Moon Lovers: The Second Chance escrita por Van Vet, Andye


Capítulo 75
Mil Anos Depois


Notas iniciais do capítulo

Olá, gente boa!!!

Finalmente este dia chegou! Bom, não o dia do fim, ainda temos mais um capítulo para encerrar a grande saga que foi esta fanfic, mas acredito que este seja o acontecimento mais esperado da história (excetuando o beijo do casal no presente, claro). Com este fato, digo que estamos um tanto apreensivas com a reação as expectativas.

Esta é nossa versão de como seria o REENCONTRO. As saídas que encontramos para que nosso casal seja feliz, acreditamos, foi a mais justo para os dois. Ao terminarem de ler este capítulo, entretanto, opinem nos comentários sobre suas impressões. Queremos saber o que vocês acharam e se gostaram de como ele ocorreu. Fizemos nosso melhor ♥

Mais uma vez agradecendo aos comentários anteriores, afinal chegamos a 1100 feedbacks e isso é pra lá de incrível!!!!

Um super beijo e ótima leitura para todos
o/



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Ha Jin aproximou-se do leito em que Wang Shin vegetava há um ano e acompanhou aquele homem, o homem que amava, abrir os olhos e balbuciar incoerências. Ela estava ficando louca, pensou, ao mesmo tempo que projetava passos cautelosos em direção a cama. A meia luz no quarto não facilitava sua visão, mas, de toda forma, a constatação era a mesma: não poderia ter visto Ji Mong, nem visto Shin acordar tão repentinamente e, muito menos, escutado sair de sua boca palavras que apenas Wang So diria… mas viu e escutou.

Então a voz repetiu:

— Soo… Soo… Soo-ya…

Ha Jin se afastou vários passos, assombrada. Estatelou na parede mais próxima sentindo seu mundo girar e toda estrutura do seu ser desmoronar. Em meio a visão turva que se seguiu àquela torrente de sentimentos antigos, ela observou Shin mexer-se nos lençóis tentando levantar dali. Era inacreditável.

O Wang parecia ter vindo das profundezas de um vale asfixiante, tateando no escuro por séculos incontáveis até conseguir respirar pausada e dolorosamente em seu novo nascimento espiritual.

As limitações de sua nova casca o acompanhavam. Erguer as pálpebras e banhar as retinas da pouca luz que incidia no lugar fora o suficiente para machucar seus olhos, assim como mover os músculos, adormecidos por um ano inteiro. Deste modo, o homem encolheu-se no leito novamente e fechou os olhos bem forte enquanto processava os fatos.

Ha Jin estava com as costas apoiadas seguramente na parede, as pernas fraquejando e tremendo tanto que não era possível caminhar. Ela sabia, ninguém precisava vir lhe explicar, muito menos ele próprio, o recém-acordado, que ele era o Outro. E ter esta certeza não facilitava em nada para seu psicológico. Era como rever um parente querido, há muito falecido, ou um ídolo intocável a poucos metros de si. Um ser outrora intangível, a não ser na figura de Shin.

So, pouco a pouco, conforme Shin invadia-o e completava-o, ia se tornando um tipo de divindade, mesmo em seus sonhos mais lúcidos. E, não importasse quantas e quantas vezes ela comparasse as duas partes daquele mesmo amor, quanto do remorso visceral de como o deixou em Goryeo, o abandono do príncipe mascarado cravasse fundo em seu ser, ainda assim Shin se tornara mais real do que Wang So fora durante todos aqueles anos em outro tempo.

Isso porque, quando Ha Jin era Hae Soo, era como se ela vivesse num conto de fadas perigoso. Em Goryeo, a consciência da mulher moderna fora parar no corpo da jovem nobre da corte do rei Taejo e nenhum dos costumes, dos modos, das pessoas, pertencia a sua essência lúcida, à sonhadora Go Ha Jin. De repente, ela caiu no rio e quando abriu os olhos as brumas de um conto de fadas se descortinou diante dela. E So, ela o amava mais do que amou qualquer outro homem na vida não importasse o contexto, também fazia parte desse nevoeiro denso, circundando e brincando com Ha Jin.

Reencontrá-lo, de verdade, na segurança de sua vida “real”, se é que existia segurança ou uma realidade única, significava novamente destruir sua bússola pessoal de tudo que é certo no universo. Ela sabia que não estaria preparada. Sabia que sua mente se destruiria com tantas reviravoltas. Não era possível um ser humano normal continuar são nessa montanha-russa de possibilidades.

So sentou na cama após grande dificuldade. A cabeça rodopiando, percebeu com os ouvidos como aquele local era barulhento. Os sons vinham dos passos de funcionários e pacientes pelos corredores, das conversas, das risadas e dos choros. Vinham do bips das máquinas médicas que serviam de suporte à vida dos enfermos mais graves. Vinham através da janela, nas ruas com suas construções incessantes e nos seus veículos de motores velozes e buzinas altas.

Com os olhos experimentou outras descobertas, tudo era branco, cru e anômalo à sua volta e à sua  sua noção de mundo. Os adornos do passado não estavam em nenhum lugar.

A criatura que Ji Mong se transformara havia lhe dito sobre isso. Ele seria arremessado em um período que não era o seu e isto era o suficiente para enlouquecer qualquer criatura normal mediante as dicotomias daquilo que nunca conhecera. Mas ele se propôs a suportar tudo isso… por ela.

Pouco a pouco, enquanto ainda em estado catatônico olhava para parede a sua frente, So deixou as memórias fluírem dentro de si como a água da nascente deixa-se levar pela jusante. Primeiro precisou lembrar quem era ele: Wang So, o quarto príncipe de Taejo; Gwangjong, o quarto rei de Goryeo.

A seguir, construiu toda a cadeia de pessoas importantes ao redor de sua vida régia. Inicialmente tapetou as memórias com a infância dolorosa e traumática, seus primeiros anos que já começaram terríveis.

A Imperatriz Yoo, que o ojerizava de modo proporcionalmente inverso a como uma mãe deveria amar um filho. O Rei Taejo, que o estimava muito, mas que fora incapaz de dar uma existência digna ao menino de rosto marcado. Os irmãos, cada um com suas qualidades e seus defeitos, todos suficientemente capazes de se amarem e dar o melhor, mas que foram condicionados, em menor ou maior grau, a lutarem entre si pelo trono, mesmo que para isso tivessem que cometer fratricídios.

Brilhando no centro dessas recordações estava a pessoa que definiu o antes e o depois na vida do amargo príncipe mascarado que ele fora: Hae Soo. Ela era seu tudo e ele nem se deu conta disso até que estivesse inebriado pela espontaneidade daquela garota inconsequente. Um dia ela quase caiu no rio e ele a agarrou para si. Um dia ela mostrou que não tinha medo dele, não temia sua fama monstruosa pelo reino e falou-lhe de igual para igual. Um dia ela escalou uma colina com um cesto de comida nas mãos e exigiu que ele comece tudo. Um dia ela o consolou sobre seus desfortúnios pessoais. Um dia ela acreditou no potencial dele, tocou seu rosto com dedos delicados e precisos, ocultando a marca de sua desgraça e reinventando seu destino. Um dia ela o perdoou pela forma estúpida como ele tentou beijá-la. Um dia ela foi perita em discipliná-lo na arte da paciência, mostrando que havia coisas que podiam ser tomadas na espada, mas outras, porém, nunca seriam conquistadas pela violência. Um dia ele tomou veneno por ela. Um dia ele enfrentou todo um palácio de guardas por ela. Um dia ele a protegeu da chuva com sua capa preta e acalantou sua dor quando ninguém mais o fez. Um dia, quando ele já não esperava nada dela e  apenas se contentava em amá-la e protegê-la, ela o beijou. Um dia eles fizeram amor. Um dia ele soube que poderia ser rei mesmo contra a vontade dela. Um dia ele não aceitou o convite para irem para longe do reino e viverem somente o amor. Um dia as escolhas que os dois vinham tomando, as palavras ferinas que vinham trocando, acabou se sobrepujando a todos os sentimentos bons que os uniam. Um dia ele tornou-se rei e casou-se com a irmã. Um dia ela estava tão magoada que não era possível vê-lo sem sentir ódio e amor ao mesmo tempo. Um dia ela partiu e o deixou solitário naquele imenso palácio. Um dia notícias novas chegaram sobre ela, mas já era tarde demais para perdões, Soo-ya havia morrido.

E como tudo era dividido entre o antes e o depois de Hae Soo, o que houvera depois dela? Corrigindo: o que houvera depois de Hae Soo, além de tristeza e escuridão?

Houve uma pequena luz no caminho escuro que ele trilhava. Era a criança que sabiamente Hae Soo escondeu dele, permitindo que ela tivesse uma vida minimamente feliz longe das intrigas aterradoras do palácio. Soh-ra era seu nome. Uma cópia, em graça e caráter, da sua mãe. E como foram bons os poucos encontros deles. Talvez, se precisasse responder rápido, todas as vezes que Wang So conseguira ver sua filha bastarda, que no coração dele era a mais legítima das nobres, foram os momentos felizes de sua longa vida sem a presença do seu amor.

O sorriso de Soh-ra recendia poesia. A voz era música das fadas e dos seres encantados das lendas sobre florestas místicas. O olhar, aquela profundidade que parecia conectá-lo a alma de Hae Soo nas incríveis oportunidades em que ele teve de ser fitado pela sua doce criança.

Novamente, suas recordações caíam nas profundezas da tristeza porque, assim como aquela criança nasceu bonita e vivaz, morreu, jovem e anonimamente. Ele jamais sendo capaz de protegê-la de verdade, no fim das contas.

E foram trevas outras vezes. Não amou seu filho, seu outro grande erro. Tratar o filho como a mãe um dia o tratara e deixar o herdeiro a mercê da manipulação de outros que, ao fim, também o levaram a ruína no poder.

Com tantos erros acumulados, So terminou seus dias vivendo oculto, como um homem-morto em suas próprias terras, assumindo o manto que a muito abandonara, o do sujeito taciturno e misterioso que fora antes de tornar-se rei. Aquela solidão lhe caía bem. Era cruel se dar conta disso, mas So sentiu-se à vontade como há muito não se sentia ao se libertar da coroa.

Ele sonhou, a partir de então, com mais e mais afinco, com sua chance de retornar no tempo para aceitar a proposta de Hae Soo e fugirem antes dele tornar-se rei.

As últimas lembranças ficaram mais fortes em Wang So. Ele recordou-se de Ji Mong transformando-se em uma criatura ancestral e convidando sua essência a buscar sua última chance junto a eterna amada. Ele foi caridoso com o velho príncipe e antigo rei, pedindo para que este lhe subisse em seu lombo enquanto atravessava o círculo misterioso do tempo, avançando para onde ela estava. Que, invariavelmente, era onde ele deveria estar também.

Olhando ao redor, observou novamente aquele recinto de aspecto tão diferente de tudo que ele conhecia. O local estava na penumbra parcial, mas ainda era possível enxergar. Tocou com os pés descalços o chão frio e se pôs de pé. Somente então conseguiu visualizá-la. Agachada contra a parede, a cabeça baixa e o corpo trêmulo, uma mulher mantinha-se calada próxima a porta.

Seu coração bateu furiosamente. Ele não precisava que ela erguesse o rosto ou que a luz se tornasse mais presente para saber quem era. Conhecia-a de qualquer ângulo, com qualquer roupa, em qualquer tempo.

Respirando fundo para controlar suas emoções reprimidas por séculos, e também porque o corpo novo cobrava o preço de um ano moribundo no leito hospitalar, So caminhou ao seu encontro.

Com muito cuidado, o cuidado de um jardineiro que precisa manejar uma rosa rebelde e rara num campo selvagem, ele se agachou na frente dela e ergueu a mão. Seus dedos ansiosos aproximaram-se da face da garota e, como se precisasse daquele toque para ter certeza de que não estava sonhando em seu corpo decrépito em Goryeo, pegou em seu queixo delicado e levantou o rosto dela para encarar o dele.

E, com mil anos de distância da última vez, seus olhos se encontram.

Ha Jin se transformou em Hae Soo, a concubina real de seu antigo país, por alguns instantes. Se despindo mentalmente de sua identidade atual, conectou fortemente as lembranças de outrora e enxergou, embora eles fossem idênticos, Wang So lhe observando dentro do corpo de Wang Shin. Era o seu jeito de observar ali. O olhar metade protetor, metade indomável, cem por cento comprometido, que ele dava para ela. Seu amado príncipe, seu amado So, que tanto se esforçou para ser uma pessoa melhor, instigado pela força do amor.

Ela havia perdido a fala. De repente Ha Jin percebeu que se abrisse a boca, nada além do que um fio de voz sairia pelas suas cordas vocais. O corpo tremia mais. Os olhos dificultavam sua visão de So, embaçando teimosamente com as lágrimas que transbordavam dali.

Com doçura nos gestos, So utilizou-se dos polegares para tentar enxugar toda aquela aguaceira que caía dela. Enquanto fazia isso, não tirava os olhos de seu rosto, temeroso que, se piscasse, sua visão encantadora pudesse desaparecer.

Ha Jin encontrou algum domínio sobre o seu corpo e conseguiu tocá-lo também. Uma mão pequena deitou na face dele e, de repente, estava sorrindo. Sorrindo e chorando. Chorando e não acreditando. Não acreditando, mas querendo que fosse verdade.

― S-So? ― conseguiu arquejar.

Ele anuiu quase imperceptivelmente e a seguir eles se abraçaram forte destruindo de vez os imemoráveis anos que os separaram.

So trouxe o corpo dela para si, envolvendo seus contornos pequenos nos seus braços longos e fundindo sua quentura na dela. Agora estava protegido na posse dele outra vez como tanto quis. Da mesma forma, Ha Jin passou seus braços ao redor do pescoço do seu príncipe e a angústia de esperar pela morte, enviando cartas sem fim a um homem que nunca veio acabara. Naquele momento único, desejou estar na mesma posição pela próxima eternidade.

Todas as mágoas passadas dissolveram-se ali. As razões que os havia separado não eram nada, absolutamente nada, perto da grandeza daquelas almas quando unidas. Todas as coisas que eles queriam falar um para o outro, as desculpas tristes para suas atitudes errôneas, tudo aquilo se tornou banal e secundário. Os dois sentiam com uma urgência cada vez maior que não havia tempo para isso. Aquelas consciências precisariam focar no mais importante, porque seu tempo ali era escasso.

― Eu te procurei a minha vida toda… ― ele confessou quando conseguiram se olhar outra vez depois do longo abraço. So chorava também.

― … e eu esperei ― Ha Jin respondeu.

― Você está tão linda… Achei que estava me esquecendo dos detalhes do seu rosto, mas não, revê-la me faz perceber como nunca apaguei nenhum traço seu de dentro de mim. Desculpe por demorar tanto e por estar muito velho agora.

― Não, é como se tudo tivesse acontecido ontem, tudo está igual ― ela o tocou calmamente na têmpora sentindo a cicatriz de Wang So despontar finamente, como um eco fantasma, na pele de Shin ― Você continua sendo você.

So baixou os olhos para suas mãos e viu, realmente, que elas estavam muito mais jovens do que ele se lembrava da última vez, quando uma pele senil e dedos cheios de nódoas dolorosas acusavam sua idade avançada. A memória, que era algo estranho naquele plano, fugaz como um suspiro, retornou para si e ele lembrou-se de que Ji Mong, ou a criatura mitológica que ele era, o havia explicado sobre esta condição. Ele voltaria para sua reencarnação no futuro, no corpo dele.

― Soo-ya, quem eu sou aqui? ― sentiu a necessidade de saber.

Aquilo era muito difícil de definir. Haviam tantas possíveis explicações para quem Shin era. Mais do que isso, havia muitas formas de explicar para Wang So quem era Wang Shin, mas nenhuma delas parecia justa ou condensadora o suficiente.

― Você é o meu destino ― disse simplesmente e abraçou-o mais uma vez, com força e por mais tempo, porque ainda parecia um sonho que seu príncipe tivesse retornado.

***

Seria uma loucura se Nyeo, prestes a chegar para trocar de turno com Ha Jin, entrasse no quarto e visse seu filho acordado após um ano. Seria loucura também tentar fazer So entender que a concubina Oh era, agora, a mãe dele. Seria mais loucura ainda, So dizendo incoerências no corpo de Shin, despertando desespero em Nyeo por um filho que não se lembrava de nada. Pesando tudo isto, mas acima de tudo, na sua necessidade de estar sozinha com o príncipe, Ha Jin providenciou um táxi e os tirou do hospital às escondidas, rumo ao parque mais ermo da cidade.

No local, So conseguiu respirar aliviado o ar fresco, não igual, mas semelhante ao de Goryeo, e seus ouvidos tiveram um pouco de paz da barulheira que o rodeava antes. Não tentou entender o que eram todas aquelas coisas inéditas que seus olhos presenciaram durante o trajeto até ali, nem mesmo aquele objeto mais veloz que um alazão obstinado, que os levou para o parque. Sua mente continuava concentrada em não esquecer um único fato, em algum momento ele não lembraria mais de Hae Soo, portanto seu tempo com ela era escasso.

O táxi os deixou no destino almejado e os dois seguiram abraçados pelo caminho de pedras parque adentro. So, ainda fragilizado dentro do corpo de Shin, um homem adormecido por muitos meses, era amparado por Ha Jin, ambos percorrendo uma bela trilha de cerejeiras que terminava em cima de uma pontezinha de madeira rodeada por um rio calmo e tapetado de pétalas rosas vindas das árvores debruçadas sobre as suas margens.

― Como você soube como me encontrar? ― Ha Jin enfim perguntou. Passado o choque de revê-lo, esta era a pergunta que mais a inquietava.

― Ji Mong me disse que você veio de outra época e, de certa forma, eu sempre soube disso. Ninguém daquela época poderia mudar meu futuro como você o fez, Soo-ya.

― Você… encontrou um jeito… ― ela refletiu, pensando como aquele homem a amava para atravessar tantas impossibilidades para encontrá-la.

― Eu tentei seguir adiante, dar o meu melhor como rei, mas vivi para te encontrar. Fracassei em todo resto.

― Não, você me deixou orgulhosa… So, você foi, sim, um grande rei ― ela adiantou-se para relembrar todos os feitos memoráveis descrito nos livros de história e nos museus. Na grandiosidade que havia significado Gwangjong para a Coreia ― Você ajudou a mudar a história do nosso povo.

So deu um sorriso pequeno e tocou sua Hae Soo na bochecha.

― Você influenciou tudo isso. Eu não teria forças para continuar mais nenhum dia depois da sua partida, mas algo me dizia que desistir no meio do caminho significava relegar a importância da sua existência em Goryeo. Não sei como, mas eu sabia ― ele disse com bastante consciência. Ha Jin sentiu um arrepio ancestral percorrer toda sua nuca pela força daquelas palavras e daquele toque ― Você e Soh-ra influenciaram minhas decisões como rei e como homem.

A menção ao nome da filha criou um estalo dentro de Ha Jin. Primeiro um vácuo de vazio terrível, um sentimento de desorientação, depois ela deu-se conta que, enfim, poderia saber sobre sua criança deixada no passado, longe dos seus braços protetores de mãe, já que no presente não existia nenhuma referência dela.

― So… Você conheceu Soh-ra? Eu… é que…

― Não quero perder nosso tempo com desculpas sobre coisas tolas, Soo-ya. Você foi sábia em afastar nossa filha do palácio e, acredite, em escondê-la de mim também. Naquela época, quando você engravidou, eu ainda era ingênuo e arrogante demais. Era no tempo que achava poder controlar tudo somente porque me nomearam rei.

― Se você a conheceu…? Como ela foi? Como ela cresceu? Foi feliz? Viveu bem?

― Sim. Ela foi uma pessoa incrível em Goryeo e viveu muito bem. Uma boa e longa vida ― ele mentiu, em partes e dolorosamente, mas achou que Hae Soo não precisava dessa culpa para si. Ele a amava demais para vê-la sofrer novamente, ele foi até ela para se lembrar de seu rosto doce e esperançoso, não para ver mais desolação na jovem mulher. Então, sim, ele poderia suportar sozinho o fardo da verdade.

― Que bom, que bom ― ela sorriu, transbordando felicidade ― So…

― Soo-ya ― disse antes dela, sentia que precisava agir logo, o tempo urgia.

― So… ― pegou-o na mão entrelaçando seus dedos nos dele e eles ficaram de frente um para o outro ― Eu não fui justa com você, eu o abandonei…

― Não… Soo-ya. Já disse que não devemos gastar nosso tempo com isso, mas… mas você quem deve me perdoar. Eu… ― lágrimas brotaram em seus olhos à lembrança de encontrar apenas um jazigo quando descobriu a verdade sobre as cartas. Aquela tristeza só era inferior a alegria descomunal que o coração do quarto príncipe sentia neste momento, ao poder estar com ela de novo. De novo e viva.

― Eu fui fraca, não suportei estar ao seu lado, mas deveria ter. Eu sinto muito por tê-lo abandonado. Eu não quis, mas eu não suportei… Eu não suportei… Eu fui embora sofrendo e nenhum dia, a não ser quando Soh-ra nasceu, teve o mesmo brilho para mim após minha partida do palácio… So… Meu Deus, So… Eu te deixei sozinho… Eu não queria… Não queria, mas não suportei… So… Me perdoe ― ela soluçava, enfim se dando conta de que conseguira sua chance sobre aquilo que a consumia também na sua vida como Go Ha Jin.

So a pegou pelos braços e a trouxe para junto de si. Não gostava de vê-la sofrendo, não atravessou eras para vê-la assim, tendo de se explicar. Os erros deles eram como uma via de duas mãos, iam e vinham e era impossível saber, àquela altura, onde o erro começou ou terminou, desencadeando a solidão em seus corações.

Naqueles tempos estavam fadados a não darem certo e, como se tivesse tido um lampejo de sabedoria, So deu-se conta de que não importava quantas possibilidades o príncipe e a concubina tentassem criar para ficarem juntos, alguma coisa sempre conseguiria afastá-los no final, fosse ela a morte, a mágoa ou as noções de responsabilidade.

Por outro lado, finalmente para Ha Jin, soltar toda aquela carga que nunca a aliviava era uma catarse. Desde que acordara do coma e relembrara de So, suas memórias nunca se fechavam pacificamente. Era como viver com um eterno peso na consciência, imaginando todos os dias de Wang So perambulando pelo passado e pensando coisas terríveis sobre ela.

― Eu fui muito egoísta, Soo-ya. Achava que as cartas que me eram enviadas vinham de meu irmão e que ele escrevia para desdenhar da vida perfeita de vocês. Devido ao meu orgulho, não as abri e não descobri a verdade. Você queria me ver… Nós nunca tivemos nossa chance no fim de tudo…

Como So, Ha Jin também não queria que seu amado sofresse por coisas que não tinham mais importância. Era necessário tirar essa carga dele também. Passara da hora de aliviar ambas as almas.

― Mas eu fui em paz com seu amor em meu coração. Eu soube no fundo de minha essência que você continuava nutrindo os mesmos sentimentos por mim. E eu cheguei aqui com essa mesma sensação e quando encontrei sua parte futura, quando vi Shin, soube que um pedacinho de você me amava incansavelmente e conspirou no inconsciente dele para que nós tivéssemos nossa nova chance. Wang So, te amei, te amo e te amarei mais que tudo, não importa quantas vezes o destino queira nos afastar. Me perdoe por ser falha e, talvez, jovem demais para tudo aquilo…

― Hae Soo… Soo-ya, eu não preciso perdoá-la por nada porque nunca houve mágoa genuína em meu coração por você, apenas o desejo de revê-la para dizer o quanto você é importante para mim e como eu a amo, amo que chega a doer, amo de verdade. Amo que barganhei com uma entidade mágica para poder ter você de novo, nem que fosse por pouco tempo.

E então, sem perderem mais um segundo, os dois se beijaram. Um beijo doce, terno e delicado. Um beijo como nos velhos tempos. Um beijo eterno. Quando se soltaram, So apoiou-se no parapeito da ponte, as pernas trêmulas, outra expressão no rosto, e disse:

― Ha Jin, onde estamos? ― olhou ao redor, desorientando.

― So?

― Hã? O que está havendo?

― Shin?

― Ha Jin, meu corpo todo está dolorido… Por que estamos em um parque? ― sentiu as pernas, movimentadas apenas por fisioterapia nas últimas semanas, como de borracha.

A tristeza e a solidão começaram a invadir Ha Jin mesmo estando diante de seu grande amor atual, a ausência de So era retumbante. Ela perguntou alarmada:

― Você não se lembra?

― Soo-ya, eu estou esquecendo… ― So ecoou de algum lugar dentro de Shin. A cicatriz em Wang So começou a sumir do rosto de Shin.

― So, ainda está aí? ― ela o segurou pelo ombro, fitando seus olhos em busca de resquícios da alma régia de Shin.

― Estou, mas… Ha Jin, está tudo tão estranho. Eu sofri um acidente?

― Shin.

― O que aconteceu?

― Você está bem agora. Nós estamos bem, enfim ― ela respirou fundo, começando a apreciar a ideia de ter Shin de volta para si e, ao mesmo tempo, triste pela partida de So.

― Mas o que… Soo-ya, não importa se não nos lembrarmos, não é? Nosso amor continua através das nossas reencarnações?

― Nosso amor continua… ― ela sorriu como que impulsionada, repentinamente, por uma onda de felicidade eterna ― Mas… Shin, quem é Soo-ya?

― Estou confuso e minhas pernas doem. Acho que preciso sentar.

― Você ficou muito tempo numa cama de hospital.

― Porque eu precisava esquecer, este foi o jeito que Ji Mong arrumou de me trazer de volta. Eu queria te rever nem que fosse por pouco tempo e estou feliz agora. Nós nos encontramos nesse futuro de toda a forma…

― O médico disse que você bateu com a cabeça e falaria coisas sem sentido.

― É bom poder ter ver… Ha Jin, eu estava voltando para você.

― Eu sei, So, eu sei.

― Soo-ya, acho que é um adeus. Estamos esquecendo quem somos…

― Não, não é um adeus. Somente nossas consciências estão indo. Nossas almas, eu sinto, se lembrarão para sempre.

― …Eu te amo, Hae Soo ― ele lançou seu olhar indomável e principesco para Ha Jin pela última vez.

― Eu te amo, Wang So ― ela respondeu.

Desorientados, o jovem casal desviou o olhar um do outro por um instante e se pôs a deslumbrar a calmaria do rio sob a ponte. Seus semblantes ficaram perdidos e opacos, como se tivessem saído de uma sessão de hipnose profunda. Minutos depois, se encararam de novo e voltaram a conversar:

― Devemos voltar para o hospital e você deve passar por avaliação médica. Eu não sei onde estava com a cabeça quando te trouxe para cá.

― Ha Jin, espere ― Shin pegou-a pelo pulso ― Acho que aguento. Eu quero estar com você por mais alguns minutos. Só nós dois.

― Mas você está confuso e com dor.

― Não é nada que eu não possa suportar. Imagino que você nos trouxe aqui, neste parque, porque queria isto também.

― É, talvez... ― Ha Jin estranhamente não se lembrava de nada. As recordações da última hora se tornaram um papel em branco em seu cérebro.

― Ha Jin, eu pensei e…

― Espere, não quer saber o que houve com você?

― Não importa agora ― ele foi enfático e continuou ― Não foi preciso muito tempo para decidir que não quero estar comandando a empresa. Nada daquilo combina comigo. Posso ajudá-los de outro jeito, do meu jeito, e seguir ao seu lado como deve ser. Como meu coração pede. Não posso me afastar de você. Não sei fazer isso depois que te conheci. Eu te amo, te amo de um jeito tão forte que nem posso explicar ao certo. Eu abri o jogo com Taeyang e entreguei as responsabilidades. Minha prioridade é outra: vou para onde você for.

― É uma notícia triste a que vou lhe dar agora, Wang Shin, mas eu também te amo. Estive ao seu lado todos os dias enquanto você ficava naquele leito de hospital e confirmei: não senti nenhum remorso desse tempo. Eu quero estar com você para sempre.

Shin abraçou Ha Jin o mais firmemente que conseguiu e os dois, outra vez, se beijaram, profunda e urgentemente, agora. Quando se desconectaram nos lábios, haviam sorrisinhos cúmplices e contentamento explodindo em seus peitos.

― Agora manda a bomba: eu fiquei muito tempo apagado?

― Melhor a gente voltar para o hospital e, junto da sua mãe, que certamente está subindo pelas paredes com a sua ausência, contar o que houve… Você deixou todo mundo muito aflito ― ela começou a caminhar com ele para a saída do parque, a passos cautelosos

― Agora todos vão me dar mais valor ― Shin brincou.

― Eu não te dava valor, por acaso? ― Ha Jin rebateu, indignada.

― Não se ofenda, meu amor, mas veja pelo lado bom, você terá mais chances de mimar…

― Mais mimo? Rá-rá, bateu com a cabeça mesmo!

― Você é muito cruel, garota… ― Shin fingiu estar ofendido. Shin, que havia se livrado completamente de So, que nunca o conhecera na verdade, mesmo sendo ele próprio no passado.

E quanto a Ha Jin? Ha Jin encontrou estranhas lembranças dentro de si enquanto contemplava o rio ao lado de seu amado. So e Hae Soo eram nomes familiares e remetiam a uma vivência intensa nalgum lugar do tempo-espaço.

Ela se lembrou de um homem bonito em um cavalo preto, um homem mascarado, ora gentil, ora impiedoso, ora benevolente, ora rancoroso, ora honesto, ora insondável. Em todas as facetas desse homem, ele tinha uma única característica que permanecia imutável: ele era fiel. Fiel aos seus princípios e fiel às suas escolhas. Fiel ao seu amor.

Lentamente essa lembrança também foi se apagando. O cavaleiro cavalgou para longe, trotes firmes e corajosos em meio a poeira da estrada, rumo ao seu destino que seria fatídico, mas necessário. Que traria sofrimentos para alguns, mas felicidade para muitos e muitos outros.

No passado essa mesma história se repetiria não importava quantas vezes o futuro avançasse porque, na verdade, o tempo é um ciclo e não uma linha reta. Ele se fecha nele mesmo, embora nos permita ser mais e melhores em seu decorrer, o que está feito lá atrás, está feito... ao menos até que alguma entidade mistíca resolva mudá-lo. 

Ao fim do fitar distante e hipnótico do horizonte a frente, Ha Jin já não se lembrava mais de quem ela fora no passado. Os momentos bons com Wang So, as recordações daquele amor, se foram. Mas se foi também a dor de todas essas lembranças.

Os Wang morreram centenas de vezes diante dos seus olhos, So padeceu triste e solitário outras mais, e a dor desta recordação e dos horrores daquele tempo jamais deixariam Ha Jin separar seu amor atual do antigo, de fazer comparações, de acordar noites a fio, em pesadelos, revivendo as agonias dos tempos em Goryeo. Das guerras, das mortes em vão, dos inocentes partindo aos pedaços porque não tinham condições melhores… para serem melhores.

Porém, nem tudo pode ser tirado da essência de um humano e mesmo que Shin fosse outra pessoa, ele ainda era a mesma alma e era por isso, primordialmente, que Ha Jin fora para ele e o ajudara mais uma vez. E depois, o amara com toda sua força.

A consciência não se recordava, mas o espírito sim. Ele se lembrava que eles eram, simplesmente, almas gêmeas.

***

 


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