Damned escrita por IS Maria


Capítulo 7
Controle


Notas iniciais do capítulo

Essa história terá ao todo, 26 capítulos. (Contando com prólogo e epílogo)
Fiquem atentos para a atualização.



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Kate sabia que a qualquer momento Carlisle chegaria, provavelmente preocupado, querendo saber o que havia exatamente acontecido. Ela não podia deixar de imaginar se seus pais biológicos não tinham a deixado por já sentirem o problema que ela causaria. Era impressionante como, mesmo em uma segunda vida, depois da morte, ela ainda não havia encontrado descanso.

Ela ficou sozinha e seus olhos imediatamente se encontraram em seu reflexo no espelho. Era estranho olhar para uma nova versão de si mesma, mas agora ela podia ver tudo. Antes era como estar cega, estar presa em borrões escuros sem fim.

 

“Eu deveria estar cega.

Pela primeira vez, com as sombras turvadoras e a fraqueza limitadora da humanidade extraídas de meus olhos, eu vi seu rosto.”

           — Bella, em Amanhecer

 

Por um tempo, foi como se não se reconhecesse dentro de sua própria pele e por muitos dias, não compreendeu o que sentia. Os primeiros dias foram dominados pela sede, que parecia ser tudo no que ela conseguia pensar e depois a estranheza de tudo ter mudado. Foi uma montanha russa e ela esperava, como todos a diziam, que tudo ficaria mais fácil...mas por quê tudo não parecia ficar mais fácil?

Kate sentiu a ardência voltar para a sua garganta. Não, na verdade ela não tinha a deixado, Kate só tinha a ignorado desde a última vez que se alimentou. A sede, às vezes, lhe parecia incontornável, insuportável, mas a solução era se agarrar a qualquer coisa. Dentro de si haviam as coisas que ela valorizava e que ainda acreditava serem importantes.

 

“Quem você caça é o tipo de decisão que se deve tomar antes de farejar a presa.”

— Bree, a breve segunda vida de Bree Tanner (uma história de eclipse)

 

O que, ou quem, se caçava, dizia muito sobre o tipo de pessoa que era e quem Kate acreditava ser, era tudo o que ela sempre teve. Quando não se tem nada material ou de valor, ou qualquer outra coisa, na vida, fazia ser mais simples pesar a moral e encontrar a essência real ou o sentido de grande parte das coisas.

Kate teria que se lembrar de pedir a Carlisle por alimento, mas reconhecia ter de aprender a sobreviver com o menos o possível.

Ouviu passos no andar de baixo e soube os identificar. Carlisle estava na casa. Seus sentidos, diziam a Kate que era cedo demais para que ele estivesse ali o que implicava que ele estaria mais preocupado do que Kate pôde prever.

Pensou ir para o encontrar e no próximo segundo estava diante a ele. Era assim que seu corpo funcionava, ela pensava e estava feito...às vezes tão rápido que nem conseguia registrar os movimentos.

— Eu estou bem. - Disse a primeira coisa que veio em sua cabeça.

— Eu gostaria de examiná-la. - Ele tinha olhos mais profundos. Kate  concordou com um movimento de cabeça, mesmo sem saber se aquilo ajudaria.

Foram juntos até o primeiro ponto que encontraram onde o sol não estaria coberto por nuvens e Kate se expôs a luz. Em algum momento estava atenta às emoções que Carlisle transmitia, mas logo se distanciou.

A floresta trazia uma sensação distinta naquele momento. Ela não sabia dizer se era por ainda estar sentida pelo que havia se passado ali hoje, mas podia se sentir puxar para os cantos escuros. Quase como uma vibração, vinda das árvores, era uma energia diferente. Talvez só estivesse impressionada com a possibilidade de haver um vampiro, que ela não conhecia, bem ali perto, caçando no território deles, mas era quase como se sentisse ser observada.

Tinha de admitir que se realmente fosse alguém ali, sua energia era bem forte e se perguntou como não havia o encontrado antes. Alguém com aquele tipo de presença, não simplesmente desaparecia.

Ignorou o que sentia. Carlisle parecia completamente alheio, com seus olhos presos nos braços de Kate e se ele não parecia notar a tal presença, era porque provavelmente não havia ninguém ali e Kate estava exagerando.

Mas não conseguiu mandar a desconfiança embora. Era como se todos os seus instintos estivessem atentos, prontos para tomarem conta e sair em modo predador, para caçar.

Devia ser a sede.

— E ai? — Ela o observava com os olhos cravados em sua pele, como se a qualquer momento algo pudesse acontecer.

— A sua pele é semelhante, a olhos nus, a qualquer uma das nossas. — Ele parecia frustrado. Aquilo era algo que ele não compreendia e ele não gostava de não saber o que fazer.

— Então tá tudo bem, não é? É isso o que quer dizer?

— O que eu quis dizer...é que não consigo ver nada. — Ele a olhou nos olhos. — Mas não vou desistir por agora. — O sorriso dele era uma maneira de a tranquilizar.

O que Carlisle acreditava, levando em conta a sua experiência, adquirida ao estudar por séculos e ao trabalhar com doenças, que, a doença de Kate, que já estava em estado terminal, tinha trazido mudanças significativas ao seu organismo e como consequência, o corpo dela não se transformou como um corpo saudável se transformaria. O veneno deveria ter reparado algumas coisas, como os estragos aos ossos, mas outras, e outras sofreram mutações.

Mas ele não podia ter certeza e mesmo se tivesse, restava saber até onde o veneno tinha reparado e onde começavam as mutações.

Carlisle a ouviu limpar a garganta e seu rosto se tingiu de tensão.

— Espere aqui, vou ir na casa buscar uma bolsa de sangue. — Foi como se ele adivinhasse seus pensamentos.

Kate tirou dos bolsos o ipod que Nessie havia a dado de presente e colocou os fones de ouvido. A música deveria ser o suficiente para inibir parte de seus sentidos e a fazer parar de pensar pelo momento que teria de esperar.

O pior momento da sede, era a espera antes de sacia-la. O corpo todo antecipava o momento em uma ansiedade que parecia crescer como crise de abstinência para um viciado e era muito mais difícil se controlar.

A música era calma e a letra não era complicada, mas ela podia sentir a batida crescer dentro de si. Ela podia sentir cada nota com profunda intensidade, quase como se os arranjos da canção a fizesse vibrar. Suas mãos dançaram junto à melodia...seus braços... e então o seu corpo.

Como uma consequência de seus reflexos. Ela pensava em dançar e quando poderia se dar conta, já o fazia.

Seus lábios se moviam junto às letras da canção. (Hunger - Florence and The Machine).

 

“We all have a hunger… tell me what you need, oh you look so free, the way you use your body, baby, come on and work it for me”

 

Todos possuíamos uma fome, certa voracidade e cabia a cada um saber do que precisava. É quando seu corpo está livre que se saber ter encontrado o que falta.

 

“We never found the answer but we knew one thing...we all have hunger.”

 

Só que Kate sabia que, independente de sua fome, ela não precisava deixar que a sua necessidade definisse quem ela era. Pela primeira vez, podia dançar daquela maneira sem sentir dor alguma, sem precisar de medicações, sem ter quem controlasse ou assistisse cada um de seus movimentos. Pela primeira vez, ela era responsável pela maneira como usava o próprio corpo, não haviam limites e não havia data de validade.

Aquilo não era o bastante para suportar os outros problemas? Teria de ser.

Carlisle retornou, mas não a interrompeu. Eram momentos como aquele que o faziam ter certeza de que ele havia feito a escolha certa. Kate não merecia morrer, ela tinha vida demais dentro dela para que deixasse tudo ir embora.

Mas Kate pode sentir o cheiro de sangue e no próximo instante estava em frente a Carlisle, olhos atentos e um chiado a deixar sua garganta enquanto rangia os dentes.

— Calma. - Carlisle preparou o sangue. — Tente manter em mente o que explicamos...vá devagar e..

— Espera...quanto sangue tem aí? — Ela apontou para a bolsa em sua mão.

— O equivalente a um adulto. — Carlisle não parecia completamente confortável.

— Isso é mais do que eu tomei da última vez. — Cada pequeno pedaço do corpo de Kate era atraído pelo cheiro, mas sua confusão era alarmante.

— E você precisou se alimentar mais rápido do que eu previa. Agora...vamos…- ele a entregou a primeira bolsa de sangue.

Kate não permitiu que seu cérebro se desligasse todo e lutou para que sua consciência ficasse. Tentou ir devagar, o quanto pode, cometendo alguns deslizes no caminho.

E veio mais uma bolsa…

E outra…

E vieram até que o ardor já não a incomodasse tanto, mesmo que ele ainda estivesse ali.

— Não vai poder tirar tanto sangue assim do Hospital sempre. — Ela limpou a boca com as costas da mão.

— Se tivermos sorte, não vamos precisar fazer isso para sempre. — Ele parecia esperançoso, mas com dificuldade de acreditar em suas próprias palavras. — Com o tempo, o seu autocontrole aumenta e vai poder passar mais tempo driblando a sede.

— Podíamos tentar mais vezes com o sangue de animal — Ela parecia incerta com a maneira de Carlisle de ver as coisas. — Ou quem sabe misturar os dois.

— Misturar os dois é uma boa ideia. — Ela tentaria se lembrar disso. — Eu trouxe mais livros para você, vi que estava interessada em história.

— Obrigada. — Ela espantou o sentimento ruim e tentou sorrir. Já estava ficando sem opções para ler durante a noite.

— Estão na casa. - Carlisle começou a andar na frente. Mas Kate sentiu o cheiro de Seth se aproximar. Ela poderia ir e o ignorar, mas sabia que ele daria um jeito de a ver na casa.

— Vai indo na frente...Seth quer falar comigo.

E assim que Carlisle já não estava mais a vista, Seth a alcançou. Kate ainda estava na clareira onde a pouco havia se alimentado.

— Você não tem nada melhor para fazer? - Soou como uma brincadeira, mas ela realmente estava irritada. Mais cedo ele havia a colocado de lado como se ela não fosse nada. — Estudar? Trabalhar? Qualquer coisa?

— Você sabe que eu largo qualquer coisa quando sinto seu cheiro por perto. — Ele se aproximou, mas ela o desviou e quando ele percebeu, ela estava sentado em um dos galhos de uma das árvores mais altas.

— Não estamos nem um pouco perto da reserva. — Ela não facilitaria para ele.

— Certo...mas, precisávamos conversar sobre…

— Não! Eu sempre fui rápida para pegar as coisas. - Os olhos dela o dilacerava aos poucos.

— Você não entendeu nada pelo visto, Kate. — Mas aquilo só piorou. Kate tinha um temperamento que não podia controlar e ele deveria saber disso. Em menos de um segundo, ela já havia chegado até ele e jogado seu corpo sobre o de Seth. Com seus dedos ao redor de seu pescoço, ele tinha dificuldade para respirar e com as pernas dela ao redor de seu quadril, ele tinha dificuldade para se mexer.

— Quem não entendeu foi você...lobo… Talvez eu tenha dado a entender que eu sou mais fraca do que pareço ou que sou fácil demais — Ele viu o vermelho nos olhos dela se tornar ainda mais intenso. — Talvez eu sorria demais ou te deixe no controle mais do que deveria, mas as coisas não são assim. — Ela sorriu e o soltou.

— Kate. — Ele protestou, se levantando rapidamente enquanto a via ir embora.

— Não vou colocar um dedo em você de novo, Seth, a não ser que você implore. — Kate reconhecia que talvez estivesse sendo dramática demais, mas pelo menos tinha feito claro o seu ponto. Ela tinha se sentido humilhada e com o orgulho ferido, sempre era ela quem buscava um contato mais íntimo ou tentava aprofundar a relação dos dois e ele a afastava no final. Ela precisava mostrar para ele que não estava mais disposta a ir atrás e que ele teria de mudar muito se quisesse o que tinha a oferecer.

Mas a chegar na casa, Kate sentiu que talvez deveria ter prolongado sua discussão com Seth. Tinha um humano ali, ela podia sentir o seu cheiro se aproximar da entrada da casa.

Nessie a viu através das paredes de vidro e logo se aproximou.

— o vovô Charlie veio fazer uma visita surpresa. — Ela enfiou no rosto de Kate um par de óculos escuros. — Isso deve te ajudar com os olhos. Se lembra o protocolo?

— Não sentar tão reta, lembrar de piscar os olhos...não respirar para mexer os ombros para pensarem que estamos respirando. — Kate revisou tudo em sua cabeça. — Eu posso só voltar para floresta...me afastar.

— Você vai precisar passar por isso uma hora ou outra, vai dar tudo certo KitKat. - Nessie passou seu braço pelo o de Kate e a levou para dentro. Kate se deslocou para perto de Carlisle, passando o seu braço pelo o dele caso ele precisasse a segurar.

O humano bateu na porta e Nessie foi o receber. Ele tinha cheiro de amêndoas e amendoim salgado. Kate prendeu sua respiração como se sua vida dependesse disso.

— Você não vai mais me visitar  tanto quanto costumava ir. - Charlie abraçou Nessie. — Tive que vir até aqui te ver. Carlisle. — Charlie o cumprimentou e em seguida, seus olhos encontraram Kate. — Eu acho que não conheço você. — E ele se aproximou.

O fogo ardeu novamente em sua garganta e ela teve dificuldade em pensar.

Ela podia sentir o calor que saía da pele dele…

 

“Ouvir sua pulsação latejando bem perto da superfície (...) A sensação era de que eu estava muito perto de me rasgar ao meio na tentativa de continuar onde eu estava. (...)”

                                    — Bree, A breve vida de Bree Tanner.

 

Mas se controlar, era a única maneira de continuar viva. Tentou manter isso em mente.

O humano estendeu a mão e foi como se pudesse sentir o mundo parar sob seus pés e ela se tornar o corpo mais pesado a pisar na terra. A dor era infernal.

— Sou Charlie. — A voz dele indicava que ele era bom e que não fazia a menor ideia de onde estava ou com quem estava lidando.

Todos estavam estáticos no cômodo, em posição de alerta...os segundos passaram a se arrastar como se durassem minutos completos.

— Katerina.... Mas me chamam de Kate. — Ela soltou as palavras como se soltasse um grito doloroso, tendo de se controlar até para manter um tom aceitável de voz. Apertou a mão dele e pode sentir a pulsação contra a sua pele.

— Ela se mudou recentemente. — Carlisle interrompeu, ainda ansioso demais para confiar na situação.

— Mais uma Cullen. — Ele brincou e Kate sorriu, independente da dor que sentia. — Óculos escuros em Forks? — Ele olhou para Nessie.

— Conjuntivite. — Kate explicou, mantendo-se um pouco mais próxima de Carlisle.

— Por quê não vai dar uma olhada nos livros que eu te falei? Estão no andar de cima. — Carlisle sussurrou. Kate entendeu.

Mas se afastar, lentamente para que ele não percebesse seus movimentos, foi ainda pior. “Se eu conseguir passar por isso, posso fazer qualquer coisa.” É o que ela dizia para si mesma a cada passo.

Quando não estava mais na sala e o cheiro não era tão forte, ou o barulho do coração dele, ou a intensidade de sua pulsação, foi como se tirassem uma tonelada de suas costas. Ela tinha conseguido...ela tinha se controlado...tinha demorado, mas ela tinha começado a se controlar.

 

***

 

A essa altura, Caius já havia percebido que a novata tinha feito com que Carlisle fosse contra seus próprios princípios e alimentasse um vampiro com sangue humano. Por quê não a fazer seguir a dieta que ele seguia a séculos? Por quê ela era tão diferente dos outros e por quê ele se preocupava tanto?

Caius era mais ganancioso do que deixava transparecer e suas descobertas recentes o dopava em uma excitação que ele não sentia a muito tempo.

Se ao menos ele fosse prudente o bastante para observar de longe.

Mas ele precisava a ver de perto.

— Venha. - Sem tirar os olhos da casa dos Cullen, ele se dirigiu a Raziel.

— Para onde vamos?

— Precisamos de um lugar para ficar.

— A garota não parece ser uma ameaça, mas Aro gostaria de ser imediatamente informado destas descobertas — Raziel se mostrava especificamente incerto e ainda possuía rastros da inicial lealdade por entre cria e seu criador. Aro tinha o criado e ele parecia desejar honrar isso.

— Oh, eu sinto que estamos a um passo de colocar as mãos em algo interessante, só não vamos estragar isso.

Caius calculava qualquer movimento antes de o fazer e reconhecia que talvez estivesse forçando para ver algo onde não tinha nada, mas ele não conseguia mandar embora a sensação de que havia algo para ser visto.

 

Katerina...



***

 

— Nem pensar. — Carlisle nem terminou de ouvir a ideia de Renesmee.

— Por favor...você viu o quanto ela foi bem hoje mais cedo. — Ela insistiu, apelando com os olhos, para que sua mãe a ajudasse a convencer Carlisle.

— Ela lidou bem com um humano, não com dezenas deles. — Esme se mostrou do lado de Carlisle.

— Mas vai ser bom para ela, não ter que ficar nessa casa por uma noite que seja… e O Jacob vai estar lá, ele é forte...e  o Seth também. — Renesmee estava empenhada em conseguir o que ela queria.

— Cachorros não são o suficiente para vigiar um leão. — Rosalie não podia deixar de achar engraçado.

— Então vocês podem vir, mas não acho justo que Kate não veja nada além das paredes dessa casa, não tá ajudando ela a se preparar para conviver com humanos.

Um longo silêncio se sucedeu.

— Você...acha que consegue Kate? — Carlisle não concordava, mas também não queria dar a entender que não confiava no potencial de Kate.

— Eu...acho que não. — Kate cravou seus olhos em Nessie, deixando claro que ela também considerava aquilo uma ideia ridícula. — Mas, sei que consigo correr da situação...se me sentir perder o controle. — E ela conseguia...se seu cérebro não se desligasse e ela entrasse em modo de caça.

— A escolha é sua. — Carlisle parecia arrependido daquelas palavras no instante em que as disse, mas esperava pelo melhor.

E Kate mal pode acreditar que pela primeira vez na vida, ainda que ultimamente viesse vivendo muitas primeiras vezes, iria em uma festa.

 


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