A Long Fall escrita por Kiara


Capítulo 3
II — Friendships




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Acordar na manha seguinte fora bastante complicado. Ontem eu havia conseguido porque estava com o objetivo de conseguir um emprego e minha matrícula na mente, e agora que havia conseguido ambos, a preguiça parecia ter me dominado por completo.

No final, tive que tomar um banho gelado para me livrar do torpor que o sono causou. Por a clínica ser longe da minha casa, cheguei mais tarde que o previsto, ainda mais exausta do que quando sai de lá. E tinha de agradecer a Scott, pois se não fosse por ele, eu teria ficado ainda mais cansada e sem forças para levantar hoje de manhã.

Me vesti da melhor maneira que pude, optando por roupas confortáveis e soltas, levando em conta o calor que faz já no começo da manha; blusa branca e caída de um ombro, calça escura e rasgada do joelho para baixo, o cabelo preso em um coque e o rosto sem maquiagem. Arrumei minha mochila, que é a mesma que usei durante todas escolas sue frequentei, e desci as escadas, roubando uma barra de cereais da geladeira. Em momentos como esse, agradeço pela mania de Jocelyn de encher a comida de geladeira, mesmo que não fique tempo suficiente para comer tudo.

Depois de quinze a vinte minutos andando, avistei o gramado da escola no mesmo instante que o sino tocou, anunciando que as aulas iriam começar. Agi com o instinto e não com a razão; comecei a correr pelas ruas asfaltadas irregularmente, chegando a tropeçar em vários buracos e quase indo de encontro ao chão, para, no final, chegar ofegante a porta principal. E descobri que a pior sensação que se pode sentir é a de ser observada por pessoas desconhecidas. É desconfortável, angustiante e sufocante, faz um tremor subir pelo peito e chegar a garganta, que fica seca de repente. O coração passa a bater em uma velocidade absurda contra as costelas, dolorosamente, assim como a respiração, que passa a ficar descompassada, pesada.

Havia acontecido diversas vezes comigo, a atenção focada em mim por ser a novata de cidades pequenas, que não possuem a banalidade de ter alunos entrando no final do ano. Com isso, havia aprendido uma tática efetiva para me manter estável e não ficar nervosa a ponto de gaguejar e ter o rosto avermelhado pelo rubor: Respirar.

Normalmente, em uma situação de perigo ou desconforto, o corpo passa a deixar de realizar algumas ações manualmente para poder se concentrar em alguns órgão vitais, que estão a beira de entrar em insuficiência devido ao grande nervosismo. A respiração é uma dessas ações. Você não sabe que a respiração está presa até seus pulmões clamarem por alivio. Sabendo disso, inspirei longamente, deixando um sorriso expandir-se por meus lábios para mostrar que eu não me importava com os murmúrios e olhares tortos. Pouco me importa o que achariam de mim, que primeira impressão causaria; estou mais preocupada com meu armário, meu horário anotado em uma folha amassada e colocada no bolso traseiro da minha calça e nas provas, que pelo que o diretor disse-me, dessa semana.

Puxei a mochila para mais perto dos meus ombros, começando a andar apressadamente pelos corredores, desviando de alguns adolescentes que estão preocupados demais conversando para sair do meio do caminho. Feito isso, parei em frente ao armário de número 482, a cor vermelha desbotando-se e tendo o branco sobrepondo. Deixei os livros que não constam no primeiro horário ali e encaminhei-me em direção a minha sala, ciente do meu pequeno atraso para o primeiro dia.

Esperava, e muito, que seja lá quem for o professor que esteja em minha sala, me deixasse entrar e desconsiderasse meu atraso.

Porém, tive essa expectativa quebrada ao ver uma mulher de expressão amargurada, rosto rechonchudo e roupas escuras sentada na cadeira no centro da sala, tamborilando os dedos sobre a madeira da mesa. O olhar zangado, quase intimidante, deixava claro sua irritação em estar ali, e que qualquer um que ousasse abrir a boca, teria a trágica punição de ser mandado para fora de sua aula. Mas eu já estava para fora, e temia ser apanhada pelo diretor ali, escorada na porta da sala, esperando a sorte me ajudar a conseguir entrar naquela aula.

E de certa forma, fora isso que aconteceu.

Senti uma mão tocando meu ombro, virando-me na direção do sujeito e tampando minha boca no mesmo instante que a abri para soltar um grito. Relaxei aos poucos ao ver que era Scott, exibindo um sorriso divertido e tendo as sobrancelhas arqueadas.

— Atrasada? — quis saber, divertindo-se em ver meu rosto assumir a coloração avermelhada pela vergonha.

Sem conseguir evitar, abaixei a cabeça, jogando o cabelo sobre o rosto para cobri-lo. Não quero que ele pense que não tenho pontualidade, pois isso pode afetar o emprego fixo que estou próxima de conseguir. Mas também não posso negar que estou atrasada, nunca gostei de mentir e acredito que falta de sinceridade afeta o futuro.

— Sim, estou. Eu achei que estava adiantada, gastei tempo procurando meu armário e acabei me atrasando. — admiti, um tanto quanto encabulada, porém, levantando a cabeça para olhá-lo com firmeza, deixando claro que não me arrependo.

Já havia notado que Scott sempre tem reações contrárias as que espero, e não foi diferente hoje. Ele sorriu, do mesmo modo que ele fizera ontem e que faz seus olhos se encolherem, depois empurrou a porta da sala com cuidado, evitando fazer barulho.

— Eu vou entrar primeiro e distrair a professora, entre em seguida e vá para o final da sala. — avisou, o tom de voz baixo.

Enquanto via sua figura musculosa adentrar a sala e chamar a atenção da professora, que começou a lhe dar uma bronca de costas para a porta, fora inevitável comprimi os lábios, sabendo que teria que agradecer mais tarde.

Empurro a porta com cuidado, indo para o final da sala como instruído. Por sorte, os alunos presentes não se importaram nenhum pouco com minha presença, preferindo aproveitar que a professora está distraída para conversar. E também, a ultima carteira está vazia, um ótimo lugar para poder me camuflar e passar despercebida pela professora.

— Não quero escutar suas desculpas esfarrapadas, McCall, se chegar atrasado mais uma vez, irá direto para a diretória. — escutei a sentença da professora sobrepor-se aos murmúrios dos alunos, calando qualquer um que conversava.

Engoli em seco quando Scott anuiu com a cabeça e encaminhou-se para a carteira na frente da minha, que, incrivelmente, está desocupada.

— Obrigada. — sussurro, não querendo atrair a atenção indesejada da professora.

Scott anuiu com a cabeça, como fez instantes atrás, ajeitando-se na cadeira e prestando atenção na aula, o que, depois de alguns minutos, também o fiz.

[•••]

Nas duas aulas seguintes, foquei-me em chegar no horário estipulado e prestar atenção nos professores. Estava dando certo, consegui acompanhar as matérias, responder algumas perguntas dos professores e sanar algumas dúvidas.

Era aula de matemática. Depois que a mesma acabasse, seria o intervalo, onde os alunos iriam para o refeitório comer e conversar. Nesse período de tempo, permaneceria estudando, pois como cheguei no final do ano, as provas retrasadas terão que serem aplicadas para que eu tenha notas no semestre. E, encarecidamente, não posso depender apenas da minha força de vontade para me sair boa no ano letivo.

— Isso é tudo por hoje, alunos. — a professora de inglês, sendo uma mulher jovem, de cabelos claros e olhos igualmente da mesma coloração, abriu um sorriso quando o sino bateu.

Me levantei e ajeitei meus materiais, saindo da sala. Fui primeiro para meu armário, onde deixei meus livros, e depois, quando estava prestes a seguir o aglomerado de alunos para o refeitório, Scott, junto de um garoto, apareceu em minha frente.

— Charlotte, esse é Stiles. — apresentou, apontando sutilmente para o garoto ao seu lado, que abriu um sorriso pequeno.

Stiles possui uma postura desajeitada que logo notei. Além disso, os cabelos negros são revoltos, e os olhos verdes, pequenos, possuem um brilho maroto, como quem está sempre tramando uma brincadeira. O corpo magro, sem musculatura, está coberto por roupas escuras, sendo apenas os sapatos coloridos.

— É um prazer conhece-lo, Stiles. — cumprimentei-o, educadamente.

Scott começou a andar, acenando com a cabeça para que eu e Stiles fizéssemos o mesmo, o que, depois de alguns instantes, obedecemos. 

— É de Odense, certo? — Stiles, que havia passado a caminhar ao meu lado, perguntou, gesticulando. Anui brevemente com a cabeça, incentivando-o a prosseguir. — Por que mudou de cidade no final do ano letivo? Não seria mais sensato ter permanecido na antiga cidade, finalizado os estudos, depois vindo para cá nas férias? — quis saber, o brilho maroto dos olhos sendo substituído pelo da curiosidade.

Aquela pergunta me fez engolir em seco, chegando ao ponto que doía ser debatido. Mas mesmo sendo um assunto delicado, ainda preferi dizer a verdade, acreditando ser melhor contar de uma vez do que esconder.

— Não tive escolha, minha mãe trabalha com publicidade e o emprego exigi que ela se mude constantemente. — comecei a explicar, usando as mãos para tornar minha explicação mais sólida. — Recentemente, chegamos aqui. E eu fui emancipada. — completei, as palavras custando sair e causando um gosto amargo na boca ao serem pronunciadas.

Stiles percebeu meu incômodo, até mesmo Scott, que estava a pelo menos dois metros a nossa frente, diminuiu o passo para andar ao meu lado. Ambos os garotos começaram conversas aleatórias para diminuir o clima pesado que havia se propagado, e na maior parte do trajeto para o refeitório, permaneci rindo ou sorrindo.

Passei os quinze minutos de intervalo conversando, debatendo com ambos os garotos sobre as matérias extracurriculares que fiz em minhas antigas escolas. Até mesmo ofereci ajuda em matemática a Stiles, que mostrou-se com dificuldade, achandoo engraçado o modo como a coloração vermelha atingiu o seu rosto, chegando a suas orelhas.

Quando o sino soou, avisando para que todos voltem a suas salas, fomos os últimos a ir em direção aos armários, apanhar os livros para o próximo horário. Enquanto Stiles ia na direção oposta a minha e de Scott, por conta de seu armário ser distanciado do nosso, o emprego me veio a mente, assim como a falta de informações que eu havia pedido ontem.
 
— Scott, que horas devo ir para a clínica? — perguntei, finalmente lembrando-me daquele detalhe crucial.

No desespero de conseguir um emprego e de voltar para o conforto da minha cama, não perguntei nada sobre o primeiro dia de serviço, nem o mais importante, como o horário. Tive sorte por McCall ter vindo a aula, pois de certo, iria acabar indo direto para a clinica para não correr o risco de me atrasar. 

— As duas e meia. — respondeu, apanhando os livros no último armário da parede, a dois do meu.

— Certo, qual é mesmo o endereço? — inquiri, sentindo-me momentaneamente constrangida por fazer tal pergunta.

O olhar divertido que Scott me lançou, aproximando-se, só conseguiu me deixar mais encabulada.

— Posso passar na sua casa e lhe levar para a clínica, caso queira, assim não vai precisar pagar um táxi ou ir a pé. — propôs, apoiando seu corpo no armário ao lado, os livros embaixo do braço.

Senti meus olhos arregalarem-se lentamente perante a oferta, minha boca abrindo-se diversas vezes, mas nenhuma palavra saindo.

— Eu adoraria. — respondi, depois de instantes em silêncio, abrindo um sorriso imenso por conta da felicidade. — Quer dizer, se não for incomodar, eu adoraria. — corrigi, pigarreando, um tanto quanto constrangida.

Nunca fui uma pessoa fácil de ficar sem jeito, mas aqui, nessa escola, principalmente perto de McCall, tal ação está acontecendo com mais frequência que deveria.

— Não há problema algum, passo na sua casa as duas. — sibilou, passando as mãos pelos cabelos, o olhar desviando-se para longe.

Fechei meu armário e ajeitei os livros nos braços, começando a caminhar, junto de McCall, para a sala de aula, onde encontramos Stiles, que também teria a mesma aula que nós. Dessa vez, no entanto, fiquei em júbilo, observando, com certa felicidade, que estava me tornando amiga de ambos os garotos e que os mesmo, de forma despercebida, conseguiram tornar minha estadia na nova cidade mais agradável.


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Notas finais do capítulo

Meu atraso não foi proposital, mas justo semana passada, quando fui postar, fiquei sem internet até ontem. Aproveitei isso para escrever mais capítulos e voltar a ter um bom estoque, e posso afirmar que a calmaria vai durar bem menos que esperam. Estou deixando os primeiros capítulos mais tranquilos, mas logo, logo começa as "tretas" kjakkk.

Tenho que agradecer a quem está comentando também, amo responder todos os comentários, a quem acompanha e favorita também, só fazem a fanfic ir pra frente ❤ Obrigada mesmo ❤



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