Azkaban escrita por Phoebe


Capítulo 1
Único


Notas iniciais do capítulo

A música no começo e final da história é Bohemian Rhapsody, do Queen. Muito boa, recomendo.
Espero que gostem!



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Is this the real life?

Is this just fantasy?

Caught in a landslide

No escape from reality.

(Isso é a vida real?

Isso é só fantasia?

Pego num desmoronamento

Sem escapatória da realidade).

 

 

Os fortes raios de sol, provenientes da pequena janela retangular engradada, castigavam seu rosto naquele início de verão e o obrigavam a fechar os olhos. Ele não contestava - não era como se tivesse forças ou motivos para abri-los novamente algum dia. O prisioneiro de segurança máxima (que irônico) estranhou quando ouviu passos ecoarem pelos corredores da prisão. Dementadores não propriamente andavam e ele tinha certeza de que eram os únicos guardas de Azkaban. Os outros prisioneiros há muito haviam parado de andar, já tendo aceitado seus destino e entregue-se à morte. Então, de quem eram os passos que insistiam em se fazer ouvir, incomodando seus ouvidos desacostumados?

 

Sirius teve sua resposta quando viu a calça social com risca de giz e terno da mesma cor. Segurando sua maleta lustrosa e chapéu coco cor-de-limão, o ministro Cornélio Fudge caminhava pelos corredores da prisão, avaliando brevemente cada prisioneiro, desviando o olhar quando era notado. Ele claramente não estava nada contente em estar ali, naquele lugar que beirava ao abandono e morbidez. Sirius se pegou satisfeito ao constatar isso.

 

No entanto, Black viu em Fudge uma chance de ver o mundo lá fora, além de sua gaiola minúscula e solitária. Antes que percebesse, seus pés o haviam levantado e levado-o para perto das grades, por onde o ministro passava naquele momento. O prisioneiro esticou o braço direito por entre as grades, encostando em Cornélio e, consequentemente, o assustando. Fudge puxou o ombro no qual Sirius encostara, como se o tivesse queimado. Seus olhos estavam arregalados de pavor. Black foi obrigado a explicar-se.

 

— Será que você poderia me emprestar um jornal? Há muito não leio qualquer coisa - ele disse. Sua voz estava rouca pela falta de uso. Afinal, qual a necessidade de falar em um lugar onde as criaturas lêem seus pensamentos, memórias e medos?

 

Já recuperado pelo susto, o ministro alisou seu terno riscado com toda a dignidade que pôde reunir. Enfim, ele respondeu, desdém beirando em sua voz:

 

— Nada de jornais para prisioneiros, Black. Faz parte da punição em Azkaban.

 

E assim ele se foi, tendo ainda muitas celas para averiguar naquele dia, o Profeta Diário embaixo do braço, encarando Sirius como se zombasse dele.

 

Sirius Black nunca pôde ler aquele jornal. Ele nunca pôde ver o artigo sobre o prêmio que a família Weasley havia ganho na loteria. Ele nunca viu o rato no ombro de um dos membros da família, o rato que o traíra e o incriminara, mas que acima de tudo, entregara seu melhor amigo e irmão à morte, ao Lord das Trevas.

 

Sirius Black não fugiu de Azkaban naquele verão. Nem nos que se seguiram após aquele.

 

 

[...]

 

 

Hogwarts, 02 de setembro de 1993

 

 

 

Quando o agora quartanista entrou no grande salão onde tomava seu café da manhã, o cheiro de panquecas e bacon invadiu suas narinas, como de praxe, embriagando-o momentaneamente. Com um sorriso saudoso, Harry aproximou-se da ponta mais distante das portas duplas do salão, onde seus amigos estavam sentados. Mesmo de longe ele pôde sentir a tensão que aquele lugar exalava; Hermione estava com sua coluna mais ereta do que deveria ser considerado normal, o queixo erguido com superioridade. Rony estava vermelho até as orelhas, sua pele se misturando com o cabelo ruivo. Ele comia três fatias do bacon ao mesmo tempo e em tal rapidez que Harry desacreditou que aquele era seu melhor amigo por um momento.

 

Com o mesmo cuidado que teria se tivesse uma bomba prestes a explodir ali mesmo se fizesse um movimento em falso, Harry sentou-se ao lado da garota de cabelos revoltos, de frente para Rony. Houve um momento de silêncio, no qual apenas o barulho do ruivo mastigando furiosamente era ouvido. Harry pigarreou.

 

— Então? - Ele alternou seu olhar entre os dois. Nenhum deles deu sinal de que o escutava. - ‘Tá tudo bem por aqui?

 

Hermione foi quem respondeu, não desviando o olhar de suas torradas.

 

— Está tudo ótimo - Ela passava geleia em uma torrada com mais força do que necessário. - Por que não estaria?

 

— Talvez porque houve um assassinato recentemente? - Rony se pronunciou pela primeira vez, por cima de sua torre de bacon.

 

Hermione revirou os olhos, abandonando sua postura indiferente.

 

— Tenha dó, Ronald. Seu rato estúpido deve ter fugido de você! Também, o jeito que você o tratava! - ela disse. - Ele tinha até dedos faltando, Ronald!

 

Rony largou outro pedaço de bacon no meio do caminho para sua boca, ofendido.

 

— Pare de acobertar esse assassino que você chama de gato! E para sua informação, Perebas já havia chegado em casa com um dedo faltando! Eu tratei ele muito bem!

 

— E por qual motivo você acha que ele fugiu, então? - Hermione retrucou.

 

— ELE NÃO FUGIU! - vociferou Rony, agora de pé. Harry viu de relance que alguns olhares da mesa se redirecionavam para eles. - O SEU GATO MATOU ELE!

 

Hermione também se levantou, com mais classe do que o amigo e, embora aparentasse estar calma, Harry sabia que estava prestes a chorar.

 

— Não matou! Bichento nunca faria uma coisa dessas!

 

— CLARO QUE FARIA! - Rony berrou. Na mesa dos professores, McGonagall se levantava. - TANTO QUE ELE TENTOU VÁRIAS VEZES!

 

Os olhos de Hermione estavam cheios de lágrimas quando ela pegou sua mochila pesada e saiu, sem terminar o café da manhã, antes que a professora de Transfiguração chegasse à mesa. Harry assistiu a garota passar feito um raio pelas portas do salão e sumir de vista, enquanto Rony bufava ao seu lado.

 

 

 

[...]

 

 

Hogwarts, um dia antes

 

 

O usual burburinho de conversas paralelas entre os alunos, que colocavam os assuntos de um verão inteiro em dia, soava no grande Salão Principal naquela noite. Estranhamente, nenhum aluno pareceu notar quando Olho-Tonto Moody, novo professor de Defesa Contra as Artes das Trevas, levantou-se da mesa dos professores e saiu do local, sua perna de pau arrastando pelo chão liso.

 

Moody caminhou pelos corredores, mal humorado como sempre, mas desta vez por outros motivos. Bartô Crouch Jr., sob a poção Polissuco, resmungava enquanto sentia um ardor nas costas, típico de alguém na idade de Moody, mas incomum para um jovem como ele.

 

Foi quando ele parou para ajustar a coluna, acabando por estalar ossos que ele nem sabia que existiam, que ele viu.

 

O pelo um tanto menos brilhante, a cor meio desbotada, mas ainda assim, ele sabia quem era aquele rato imundo que corria pelo corredor, tentando parecer um rato comum, não um bruxo disfarçado de um.

 

Mas Bartô reconheceria em qualquer lugar o homem - ou rato - que dera uma informação errada ao seu Lorde, e acabara por levá-lo à derrota.

 

Crouch esticou sua boca em um sorriso que mais parecia uma careta e avançou sobre Peter Pettigrew, sua promessa de vingança há muito feita e agora finalmente sendo cumprida.

 

 

[...]

 

 

Verão de 1994

 

 

Sirius gostava das estrelas. Uma vez ele tivera imensa vergonha de seu nome - Merlin, que tipo de nome é esse? —, mas o tempo dera seu jeito e ele passara a apreciar seu nome e a estrela à qual ele homenageava. De sua minúscula e suja cela de Azkaban, Sirius não conseguia ver muitas estrelas. Aquelas que uma vez tiveram tanto significado para ele eram agora apenas pontos no céu. Para ele, elas nem eram mais tão brilhantes como antes. Pela milésima vez, Black imaginou se era aquele o efeito que os dementadores causavam - eles não apenas roubavam lembranças boas, eles as manchavam com tristeza e solidão.

 

A quilômetros de distância de Azkaban, em um quarto que lembrava muito bem uma prisão, o Menino-que-Sobreviveu também observava aqueles pequenos rasgos ofuscantes no céu.

 

Uma vez Harry lera em algum lugar, provavelmente um livro infantil, que quando as pessoas morriam elas viravam estrelas e tomavam seus lugares no céu. O garoto se perguntou se Cedrico Diggory estaria ali, brilhando tanto quanto seu sorriso uma vez. Ele encarou as estrelas, inutilmente procurando a que ele teria se tornado. As estrelas lhe olharam de volta, tristes, mas nem tão tristes quanto ele.

 

 

[...]

 

 

 

1996

 

 

Os estrondos o acordaram. O habitual frio vindo dos dementadores que insistia em congelar seus ossos até mesmo no verão havia sumido. Azkaban estava um caos. Aqui e ali as paredes da prisão explodiam e ele Sirius pôde ver as figuras mascaradas ao longe por sua janela.

 

Comensais da Morte.

 

O vento abraçou seu rosto quando uma cela ao lado próxima à sua simplesmente explodiu. Distante mas não menos audível, soou a gargalhada desequilibrada de sua prima, Bellatrix Lestrange.

 

Sirius pensou em aproveitar-se da confusão e fugir também. Uma possibilidade de liberdade surgiu em sua mente e seu coração passou a bater mais rápido. Esperança. Algo que ele não se atrevia a ter há muito tempo.

 

Black pôs os pés para fora de sua cela que, por causa das explosões seguidas, tinha suas grades arrancadas. Ele ousou sorrir. Estava livre! Poderia encontrar Harry, lhe dizer a verdade e Remus… ele poderia vê-los, depois de tanto tempo!

A inconsciência o atingiu antes que percebesse a presença deles.

 

Malditos dementadores.

 

 

[...]

 

 

Batalha de Hogwarts, 1998

 

 

Havia chegado o momento. Comensais da Morte vinham de todos os lugares, centenas de homens sorrindo maldosos para os alunos e professores. Remus estava memorizando cada feitiço ofensivo e defensivo que conhecia e analisava a posições dos seguidores de Voldemort, mentalizando estratégias. Lupin poderia estar preparado para tudo, menos para aquilo.

 

No seu campo de visão, sua esposa aparecia, os cabelos que normalmente eram cor-de-rosa agora escurecidos, correndo em sua direção, sorrindo. Ela jogou seus braços em volta do lobisomem e o apertou contra seu peito com força.

 

— Nymphadora, o que você está fazendo aqui? - ele perguntou, olhando sério para ela. - Você não deveria estar cuidando de Teddy?

 

— Teddy está com minha mãe, você precisa de mim agora - ela o olhou com ternura.

 

Um sorriso entristecido preencheu o rosto de Lupin. Os comensais estavam cada vez mais próximos. Tonks esticou sua mão, tentando alcançar a do marido, e ele fez o mesmo. Ambos trocaram um olhar cheio de significados antes de começarem a lutar.

 

 

[...]

 

 

Junho de 1995, dia da terceira tarefa do Torneio Tribruxo

 

 

Os mais fiéis Comensais de Voldemort estavam todos reunidos em um círculo em volta de seu Lord e, ao seu lado, Lucius Malfoy, segurando o braço direito que sangrava copiosamente após ter sua mão decepada para a ressurreição de seu Mestre. Esta era uma tarefa dada ao fiel servo de Voldemort, que deveria ser Peter Pettigrew. Mas ora, que bobagem, ele estava morto há uma década - morto por Sirius Black.

 

O que Malfoy não sabia era que provavelmente teria sua mão poupada se, meses antes, Bartolomeu Crouch Jr. não tivesse matado um rato.

 

Lord Voldemort não demorou em conjurar uma mão metálica para Lucius.

 

 

[...]

 

 

Batalha de Hogwarts, 1998

 

 

Os movimentos de Remus eram rápidos enquanto ele duelava com Bellatrix Lestrange. A bruxa tinha um sorriso louco na face que era visto com o olhar de fúria do lobisomem. Ela lutava com elegância e ele, em compensação, lutava com toda a sua selvageria.

 

Logo Nymphadora apareceu ao seu socorro. Ambos lutavam contra a seguidora de Voldemort agora, o que nem de longe pareceria uma luta justa se a bruxa não fosse tão boa em duelar. Mas logo ela começou a cansar e seu sorriso, diminuir. Seus dois adversários não pararam - continuaram a lançar feitiços, fazendo-a recuar. Logo ela estaria encurralada na parede de pedra.

 

No entanto, o sorriso da bruxa voltou a habitar sua face quando ela olhou para algum ponto atrás deles. Tonks parou para virar-se, mas Remus continuou a lutar com Bellatrix - ele tampouco precisou. A voz de Lucius se fez presente, aveludada e lotada de desdém.

 

— Ora, mas o que é isso? Um reencontro familiar?

 

Bellatrix foi para o lado de Malfoy, nunca parando de lançar maldições, fazendo agora Tonks e Lupin estarem encurralados contra a parede. Os Comensais não tinham um intervalo muito longo entre uma maldição ou outra, e estavam quase derrotando o casal.

 

Mas algo deu errado. Lucius parou subitamente de duelar e, para a surpresa de todos, caiu de joelhos no chão empoeirado. Remus demorou a perceber que ele estava sendo enforcado por ele mesmo. Seus dedos de metal apertavam sua garganta fortemente, roubando-lhe o ar. Isso pareceu chocar Bellatrix também. Ela se permitiu um momento de distração para encarar o cunhado, surpresa. Isso foi suficiente para Tonks desarmá-la e lançar a maldição que Bellatrix tanto dissera, e agora ouvia pela última vez.

 

 

[...]

 

 

1999

 

 

Sirius poderia muito bem estar pagando para assistir aquilo.

 

Os Comensais avançavam pelos corredores da ala de segurança máxima, a sua ala, passando por sua cela em fila indiana, as mãos atadas e lhe dando uma visão privilegiada do que deveria ser o paraíso.

 

Ele viu Greyback, Avery, Nott e até mesmo Lucius Malfoy, que não tinha algemas e sim cordas em volta de seu corpo, já que aparentemente não tinha uma das mãos. Isso o fez querer rir mais ainda.

 

Mais surpreendente para Sirius do que aquilo foi quando o novo Ministro da Magia anunciou o fim dos dementadores em Azkaban. Logo, onde havia as criaturas temíveis por tanto tempo, estavam sentados em cadeiras conjuradas guardas humanos, entediados por passarem o dia inteiro na prisão.

 

A ausência dos dementadores pela primeira vez em muito tempo trazia a Sirius um novo sentimento, aquele mesmo que se apossara dele tantas vezes quando escapava de uma bronca de Profa. McGonagall ou corria antes de Filch pegá-lo - alívio.

 

Enfim, Sirius podia lembrar-se de tudo sem medo de ter aquilo sugado de si.

 

Será que ele havia morrido e não percebera?

 

 

[...]

 

 

Agosto de 2009

 

 

A diretora Minerva McGonagall decidira que o recesso escolar era um bom momento para se fazer uma faxina total no castelo. Filch não aprovava muito isso, mas não havia muito que o velho faxineiro de Hogwarts pudesse dizer para mudar a opinião da diretora. Então ali estava ele, de frente para a antiga sala de Alastor Moody - que na verdade não era Alastor Moody -, na qual ninguém entrava havia muitos anos. Quando o faxineiro abriu a porta da sala, ele teve certeza de que alguém havia morrido ali, honestamente.

 

Agora ele entendia porque Minerva queria fazer uma faxina.

 

Ele começou a tirar o pó primeiro. Ele estava em todo lugar - nas prateleiras, nos móveis, nos livros e, principalmente no chão. Para piorar, teias de aranha “enfeitavam” cada canto daquela sala. Filch temeu encontrar um bicho-papão no meio de toda aquela sujeira, mas ele não encontrou. Enfim, ele viu com satisfação que a sala brilhava como nova. Agora só faltava os aposentos do antigo professor de Defesa Contra as Artes das Trevas e aquele canto do castelo estaria limpo.

 

Porém, quando Filch abriu a porta do quarto, que ficava em um canto da sala, o cheiro que o saudara antes estava pior. O velho mal podia respirar e seus olhos ardiam, tal era o fedor. Arrastando seu esfregão consigo, ele foi em direção ao pequeno armário do quarto, de onde o cheiro parecia vir. Quando abriu a porta, com um ruído alto, várias aranhas, grandes e pequenas, saíram dele. Mas não foi isso que o surpreendeu.

 

O que o surpreendeu foi o corpo.

 

 

[...]

 

 

Hospital St. Mungus, 17 de setembro de 2009

 

 

Ela só poderia ter enlouquecido.

 

— Você tem certeza absoluta disso? - o doutor Stone perguntou, olhando para a enfermeira à sua frente com ceticismo. Ela assentiu.

 

— Sim, doutor - ela disse. - Este é o corpo de Peter Pettigrew.

 

O medibruxo colocou uma das mãos no queixo e olhou para os restos do que um dia fora Peter Pettigrew, pensativo. Um dos maiores mistérios do mundo bruxo era como Sirius Black havia carbonizado um corpo inteiro - com exceção de um dedo - com apenas uma maldição imperdoável. Mas ali estava o corpo - ou pelo menos o que sobrara dele -, bem na sua frente.

 

— Bem, não é como se não soubéssemos que o Sr. Pettigrew está morto, Srta. Hale - ele disse.

 

Ela pareceu tomar fôlego antes de dizer:

 

— Eu sei, doutor, mas… - ela mordeu o lábio inferior. - Fiz alguns testes com ele e descobri que o Sr. Pettigrew foi morto a facadas, lenta e dolorosamente, e não da forma que está escrito e seu atestado de óbito, que foi por uma maldição da morte.

 

— Isso é interessante - doutor Stone concordou. A enfermeira sorriu com a aprovação do medibruxo.

 

— E não é só isso - ela disse. - Estranhei o fato do corpo dele ter sido encontrado em Hogwarts, digo, quem o teria levado até lá? Então fiz mais uns testes e descobri que foi ele mesmo.

 

O curandeiro tirou os olhos do cadáver e olhou para sua enfermeira como se tivesse nascido uma outra cabeça nela.

 

— Como é?

 

— Isso mesmo - ela disse, assumindo um semblante sério. - Peter Pettigrew morreu, segundo minhas contas, entre 1994 e 1995 e exatamente onde seu corpo foi encontrado. E isso nos leva a outra pergunta, doutor.

 

Ela olhou para o cadáver e depois para Stone.

 

— O que Sirius Black está fazendo em Azkaban?

 

 

[...]

 

 

Ministério da Magia, 28 de outubro de 2009

 

 

— Você jura falar a verdade e apenas a verdade em nome de Merlin? - um dos aurores lhe perguntou, cravando seus olhos castanhos nele. Sirius deu um meio sorriso.

 

— Não é como se eu pudesse mentir sob, o quê?, três doses de Veritaserum?

 

Mas o auror continuava a lhe encarar, esperando por uma resposta. Black suspirou. Ele era o recém-saído de Azkaban, não eles, então por que estava todo mundo mal humorado?

 

— Eu juro - ele respondeu com um tanto de relutância.

 

O julgamento passou para ele como um borrão. Repetiu várias vezes seu plano de trocar o fiel do segredo dos Potter, a armadilha de Pettigrew e como ele se escondera sob a forma de um rato. Após dizer isso, ele ainda teve que contar por que Peter era um animago ilegal, tendo também que confessar que ele era um, assim como ele. Ele estava exausto, por que aquilo nunca acabava? Merlin pareceu ouvi-lo, porque Shacklebolt finalmente pediu a opinião do júri.

 

Então, milagrosamente, a maioria das mãos levantou em favor de sua liberdade.

 

Merlin, ele era um maldito sortudo.

 

 

 

[...]

 

 

Godric’s Hollow, 31 de outubro de 2009

 

 

Fazia vinte e oito anos agora. Vinte e oito anos que o mundo perdera as brincadeiras muitas vezes de mau gosto, a obsessão por quadribol e o sorriso fácil de James Potter. Vinte e oito anos que o mundo perdera a dedicação, a gentileza e o jeito cativante de Lily Potter.

 

Vinte e oito anos que Sirius Black não via seus melhores amigos. Vinte e oito anos inteiros privado de felicidade, afundado na culpa e sentimento de traição.

 

Sirius agora “celebrava” esses vinte e oito anos no cemitério de Godric’s Hollow. Se James soubesse que algum dia teria uma estátua em sua homenagem ao lado de Lily e seu filho, seu ego atingiria níveis extremos. James realmente merecia uma estátua em seu nome, seu rosto entalhado no mármore - mas não por aqueles motivos. James Potter não merecia a morte.

 

Com cuidado, Sirius depositou um lenço velho e remendado da Grifinória sobre a lápide fria do amigo, ao lado de um lírio que escolhera para Lily. Então ele disse, sua voz não saindo mais alta que um sussurro:

 

— Malfeito feito.

 

 

[...]

 

 

Sirius não saberia dizer quanto tempo havia ficado ali. Horas, talvez. O vento frio não o incomodava - não mais do que o frio que sentia dentro de si. Ele finalmente tivera sua vingança, Peter estava morto, ele estava livre! Mas por que então ele se sentia tão vazio?

 

— Imaginei que lhe encontraria aqui - Sirius ouviu a voz grossa e calma que há muito não ouvia. Ele virou-se e encontrou-o. O último Maroto, exceto por ele. Remus Lupin, com suas vestes eternamente desgastadas e suas cicatrizes quase completamente sumidas, o observava atentamente.

 

— Você sempre foi inteligente demais para o bem de qualquer um, Moony - ele zombou, mas sua voz tremeu um pouco.

 

Remus deu de ombros como quem diz “o que posso fazer?” e se aproximou dele. Houve um momento de silêncio antes de Lupin suspirar.

 

— Me perdoe, Sirius - ele disse, com sinceridade. - Foi minha culpa. Eu deveria ter procurado saber mais, se eu tivesse ao menos…

 

— Você ainda tem - Sirius interrompeu o discurso do amigo, fingindo um tom incrédulo.

 

Moony franziu as sobrancelhas.

 

— Tenho o quê?

 

— Essa mania de se culpar por coisas que você não tem controle - Sirius disse, e Remus soube que ele estava falando de outra coisa. O lobisomem sorriu.

 

— Vamos, está frio - ele disse.

 

— Eu não tenho para onde ir - Padfoot explicou ao amigo.

 

— Não seja bobo, vamos para casa. Teddy vai adorar te conhecer.

 

Sirius não sabia quem era Teddy, mas aquele pareceu-lhe um bom convite.

 

 

[...]

 

 

Casa dos Lupin

 

 

Sirius não se surpreendeu ao ver o pequeno chalé no qual ele e Lupin aparataram. Ele era simples e aconchegante ao mesmo tempo - aquilo era simplesmente a cara de Remus. Porém, quando o lobisomem abriu a porta do lugar, ele pôde ver um objeto ou outro de cores vibrantes que simplesmente não combinavam com o estilo de Remus. Havia um conjunto de pratos rosa-choque, um vaso laranja fluorescente, uma cabeça azul brilhante…

 

Espere, uma cabeça?

 

Antes que Sirius pudesse assimilar aquilo, a cabeça - que na verdade era um garotinho - correu até eles e pulou no colo de Remus, uma confusão de fios azuis tampando o rosto do homem.

 

— Pai, pai! Diretora McGonagall deixou eu passar o Halloween em casa! Isso não é o máximo?!

 

— Incrível, Teddy - Remus respondeu, sorrindo para o menino hiperativo e o tirando de seu colo. - Por que você não diz oi ao amigo do papai, hã?

 

O garotinho virou-se para Sirius, que por sua vez olhava espantado para Remus. Ele era pai? O que mais ele havia perdido? Seus pensamentos foram interrompidos pelo menino, que tinha a mão esticada.

 

— Oi, meu nome é Teddy! - ele disse. - Qual é o seu nome?

 

Sirius pigarreou e se abaixou para ficar na altura dele.

 

— Meu nome é Sirius. Alguém já lhe disse que esse seu cabelo é muito maneiro?

 

Teddy corou.

 

— Só uma vez - ele disse, constrangido. Remus levantou as sobrancelhas.

 

— Ah, é? - Sirius perguntou. - E quem disse isso?

 

Teddy corou ainda mais.

 

— V-victoire.

 

O sorriso de Sirius aumentou.

 

— Ah, claro, uma garota - ele piscou para o menino e levantou-se. Naquele momento, um estrondo foi ouvido da porta dos fundos e uma voz feminina.

 

— Maldito baú!

 

A dona da voz veio até eles, pulando em um pé só. Quando notou a presença de Moony, se apressou em ir beijá-lo. Sirius notou que os cabelos dela eram púrpura e os olhos, da mesma cor. Um pouco constrangido, Remus a afastou gentilmente.

 

— Dora, nós temos visitas! - ele a repreendeu com carinho. Dora dirigiu seu olhar a Sirius e arregalou um pouco os olhos. Obviamente, ela tentou disfarçar, mas não era muito boa nisso. Sirius sorriu com isso.

 

— Bem a tempo para o jantar, não é mesmo? - ela sorriu.

 

— Oh não, mãe, você tentou cozinhar de novo? - Teddy choramingou, mas sorriu.

 

— Ei! A minha comida é muito boa, mocinho! - ela disse. - Não é nada como a de Molly Weasley, eu sei, mas melhor do que a de sua tia Hermione, lhe garanto!

 

Teddy gargalhou.

 

— Anda, vai se arrumar - Dora despachou o filho para seu quarto. - Você também, senhor Lupin, tire esses trapos, teremos visitas.

 

Remus arqueou uma sobrancelha.

 

— Que visitas? - perguntou.

 

— Os Potter, é claro!

 

 

[...]

 

 

Todos já estavam na mesa quando a campainha tocou. Teddy, que usava uma camiseta de algum super herói trouxa, que ele considerava sua melhor roupa, alisou os cabelos um pouco. Sirius, de frente para ele, olhou para a porta. Dora levantou-se para atender, mas acabou tropeçando em sua cadeira. Remus ajudou-a a se levantar e abriu a porta.

 

Sirius segurou sua respiração. Harry agora seria mais velho do que James quando morrera. Harry, o bebê que facilmente caberia em sua mão, o bebê que amava puxar seus cabelos e voar em sua vassoura de brincadeira.

 

Harry. Um adulto.

 

Mas, contrariando todas as suas expectativas, não foi Harry quem entrou. Em seu lugar, uma moça ruiva e com vestes simples entrou. Atrás dela, dois garotinhos vinham segurando sua saia e, em seu colo, descansava uma garotinha que não deveria ter mais de um ano.

 

— Ginny! - exclamou Tonks indo abraçar a mulher e seus filhos. Ela apertou as bochechas grandes do mais novo e bagunçou os cabelos revoltos do mais velho. Quando ela os largou para pegar a bebêzinha, os dois irmãos correram para o lado de Teddy, não sem cumprimentar Remus antes. - Onde está o Harry?

 

Sirius esperou por sua resposta também. Ginny suspirou.

 

— Trabalhando. Ele disse que vai se atrasar um pouco para o jantar, mas eu sugiro que já comecemos sem ele.

 

Dora assentiu, sorrindo confortante. Enfim ela pareceu lembrar-se de Sirius.

 

— Merlin, que falta de educação a minha! - dava para ver que ela tentava ser o mais polida possível. - Ginny, este é um amigo de Remus, Sirius Black. Sirius, essa é Ginny Potter.

 

Ginny sorriu para ele. Ela tinha um sorriso muito bonito, que lhe lembrava muito o sorriso de Lily. Seu cabelo ruivo e brilhante só aumentava as semelhanças.

 

— É um prazer conhecê-lo, senhor Black - ela disse, educadamente. Sirius deu um meio-sorriso.

 

— Oh, por favor, assim eu me sinto velho - ele brincou. - Pode me chamar apenas de Sirius.

 

Ginny concordou, não perdendo seu sorriso. E assim o jantar passou, com Nymphadora entretendo as crianças mudando suas expressões faciais, Remus e Ginny conversando sobre política e o garotinho mais novo de Ginny - que Sirius veio a descobrir que se chamava James, para sua surpresa - jogando ervilhas nas pessoas - e sendo devidamente repreendido por sua mãe.

 

Bem como Ginny dissera, Harry não aparecera durante o jantar. Os meninos haviam ido para o quarto de Teddy fazer “coisas de garotos” - como eles mesmo disseram - e agora os adultos conversavam na sala de estar. A bebêzinha que viera no colo de Ginny, Lily, dormia em um berço conjurado por sua mãe ao lado do sofá. Sirius estava em uma conversa com Tonks sobre quão horríveis podiam ser as tradições da família Black quando a campainha tocou.

 

Remus levantou-se e rapidamente foi atender a porta. Sirius pôde ouvir vozes vindo de lá, mas não ousou se levantar, mesmo tão ansioso como estava. Ele sabia quem era. Só podia ser uma pessoa. Só faltava uma pessoa naquele dia.

 

E ele veio. E se parecia tanto com James que Sirius não poderia distinguir os dois de longe. De perto, no entanto era mais fácil. Os olhos lhe davam uma boa dica. Remus, tão polido como sempre, os apresentou. Sirius sorriu nervoso quando Harry sorriu para ele. E o sorriso de Harry não era aquele meio-sorriso conquistador e galinha que seu pai uma vez ostentara. Não, o sorriso de Harry era um sorriso doce, acolhedor.

 

O sorriso de Lily.

 

— Ah, então você é o famoso Sirius Black - ele disse, nunca deixando seu sorriso. - Os jornais têm falado muito de você.

 

— Oh, eles têm? Então é por isso que todo mundo estava olhando pra mim! - Sirius brincou.

 

Harry riu.

 

— Sei bem como é isso. Bem, é um prazer finalmente conhecê-lo - ele estendeu a mão. Sirius a recusou e o puxou para um abraço de urso, o mesmo abraço que dera tantas vezes nele quando ele era apenas um bebê.

 

— Você nem imagina - ele disse entre o abraço.

 

 

Anyway the wind blows…

(Não importa para onde o vento sopre…)

 


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Notas finais do capítulo

Espero que tenham gostado! Aceito comentários de vez em quando haha!!!