Rise escrita por Lua Chan


Capítulo 10
Srta. Jay




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                          gr. cl.

                N e k r ó s: Morte

        M a n t e í a: Adivinhação


     Após aquele mórbido momento, os policiais me pegaram. Faz cinco dias desde que eu fui preso. Motivo? De acordo com os tiras, eu esfaqueei uma jovem moça e planejava esquartejá-la, mas fui parado.

A grande ironia é que eu nunca matei ninguém e nunca faria isso. Especialmente com Eleonor Jones. Tentei me explicar, dizer que foi um mal entendido e que o verdadeiro assassino fugira, mas não havia como. Todas as evidências apontavam para mim. Era eu quem estava na cena do crime.

Eu estava perto da vítima, segurando uma faca com as mãos lambuzadas de sangue.

—Detento? -Um dos guardas me chamou. Estava sozinho num cárcere, achavam que eu tinha problemas mentais e que poderia tentar estrangular outros presos -Hora do jantar.

Olhei para a janela, esperando encontrar a figura de um pássaro azul de cabeça negra. Uma pequena gralha passou a me visitar no período em que eu estava na prisão. Era como se me vigiasse atentamente.

Segui em direção ao refeitório. Muitos detentos me encararam enquanto eu entrava no salão arejado. Me olhavam com desgosto, um deles até passou o dedo indicador pelo pescoço, como quem dissesse "venha aqui e eu corto sua cabeça".

Quase ninguém sabia, mas minhas noites eram reservadas para chorar. Meu coração ardia em desespero, só de lembrar que perdi Eleonor para sempre. Mas eu achava aquilo bom. Eu queria chorar, até me esquecer de tudo, até retirar toda a dor que ainda restava, mas seria uma tarefa difícil. Fui fechando o meu coração para o mundo, para as pessoas. Para tudo.

Depois de ter comido, fui direto para minha cela, sem olhar nos olhos de ninguém -tinha medo de fazê-lo e criar mais confusões.

Cheguei no quarto e espiei a janela. O pássaro estava lá.

—O que foi, amigo? -Perguntei, me sentindo idiota por conversar com um animal -Não estou bem, será que poderia me deixar em paz por um instante?

A ave, como se quisesse me irritar, voou para a palma da minha mão. Não resisti e alisei o cume de sua cabecinha. Assobiei para ela, a gralha repetiu o barulho e voou pela noite fria.

Acordei debilitado, cobrindo meu rosto do feixe de luz que atravessava as grades da janela. Fui surpreendido por um dos vigias.

—Hora de acordar, O'Connor. -Disse, segurando um molho de chaves e encaixando uma delas na fechadura da cela -Você está saindo daqui hoje.

—Como assim? -Pedi, erguendo-me da cama.

—É... tem uma senhora na secretaria que se dispôs em te ajudar. -Senhora? Minha mãe ou tia May? Como elas saberiam sobre o incidente?

—Qual é o nome dela? -Fiquei mais interessado, claro, por que não estaria? Alguém acabou de comprar minha liberdade.

—Uma tal de Pearl Jayne. -Tentei reconhecer esse nome, mas falhei. Não fiz mais perguntas a respeito, apenas fui para o encontro com a moça.

Cheguei na sala da secrataria da prisão e lá estava ela. Uma mulher de cabelos negros com umas mechas mais claras se aconchegava em um sofá. Ela era simples -se comportava num vestido azul vivo e usava um par de óculos redondos que descansavam sobre seu nariz pontudo e levemente empinado.

—Vou deixar os dois a sós, mas concedemos, no máximo, 10 minutos. -O tira se dirigiu à mulher -Aproveitem e me chame, caso precise. -Na última parte, olhou ferozmente para mim. Olhei para o chão em resposta, o rosto totalmente comprimido. Ficamos só nós dois no cômodo.

—Olá, sr. O'Connor. -Ela começou, mostrando um sorriso que tinha dúvidas se poderia confiar. Seu sotaque era forte e definido -Receio que não me conheça. Sou Pearl von Jayne. Prazer em conhecê-lo. -Ela estendeu a mão para eu cumprimentá-la, mas não o fiz. De maneira constrangedora, recuou e tossiu nervosamente -Sinto muito pelo que aconteceu à sua amiga. Sei que não foi o responsável por sua morte.

—Espere, como sabe? Nunca a vi pelos arredores de Londres. Por que a senhora, se me permite falar, gostaria de me tirar de um lugar como esse?

"Pearl" se virou para a mesa e preparou para si uma xícara quente de chá.

—Quer um pouco? -Perguntou, delicadamente. Remexi o nariz, desconfortado -Eu assisto você há muito tempo, Enoch. -Tremi quando pronunciou meu nome -Você está na minha lista de procurados, querido.

Encarei a mulher com medo. Por onde começaria?

—Q-que tipo de lista? -Hesitei, me afastando dela. Pearl ergueu os olhos friamente, ajeitando os óculos que ameaçavam cair.

—Uma lista de peculiares, sr. O'Connor. -Antes de perguntar o que "peculiar" significava, ela adiantou -Pessoas com dons magníficos. Os diferentes, como você.

—Está começando a me assustar. -Disse, mantendo a postura. Ela se aproximou, como se percebesse minha jogada.

—Você é um necromante, filho. Do grego antigo, "aquele que fala com os mortos". Sei que tentou reanimar sua amiga, mas não pôde porque aquilo era além dos seus limites. -Um nó foi formado na minha garganta, não estava mais disposto a falar com ela.

—Eu acho que já me humilhou o suficiente, srta. Jayne. -Falei, indo em direção à porta e chateado -Passar bem.

Antes que eu pudesse girar a maçaneta, ela me fez uma revelação, fazendo-me parar.

—Sou peculiar também, sr. O'Connor e tenho como provar isso. -Disse. Permaneci instático -Quer ver o que posso fazer?

Assenti, encantado. A mulher fechou as cortinas e trancou a porta. Pearl se afastou de mim e cerrou os olhos. Em questão de pouquíssimos segundos, assisti seus braços serem substituídos por um par de asas e seu tamanho diminuir gradativamente. Suas roupas caíram no chão e quando menos esperei, havia um pássaro na minha frente. Mas não era qualquer um.

Era uma gralha azul.

Abri minha boca num "o" e a observei atenciosamente bordar o ar com piruetas e giros. Até que enfim o pássaro, já se transformando em mulher, voou para trás de uma enorme poltrona e se escondeu. Já imaginava o por quê.

—Essa é minha peculiaridade, querido. O que me faz diferente dos outros. -Respondeu, ainda atrás da cadeira -Uhm... será que poderia jogar minhas roupas? Quando me transformo em um pássaro, eu não as mantenho no corpo.

Fiz o que pediu, virando-me de costas até que estivesse pronta.

—Sou uma Ymbryne, um ser capaz de se transformar em pássaro. Além dessa habilidade, posso controlar o tempo, formando fendas temporais. -Espantei-me, lembrando de ter lido algo semelhante em um dos livros de ficção científica do meu pai -Mas não sou a única.

Ela se preocupou em me explicar tudo. Disse que fendas são espécies de espaços de tempo controladas pelas Ymbrynes que se repetem num só dia, por isso, nenhum dos "peculiares" ou syndrigasts envelheciam. Existiam várias delas e a dela era localizada em 8 de abril de 1917, na época de uma guerra.

No futuro.

—Confesso, Enoch, não vim aqui apenas para lhe retirar da prisão. Gostaria de convidar a vir comigo para minha fenda. Tem muitas crianças iguais a você, especiais. -Falou, os olhos enchedo de emoção -Queria que pudesse conhecê-las e não se sentir sozinho. Mas para isso, teria que abandonar sua vida aqui.

Fiquei pensando, olhando para meus sapatos, enquanto isso. Mudar minha vida representaria me afastar dos meus pais, da minha tia, da escola... foi doloroso pensar nos rostos de mamãe e papai, mas minha vida já tinha um rumo. Eu não era como eles.

Eu era um peculiar e pela primeira vez na vida, estava orgulhoso disso.

—Eu topo. -Falei, finalmente.

—Ótimo! -Suspirou -Partiremos daqui a... -olhou para os ponteiros de seu antigo relógio -3 minutos. Seja bem-vindo ao reino dos peculiares, querido.


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Notas finais do capítulo

Peguei a parte inicial do cap no google (Nekrós e manteía são palavras do grego antigo. A "formatação" foi baseada em outras maravilhosas fanfics do En que eu já li).

Só pra lembrar que o En já pertenceu a duas fendas (eu criei a srta. Jayne para ser sua mentora na primeira fenda, antes da srta. Peregrine)
Até o próximo cap.



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