricia o cabelo. Tom vê um novo sorriso aflorando nela, causando nele uma sensação estranha de contentamento. Ao mesmo tempo, ele notou a mudança no rosto do rapaz, a dureza dando lugar a uma expressão mais suave. Tom o vê sorrindo também, notando os dentes perfeitos. Foi então que o rosto dele se virou, olhando direto para o garoto sentado na cadeira, exatamente em frente a eles. O sorriso suave desaparece do rosto dele, a face ganha de novo o ar de dureza. Os dentes perfeitos desaparecem na boca torta. Ele ainda sorri, mas agora é um sorriso de ameaça.

— O que nós temos aqui? – Tom sustenta o olhar diante dele, mas tal como em seus encontros com Dumbledore, sente algo próximo do que seria um sentimento de temor diante de alguém. Ele odiou isso, assim como odiou instantaneamente a pessoa que provocou esse sentimento nele – quem é você garotinho?

— Deixa ele para lá, Adam – ela voltou a falar – é só um garoto, deve ser novo no orfanato; vai ver perdeu os pais a pouco tempo.

— Minha mãe morreu no meu parto e eu não conheci o meu pai – a resposta dele veio firme, sem qualquer tipo de emoção. Não havia da parte de Tom qualquer tentativa de ganhar a solidariedade da garota, muito ao contrário.

— Você veio transferido para cá? – Tom não sabia se havia um verdadeiro interesse do jovem diante dele, ao fazer a pergunta.

— Eu nasci aqui, mas estive fora nos últimos meses – a resposta de Tom continuava no mesmo tom firme de antes – estive numa escola particular.

— Qual é o seu nome garotinho?

— Meu nome é Tom Ridlle Jr. – há uma ligeira mudança na entonação de sua voz, uma irritação que Tom não queria deixar transparecer, mas não conseguiu evitar, da mesma forma que mal se dera conta de ter se levantado antes de voltar a falar – e pare de me chamar de garotinho.

            A resposta demorou alguns segundos, mas parecia que o tempo estava passando lentamente. Tom notou a tensão no ambiente, todos à sua volta como que esperando algo acontecer. Ele viu o jovem se levantando, obrigando-o a inclinar sua cabeça para manter o olhar fixo junto a ele, pois era bem mais alto, Tom mal conseguindo chegar-lhe ao ombro. Ainda assim, se manteve firme, jamais demonstrando nada menos que firmeza e segurança. Uma risada toma conta do ambiente silencioso. O jovem Adam Campbell gargalhava com vontade, ainda que isso não fizesse com que o ambiente ficasse menos tenso.

— Viu só querida? Ele é corajoso! – a gargalhada morrendo em sua garganta, o rosto adquirindo uma expressão séria – ouça bem, Tom Ridlle Jr. Fique sabendo que as coisas mudaram bastante por aqui desde que passou o seu tempo na tal escola particular onde estudou. Eu trataria de me acostumar a isso se fosse você – ele diz isso e oferece a mão para a jovem diante dele, que se levanta de imediato. Ambos saem juntos, altivos e serenos, todos olhando para eles, como se ambos reinassem naquele lugar.

            Tom os viu saindo pela porta, se dando conta de que o ambiente ficara menos tenso após terem deixado o salão. Ele volta a se sentar, mal notando os olhares voltados para si. Tudo o que queria era processar os sentimentos que tomavam conta dele. Não entendia o porquê de ter sentindo o que sentiu pela garota, menos ainda o ligeiro sentimento de intimidação que o jovem que saíra lhe provocava. Ele odiava isso, odiava tais sentimentos. Odiava senti-los. Odiava que o afetassem como estavam afetando. A maldade nunca lhe fora estranha. A dor que já causara em outras pessoas, sempre foi para ele um motivo de alegria. No entanto, foi uma ligeira surpresa para o jovem órfão, constatar o fato de que, até então, nunca desejara realmente a morte de qualquer pessoa, não até aquele instante.


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Notas finais do capítulo

Cronograma inicial cumprido. Agora é trabalhar para manter a regularidade prometida. Me desejem sorte, quem se dispuser a acompanhar essa história.



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