Raiva Mente escrita por Hypnomium


Capítulo 1
Raiva Mente




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Raiva.

Raiva, raiva, raiva. Sinto tanta raiva que isso não pode ser normal.

Às vezes é como se a Raiva tivesse amarrado todas as outras emoções em minha cabeça, como no filme divertida-mente. Existem pessoas dentro e uma fora. Peças e um Avatar. Mas esse pequeno operatório abstrato (PIAJET) se manifesta na forma de Eu e de Ondas e faz uma bagunça dentro de mim que não tenho o menor controle, apenas alerta das consequências e uma prévia das catástrofes.

Não é tristeza, não é pena, não é ciúmes, nem empatia. Sinto apenas raiva.

Cada vez que não faço algo que sinto que poderia ter feito, o sentimento vem à tona como uma onda de escalda desprovida de controle e afoga toda minha cidade de paciência, causando nada senão uma inundação da própria. Fica tudo imergido nas águas turbulentas, sem qualquer animal marinho, pois ela não tem companhia, ela tem a mim.

São poucos que engatam minha raiva, ela costuma vir de mim, do online. Ela vem das minhas consequências em cima de mim. Minha cobrança, meu problema. Mas existe um alguém capaz de atiçar essas águas com uma facilidade incrível, o timbre de sua voz já faz a mais tranquila das águas oscilar.

Uma vez que fui puxada para o centro fundo das águas do sentimento vermelho, caloroso, pulsante, sinto transbordar de mim uma força que não tenho, uma energia que precisa a todo custo ser gasta ou ela vai me desgastar.

Então eu chuto, quebro, parto, arranho, mordo, grito. Faço tudo que uma mocinha não deve fazer, deixo ela vazar, transbordar. Nem que seja um pouco, nem que doa bastante.

O bom da escalda ser quente é que ela evapora com igual facilidade que veio, logo posso respirar, tirar minha camisa e me deitar. O corpo abre espaço para outros sentimentos, as águas recuam e a pequena cidade de paciência recebe outros eventos naturais.

Podem ser dos mais variados convidados. A tristeza com suas caneleiras de toneladas de fracasso, que adora mergulhar no poço das lamentações, gosta de medir o quão fundo chega para fazer transbordar pelos olhos. Pode ser o cansaço mesmo que já está sempre ali, beirando o chão, o tapete, a cama. Ele nunca tirou o pijama, parece sempre tão confortável.

Gosto do pulso de produção, ele sempre vem de braços juntos da criatividade em seu vestido verde, rosa e azul. Ambos ornamentados, exóticos, lindos. Eles gostam de transbordar pelas mãos, dançam das mais diferentes formas. Às vezes em lápis e papel, às vezes por teclado de computador, de celular, às vezes em cantaroladas e até mesmo em pulinhos circulares em volta da mesa da sala.

Antes deles, às vezes vem o ócio. Todo engomado, gravata borboleta e um blazer que ninguém tem coragem de dizer que está velho demais.

Seja lá o que venha, a ilha volta a funcionar. Eles harmonizam e seguem por mim, se manifestando das mais diferentes formas pelos mais diferentes estímulos.

Então ela vem. Eles vêm.

Ele vem falar de mim, de um nós que não quero. Ele vem me cobrar algo que devo. Ele vem me cobrar algo que não devo. Ela vem perder meu tempo. Ele vem perder meu tempo. Eles chamam pela protelação, demandam a distração ou ameaçam me virar as costas. Eu dou-lhes atenção.

O monstro do lago, que vive em seu fundo sente uma brecha de subir e nada. Vira seu enorme corpo para cima, dá uma cambalhota.

Ela vem, ela vem como a onda, ela vem quente, em vapores. Ela grita, esperneia, reclama.

Ela debocha, faz escândalo me humilha. Depois vem perguntar do meu dia. Depois está tudo errado de novo. Meus sentimentos passam a ficar tensos, agora é tudo tênue, tudo sensível. Um botão errado e a terrível onda pode voltar. E todos sabem o que acontece quando essa onda encontrar a dela, todos sabem que o tumulto vai acordar o monstro do lago.

Eu só quero um minuto pra mim, um minuto comigo, um minuto de mim. Preciso segurar as rédeas.

A onda volta, volta devagar, volta na forma de maré. As emoções sobem os arranha-céus para se esconder das águas, se proteger da escalda.

Ela fala do sempre. É sempre tudo errado, é sempre tudo uma merda. Sobrevivo, aguento. Me foco em manter a onda afastada, em não deixar ela transbordar, mas ela já sufoca. Então ela fala do nunca. Nunca faço nada, nunca vou pra frente, nunca vai melhorar.

Concordo e afasto. Seguro as águas que querem vazar pela tristeza. Seguro o impulso da produção em escrever algo ofensivo, a criatividade coça. Seguro os impulsos de energia para não destruir nada, agora tenho que ser mocinha. Submissa, controlada, quieta.

Respiro, o mar recua. Mas as emoções não descem.

Essa onda trouxe o monstro e ele já envolveu a cidade. Sua energia consome a dos demais e por fim a minha. O enorme dragão negro abraça a ilha e sei que não vou sentir mais nada até que ele decida voltar para o fundo de seu oceano.

Mesmo sem água já não consigo respirar direito, ele me sufoca. Quando que vou ter a espada para matar este dragão?

Quando que a raiva vai parar de trazer a depressão?


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Notas finais do capítulo

Expressão pessoal - Não romantizo a doença, apenas quero por para fora marés violentas internas.



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