Rise escrita por Lua Chan


Capítulo 9
E ela se foi...




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O ar estava denso, o céu coberto de nuvens macias e negras, ameaçando chover. Eu amava a chuva. Ela me dava criatividade quando só o que eu tinha era uma massa encefálica murcha e sem ideias. Agradeci pelo clima estar ao meu favor. Agora precisaria de muita coragem para encarar Trevor.

Fui para a viela pela qual sempre passávamos quando íamos para casa. O garoto fazia o mesmo percurso todos os dias. Trouxe Eleonor comigo, hesitando em soltá-la a qualquer momento.

—O que veio fazer aqui, Aberração? -A voz de Trevor veio como uma surpresa. Estaria ele me esperando? -Tentando fugir de mim?

Olhei para ambos os lados, procurando por seus amigos. Dessa vez, éramos apenas nós dois.

Dois espíritos livres, cheios de energia, com diferentes intenções. Éramos preto e branco. Paz e guerra.

—O que você está fazendo perto dele, amor? -O valentão se direcionou a Eleonor e ela sem se encolher na frente dele como de costume acontecia -Será que não deixei claro o suficiente o que acontece se você ousar olhar pra ele? -Trevor apontou para sua própria bochecha, emitindo uma gargalhada doentia.

—Se encostar na El de novo, você será um homem morto, Wartch. -Uma voz maior do que eu nasceu dentro de mim. Nunca matei ninguém e nunca desejaria matar. Mas por que com Trevor as coisas soavam diferentes?

—Você não teria coragem, O'Connor. -Disse, pela primeira vez acertando meu sobrenome -Você é imprestável, sequer serve para viver. -Ele chegou perto, com o olhar colado em Eleonor -É tão irritante quanto aquele seu cachorro idiota. Foi um prazer envenená-lo.

Minha cabeça estava queimando em fúria, minhas mãos cerradas e prontas para acertá-lo.

—Quer tentar a sorte, garanhão? -Parecia que ele lia minha mente. Era o que eu sonhava fazer desde a primeira vez que o vi. Desde o primeiro insulto levantado -Tudo bem, por mim. Só vamos torcer para que tudo acabe como na última vez que nos enfrentamos, sim? -Debochou, cuspindo algo para o outro lado.

—Ah, acredite. Eu vou torcer algo hoje. -Falei, puxando as mangas da minha longa camisa -E vai ser a sua cara!

E como se estivéssemos naquela fria tarde de 1907, começamos com a briga. Socos voavam pra lá e pra cá, às vezes eu mal sabia de quem pertenciam. Trevor me derrubou com um golpe em meu tornozelo -não consegui andar direito depois disso.

—Enoch! -Aquele grito. Aquela voz. Aquilo tudo estava se repetindo como num looping infinito. Felizmente, já sabia o que iria suceder, mas não deixaria o garoto me acertar.

Acertei um golpe na sua nuca, fazendo-o cair de cara para o chão. Ele estava vulnerável, engatinhando como um bebê e limpando o sangue que escorria intensamente pelo nariz.

Eleonor correu para minha direção, se jogando aos meus braços que agora se assemelhavam a dois colchões infláveis. Ela roçou seus dedos em meus lábios, como quem quisesse limpar uma ferida.

—Acabou pra você, Enoch! -Trevor correu na minha direção como um atacante de um jogo de futebol. Joguei, literalmente, Eleonor para o lado, preocupado na possibilidade dele chocar-se contra ela. O menino de cabelos loiros conseguiu me imobilizar assim como na primeira vez. Seus olhos, negros como os meus, brilhavam de raiva. Vários socos e tapas foram lançados contra mim.

Meu corpo quase inerte ficou no chão, tentando se recuperar. Ainda estava consciente, mas isso não me ajudou em nada. Trevor foi na direção de El e a agarrou pelo braço, obrigando-a a levantar do fétido solo. Fiquei assistindo fracamente, enquanto ele pescava algo em seu bolso.

—Já chega! -Gritou com Eleonor debatendo na sua frente, tentando se soltar dele -Se eu não posso tê-la, nenhum de nós a terá!

Não!—Gritei, mesmo tendo a fraqueza como companheira.

E então aconteceu de novo, só que dessa vez, com ela. Trevor segurava arduamente uma faca -a faca que usara contra mim, ano passado. Só que dessa vez, eu não era seu alvo.

Dessa vez, a vítima era Eleonor.

Trevor enterrou o objeto metálico por suas costas, Eleonor deixando um grito escapar de seus trêmulos lábios. Meu coração fora rasgado e quase pude sentir sua dor.

O garoto fugiu, desesperado em ser pego pela polícia. A faca ficou perto de Eleonor. Corri mais desesperado ainda para onde seu corpo jazia, flácido.

—El! Por favor, acorde! -Chacoalhei seus ombros, seus olhos ainda abertos numa estranha posição.

Ela estava morta.

Minha respiração começou a ficar pesada, não podia ter um ataque de pânico naquela hora. Chorei feito uma criança que acabara de se machucar gravemente. Mas então lembrei.

Lembrei do meu estoque de corações, da minha estranheza, do que me fazia ser diferente dos outros. Eu podia gerar vida.

Puxei Eleonor para um lugar mais escuro, retirando seus úmidos cabelos do rosto -já estava chuviscando. Peguei a faca que Trevor usara para matá-la e estremeci, pensando no que estava prestes a fazer.

Engolindo uma vasta corrente de ar, comecei a operação. Fiz uma breve incisão em seu tórax, expondo alguns de seus órgãos internos. Fiquei meio enojado, mas se tudo desse certo, teria uma chance de trazê-la de volta para mim e sermos felizes juntos.

Toquei em seu coração -literalmente- sentindo uma bolota viscosa e rubra. Pressionei o órgão em minhas mãos, concentrando nos meus próprios batimentos -normalmente, era o que fazia.

De repente, fortes pulsos foram transmitidos de mim para El. Seu corpo se remecheu um pouco e ela acordou.

—E-En? -Pediu, fracamente. Não respirava direito -O que está... acontecendo? -Limpei uma singela lágrima que brotara no olho esquerdo.

—Você está bem, El. -Falei, soluçando. Beijei suas mãos gélidas e suaves como algodão -Está comigo agora. -Arrumei seus cabelos.

—Mas eu... mas eu não entendo, En. -Disse, chorando, sua cabeça deitada no meu colo -Eu não deveria estar morta? Por que isso dói tanto?

—Eu sou diferente, Eleonor. Nunca tive coragem pra te falar isso. Tenho essa habilidade estranha que me permite trazer os mortos a vida! -Exclamei, ainda preocupado com seu estado. Ela estava cada vez mais pálida.

—V-você me trouxe... de volta? -Pediu -Por que gostaria de conversar com um cadáver? -Ela mostrou um sorriso triste. Repeti a ação.

Fiquei ali, olhando para seus olhos como se fossem meu único refúgio.

—Enoch? Posso te pedir algo? -Perguntou, tentando erguer sua cabeça.

—Qualquer coisa. -Ela pegou minha mão e a encarou como se fosse uma coisa anormal.

Me deixe ir.

Aquelas três palavras foram o suficiente para me quebrar. Sabia o que estava falando, mas a vontade de atender ao seu pedido era a mínima. Mas seria tão egoísta da minha parte.

—M-mas... e os nossos planos de ficarmos juntos? -Questionei, lembrando que quando éramos crianças, eu a pedi em casamento -E a nossa vida? E se isso doer para sempre em mim?

—Enoch... -Ela chamou, eu a ignorei.

—E se eu não conseguir viver sem você, Eleonor? E se-

—Por favor, escute. -Parei, decidindo escutar suas próximas palavras -Me prometa... uma coisa, sim?

—Qualquer coisa.

—Vai me amar, mesmo não estando perto de você. -Disse, pondo uma mão no meu peito -Vai seguir sua vida e encontrar um outro alguém que te faça tão feliz quanto eu fui com você.

—Não... mas eu-

—Enoch... -Falou, trêmula -Me abrace, por favor. Quero morrer nos braços do meu primeiro amor.

Fiz o que pediu, hesitando no início. Envolvi meus braços em suas costas e fui abraçado não só por ela, como pela chuva.

—E-eu te amo. -Sussurrei, esperando nunca mais ouvir uma resposta, mas para minha surpresa, tive.

—Eu te amo... En.

Exclamei um grito de dor, deve ter chamado a atenção de algumas pessoas, pois quando olhei para trás, vi quatro policiais com pistolas carregadas e apontadas para mim.


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Notas finais do capítulo

"Quero morrer nos braços do meu primeiro amor" Se vc pensou em Teen wolf, então sim. Vc acertou a referência, meu pobre ser humano. ;(
[Spoiler, só que nem tanto]



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