Damned escrita por IS Maria


Capítulo 13
Dom




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Deveria ter ido embora quando o ouvira dizer o próprio nome. Ela sabia de quem se tratava, lembrava-se das histórias que haviam lhe contado. Não havia nada que a segurasse ali.

Queria dizer ter ficado por não conseguir se mexer.

Queria dizer ter ficado por não ter escolha.

No entanto, ela conseguia se mexer, tinha escolha e tinha escolhido ficar.

Podia ver em seus olhos que ele esperava vê-la ir embora e ela teve o prazer de quebrar suas expectativas a cada segundo que escolhia permanecer ali.

— O que você quer de mim? — Seus lábios arrastaram cada palavra.

Kate sentia-se desmanchar sob seu olhar, mas, manteve-se firme.

— O que você pode me dar? — Os olhos dele procuravam nela, como uma escavadeira procura à terra.

Não deixou-se ser devorada. Ela tinha visto o suficiente para saber que ele esperava vê-la ceder.

— O que te trouxe aqui? — Kate mordeu os lábios.

Em um outro momento — onde um outro alguém perguntasse - Caius teria levado aquela atitude como motivo o suficiente para arrancar sua cabeça fora e jogá-la ao fogo.

— Eu te dei o direito a apenas uma pergunta. — Ele tocou sua boca em um movimento breve e se afastou.

Ela sabia estar fora de seu lugar, mas, não havia qualquer garantia de que o veria de novo se saísse pela porta. O motivo de querer o ver novamente, não era uma pergunta que ela se preocupava em responder naquele instante.

— O que você quer?

— Eu teria que querer alguma coisa? — Cruzando os braços, sua postura se tornou defensiva.

— Se é quem diz ser...— Ignorou qualquer instinto de sobrevivência que a alertava para manter a distância e se aproximou dele, o suficiente para que ele a sentisse perto. — Poderia ter pedido a minha cabeça por atacar o garoto na festa, por quê me salvar? — Sussurrou.

— Porque não seria tão divertido.

— Por quê sinto que não é a verdade? — Ele se virou mais uma vez.

— Porque você sente demais.

— Não faz sentido.

— Eu não tenho qualquer obrigação de fazer sentido para você. — Ele era bom em esconder, mas ela conseguiu ver exatamente o que precisava.

Incerteza.

Ela apenas sorriu.

— Eu deveria voltar para casa agora.

— Eu posso levar-la. — Ele a deu as costas.

— Isso seria extremamente desnecessário.

— Bom,  eu adoro perder o meu tempo com coisas extremamente desnecessárias.

Kate sentiu uma nova presença na casa. Não esperou ter certeza, seu corpo agiu como havia sido treinado para agir.

Imperceptível ao ouvido humano, o ar, abraçando a presença de um novo corpo, molda-se para acolher cada movimento.

Tudo o que ela precisou fazer foi ouvir com atenção.

Não tinha coração ou qualquer pulso. Seus movimentos eram desleixados, mas, bem assistidos. Cabelos longos, sujos de sangue. Mulher.

Vampira.

Em instantes, mantinha a “intrusa,” preso sob seus braços. Seus reflexos não eram rápidos, ou limpos, o suficiente. Era mais velha, não apenas em tempo de transformação.

Tinha acabado de caçar, aroma do sangue de cervo ainda estava por toda parte. Isso deveria a tornar oponente capaz, porém, Kate era uma recém-criada, semi-treinada. Não era uma disputa justa.

— Caius...— A mulher procurou por ele.

Ele a conhecia?

— Katerina...por favor. — Kate, de costas para ela,  entendeu. Soltou-a. Trocaram olhares por alguns segundos. — Para o quarto. — A ordem havia sido clara e a vampira não pareceu pensar antes de obedecer cegamente.

Então ele a conhecia.

Ele não morava sozinho.

— Então você não está sozinho. — Ela disse sobre o ombro. “E se eu não for o único.” Ele havia dito quando se conheceram.

Não disse nada. Ela o ouviu alcançar as chaves do carro. Não fez questão de o impedir.

Port Angeles ficava a uma distância segura de Forks, pouco mais de uma hora, ainda que parecessem se tratar de duas atmosferas completamente distintas. Kate amava correr, sentia que o direito tinha lhe sido privado por uma vida toda, mas, tinha descoberto não odiar carros também. Ela apreciava a vista.

— Eu tenho um namorado também. — Disse enquanto olhava a paisagem da cidade, aos poucos, ceder para a floresta. Seth não era nem seu namorado.

— Nora não é minha “namorada.”

Kate sabia que não. Podia dizer pela maneira como ele havia se dirigido a ela.

— E você tem uma?

— Eu tenho uma esposa.

Deveria ser o suficiente.

Deveria bastar.

Tinha escolhido não dizer mais nada durante o caminho que ainda restava. Não por não saber o que dizer, mas, por sentir não precisar ser dito.

O carro parou a uma distância segura. Não o suficiente para serem notados, mas o suficiente para não ter de caminhar muito, usando apenas uma camisa para se cobrir.

Kate não quis prolongar seu tempo no carro, assim que chegaram, desfez do cinto, que não fazia ideia do porquê de usar.

— Vejo você de novo? — Ela não esperava que a pergunta viesse dele.

Mas, veio.

Olhou-o. Seu rosto, agora, manchado pela dimensão de quem era e do nome que carregava. Mais intenso em meio à escuridão, envolto em sombras. Ele não era pessoa qualquer, seus olhos diziam que ele havia nascido para reduzir o mundo a pedaços.

Escolheu, mais uma vez, não dizer nada.

Era o poder que tinha percebido ter sobre ele. O de o entregar tão pouca certeza quanto ele a entregava.

Não sabia se o veria de novo.

 

***

 

Mentir é ainda mais fácil quando não se tem qualquer noção da verdade.

Ela não sabia o que viria dele e ele tinha escolhido dizer a verdade.

Não precisaria ter dito quem era. Não precisaria ter lhe dado nada em troca, ela não esperava coisa alguma.

Entretanto, desejava ver o que ela faria com o que ele havia lhe dado. Tinha entregado-a a chave para todas as respostas que desejasse.

Ela agora sabia quem ele era. O que faria com isso?

O jogo parecia se tornar mais interessante a cada instante e o segurar nas mãos, o fazia vibrar. Caius, porém, não suportava as variantes.

— Nora. — Chamou assim que retornou.

— Sim? — Ela não pensava antes de o responder. Tinha-o oferecido sua total submissão, na esperança de que ele a notasse.

— Eu disse que não queria ninguém na casa.

— Eu sei, mas…

Ele fechou os olhos. Era o sinal para que suplicassem.

— EU DISSE QUE NÃO QUERIA NINGUÉM EM CASA. — Gritou.

A vampira caiu de joelhos diante a ele, rosto coberto em suas mãos. Ela era um desastre sobre duas pernas, o ato de caridade que faziam a cada década. Era sortuda por estar viva e o azar de não se mostrar apta para continuar a viver.

— Mestre, por favor, tenha piedade…

Ele não teria piedade. Ele não oferecia segundas chances.

—ARTIFÍCIO! — Gritou para as sombras.

Elijah trouxe o seu gancho.

Ele jamais foi visto conceder piedade a quem quer que fosse. Na verdade, ele tinha prazer em torturar e julgar suas vítimas. Era quem ele era, era quem ele sempre havia sido. Caius era o mais cruel dos três líderes e os seus métodos, os mais violentos. Não havia nada que lhe desse mais prazer do que o derramamento de sangue.

“Vejo você de novo?” Ouviu-se perguntar mais uma vez e novamente, pôde a ver sorrir. Ela não tinha se desfeito diante a ele. Ela era a única que não tinha se desfeito.

Ele precisava a ver se desfazer.

— Vá para o quarto. — Ele deixou a sala.

Caius não tinha a matado.

Pela primeira vez, sob seu gancho, ele tinha deixado alguém viver.

 

***

 

Segurou o tecido da camisa, sentindo-o na ponta dos dedos, uma última vez antes de o tirar do corpo.

Encostou-se contra a madeira da porta. Queria poder dizer saber o que fazer. Sentia-se flutuar, anestesiada com o que havia descoberto. Tinha um nome, mas, não sabia quem ele era.

Acreditava o conhecer tão pouco quanto os que contavam histórias, os que o disseram conhecer e os que  disseram o ter visto fazer muito. Ele não era do tipo que se permitia conhecer.

Talvez, nem mesmo ele se conhecesse.

Ele quebrava para não ter de quebrar. Qualquer um que não percebesse, nunca tinha o olhado, verdadeiramente, nos olhos.

— Não deveria sumir por tanto tempo assim. — Pôde ouvir a voz de Carlisle através da porta.

— Eu sinto muito. —  Abriu a porta para o encontrar.

— E ai?

— Pior do que a última vez. — Ela tinha substituído a camisa por shorts de moletom e blusa de alcinhas. — Mas, posso continuar tentando.

O sorriso dele demonstrava o quão agradecido estava. Ele sabia que ela fazia isso por ele. Mas, Kate também fazia por si mesma.

— Queria conversar com você. — Ela abriu espaço para que ele entrasse no quarto.

— Aconteceu alguma coisa? — Sentiu seu peito pesar. Vinha escondendo mais do que deveria. Estava apreensiva.

— Edward e Bella estão voltando.

— Sei que saíram por minha causa.

— Foram procurar alguém.

— Alguém?

— Alguém que pode te ajudar.

Era uma tentação. Ajudar? Não sabia por onde começar a pedir ajuda.

— Com a alimentação?

— Com o seu dom. — Kate tinha se esquecido, por um instante. Não tinha acontecido novamente. — Ele é um amigo da família, vai nos ajudar a descobrir.

— Tudo bem então.

Eleazer era um vampiro tão velho quanto os outros. Vindo da espanha e transformado por volta de 1700, fazia parte do Clã Denali, um dos poucos vegetarianos como os Cullen. Transformado em seus vinte e poucos anos, era alto e de cabelos negros, sua pele possuindo um leve tom de oliva em meio à sua palidez. Sua habilidade especial, era constituída pelo dom de identificar o dom de outros vampiros - ou humanos, ainda que de maneira limitada - tendo sido de grande utilidade para os Volturi antes de encontrar sua companheira, Carmen.

Tinham lhe dito pouco sobre ele, o suficiente para que soubesse estar segura. Ainda que não pudesse a tirar da ansiedade crescente.

Kate já o esperava quando chegaram. Disseram-lhe que Eleazer não precisaria de muito além de proximidade para dizer o que ela era.

Mal teve tempo de o cumprimentar.

— Eleazer...— Carlisle se mostrou apreensivo, tanto quanto os outros.

— Interessante…— A postura dele havia mudado assim que Kate entrou na sala.

Seus olhos a percorreram com cuidado. Era preciso ter certeza do que sentia. Mais um vampiro de olhos dourados.

Eleazer estava impressionado, Carlisle poderia dizer. Conseguiu dizer que aquela que acabara de conhecer, possuía dentro de si, algo peculiar e único. Tinha se deparado com vários dons, mas nenhum naquela extensão.

Podia sentir o poder preso dentro dela, ainda não explorado, acomodando-se como qualquer outra parte da garota. Sempre havia sido parte dela. O dom não era tímido ou retraído e desejava expandir, ganhar força.

— “Sussurradora…” — Soou espanhol, mas, Kate não teve certeza se reconhecia. — O dom dela pode ser comparado em extensão ao de Aro e Edward...mas, ela pôde influenciar a mente.

— Eu não entendo. — Kate era a única que ainda se atrevia a dizer alguma coisa.

O resto todo observava, atentamente. Ninguém ousava sequer respirar, ou piscar com uma fração de segundos sequer.

— Ela não pode só ler pensamentos como Edward ou Aro, pode criar-los, manipular..ter controle...Ela é uma sussurradora...fascinante.

— Isso existe? Sussurradora?

— Agora existe. — Ele sorriu. — Eu deveria saber quando me disseram.

— O que eu devo fazer com isso?

— Você pode o treinar.

— E se eu o treinar?

— Eu já vi os Volturi dizimarem Clãs inteiros por dons menores do que o seu...imagino o que fariam para colocar as mãos em você.  — O nome ecoou por suas entranhas.

— Vai ficar tudo bem. — Ela até o momento não tinha percebido Carlisle ao seu lado, mas, agora o sentia a abraçar pelos ombros, em um carinho terno.

— Você pode me treinar? — Perguntou-o, olhos abertos como quem havia acabado de descobrir algo vital.

— Se me deixarem..

— Por favor. — Carlisle concordou.

Queimou por algo diferente desta vez. Não era sua sede ou instintos que não podia nomear. Queimava por esperança. Esperança de finalmente ter controle de qualquer parte de si.

Jasper e Rosalie concordaram em a ajudar com os treinamentos. Ela não queria fazer sozinha de qualquer maneira.

Em parte, ainda tinha dificuldade em acreditar. Teria de lidar com todo o resto depois, precisava daquilo no momento.

“Sussurradora.”

Não era uma má ideia. Edward era um telepata, Alice era uma vidente, Bella um escudo e Kate...uma sussurradora. O nome não era oficial, mas serviria.

As instruções eram claras. Ela tinha de olhar nos olhos de quem fosse e tentar ver. Era o primeiro passo. Surpreendentemente, não teve tão dificuldade quanto teve nos outros.

Entrar, observar, dominar e...sussurrar.

A força se expandia com facilidade e se alimentava do que encontrava pela frente. Era uma sensação conhecida, fazendo-a se perguntar o quanto havia ignorado. Não parecia vir de uma só direção, vinha de todas as partes e crescia rapidamente.

— O dom se alimenta como nós nos alimentamos...eu nunca vi nada parecido. — Eleazer ainda a observava com cuidado. — Ela vai o controlar em pouco tempo se praticar todos os dias.

— Isso é bom, não é? — Jasper perguntou.

— É incrível. — Eleazer se mostrou empolgado.

Porém, Kate sabia que não seriam apenas respostas, enfrentaria dúvidas. Dúvidas das quais não conseguia prever ainda.

Sentia-se mentalmente exausta.

Precisava de sangue.

Alimentou-se pouco na noite passada, não teve tempo para pensar até então e não fazia a menor ideia se encontraria Carlisle em casa para a ajudar.

Pediu por uma pausa.

O ardor retornava assim que se lembrava de sentir sede e ela sabia estar a um passo de se tornar insuportável. Deveria ser rápida. Seu controle era maior, mas, tinha perdido mais do que tinha colocado dentro de si.

Segurava a garganta nas mãos, apertando-a com força, de maneira a sentir sua própria pele rachar. Era o suficiente para a distrair por alguns segundos, mas a cicatrização vinha rápida.

Impediram-na de continuar.

Era uma péssima hora para cruzarem seu caminho.

— Seth...— Sua garganta arranhava a cada letra que pronunciava.

— Vi você ontem a noite, correndo na floresta...não estava sozinha. — Seu desconforto era tanto, que mal podia se concentrar.

Tentou se manter presa no lugar em que estava.

— Eu não tenho tempo para isso agora..

— Não tem tempo para isso, ou não tem tempo para mim?

— Você não pode estar falando sério. — Passou por ele, dando-lhe as costas.

— Kate...pare de me manter longe. — A voz dele era macia e agora, ele sussurrava com cuidado.

Os olhos de Kate ardiam e o veneno se acumulava em suas mucosas.

— Eu não estou te mantendo longe. — Dizia com dificuldade.

Fechou as mãos em punho e desejou que seu peso fosse maior do que seus pés conseguissem carregar.

— Então eu não sou bom o suficiente para você?

Ela queria esmagar sua cabeça contra uma das árvores até ter seu sangue escorrer por entre seus dedos, ouvi-lo gritar enquanto se desfazia em dor.

E quase o fez.

Segurou-o pelo pescoço, seus dedos o marcando na pele, a ponta de seus dedos ameaçando romper a carne.

— NÃO! — grunhiu. — EU NÃO SOU BOA O SUFICIENTE PARA VOCÊ! SERÁ QUE NÃO PERCEBE?

A maioria das espécies mostram seus dentes como uma ameaça, uma amostra de agressividade, de liderança. É um lembrete de que podem - e irão - rasgar a garganta de quem quer que os desafie. Ela não era diferente.

Mas, Seth nunca teve medo de ameaças...ou de vampiros.

Beijou-a.

Mostrou ser a pior coisa que poderia ter feito.

Ela o mordeu sem pensar duas vezes.


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