Durante o Fim escrita por Van Vet


Capítulo 59
Décimo Sexto Dia - Rony




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/714113/chapter/59

   Quando o intruso mecânico saiu de ação, deslizando para fora pela mesma porta da qual entrou, não era o fim. O pesadelo não terminaria jamais… Ou só terminaria até que todos eles estivessem mortos ou subjugados por outra espécie. Foi com esse pensamento pessimista que Rony viu as coisas começarem a descer.

 

   Acenando para os filhos, ele e Hermione acomodaram Hugo e Rose embaixo das pesadas prateleiras de ferro do quarto de armamento de Smith enquanto Rony implorava pela décima vez que o homem se calasse. “Eu prometo ajudar você a cavar aquele túnel”, sussurrou em desespero para o sujeito, afim de lhe oferecer alguma barganha. Ele acabou concordando, os olhos não deixavam de refletir o brilho alucinado de um louco incontrolável, e os três adultos se esconderam por detrás de um amontoados de caixas de metálicas da qual o ruivo não estava nem um pouco interessado em saber sobre seu conteúdo.

 

    Hermione quis se agachar para ficar o mais próximo possível das crianças, mas Rony a puxou de volta contra o seu peito, pois não havia mais tempo. Eles acabavam de descer no porão e, em breve, inspecionariam o quarto. Abraçando sua esposa firmemente, existia uma vasta possibilidade de ser a última vez que ele poderia fazer isso, desejou que os filhos se mantessem protegidos e em silêncio e, principalmente, que as coisas não os encontrassem.

 

   Os barulhos no pequeno espaço sala-cozinha iniciaram. Coisas sendo derrubadas, arrastar de móveis contra o chão e os arrepiantes atritos, semelhantes a passos bípedes. “Eles deveriam ter fechado a porta do quarto”, pensou Rony, apavorado. Então pensou de novo e, talvez, isso fosse suspeito demais já que a sonda inspecionara o porão com a porta justamente daquele modo.

 

   Uma das coisas avançou pelo corredor, a escassez de luminosidade ali criando formas extraordinárias e inimagináveis ao que viria. Hermione agarrou o corpo de Rony com força, ela tremia. Ele não estava muito melhor, prendendo a respiração sem saber se a criatura poderia ter uma super audição igual a de um cão. Smith suspirou ao seu lado, agarrando uma maldita pistola que ele convenceu Rony, mais por falta de tempo do que por tato, a portar para o caso da coisa sair do controle. Quem causara aquele descontrole todo fora ele, oras!

 

   O alienígena parou sobre a soleira da porta e encarou a vastidão escura do quarto. Era um ser baixo, do tamanho de uma criança de dez anos, mas com uma cabeça gigantesca em formato triângular. Sua pele translúcida refletia a baixa luz lunar provinda das janelinhas retangulares e sua postura corporal encarquilha.

  

   Rony teve a impressão de que ele estava tentando cheirar o ar e esperava que não fossem os humanos, e sim a fossa séptica abarrotada, desembocando e causando um odor desagradável no sanitário ao lado. Ele começou a andar na direção das prateleiras e dos entulhos, a cabeça girando rapidamente para todos os lados. Quando se aproximou do local onde Hugo e Rose estavam, teve um desejo surdo de arremessar um dos objetos que o cobria e protegia, contra aquilo. Não o fez. Ficou muito parado concentrando todos os seus sentidos no movimento do alienígena. Ao fundo, a barulheira na sala-cozinha prosseguia. Haviam mais.

 

   A coisa de cabeça geométrica pegou algumas das sucatas bélicas de Smith na mão para, em seguida jogar ao chão, desinteressado. Continuou andando, se afastando das prateleiras e inspecionando as caixas. Pela mínima fresta que permitia Rony visualizar o que acontecia no quarto, ele vislumbrou, muito de perto, o olhar da criatura. Eram dois olhos grandes e pretos, sem pupilas, tão frios e desalmados, que o ruivo imediatamente os remeteu a de um tubarão. “Então eram aqueles olhos, aquele bicho extraterrestre, que dirigia os tripods e dizimava a população humana sem pestanejar?”

 

   O que eram? De onde vinham? Por que matavam daquele modo? Eram algumas das perguntas que passava pela cabeça do Weasley pai enquanto observava o alienígena de perto.

 

    Um segundo alienígena passou pelo corredor e sumiu para dentro do outro quarto. Mais barulheira, mais anarquia, mais pânico contido. A coisa inspecionando aquele cômodo também não parecia ter hora para sair… Até que uma terceira figura, este parecia ter a cabeça um pouco maior, pela pouco que Rony conseguiu identificar de sua silhueta à sombra, produziu um estalido com suas cordas vocais, um som que ficaria impresso para sempre na memória do ruivo, e chamou a atenção dos outros dois iguais espalhados pelos quartos. A coisa próxima a eles retribuiu a comunicação e saiu dali jogando uma lata enferrujada que servia de alimentação do exército americano na Segunda Guerra Mundial, no chão, desinteressado.

 

   Quase uma hora depois que tudo se aquietou no porão foi que Rony e os demais tiveram coragem de se movimentarem e saírem de seus esconderijos…

 

  ***

 

  Havia amanhecido. As máquinas extraterrestres voltaram a todo vapor, produzindo seus ruídos intimidadores pelo vale, trabalhando naquele grande açougue humano. Os Weasley reforçaram a porta do porão com os móveis mais pesados disponíveis e Rony entregou uma das armas enferrujadas do depósito militar do anfitrião, para Hermione. Ele portava outro. Nada era certeza, contudo existia a fatídica possibilidade de a próxima vez ser a última… Iriam até às últimas consequências...

    

   Smith voltou para o quarto, batendo a pá contra a terra e gritando, como ele fizera durante a madrugada, embora agora chamando Rony para cumprir sua parte no acordo. O casal não tinha força para mandá-lo calar-se e o motivo era que durante o dia dificilmente os berros daquele sujeito sobrepujariam os sons dos tripods funcionantes, acima deles.

 

ー Eu não tenho mais escolha… ー Rony suspirou, sentado no sofá, Hermione ao seu lado. Ele torcia o cabo da pá que Smith pusera em sua mão minutos atrás, antes de retornar para sua tarefa insana.

 

ー Eu posso ajudar…

 

ー Não, Mione. Jamais vou querer que você suje suas mãos.

 

ー Mas e você? Eu me importo também… ー ela segurou em seu braço, o fitando com angústia.

 

   Uma lágrima solitária escorreu pela bochecha dele ao encará-la de volta. Então baixou os olhos… Sentia que se ficasse mirando Hermione por muito tempo se reconectaria a sua humanidade e perderia a força… Não poderia perder a força, tinha de aproveitar enquanto a chama da vingança, o instinto protetor de um pai, de um marido, continuava queimando dentro dele.  Ver Hugo, Rose ou Hermione despedaçados por uma mera imprudência, por covardia, o destruiria por completo. Ele precisava agir.

 

ー Saber que você se importa comigo desse modo já me conforta, Mione ー murmurou para a morena lhe dedicando um sorriso fugaz, sem alegria.

 

ー Ron… ー ela respirou forte vendo-o se levantar. Queria impedi-lo, Rony sabia, mas não poderia se também compactuava com a ideia de manter eles a salvo pelo máximo de tempo que conseguissem.


       ー Só distraía Hugo e Rose… Por favor… ー ele pediu, agarrando o cabo da pá fortemente entre os nós dos dedos e se encaminhando para onde Smith estava.. para terminar o serviço.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Durante o Fim" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.