Rapidamente ele desceu os degraus que o separavam do hall. Wood estava parado no meio do espaço, distraidamente remexendo na casaca quando ouviu os passos do amigo vindo em sua direção. Quando finalmente os parceiros se encararam, havia certo constrangimento entre eles.

— Estou surpreso com sua visita. – Sebastian comentou enquanto vencia os últimos degraus. – Pensei que você não pretendia mais voltar aqui.

Wood balançou o corpo para a frente e para trás sobre os calcanhares, antes de explicar:

— Isso foi antes de você ficar noivo de minha pretendida.

Aquilo não era verdade. Paul nunca se interessara por Hannah. Fora embora por medo de ser obrigado a assumir um compromisso que não desejava. Mesmo assim, havia a pergunta: o que ele estava fazendo ali? Qual sua intenção em retornar de forma tão inesperada e sem prévio aviso? Sebastian suspirou com mil pensamentos inundando sua mente. Quando sua noiva  visse o conde, talvez tivesse a ilusão de que ele voltara por causa dela.

— Por que você voltou? – a pergunta tinha um tom de exigência.

O conde sorriu descontraidamente. Seu amigo não parecia satisfeito em vê-lo.

— Para saber como isso aconteceu. Quando e por que você acabou noivo de Hannah em lugar de Betina?

— Isso lhe importa agora? – a conversa pouco amigável continuava enquanto Sebastian conduzia o amigo para sua sala principal.

— Claro que importa! – Paul não demonstrava embaraço enquanto falava. – Nesses últimos dias muitas coisas aconteceram... preciso de uma noiva Sebatian. E Hannah seria a mulher perfeita. Pensei nela assim que conversei com mamãe sobre o assunto, mas, logo depois recebo sua carta, dizendo que está noivo dela.

— Você foi embora. Não tinha intenção de voltar. Ela não ficaria esperando para sempre.

— Mas, por que você? – essa era a parte incompreensível da história toda.

— Por que não? – eles se encaravam firme, Evans ainda não desculpara o amigo por fugir sem dar explicações. – E você? Foi embora por que exatamente?

Sebastian estava zangado e não fazia questão de esconder.

— Precisava ir. A situação estava se tornando insustentável por causa de...

— Betina. – o outro completou. – Você estava caído por ela, não pense que não percebi. – lentamente caminhou até a cadeira e se sentou, pelo jeito aquela conversa não seria rápida – Mas não o culpo, minha futura cunhada é realmente linda.

Paul soltou um riso nervoso. Sua situação se modificara a tal ponto que aquela história parecia muito com uma tragédia grega.

— Sua futura cunhada. – o tom usado era quase de brincadeira. – Quem diria... – Paul se sentou também, exatamente de frente para o amigo.

Os olhos azuis de Sebastian se fixaram diretamente sobre o amigo antes das explicações começarem.

— Hannah precisava de ajuda. Não havia forma de ajudá-la sem me comprometer já que você não estava aqui... – ele sabia que se Paul estivesse Hannah não teria aceitado seu pedido. Na verdade ele não precisaria fazer um pedido.

— O que você quer dizer com precisava de ajuda?

Um longo suspiro escapou dos lábios de Sebastian. Teria de contar tudo. Desde o começo. Isso o atrasaria para o baile.

***************

Hannah estava parada junto a futura sogra e Cíntia Evans. A mãe e a irmã desfilavam pelo salão exibindo a beleza para todos que estivessem interessados em vê-las. O número de pretendentes de Betina, não aumentara após o noivado da irmã. Mas estava mais firme do que nunca. Aqueles que não se perturbaram diante da inusitada troca feita por Sebastian da irmã bonita pela sem graça, insistam em realizar o sonho de se casar com a mulher mais bela da região.

Apresentando agitação, a marquesa cochichou algo no ouvido de Cintia e se afastou rapidamente. Sem demonstrar que se importava com aquilo, Hannah continuou a inspeção pelo ambiente. Mas, como esconder que se ressentia da ausência do noivo. Ele já deveria ter chegado. Será que a estava evitando? Será que se sentia constrangido por ser seu acompanhante? Será que...

— Celine está preocupada com Sebastian. Ele já deveria ter chegado. – Cintia informou percebendo que a jovem padecia da mesma preocupação da marquesa.

— Será que aconteceu alguma coisa? – ao fazer a pergunta Hannah não se preocupou em esconder a agitação que lhe invadia o coração.

— Acredito que ele deva ter se atrasado apenas. Logo estará aqui... Sebastian nunca poderia ser chamado de um homem pontual. Você logo descobrirá isso. – enquanto falava, Cintia mostrava o largo sorriso. A moça não era alta, seus cabelos castanhos eram bonitos e brilhantes. Ela tinha lindos olhos cor de mel que examinavam tudo e todos detalhadamente.

De repente, alguém que Hannah pensou não veria mais, se aproximou dela. Sir Pierce parou exatamente diante de si, sorriu, fez uma mesura para as duas mulheres e logo depois perguntou se poderia dançar com a senhorita Larkin. Pronta para dizer não, Hannah ouviu Cintia sugerir em voz alta:

— Vá Hannah! Divirta-se. Sebastian com certeza não se incomodará que dance.

Ela sabia que para Sebastian não fazia qualquer diferença se ela dançava ou não com alguém. Entretanto, de sir Pierce, ela queria distância. Mas acabou acatando a sugestão da outra, pois diante do olhar desapontado de Pierce, Cíntia insistia que nada havia de mal em uma dança.

Com as mãos tremendo Hannah segurou o braço que sir Pierce lhe oferecia. Ele rapidamente lhe conduziu em direção a pista de dança e não perdeu tempo para alfinetar.

— A senhorita está especialmente bela esta noite. – começou e Hannah gesticulou agradecendo, ele continuou: - Seu noivo não está aqui para acompanhá-la? Que lástima!

— Ele teve um compromisso de última hora. – ela soltou rapidamente, sentindo-se irritada com o comentário que nitidamente tinha a intenção de provocar.

— Ah sim. Sir Evans é conhecido por seus “compromissos” inadiáveis.

Outra insinuação de que ela fora relegada ao segundo plano por causa de outra mulher. Hannah não duvidava que esse fosse o caso, mas também não queria acreditar que Sebastian fizesse tal coisa. Ainda não.

****************

Sebastian ingressou na casa em passos largos, apressados e rápidos e encontrou a mãe. A mulher parecia nervosa pela demora. Na verdade ele também estava ansioso e preocupado por ter se demorado mais do que gostaria. Mas, sua apreensão se devia ainda mais pela presença de Wood ao seu lado. Era certo que ele justificaria bem o atraso, porém, havia o lado negativo dessa presença. O que Hannah faria quando visse seu amigo de volta?

— Onde você esteve Sebastian? Sua noiva estava sozinha...- a preocupação da mãe era a mesma que o afligia.

Só então a mulher viu Paul e imediatamente sorriu.

— Wood! Que prazer em vê-lo!

— O prazer certamente é meu diante de tanta beleza! – o rapaz comentou se aproximando para beijar a mão da mãe do amigo.  

— Sempre lisonjeiro, não é a toa q você e Sebastian são tão amigos.

Os dois rapazes se olharam rapidamente. Ainda não havia paz total entre eles. Apesar do clima de cordialidade, a dupla não sabia bem como se sentia diante das mudanças ocorridas.

— A culpa do atraso é toda minha. – Paul explicou colocando a mão aberta sobre o peito. – Sebastian me esperou e com isso se atrasou.

Ignorando o comentário do conde, Evans segurou o braço da marquesa.

— Hannah? – perguntou à mãe. – Onde ela está?

A mulher gesticulou com o leque em direção ao salão.

— A deixei com Cintia do outro lado, junto das cadeiras.

Sebastian ingressou finalmente no enorme salão de festas da casa do pai. Olhou em volta e não viu a noiva. Cintia estava conversando com Artur e James. Seus olhos correram pelas pessoas em volta, definitivamente sua noiva não estava ali. Era fácil ver longe e não havia uma única mulher com cabelos ruivos por ali. De repente sentiu um cutucão. Paul estava lhe mostrando algo. Ele voltou-se na direção indicada pelo amigo. Era Betina, em seu vestido vermelho, brilhando como uma estrela e, totalmente envolta por pretendentes.

O filho do marquês não estava interessado nela. Queria saber onde Hannah estava. Seus olhos continuavam a procura. Porém, quando finalmente a viu, não foi exatamente tranquilidade por atingir o objetivo que o invadiu. Ela estava dançando. Com ninguém menos do que sir Pierce.

Sebastian deu um passo a frente sentindo o sangue agitar-se dentro dele. O homem a assediava claramente enquanto circulava em torno do corpo feminino. O que, por Deus, Hannah estava fazendo dançando com aquele homem? Ela não o detestava!? Ou apenas dizia que o detestava.

Naquele momento, ali, dançando, rodopiando pela pista de dança, vestida daquela forma não parecia detestar tanto assim... só então ele a examinou mais profundamente. Hannah estava encantadora, simplesmente suave como... uma fada. O corpete justo mostrava a delicadeza do corpo esbelto. As plumas brancas reforçavam o tom da pele e emolduravam os olhos grandes.

— Onde está sua noiva? – Paul perguntou se aproximando. – Minha antiga pretendida...

Evans apenas deixou a brincadeira passar por estar definitivamente irritado e perdido com a visão de Hannah e sir Pierce dançando.

— Está lá... dançando com o tal Pierce... – ele não pretendia esconder que estava incomodado com aquela cena.

Wood se moveu, como que para ter uma visão mais clara, pois era levemente mais baixo que o amigo.

— Aquele homem é o tal do qual você a ajudou a escapar? E por que ela está dançando com ele?

Enquanto falava Paul a observou bem.

— Não lembrava que a senhorita Larkin era tão bonita... – Sebastian o encarou, mas ele não parou de falar – Extremamente encantadora. Daria uma excelente condessa de Wood.

— Sinto muito, agora ela será a senhora Sebastian Evans... – só quando terminou a frase, o filho do marquês compreendeu que aquela garota, aquela mulher encantadora dançando com um ser repugnante, seria mesmo sua esposa. E que, em pouco mais de quarenta dias seria sua mulher.

A reação costumeira se fez sentir. Sua pele se eriçou, um arrepio deslizou pelos braços, ele se imaginou cercado, grudado em suor e em cabelos ruivos, beijando a pele macia e sedosa e finalmente compreendeu porque a pedira em casamento. Ele queria aquela mulher. E a única forma de tê-la seria casando.

A música acabou, sem demora ele seguiu na direção do casal que se afastava da pista, deixando Wood parado vendo a situação se desenrolar. Sir Pierce conduzia Hannah para o mesmo local, mas foi interpelado por um azedo e carrancudo noivo no meio do trajeto.

— Boa noite sir Pierce... – falou sério e finalmente Hannah o viu. Seus olhos se encontram e ela sorriu. Parecia um sorriso de alivio ele pensou. Mas, também poderia estar enganado. – Posso roubar minha noiva?

— Esteja a vontade. 

O outro estendeu o braço para que Hannah mudasse de parceiro. A mão dela se agarrou a manga da casaca de Evans enquanto o corpo feminino roçava suavemente contra o dele.

— Obrigada pela dança... sir Pierce. – ela falou baixo deixando transparecer o alivio que sentia por ter Sebastian junto de si.

O homem fez uma mesura antiquada e se afastou. Só então, Sebastian voltou a caminhar. Ele vira a mãe, os irmãos e a cunhada bem próximos. Mas, precisava conversar com Hannah antes de recolocá-la no grupo.

— Precisamos conversar... – Sebastian falou sem olhá-la realmente e o coração de Hannah se apertou. Ele estava atrasado. Parecia incomodado. E agora queria conversar. O que teria a dizer?

— Precisa ser agora? – ela perguntou querendo afastar aquele momento para longe. Sebastian finalmente a encarou. Os olhos azuis praticamente escondidos sob a sombra que a máscara negra fazia sobre seu rosto.

— Deve ser agora.

Oh! Meu Deus! Ela disse a si mesma. Algo estava definitivamente errado. Muito errado. Sem conseguir se controlar permitiu que o medo tomasse conta de seus pensamentos. Idéias absurdas começaram a se desenhar na mente feminina.

— Podemos conversar tranquilamente na sacada leste, certamente que ninguém estará lá. – ele sabia que ninguém iria até lá. Exceto ele é claro.

— Sir Evans... – Hannah parou, soltando o braço do dele, obrigando-o a parar também. – Por favor. Diga-me o que está acontecendo?

Os olhos dela, que naquela noite estavam espetacularmente azuis e brilhantes mostravam claramente como Hannah se sentia. Ela estava confusa, perdida e... com medo. Querendo evitar uma interpretação errada para seu comportamento, ele segurou as mãos femininas entre as suas gentilmente, aliviou brevemente o tom exaltado da voz antes de dizer:

— Não se preocupe... não é nada demais. – é apenas seu falso pretendente que voltou querendo se tornar um pretendente real. Ele pensou mas não disse.

Ela ajustou os dedos dele entre os seus. Queria poder receber mais. Queria um abraço. Queria se recostar no peito dele. Sentir seu coração bater. Sentir o aroma da pele dele. Hannah suspirou longamente, seu coração estava irremediavelmente perdido. Mesmo que sir Evans jamais viesse a amá-la. Ela já o amava. De forma intensa, inesperada e profunda.