Born To Die escrita por Sabsyoda


Capítulo 5
Capítulo 4




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Não posso dizer que dormi bem à noite. Sempre que eu conseguia cair no sono, pesadelos surgiam em minha mente me fazendo acordar assustada e ofegante. Eles variavam a cada vez que eu fechava os olhos. Às vezes, eu me encontrava sendo pega dando moradia para uma Rebellis pela professora Jeon e a diretora e outras vezes eu era uma delas. Nenhuma das opções terminava bem — chicoteada várias vezes na frente das outras garotas como forma de exemplo e até mesmo a morte —, o que não me deixou pregar os olhos direito. A culpa disso é somente minha, Miryo já me avisara uma vez que sempre tive a mente muito fértil.
Além de possuir uma mente fértil, também sou muito medrosa. Acho que a Rebellis — ou Wendy, como ela diz se chamar – percebeu isso.
— Você é criativa — ela disse, após Tiffany tirar a bala de sua perna e ajudá-la a se banhar usando duas jarras e água da pia. Se ligássemos o chuveiro, iríamos acabar nos denunciando. Lembro de Joy arfar mais uma vez e se aproximar mais de Gain.
— Ela disse outra palavra proibida — disse, sem conter seu espanto.
— Você poderia, por favor, parar de dizer tais palavras? — Tiffany indagou após Wendy rir baixinho — A Joy é muito sensível para essas coisas.
— Deu pra perceber — Wendy comentou, observando Joy que evitava seu olhar.
Tiffany encarou a Rebellis de maneira séria enquanto cobria o ferimento com uma compressa limpa.
— Você tem sorte que essa bala não atingiu nenhum osso. Caso contrário, realmente teríamos que chamar uma ajuda de verdade — Tiffany disse e Wendy fez uma careta de dor. Não sei se pelo machucado ou pelas verdades na fala da minha amiga.
— Preferia morrer do que pedir ajuda à eles.
Todas nós ficamos em silêncio. Penso que Tiffany ignorou o comentário e continuou a tratar do ferimento. Assim que o sangue estancou, ela fez um curativo com gaze em Wendy, finalizando com uma bandagem.
A Rebellis pareceu um pouco incomodada com sua nudez em nossa frente, mas não nos incomodamos com isso. Percebi seu constrangimento e não hesitei em ir até o quarto para pegar uma muda de roupas para ela. No final, eu e Gain ajudamos Wendy a se locomover até o quarto, pois segundo Tiffany, quanto menos movimento ela fizesse, melhor seria. Nenhuma das garotas foi contra quando cedi a antiga cama de Miryo para a Rebellis.
Nosso quarto é pequeno, mas sempre demos um jeito de nos arrumarmos nele. Eu e Miryo dividimos uma beliche, enquanto Joy, Gain e Tiffany uma treliche. Quando ainda éramos em cinco, Miryo ficava com a parte de cima da beliche, enquanto eu, que era muito medrosa para tal feito, dormia na parte de baixo. Joy, assim como eu, dormia na parte de baixo, depois era a cama de Gain e por último de Tiffany. Desde que Miryo sofreu o acidente, começamos a usar a cama de cima da beliche em que eu durmo para deixar alguns cobertores que conseguimos para passar melhor o inverno.
Pensei por alguns segundos em questioná-la sobre o que ela disse, as garotas que sumiram e as palavras proibidas, contudo, isso só aterrorizaria Joy que ainda estava se preparando para dormir.
Ninguém disse uma palavra quando desliguei a luz para dormimos.
Penso que Wendy, de modo não intencional, acabou contribuindo para minha noite mal dormida.
No momento em que tive a certeza de que as outras meninas estavam dormindo, tentei puxar conversa com Wendy. Apenas a luz que vinha da janela iluminava um pouco a nossa beliche.
— O que você quer saber? — ela questionou na terceira vez que sussurrei seu nome, tentando chamá-la sem acordar as outras.
Tudo.
— Não acha que 'tudo' é um pouco demais, agora? — respondeu-me com uma pergunta e parei para analisá-la. Eu deveria saber de tudo, não é? Como vou poder entender sem saber das coisas nos mínimos detalhes? — Que tal eu começar pelo início?
— E qual seria ele? — de madrugada, em minha cama debaixo dos cobertores me pus a pensar em qual seria o início.
— Há muitos anos atrás, na época em que era normal uma mulher usar calça e viver com a própria família...
O que? — lembro que a interrompi, perplexa. — Isso é mentira.
— Como vou te explicar tudo se você ficar me interrompendo assim? — a voz de Wendy se tornou um pouquinho irritada e ela suspirou — Não é mentira. Realmente, muito antes do Dia da Glória, houve uma época em que não existia palavras proibidas, em que mulheres usavam calças, viviam com as próprias famílias e ainda dirigiam carros.
— Era possível? Não temos o ensino para saber conduzir um automóvel.
O silêncio voltou e pensei que ela tinha desistido de me explicar qualquer coisa. Segundos depois, Wendy desceu a escada da beliche e veio sentar ao meu lado.
— Me esqueço que eles fazem uma lavagem cerebral em vocês aqui — ela suspira e passa a mão pelas madeixas vermelhas — Você precisa entender, Yerim, que há muito tempo atrás as mulheres possuíam direitos. Poucos, mas tinham. Coisas que parecem pequenas, como por exemplo, usar uma calça, dirigir ou viver com a família, contudo, se você parar para pensar, nem ao menos isso temos mais.
— Então, antigamente o mundo era melhor? — sei que fiz uma careta, pois Wendy riu baixinho de minha expressão.
— Em alguns pontos, sim. Veja bem, não é que antes tudo fosse um mar de rosas. Não, com certeza não era assim. O mundo é e sempre será um lugar suportável para se viver, por conta dos seres humanos. O machismo, preconceito e racismo esteve presente até mesmo naquela época. Mas diferente de hoje, a situação estava mudando. As pessoas estavam finalmente abrindo os olhos para o absurdo que ocorria em volta delas.
Acho que ela conseguiu ver a minha confusão. Aquelas palavras...Como nunca escutei e nem vi nenhuma menção à elas?
— Você entende o que é o machismo, não é? Ou o preconceito e racismo...
Não — não sei porque, mas senti vergonha em não saber. Parecia errado.
Parando para pensar melhor, Wendy realmente contribuiu, de maneira não intencional, para a minha noite mal dormida.
Ela me explicou o que significava cada palavra e até mesmo citou exemplos. O que me espantou foi que os exemplos eram coisas, momentos que todos consideram como normais no dia a dia.
— Pense, Yerim. Nunca viu nenhuma das garotas daqui serem tratadas de modo diferente por causa da etnia, cor ou raça? — a pergunta de Wendy me trouxe memórias que quase esqueci por completo.
Quando eu era mais nova, uma garotinha de pele escura, cabelos tão diferentes do meu que era liso e olhos num tom de castanho claro. Ela passou quatro dias em nossa escola e lembro que nenhuma das garotas se dignou lhe dirigir a palavra. Bem, ninguém exceto eu. No quarto dia, quando as garotas estavam distraídas demais com a lição que foi passada para casa, eu me aproximei dela. Seu nome era Jessie. Me recordo que ela, muito timidamente, me perguntou se ela tinha feito algo de errado para nenhuma das meninas se aproximarem dela. Respondi que elas eram tão tímidas quanto ela e que talvez fosse isso, Jessie riu e disse que ficou feliz por eu ter ido falar com ela.
Mais tarde no mesmo dia, Kaeun veio com Miryo questionar se eu tinha falado com a garota. Elas disseram que eu não devia falar com pessoas daquele tipo. Lembro que não compreendi o que elas disseram e falei que ela era apenas uma garota normal, igual a nós. Kaeun riu. Miryo também. Eu fiquei sem entender o motivo do riso. Depois daquilo, Jiyoon se aproximou de mim com uma expressão cabisbaixa e comentou: "Ela nunca será igual a nós, Yerim. Ela é diferente". No dia seguinte as professoras disseram que Jessie foi mandada para uma escola onde saberiam lidar melhor com pessoas do tipo dela. Desde aquela época eu percebi que ser diferente era ruim. E errado, da pior maneira possível.
Não precisei responder Wendy. Ela assimilou que eu já havia presenciado situações como os exemplos que me foram ditos e acho que foi pela minha expressão desgostosa.
— Você está com uma aparência horrorosa, Yerim.
Yuju sentou ao meu lado na hora do café da manhã. Olho para ela, que come animadamente o mingau. Uma colherada atrás da outra. Meu estômago se embrulha e ignoro o meu prato com mingau, que por incrível que parece, está com uma cara pior que o de ontem.
— É, já me falaram isso — comento, despedaçando a torrada em vários pedacinhos, assim como a fatia de queijo light. E realmente Suzy tinha me dito a mesma coisa minutos antes.
— Não conseguiu dormir? — ela questiona, entre uma colherada e outra.
— Não muito.
— Espero que você consiga ficar acordada para a aula da professora Jeon. Sabe como ela fica nervosa quando alguém dorme enquanto ela explica algo.
— Ah, nós temos aula dela hoje, não é? Nossa, eu esqueci completamente!
— E quando é que não temos? — ela ri e eu suspiro. Yuju tem razão, se existe uma professora que dá aulas praticamente todo dia, essa professora é a Jeon — Vai comer o mingau?
Faço que não e empurro minha tigela para ela. Tecnicamente, não podemos fazer isso. Mas como as guardas não nos observam mais durante as refeições, não me importo de fazer tal coisa.
Depois de comer os pedacinhos de torrada com queijo, penso que deveria ter fingido que iria comer o mingau e ter levado para Wendy. Sei que não é a melhor comida, contudo, é a única coisa que poderia oferecer.
Antes de acompanhar as outras garotas até o nosso campus, finjo que esqueci algo e volto para o dormitório.
Fico surpresa ao ver Joy no quarto estendendo uma tigela de mingau para Wendy.
— Eu vi você dando o mingau para a Yuju e pensei que talvez esqueceria de trazer algo para a Wendy...— as bochechas de Joy ficam vermelhas e ela coloca uma mexa do cabelo atrás da orelha — N-Não precisa se preocupar, eu ajudo na cozinha, então não tive problema em pegar um a mais para ela...
— Você fez o certo. — digo, achando o acanhamento dela uma graça — Contudo, devemos ir logo pois chegaremos atrasadas e isso pode levantar suspeitas.
— A-Ah, claro. — Joy sai do quarto de cabeça baixa e um pouco destrambelhada pela timidez.
— Obrigada. — a voz de Wendy me paralisa antes que eu também saia do quarto.
Dou uma última olhada para a garota antes de abrir um pequeno sorriso: — Só tente não chamar a atenção.

Chego na sala de aula junto com Joy e nós duas soltamos um suspiro de alívio ao ver que a professora não notou o nosso atraso. Na realidade, a professora nem ao menos está na sala. Nos sentamos em nosso respectivo lugar, ignorando os olhares perplexos e preocupados de Gain e Tiffany para a gente.
— Vocês deram sorte de que a professora foi chamada pelo diretora. — Sandara sussurrou para mim. — Caso contrário...
— Ela foi chamada pela diretora? — ignoro Sandara passando o dedo pela garganta num gesto de 'morte' e olho para Mijoo na frente dela que assentiu rapidamente — O que será que aconteceu?
— Não sei, mas algumas garotas disseram que é algo sobre o Grande Dia! — ela responde e até mesmo Joy começa a prestar atenção na conversa — Não é mesmo, Dara?
— Kaeun e Eunbi juram de pés juntos que é algo sobre isso! — Sandara responde e eu olho rapidamente para as duas garotas sentadas na ponta da outra fileira — Hey, Yerim, não olhe tão assim na cara.
— Desculpa — dou risada, sem graça e Sandara revira os olhos. — O que será que pode ser sobre isso?
— Não faço a mínima ideia, mas espero que...— ela não termina sua frase, pois a professora entra na sala tão de repente que todo o burburinho se silencia.
Me arrumo na cadeira e fico quieta esperando as ordens da professora. Jeon nos encara, uma a uma, com a expressão fechada.
— Muito bem, já que a diretora quis que eu lhes dissesse isso...— ela murmura. Pigarreia e tenho certeza de que todas as garotas estão a olhando agora mesmo — Ocorreram algumas...Mudanças sobre o Grande Dia.
Bastou ela dizer Grande Dia para que todas começassem a falar ao mesmo tempo, o barulho tomando conta do lugar.
— Silêncio! — esbravejou Jeon — Se controlem! Vocês são damas e damas não se comportam assim, se querem perguntar algo levantem a mão silenciosamente. Agora, onde estávamos? Ah, sim. Como eu disse, ocorrem algumas mudanças em nosso evento anual. Sim, Eunji?
— O que mudou, professora Jeon?
— É uma verdade conhecida por todos que garotas são terminantemente proibidas de possuir qualquer contanto com homens antes do Grande Dia. Vocês não possuem tal direito. Contudo...Esse ano vai ser diferente. Sim, Solar?
— Como assim diferente, professora?
— O normal e correto é que toda dama só conhecerá seu futuro marido no Grande Dia. Nesse dia, vocês terão um baile e conversarão com todos os pretendentes possíveis e quem tiver mais sorte e ser uma completa dama terá um casamento de ouro. É a lei. Bem, esse ano completa vinte e cinco anos desde o Grande Dia, e como o nosso bom presidente Hyunsuk está no poder há tanto tempo cuidando de nós, foi decretado pelo governo que nesse ano haverá uma brecha na lei. Para comemorarem tal feito, as garotas poderão se encontrar com os rapazes uma semana antes do evento. Mas somente as garotas de uma escola. E por sermos a melhor escola do bairro, e ouço dizer do país, fomos a grande escolhida.
— Isso quer dizer que...— Seulgi disse, mais alto que a voz da professora.
— Sim, senhorita Seulgi. Vocês terão o privilegio de se relacionar com os homens antes das outras garotas. E pelo que me foi dito, conhecerão os melhores pretendentes da cidade. — Jeon nos olhou com uma expressão debochada — Vamos ver se vocês vão ser capazes de arrumar um casamento digno. Já aviso que as meninas do ano passado não tiveram tanta sorte assim.


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Notas finais do capítulo

Eu criei um grupo no facebook (socorro) para explicar tudo melhor, porque como vocês estão vendo pela visão da Yerim, talvez não compreendam tudo (por mais que eu tente explicar as coisas nos mínimos detalhes haha).
Se vocês quiserem entrar e dar uma olhada, o link é esse: https://www.facebook.com/groups/750986605004221/

Bem, é isso. Bjs de luz ♥



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