Moon Lovers: The Second Chance escrita por Van Vet, Andye


Capítulo 11
A Reunião Wang


Notas iniciais do capítulo

Olá pessoinhas do nosso coração dorameiro!

Em primeiro lugar, estamos amando demais e agradecemos com muito carinho todas as pessoas que estão acompanhando a história, principalmente quem vem bater papo conosco. Isso é um super gás para nós!

Sobre esse capítulo... Ele fecha o primeiro arco da fanfic, portanto está bem grandão. Nós não curtimos postagens gigantes, porque pode se tornar um pouco cansativa na leitura, mas não tinha como cortar essa sequência toda sem vocês não nos desejarem na fogueira.

Tudo foi escrito com dedicação e diversão, esperamos que curtam!
Boa leitura!!! ;)



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Luzes de led azuladas brotavam sobre os jardins e se precipitavam por toda entrada principal da mansão. A noite finalizava o trabalho árduo dos decoradores, realçando a elegância da iluminação que atraía os convidados, que chegavam em veículos caríssimos, para adentrarem no evento com grande estilo.

O primeiro carro a despontar diante das portas de vidro trazia a senhora Ji Eun Tak. A mulher chegou acompanhada do seu filho mais velho, Eujin, que fora buscar a mãe no condomínio onde ela morava com o novo marido. Eun Tak havia sido a última esposa com quem Wang Hansol se relacionou antes de voltar com a senhora Ah Ra, e era também a que menos gostava de se envolver nas festividades da poderosa família.

Suas participações nas reuniões, todas pontuadas com convites educados do ex-marido, apenas eram atendidos pela constante insistência dos filhos, principalmente Sun. Aquela noite não era diferente: Eun Tak preferiria estar fazendo qualquer outro tipo de passeio na companhia de Eujin e Sun, mas nada que envolvesse ter de rever algumas das pessoas mais desagradáveis que cruzaram a sua vida.  

Eujin, sempre optando por guardar ele mesmo o carro na garagem, cedeu a função a um dos manobristas para poder acompanhar a mãe até o salão. De braço dado com ela, uma bela e serena mulher, partiram para dentro.

O segundo veículo a surgir, conduzido por um motorista particular, parou suavemente diante do trajeto de pedra, residência à dentro. Assim que estacionou, o condutor saltou do banco e foi abrir a porta do passageiro, ajudando sua patroa a descer. A senhora que abandonou  o carro trajava vestido preto e um chapéu de estilo casqueta, detalhado em renda preta nas bordas, dando um ar sepulcral ao seu look.

A mulher, batizada de Li Chang Ru, mais conhecida como a primeira esposa de Hansol, observou a entrada vastamente decorada. O excesso de palmeiras plantadas ao redor, a quantidade exorbitante de arbustos ornamentais próximos à porta, e a cascata - que deveria ter custado uma nota, além ter sido importada de outro país - instalada na rotatória dos carros fez com que ela balançasse negativamente a cabeça diante de toda aquela ostentação banal enquanto falava para si, em resmungo:

—  Perua exibida… —  referendou a atual senhora da casa, entrando em seguida na mansão, sozinha, porém ansiosa para reencontrar seu garoto, Wang Sook.  

Durante a hora que seguiu, dezenas de veículos pararam em frente à mansão para liberar os muitos convidados daquela noite: os acionistas da Wang S.A - as partes mais interessadas no tema principal da reunião - e seus familiares.

A maioria dos homens e mulheres que tinham participação na empresa eram velhos conhecidos do poderoso empresário. Profissionais que galgaram as escadas do sucesso empreendedor como ele e já conheciam bem a arquitetura peculiar da morada do homem, assim como a dinâmica dos encontros sociais dali.

Alguns, inclusive, como o bem-humorado Doh Yoseob, realizavam apostas às escondidas com outros acionistas para ver quem acertava em qual horário da reunião a discussão entre as ex-mulheres de Hansol se iniciaria e tomaria conta da atenção de todos.

O último automóvel a chegar, uma limousine branca, carregava a convidada mais espinhosa da reunião. Min-joo aguardou que lhe abrissem a última porta para descer do luxuoso veículo e analisar atentamente a fachada da residência da qual ela um dia fora a senhora única e exclusiva e que, agora, estava tomada por usurpadores invejosos.

A mãe de Wang Gun e Wang Jung ajeitou a barra do seu vestido de cetim vermelho e aprumou o tronco, caminhando resolutamente para as portas de vidro que deslizaram para o lado suavemente, dando as boas-vindas a legítima senhora da mansão.

A sala principal estava toda redecorada, a mobília padrão havia sido retirada e abria espaço para um ambiente confortável onde os presentes poderiam se locomover com mais liberdade. Duas bancadas laterais foram instaladas para servir os mais diversos sabores de coquetéis e uma orquestra de câmara, com jovens instrumentistas, produzia acordes que criavam o clima pitoresco desejado para o evento. Dentre aqueles moços, ela teve a impressão de reconhecer um dos bastardinhos de Hansol brincando de músico com um fagote.

Min-joo contornou o delicado chafariz de cristal, o último obstáculo antes de adentrar para o salão de fato, e foi direto para os coquetéis pegar uma taça para si. Ela chegou a tempo de ver a entrada, exagerada e cafona, do casal da mansão despontando dos corredores da área privativa.

Ah Ra, a criatura mais detestável que Min-joo teve o desprazer de encontrar, apareceu trajando pedrarias em tecido branco, o que contribuía para desbotar ainda mais sua pele envelhecida. As pedras do busto, com toda a certeza rubis e diamantes, não deixavam dúvida para a ex-mulher de Hansol de que fora o próprio que escolheu e presenteou a esposa com aquele vestido. Aquele homem tinha muitos defeitos… mas não saber agradar uma mulher não era um deles.

Ao lado de Ah Ra, o próprio, acenava para os seus convidados e fazia caudalosas reverências aos acionistas com quem trabalhava diariamente. Ele continuava o mesmo de sempre… Os anos cuidavam do Sr. Wang com generosidade, com exceção de algumas ruguinhas a mais ao redor dos olhos, do cabelo com coloração um pouco mais grisalha e a tez levemente pálida, ele não mudara.

—  Senhoras e senhores, amigos e familiares, boa noite à todos! —  Wang Hansol postou-se no último degrau, ficando um nível acima das outras pessoas que ganhavam a atenção dele, interrompendo suas conversas triviais.

—  Boa noite à todos —  Ah Ra os cumprimentou também, emulando o esposo, e Min-joo revirou os olhos, entediada daquela criatura, sorvendo o champagne da taça afim de se distrair.

— Antes de tudo, muito obrigado aos presentes que conseguiram encaixar um espaço na sua noite de sábado para estarem aqui, comigo e minha família, nessa pequena cerimônia. Estou feliz com tamanha consideração. Depois, antes de aproveitarmos esta noite, sinto que devo adiantar o motivo oficial do nosso encontro —  ele mirou vagamente pelos rostos atentos e se demorou uns segundos à mais no de Min-joo, que ergueu sua taça e respondeu-lhe mentalmente que nunca deixaria de ignorar seus convites, por mais protocolares que fossem —  Após muitos anos, estou tomando novas decisões para a Wang S.A., decisões essas que serão definitivas e inovadoras. Pensei muito sobre o tema da nossa reunião… E, finalmente, acho que descobri o melhor rumo para o futuro da empresa, para que ela ganhe com a nova geração, mas permaneça hegemônica no seu segmento, na Coreia e no mundo.

Os convidados prenderam a respiração, ansiosos para escutar o que o homem tinha para revelar, ele, porém, sorriu pacientemente para todos e completou:

—  Obviamente que o trabalho, a parte chata, ficará para o final. Por ora, aproveitem o buffet e o ambiente idealizados cuidadosamente pela minha esposa e minha filha para agradar suas noites.

A mãe de Gun nem se importou por descobrir que o cardápio da reunião tinha o toque de mau-gosto de Ah Ra e Yun Mi. Ela estava extasiada, imaginando a cara das pessoas, principalmente das outras ex, recalcadas, quando ouvissem, no fim do evento, que quem comandaria a herança Wang seria seu filho mais velho. Seu precioso e competente rapaz, o único que se importava com o patrimônio do pai. O único merecedor de tamanho reconhecimento.

— Boa noite, Min-joo —  alguém se aproximou dela, uma mulher que se assemelhava a um urubu esturricado ao sol.

—  Preto lhe cai muito bem, Chang Ru… Estou desconfiada que você gostou tanto do vestido que usou no funeral da sua avó que resolveu reprisá-lo aqui, para nossa total admiração.

—  Obrigada, Min-joo —  Li Chang Ru sorriu expondo seus pequenos dentes amarelos —  Na verdade eu me sinto como se estivesse participando de um enterro quando sei que irei lhe rever, portanto o espírito é esse. Você captou muito bem a ideia.

Min-joo semicerrou os olhos e apertou a taça na mão, desejosa para dar um banho de bebida naquela velha cheia de pompa. Se as “outras” de Hansol foram passadas para trás pela Usurpadora, àquela ali era a mais fracassada de todas. Sendo a primeira a se casar com ele, também fora a primeira a ser chutada.

—  Mamãe! —  exclamou Jung, surgindo em meio às pessoas, muito elegante em um terno branco —  Que bom que a senhora já chegou!  

—  Filho, querido, você está lindo —  ela beijou o rapaz na bochecha, carinhosamente, imprimindo a marca do seu batom cor de carmim na pele dele.

—  Boa noite, senhora Li —  ele cumprimentou a velhaca em seguida, educadamente.

—  Boa noite, meu belo rapaz —  Chang Ru retribuiu a saudação —  Se tem algo que sua mãe acertou na vida, foi com vocês. Garotos lindíssimos… Todo mundo é passível de alguma boa ação nesta existência, não é mesmo?  

 —  Ah… Obrigado…? —  respondeu Jung, confuso.

 —  Vou circular pelo salão e buscar ares mais respiráveis. Bom evento para você e a senhora sua mãe, meu bom rapaz.

Min-joo observou a mulher tomar distância no salão e mal teve tempo para continuar lhe odiando. Enxergou, há poucos metros de onde estava, Ji Eun Tak sorrindo sonsamente enquanto conversava com Doh Yoseob, acionista e amigo pessoal de Hansol. O que eles tinham em comum para ficarem de tanto papo furado, ela estava curiosa para saber.

—  E aí, mãe, está gostando do clima? —  seu filho mais novo perguntou, embora parecesse mais interessado em observar a criadagem servir aperitivos.

—  A cafonice esperada de toda vez… —  ela suspirou — Vou ali dar as boas-vindas para Eun Tak, ela parece tão feliz… Normalmente mal consegue dizer meia dúzia de palavras sem ficar roxa….

 Entretanto, nem bem dois passos ela deu e alguém a tocou no ombro. Min-joo se virou sorridente, acreditando que seria Gun, e se viu frente a frente com a vaga-lume usurpadora.

—  Min-joo, eu não te esperava aqui, hoje —  disse Ah Ra curvando a cabeça discretamente.

—  Claro que esperava —  ela respondeu acidamente, sem retribuir o cumprimento —  Eu sou a pedra que nunca vai sair do seu sapato, Ah Ra, e você bem sabe disso.

—  Mamãe… —  Jung bufou, um tanto sem graça.

Esse era o problema do seu filho mais novo. Ele se constrangia perante os facínoras, os ladrões descarados, da sua herança. Com o primogênito era tudo mais divertido, Gun sempre entrava no espírito e sabia se portar como um herdeiro autêntico.

— Já vamos voltar ao velho assunto? —  a atrevida permaneceu risonha, como se elas fossem boas amigas trocando notícias sobre os bons e velhos tempos —  Não me incomoda sua pedrinha… Algumas ex-esposas têm de acordar todo dia e se olharem no espelho para descobrir que foram atropeladas por verdadeiras rochas.

—  A rocha seria você? —  Min-joo riu das tentativas pífias de Ah Ra em querer engrandecer sobre ela —  Se Hansol tivesse uma mulher realmente sólida ao seu lado, ele não estaria prestes a anunciar sua aposentadoria. O homem que eu deixei possuía vitalidade para comandar a empresa por mais cinquenta anos, no mínimo.

O rosto da senhora da casa se fechou subitamente.

—  Quem lhe disse que ele está anunciando a aposentadoria?

—  Como pôde notar, sou tão bem informada quanto você —  ela piscou para a outra triunfante.

—  Seu filho faz suposições demais… Mas eu imagino que deva ser difícil para o pobre rapaz ter de ficar vivendo à base de informações imprecisas para fabricar relatórios regulares à mãe.

—  Meus filhos são leais a mim, Ah Ra. Eles me ouvem e por isso obtém tão bons resultados.

—  Garotos perdidos… —  a mulher suspirou, perdendo sua postura, fazendo transparecer a criatura patética escondida por debaixo da riqueza.

—  Aí está a senhora — outra pessoa se juntou à dupla de senhoras, afinal Jung já havia desistido da mãe e saído dali sorrateiramente fazia algum tempo — Seu vestido está fantástico mamãe, todos comentam.

Era Taeyang, o moleirão que veio da soma do seu ex-marido com a Usurpadora. De aparência, ele até se assemelhava ao pai, sendo muito mais novo, mas as coincidências terminavam por aí. Min-joo e Gun compartilhavam muito boas gargalhadas contando os feitos irrelevantes do rapaz na empresa. Uma ótima piada de mãe e filho era dizer que ele tinha menos culhões que a irmã.

—  Muito boa noite, Sra. Min-joo… Eu vou precisar roubar minha mãe por um minuto, alguns acionistas querem elogiá-la pela decoração —  ele intrometeu-se entre elas para poder resgatar sua progenitora.

Ela acenou em concordância, achando que já iam tarde, e voltou a focar Ji Eun Tak quando uma taça de bebida nova, do seu tipo de champagne favorito, chegou até seus olhos.

—  A festa ficou monótona por muito tempo sem a senhora —  observou Gun, arrebatador no terno preto que ela havia comprado para ele usar naquela noite —  Aqui está a taça do melhor da casa.

—  Você está maravilhoso… e vai brilhar no fim dessa reunião. Preparou o discurso de anunciação?

—  Com toda a certeza, mamãe.

***

Taeyang colocou a mãe em um porto seguro, longe das garras afiadas da ex-esposa do pai, estava cedo demais para as desavenças iniciarem, e partiu para o corredor da área privativa. A reunião nem bem começara e ele já estava se sentindo sufocado no meio de todo aquele clima tão pesado.

Segundo a visão de Taeyang, a pior coisa que um homem poderia fazer em sua vida era acumular muitas esposas, o que, inevitavelmente, significava acumular muitas mágoas. Nesse emaranhado de alfinetadas e olhares atravessados, eram os filhos que tinham que desviar dos disparos e resgatar suas mães sequeladas do tiroteio.

Ele ainda guardava amargas recordações da mãe chorando às escondidas, bem pequeno, sem entender exatamente porque o pai não estava lhe consolando, ou simplesmente por perto, naqueles momentos. Depois que crescera um pouco, foi muito fácil somar dois mais dois e chegar ao resultado óbvio: a infidelidade.

Desde então, o herdeiro havia colocado na cabeça que somente se casaria após ter certeza absoluta que amava a respectiva pretendente. Amor suficiente para estar disposto a passar todos os anos da sua vida acordando ao lado de uma única mulher.

Alguns anos atrás, Taeyang chegou a acreditar que a pessoa tão esperada finalmente aparecera, mas o destino tratou logo de lhe abrir olhos e mudar seu rumo. Foi doloroso, porém essencial.

O rapaz entrou no lavabo do corredor e encaminhou-se para a pia, abrindo a torneira e lavando o rosto abundantemente, na ânsia de sentir aquela sensação ruim se dissolver. Ele se demorou vários minutos também, se encarando no espelho enquanto ruminava que tipo de notícia o pai daria após o jantar.

Era sobre uma possível aposentadoria, disso ele tinha certeza. Yun Mi chegou a comentar algo do tipo, para reforçar suas suspeitas, dias atrás. Quem sabe a chance dele não estivesse vindo, então? Afinal, ele não imaginava Wang Hansol sendo tão injusto com os filhos a ponto de entregar o cargo mais elevado para um deles. No caso, o mais sanguessuga e bajulador de todos.

Irritado por ter sua mente invadida por mais questões desagradáveis, Taeyang secou o rosto e as mãos e saiu do lavabo novamente, dando de frente justamente com o irmão mais velho.

—  Já está se cansando de fazer o papel de um verdadeiro Wang conversando com os nossos acionistas? —  Gun provocou, sorrindo maliciosamente.

—  Aonde você vai, Gun? Seu lugar é naquele salão tentando controlar a louca da sua mãe que não consegue ficar um segundo sem tornar a vida da minha e das outras mães, um inferno.

— Primeiramente, mamãe está em casa —  ele retrucou se tornando mais sério —  Em segundo lugar, volte pra esse lavabo e lave essa boca imunda antes de chamar minha mãe de qualquer nome que não seja o dela!

O irmão diminuiu a distância entre eles para poder cutucá-lo no peito, enquanto pontuava suas grosseiras recomendações. O gesto incandesceu Taeyang, que afastou a mão de Gun com um tapa forte e o empurrou contra a parede oposta, pressionando seu tórax com a ajuda do antebraço.

—  Eu sei que vocês dois estão bastante otimistas essa noite, mas eu tenho certeza que papai jamais faria isso com o resto de nós… —  disse entredentes.

—  Confiança, é? — o herdeiro mais velho trouxe aquele sorriso de provocação nos lábios —  É a mesma confiança que você deposita na Na Na dentro… e fora da empresa?

A raiva se tornou mais intensa dentro de Taeyang e o fez pressionar o outro ainda mais, seu rosto contrariado e avermelhado, preparando-se para socar o outro. Gun riu parecendo achar tudo aquilo bem divertido.

—  Não coloque sua noiva no meio dos nossos assuntos. Tenha um pouco de respeito por ela, se a ama tanto quanto costuma dizer.  

—  Com a Na Na eu me entendo perfeitamente —  e, segurando no pulso erguido de Taeyang, empurrou-o para trás — Agora se recomponha, irmão. Segunda-feira promete ser um dia muito diferente para todos nós.

Taeyang segurou a língua, freando outros impropérios, e deu-lhe as costas retornando para companhias mais saudáveis no salão, deixando Gun rindo enquanto arrumava o terno amarrotado.   

***

Havia passado pouco mais de uma hora desde o início daquela reunião e Ha Jin já esperava o seu final com ansiedade. Aquele ar cheio de luxo e esbanjamento não lhe fazia bem. Sentia saudades de seu travesseiro deformado pelo tempo, das suas novelas cheias de drama surreais e da companhia de Mi Ok enquanto comiam alguma coisa pronta com o prazo de validade prestes a vencer.

Já havia se assustado o suficiente naquela noite reconhecendo pessoas que, de alguma forma, marcaram sua vida passada e conseguiu, finalmente, compreender o medo de Ryung ao falar da segunda esposa do senhor Wang. A mulher não era ninguém mais, ninguém menos, que a reencarnação da rainha Yoo. Tão fiel a sua cópia antepassada, encarando à todos ao seu redor com o olhar atravessado de quem enxerga insetos e não semelhantes.  

Ha Jin sentou em uma cadeira disposta na cozinha e, do nada, se perdeu em seus pensamentos.

Havia encontrado muitos dos Wang naquela noite, desde os mais amáveis aos que tanto lhe fizeram sofrer e agora, consciente, sabia que aquele que mais desejou não estava ali; havia se perdido no tempo e em suas lembranças. Ela também tinha consciência que o tinha abandonado quando ele mais precisou e, agora, seu desejo de reaver o que haviam perdido naquela dinastia cheio de tristezas e injustiças, não chegaria.

Respirou profundamente enquanto via uma leva de empregados entrar e sair da cozinha segurando bandejas com uma agilidade que ela não possuía. Olhou ao redor, aquele cômodo imenso, e se sentiu fora de seu mundo, de seu tempo. Relembrou as palavras que havia dito para a prima na noite anterior, a promessa de manter-se por perto, e percebeu que poderia cumprí-la, mesmo que não fizesse mais parte do corpo de funcionários da mansão.

Teve os pensamentos interrompidos por uma criança que adentrava no ambiente com entusiasmo, dando a entender que faria algo que realmente não deveria. Ha Na, a filha de Sook, tinha um brilho infantil e sincero nos olhos, puro como ela mesma parecia ser.

— Boa noite, governanta Go.

A forma como a menina falou deixou Ha Jin pensativa. Era a primeira vez, de fato, que alguém se dirigia a ela pelo posto que havia recebido. Ela retribuiu a vênia da menina com um sorriso seguido de um aceno de cabeça.

— Boa noite, senhorita Ha Na. O que deseja aqui na cozinha? — a menina fez uma típica expressão travessa antes de responder.

— Vim procurar doces… — e esperou, possivelmente, por uma bronca, se explicando ao perceber que essa não chegaria — Pararam de servir os doces na sala, e essas coisas que vêm agora tem um gosto estranho…

A governanta ponderou o desejo da menina ainda sorrindo e pensou se entraria em alguma enrascada caso o realizasse. Concluindo que não haveria tanto problema em procurar um novo emprego em breve, se levantou de onde estava e ofereceu uma bandeja com uma leva de doces para que a menina, de olhos ainda mais brilhantes, escolhesse os que preferisse.

— Obrigada, governanta Go — agradeceu com sinceridade instantes depois, seguindo apressada para a porta, colidindo de frente com o homem que adentrava pela mesma. As mãos cheias de doces foram escondidas apressadamente às costas — Oi tio… Não fiz nada e já estou saindo.

— O que ela queria? — Eujin achou graça, acompanhando a menina com os olhos.

— O que toda criança quer — Ha Jin respondeu, indicando os doces.

— Hmmm… Que interessante — ele assumiu seu típico tom brincalhão — Quer dizer que a governanta anda contrabandeando os doces da reunião?

— Aparentemente ela é esse tipo de criminosa, sim — ela sorriu, guardando a bandeja sobre uma estante — E o que você faz aqui na cozinha? Houve algum problema?

— Problema? O de sempre! — ele falou se sentando — Uma reunião chata, cheia de gente chata com assuntos ainda mais chatos, e nada de interessante para fazer. Preciso jogar conversa fora…

— Eu sinto muito, Eujin, mas realmente não posso — Ha Jin falou enquanto se organizava para voltar ao serviço — Preciso trabalhar…

— Eu sei — ele suspirou resignado — Sabia que você me diria isso, mas precisava tentar… — a governanta o olhou e percebeu sua destreza em manter algum assunto — Me viu tocando com a orquestra mais cedo? — fez uma mímica manejando um fagote invisível.

— Vi sim e você estava certo: precisa praticar.

O herdeiro a encarou horrorizado. Ha Jin segurou uma gargalhada e virou-lhe as costas para esconder o rosto.

— Posso, pelo menos, ter a mesma sorte que a minha sobrinha?

O rapaz barganhou para a governanta, uma voz tristonha, que, enquanto pegava novamente a bandeja de doces, o olhou com diversão. Por um segundo eles se fitaram e o clima de brincadeira contagiou os dois, que tiveram de controlar um ataque de risos. Eujin aproveitou e encheu os bolsos internos do terno com docinhos diversos mantendo um brilho infante no olhar, muito semelhante ao de Ha Na.

— Essas coisas que estão servindo tem um gosto terrível — ele comentou enquanto enchia as mãos — Não sei de onde Yun Mi e a mãe dela vêm com sabores tão exóticos…

— Também não sei, senhor. Apenas obedecemos às ordens de preparação — respondeu a governanta rigidamente ao perceber que alguns empregados observavam a interação casual entre eles com interesse — Agora, se me der licença, preciso realmente voltar ao trabalho.  

Os dois caminharam até a porta de saída da cozinha, Eujin a abrindo para que Ha Jin, que balançava a cabeça agradecida, pudesse passar. Ela percebeu, enquanto servia alguns convidados, que o amigo havia se encontrado muito animado com Jung e Taeyang, e que conversavam entre sorrisos contidos observando um ponto oposto ao deles.

***

Sun já estava irritado com aquela reunião. Mal havia começado e ele já tinha vontade que acabasse. Preferia mil vezes estar trancafiado em seu quarto jogando algum dos seus MMORPG¹ favoritos, e acumulando experiência, do que sendo obrigado a conviver com aquelas pessoas irritantes ao extremo.

Comeu mais um daqueles docinhos, contrabandeados da sobrinha que passara sorrateira por ele instantes atrás, em uma tentativa frustrada de adoçar a noite, enquanto observava a nova governanta caminhando com uma bandeja entre os convidados sem se dar conta que também era observado pelos irmãos naquele momento.  

— Tudo bem com você, Sun?

A garota que chamara sua atenção era Doh Hea, colega de curso e filha de um dos sócios do pai, Doh Yoseob. Sun não sabia muito bem o que ela pensava sobre a vida, mas sempre aparecia quando ele menos esperava. Geralmente, ela vinha com assuntos que ele até consideraria interessantes, mas que, por partir dela, preferia se esquivar.

Doh Hea era uma jovem de dezenove anos, bonita, de cabelos longos cujas pontas mudavam de cor a cada quinze dias - no momento estavam laranjas - e que gostava de várias coisas de uma única vez. Entre as prioridades estavam esgrima, boxe, vídeo-game e Wang Sun.

— Depende do que você considera bom, Hea… — respondeu entediado.

— Isso está bom? — ela perguntou apontando para o último docinho que ele ainda tinha na mão.

— Não sei — em seguida o comeu — Parece que sim. O que veio fazer aqui?

— Papai foi convidado… E eu quis vir, de toda forma.

— Pra quê? Isso aqui está uma chatice — continuou, ainda mais rabugento.

— Depende para onde você estiver olhando — ela sorria para ele, os olhos brilhando.

Ao longe, Ha Jin permancera estática por alguns poucos quatro ou cinco segundos, percebendo, enfim, sobre o que os três herdeiros comentavam tão entusiasmados. Estavam observando o irmão mais novo ser abordado por uma garota, e aquela não era uma simples garota.

A governanta tinha consciência que todos os Wang, ou quase todos, estavam naquela casa, mas não imaginou que outras pessoas de seu convívio no palácio apareceriam alí.

Estava voltando para a cozinha quando viu a jovem conversando com Sun. Tentou coçar os olhos em uma resposta descrente do próprio corpo, mas aquela sensação estranha que se apoderava dela não permitiu. A menos que estivesse muito enganada, e ela sabia que não, há poucos metros de distância, acabara de rever Park Soon-duk.

Sorriu ao lembrar o quanto a garota havia feito no passado para conquistar, o pouco que fosse, o amor do príncipe Eun. Em seguida, entristeceu-se ao recordar o fim trágico que o jovem casal encontrou, o tempo que perderam por culpa das infantilidades do décimo príncipe, o que ela percebeu que parecia se repetir mil anos depois.

Observou os dois conversarem por um curto espaço de tempo enquanto refazia o caminho para a cozinha, até que Sun resolveu se afastar deixando Soon-duk com aquele ar tristonho tão conhecido pela governanta.  

Ha Jin parou onde estava e sentiu um desejo gritante de ir até Sun e lhe dar uns bons tapas por deixar a garota assim; queria lhe falar sobre o que ele perdia, sobre o amor que o acompanhava com o olhar, mas não pôde e se obrigou a fazer o mesmo que Soon-duk enquanto ele caminhava decidido em direção aos irmãos.

Taeyang, Eujin e Jung pareciam rir ainda mais agora que perceberam Sun se aproximando deles claramente constrangido. Ela entendeu rapidamente sobre o que tratavam tão entusiasmados tão logo viu Jung abraçar o irmão e lhe dar tapinhas de companheirismo nas costas; Eujin e Taeyang sorriam e falavam algo que ela sabia se tratar de Soon-duk, enquanto a face do recém-chegado assumia uma coloração avermelhada e contrariada.

As brincadeiras com o irmão continuaram até que Gun se aproximou com a noiva, Kim Na Na. Animados até instantes atrás, os rapazes pararam de sorrir esperando claramente que Gun falasse algo. Ha Jin, porém, se concentrou em Taeyang que assumiu uma expressão irritada, seu semblante mudando por completo, lhe fazendo lembrar de Wook em seu pior momento.

O pensamento veio e se foi velozmente, pois não demorou muito para que ela sentisse uma nova onda de sensações angustiantes transpassá-la, o coração doendo ao bater mais rapidamente, observando concentrada a cena que se desconstruia: Enquanto Gun se afastava, obviamente depois de perceber o assunto insignificante que reunira os irmãos, Na Na permaneceu parecendo à vontade próxima aos rapazes. As brincadeiras novamente se iniciaram e instantes depois todos, com a exceção de Sun, voltaram a se descontrair.

Ha Jin queria sentar em algum lugar. Os músculos das pernas e braços tremiam mais do que ela poderia controlar. Andou um pouco para trás e encontrou alguma segurança junto a uma parede. Seus olhos novamente focaram aqueles que lhe faziam respirar de forma acelerada: Taeyang e Na Na estavam juntos, sorrindo de um gracejo qualquer.

Tudo lhe pareceu claro como uma lâmpada que se acende na escuridão. Finalmente entendeu porque se dera tão bem com a prima desde que a conheceu. Entendeu também porque, em determinados momentos, tinha sentimentos incompreensíveis quanto a ela, como se ela fizesse parte de uma lembrança distante. Sabia agora o porquê de querer ajudá-la, enquanto lembrava de mais um momento de sua vida em Goryeo. Ela estava tão diferente naquele futuro… Sua prima Na Na também fora sua prima no passado. Ha Jin a reconheceu.

— Lady Hae.

***

Quando o senhor Wang anunciou o jantar, os convidados que ainda estavam de pé procuraram suas mesas e esperaram que as bandejas com variados pratos e bebidas refinadas chegassem até eles.

A orquestra encerrou o repertório de entrada e modificou toda a sequência de músicas iniciando a seleção que Yun Mi havia feito ao decidir que aquelas eram mais apropriadas para um momento de degustação.

De braços dados com o noivo, Kim Na Na realmente esperou que não precisasse seguir para a mesa a qual era conduzida, mas Gun fizera questão que eles sentassem com a senhora Min-joo durante o jantar. Imaginou quão mais agradável teria sido se estivesse na mesma mesa que os cunhados, sorrindo como fazia instantes atrás, mas sabia que não poderia fugir daquele sagrado ritual de humilhação.

Min-joo já a olhou com superioridade, como sempre fazia, de cima a baixo com ar de repugnância. Não era segredo para ninguém que ela detestava a nora e aquela condição não era agradável para nenhuma das duas, assim como a consciência que Na Na mantinha sobre a indigestão que sofreria após o jantar, caso conseguisse se alimentar.

— Boa noite, senhora Min-joo.

Na Na cumprimentou com simpatia tão logo chegou à mesa onde a mulher estava sentada. Observou a elegante senhora tomar mais um gole de sua bebida e repousar a taça sobre a mesa antes de se dirigir diretamente ao filho, sem nem se dignar a respondê-la.

— Gun, por onde andou…? Pensei que não viria me fazer companhia durante o jantar. Sei que não posso contar com Jung, ele é muito jovem, tem assuntos mais interessantes à sua idade… Como se compartilhar conversa fiada com esses meio-irmãos imprestáveis fosse importante...

— Não fale isso, mamãe — ele continuou a conversa e Na Na já começara a se sentir totalmente excluída — Eu nunca a deixaria desacompanhada por algum capricho idiota.

— Tudo bem... — a senhora continuou enquanto voltava a agarrar seu champagne — Mas compreendo também que você, ocupado como é em seus afazeres, teria coisas muito importantes a agilizar para esta noite.

— Sempre há tempo para a senhora, mamãe. Para mim, não existe nada mais importa que o seu bem e conforto.

A senhora sorriu satisfeita com a dedicação do filho e, em silêncio, o observou puxar uma cadeira ao seu lado, a oferecendo para Na Na que parecia tensa, contrariada e triste.

— Às vezes tenho minhas dúvidas sobre o que você acredita ser meu bem e conforto.

— Por que diz isso? — Gun perguntou com interesse preocupado, mas Na Na já entendera sobre o que se tratava curtindo o início de uma ansiedade cega de correr dali.

— Você realmente pretende se casar tão cedo? Eu já disse e repito: você tem outras prioridades na vida no ano que vem. Casamento não deveria estar ocupando seu tempo nesse momento. E se sua noiva realmente tem apreço por você tem que ser bem capaz de entender isso — Min-joo atalhou encarando a nora cheia de desprezo e Na Na suspirou, observando os pratos que eram colocados à sua frente.

Ela precisava dizer algo. Formular uma resposta boa o suficiente para trazer um pouco de dignidade ao seu ser e, com muita esperança, fazer o noivo acordar para as grosserias da mãe contra ela.

— Mamãe, pare com isso ao menos hoje, pode ser? — Gun falou antes, parecendo indiferente, tomando um gole de sua bebida.

— Não consigo compreender o que você ainda faz perdendo o seu tempo com esse tipo de coisa — a mais velha continuou a conversar com o filho como se Na Na, que os observava, não estivesse presente — Um homem de negócios deve mirar em objetivos mais certeiros na vida. Eu entendo suas necessidades, suas diversões, mas não deve esquecer de separar o joio do trigo para não acabar assim, como seu pai.

Na Na ficou em silêncio, engolindo mais daqueles discursos venenosos da sogra, que significavam, até mesmo ao ouvinte mais desatento, que a garota não estaria à altura do seu filho em nenhum momento. Que para Gun ela deveria ser considerada apenas uma aventura ínfima.

Remexeu a comida de seu prato esperando que o noivo falasse algo em sua defesa, mas novamente, e como de costume, ele não o fez, apenas contestando a mãe ao afirmar não ser inocente e saber fazer suas próprias escolhas, porém em nenhum momento falou algo lhe fizesse sentir protegida.

Ela olhou para Min-joo e se sentiu acuada. Depois de mais uma garfada, encontrou a prima caminhando entre os convidados e se lembrou da conversa tida no dia anterior. Suspirou entristecida confirmando o que dissera para a Ha Jin sobre o noivo: "Gun… Eu acho… Talvez ele não se importe..."

***

Na cozinha o trabalho parecia não ter fim, assim como aquela noite, então Ha Jin  preferiu não se perder mais uma vez em seus devaneios e resolveu voltar para a sala e continuar seu trabalho mesmo depois de reconhecer tantos rostos e recobrar tantas emoções. Quase colidiu com Jung quando atravessou a porta que separava os convidados dos empregados.

—  Jung! — exclamou assustada, controlando a bandeja, se corrigindo em seguida — Senhor Jung. Perdão… Quase aconteceu um acidente…

— Por que continua me chamando de senhor, Ha Jin?

— Porque estamos em um ambiente formal e não quero maiores prejuízos…

— Entendo… Eu estive pensando… Quando fui à piscina ontem, você disse que gostaria de me fazer companhia…

Ha Jin observou o rapaz e ponderou o que responderia àquela frase. Pensou que a única coisa que precisava naquela noite era trabalhar e se manter longe daquelas pessoas, porém se perguntou em seguida por que eles insistiam em se aproximar dela.

— Por que não saímos qualquer dia desses? — ele continuou receoso. Ela o observou curiosa enquanto ele se justificava, coçando o queixo, um pouco nervoso — Apenas para nos divertirmos, quer dizer… jogar conversa fora, tomar um sorvete… ou algo mais forte… Não sei os seus gostos...

— Senhor Jung, eu realmente preciso trabalhar. Podemos conversar sobre isso em outro momento? — tentou ser o mais gentil possível.

— Tudo bem, tudo bem… Nos falamos depois.

Enquanto se afastavam, Ha Jin percebeu os olhos da governanta Nyeo pousados sobre ela. Controlou sua postura e não vacilou, fatigada daquela situação. Sabia o que ouviria tão logo retornasse para a cozinha.

***

Yun Mi deslizava pela sala da mansão exibindo seu sorriso mais simpático enquanto esvoaçava o longo vestido perolado, feito em tecido finíssimo e especialmente para ela, recebendo com delicadeza os muitos elogios que havia se preparado para ouvir durante aquela noite.

Enquanto conversava com os muitos acionistas, e respectivos familiares, mostrando-se imensamente interessada em saber sobre os serviços da noite e se estavam satisfeitos, focou uma senhora, a única que tivera o péssimo gosto de escolher vermelho para aquela ocasião. Acenando educadamente para os sócios do pai com os quais conversava, pediu licença e se encaminhou até a mesa da solitária mulher.

— Está sendo bem servida, senhora?

Yun Mi se aproximou de Min-joo com o sorriso mais engessado que o normal. A senhora parou a taça que levava à boca no meio do caminho e voltou a colocá-la sobre a mesa antes de responder à mais nova.

— O cardápio não é dos mais refinados para o meu paladar, porém posso dizer que já estive melhor... Como, por exemplo, segundos atrás, antes de ter o desprazer de ver a sua cara de sonsa.

— Nossa... — Yun Mi sorriu ainda mais — Continua delicada e gentil como sempre, senhora. É bom ver que a idade não tem afetado a sua tão boa educação. Acredito que seja essa a razão de estar sempre assim — fez um gesto indicando as cadeiras vazias — Tão bem acompanhada.

— Escolho muito bem as minhas companhias… Não costumo me misturar com todo tipo de gente.

— Percebe-se… A senhora tem sempre um excelente gosto para tudo.

— Pare de rodeios e diga logo o que você quer aqui, garota? — Min-joo perdeu a paciência e falou mais áspera que de costume.

— Apenas vim ver se a senhora está bem, se não precisa de nada...  Tenho medo que as revelações que serão feitas pelo meu pai logo mais possam fazer com que tenha algum tipo de mal súbito, afinal, bem sei o quanto espera que Gun tome o controle da empresa e todos sabemos que não será assim.

— Do que você sabe? — a mais velha estava irritada...e intrigada.

— Não sei de nada, apenas tenho convicção de que seus planos para controlar a empresa não serão concluídos essa noite, senhora Min-joo. Saiba que essa empresa não será passada para Gun...

— Não? E será para quem? — Min-joo sorriu ironicamente — Para você? Uma menina mimada que mal sabe o que quer da vida? Hansol pode fazer muitas coisas que não concordo, mas uma certeza que tenho é que ele não é idiota o suficiente para confiar o que quer que seja relativo à sua fortuna a você, então não se dê ao trabalho de desovar suas serpentes perto de mim porque nenhuma delas será suficientemente venenosa para me picar. Sugiro, inclusive, que tenha cuidado para que elas não morram sob o seu próprio veneno.

Yun Mi manteve o sorriso, mas a face contrariada demonstrava o desgosto por aquela conversa. Olhou para a ex-esposa do pai ameaçadoramente enquanto a outra lhe devolveu um sorriso e a menção a um brinde, fazendo a jovem virar as costas e sair de perto da mulher que ria alto.

***

A jovem governanta estava sentada novamente, impedida de voltar com as bandejas para a sala. A governanta Nyeo estranhava o interesse dos herdeiros nela e acreditava ser melhor que a mantivesse afastada, ao menos pelo resto da noite, deixando-a responsável pela cozinha, o que ela, na verdade, também havia achado bom. Não precisaria se preocupar em servir àquelas pessoas e se focaria apenas em controlar a saída das sobremesas e bebidas até que aquela noite, por fim, acabasse.

Aproveitara que o jantar já havia sido servido e, finalmente, tinha encontrado um tempo para pôr em ordem as descobertas da última hora. Não conseguia entender como não fora capaz de lembrar de Na Na antes… Era Lady Hae, sua prima querida do passado que voltara igualmente gentil, e só agora entendia porque sempre sentiu que a conhecia. Agora que a lembrança havia voltado, sabia que precisava, de alguma maneira, ajudá-la a perceber qual dos Wang deveria escolher, qual deles era o certo para ela, embora tivesse consciência de que não poderia interferir em nada diretamente.

Da mesma forma, precisava, embora isso fosse bem mais complicado, convencer o jovem Sun de que estava jogando sua felicidade pela janela mais uma vez. Presenciou todo o amor de Soon-duk pelo décimo príncipe, tudo o que fizera e se dispôs a fazer por ele e sua felicidade, assim como viu Eun descobrir que a amava ao ponto de escolher enfrentar exércitos ao seu lado do que vê-la partir e o deixar; sentimento suficiente para não permitir que ela se fosse só.

Ha Jin novamente sentiu um aperto em seu coração e, daquela vez, era puramente a tristeza. Sabia que uma parte da culpa para o fim que eles tiveram era sua e, por isso, se sentiu impelida a fazer tudo o que pudesse, nessa vida, para que aquele mesmo erro não fosse cometido outra vez.

Como vou fazer para juntar vocês?

— Ha Jin, por favor, socorro — Ryung entrou na cozinha desesperada, interrompendo os pensamentos da outra. A face estava avermelhada e a expressão ansiosa — Eu sei que a governanta Nyeo te mandou ficar aqui, mas eu realmente preciso ir ao banheiro… Estou muito apertada e ainda preciso terminar essa bandeja de bebidas. Todos já estão jantando, eu preciso levar a bandeja, mas preciso ir ao banheiro… É só essa bandeja…

Ha Jin olhou para Ryun com a boca entreaberta. Entendia o desespero da amiga entre ter de fazer algo que necessitava e a obrigação que poderia lhe custar a cabeça. Sabia que levaria uma nova sequência de recomendações da governanta assim que a encontrasse servindo, mas precisava ajudar a amiga.

Enquanto via a outra correndo pela porta do fundo rumo aos banheiros externos destinados aos empregados, Ha Jin pegou a bandeja e caminhou cuidadosamente, porque seu conteúdo estava repleto e delicado, muito além do que ela vinha se acostumando a equilibrar naquela noite. A governanta, porém, deixou a cozinha tendo a impressão de escutar um  peculiar barulho de motor ecoando nos arredores da mansão.  

Sua intenção era chegar até as mesas de coquetéis para abastecê-las, sem focar pelo salão qualquer pessoa que pudesse fazê-la perder a concentração e colocar tudo a perder. Obstinada em sua tarefa, teve a atenção novamente desviada pelo atípico som além da reunião, pouco a pouco se sobrepondo à orquestra e aos burburinhos dos convidados, invadindo o salão.

— Oh garota, me sirva aqui — alguém nas mesas chamou sua atenção e, ao se virar para descobrir quem falava, deparou-se com Min-joo, a rainha mãe, acenando com dois dedos rígidos na direção dela.

Controlando sua irritação por ter de servir aquela mulher intragável novamente e já mentalizando que pediria as contas tão logo aquele jantar acabasse, notou os convidados se tornando agitados e curiosos diante do barulho externo que agora estava muito mais alto e rouco, não tendo dúvidas que era o som de um motor raivoso, e que  este não pertencia a nenhum carro.

Enquanto tentava se aproximar cuidadosamente de Min-joo, desviando de alguns convidados que se levantavam atentos com o estrondo, Ha Jin ouvia os muitos comentários exasperados vindos dos que permaneciam sentados nas mesas e procuravam em todas as direções o foco daquele infortúnio.

— Que som é esse? — alguém comentou.

— Mas de onde vem essa terrível barulheira? Que falta de respeito… — outra pessoa opinou, e mais dos presentes se uniram aos cochichos, concordando.

— Que horror…

Estava quase chegando na mesa de Min-joo que, ao lado do filho, e como os demais, olhava para descobrir quem ousava quebrar o clima tranquilo da noite com tamanho desrespeito sonoro, quando a orquestra subitamente interrompeu o som dos instrumentos se sentindo ofendidíssima por ter a música abafada daquele modo.

Então, o barulho morreu subitamente quando parecia prestes a adentrar na sala e, em seu lugar, no silêncio suspenso que todos fizeram por alguns segundos, foi possível escutar as portas de vidro da entrada principal deslizando suavemente para deixar alguém passar.

O rosto dos espectadores evoluiu do interesse irritado para o choque ao testemunharem quem entrava. Ha Jin, que estava quase na mesa da senhora que a chamara, observou Jung estranhamente curioso enquanto Gun contraia a face com irritação. Em seguida percebeu o rosto de Min-joo empalidecer como se ela estivesse prestes a ter algum piripaque e virou-se também para descobrir porque, ou por quem, o semblante da altiva criatura tanto se abalou.

Ele contornou o chafariz de diamantes e surgiu do outro lado. Jaqueta e luvas de couro, calça jeans e coturnos pretos, cabelos desalinhados, como se estivesse caminhando diretamente de outra dinastia para o presente, como se as eras tivessem sido suspensas e se fusionado numa única linha do tempo. O seu olhar, este sim era atemporal. Dele emanava a tão conhecida rebeldia, a alegria notória em criar o caos.

Wang So… Gwangjong... O rei de Goryeo…

Ha Jin foi sugada para dentro de um furacão de recordações profundas. As palavras que ele havia proferido no passado, a intensidade do quarto príncipe, retornando de uma vez só para dentro dela.

Você é a minha única rainha…

Você se lembra? O que eu disse antes? Você é minha.

Seja antes ou agora, ou no momento em que você tocou o meu rosto… Eu mudei meus pensamentos…

Se prepare… Jamais deixarei você ir embora…

Ele caminhou para o meio do salão sorrindo mordazmente, enquanto olhava para as mesas, focando alguns rostos, e disse a plenos pulmões para que ninguém ficasse em dúvida se o escutara ou não.

— Como assim vocês já começaram essa reunião sem mim? — um empregado passou carregando algumas taças e o rapaz roubou uma para si, erguendo-a diante de todos — Vamos lá… Cadê o brinde para a volta do filho pródigo?

Ele entornou a bebida ferozmente e todos que prestavam atenção na surpreendente cena de seu retorno se assustaram quando o estrépito de dezenas de taças de cristal se espatifaram pelo chão de mármore retinindo em centenas de cacos. As cabeças viraram dele para a jovem governanta que, de tão absorta, não se deu conta que acabara de derrubar todo o conteúdo da bandeja no salão.

Ela estava muito mais engajada em sustentar o olhar que So, curioso, lhe devolvia.

 


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Notas finais do capítulo

¹MMORPG - Modalidade de jogo online, onde vários jogadores interagem ao mesmo tempo com regras e atributos de RPG.
Ex. World of Warcraft, Ragnarök, Tibia.


Glossário
Go Ha Jin - Hae Soo
Ji Eun Tak - 4ª esposa de Wang Hansol
Khan Mi-Ok - amiga de Ha Jin
Kim Na Na - prima de Ha Jin
Li Chang Ru - 1ª esposa de Wang Hansol
Nyeo Hin Hee - Concubina Oh
Sung Ryung - empregada/amiga de Ha Jin
Woo Ah Ra - Imperatriz Hwangbo
Wang Eujin - Wang Baek Ah
Wang Gun - Wang Yo
Wang Ha Na - filha de Wang Sook
Wang Hansol - Taejo
Wang Jung - Wang Jung
Yoon Min-joo - Imperatriz Yoo
Wang Shin - Wang So
Wang Sook - Wang Mu
Wang Sun - Wang Eun
Wang Sun Hee - esposa de Wang Sook
Wang Taeyang - Wang Wook
Wang Yun Mi - Hwangbo Yeon-hwa