Durante o Fim escrita por Van Vet
Enfim eles pararam numa lanchonete, embora o tempo continuasse na mesma. No momento estavam há quarenta minutos de distância de casa e Rose quase apostava numa chance real da viagem ser cancelada e todos retornarem. Era divertido pensar nisso, só não se divertia mais porque seus amigos começaram a mandar mensagens em seu celular perguntando sobre o tempo.
Na casa de Jess uma ventania louca havia começado há dez minutos, tão intensa que arrancou todos as roupas penduradas no varal. No condomínio de Mary a energia elétrica tinha acabado e chegava rumores que o senhorio pensava em abrir o abrigo anti-furacões. O mais incomum acontecia na rua de Kevin, o garoto relatou para todo mundo no grupo de mensagens que três raios caíram no mesmo lugar e abriram uma cratera no asfalto. Neste último a adolescente não acreditou. Os pais de Kevin eram hippies doidões e os cômodos na sua casa tinham uma atmosfera nublada e constante de maconha, diziam amigos que já o visitaram. E afinal, um raio nunca cai duas vezes no mesmo lugar, que dirá três. Mentiroso!
A mãe de Rose parecia ter o mesmo tipo de assunto mórbido no seu celular. Ora digitava freneticamente, ora encarava o céu a espera de alguma terrível surpresa. Será que era mesmo um tornado?
Hugo mexia freneticamente no seu tablet. O garoto parecia mergulhado num mundinho de pixels e então erguia os olhos minuto sim minuto não, e estudava as expressões da mãe. Pirralho esperto.
O pai voltou do balcão da lanchonete carregando quatro refrigerantes e entregando um para cada membro Weasley. Depois sentou-se e tamborilou os dedos na mesa. Seu pai quando tentava parecer calmo era descaradamente aflito. Ele coçou o lóbulo da orelha esquerda quatro vezes antes de falar:
ー Daqui pra frente, quem tá vindo do lado oposto da rodovia disse está tudo bem.
Hermione olhou para o esposo de jeito trucidante.
ー Acabei de falar com Thereza ー era a vizinha abelhuda ー e ela disse que está uma ventania no bairro. A porta de trás de casa está batendo.
ー A tela ou a porta mesmo? ー o pai quis saber.
ー A tela, mas estou com preocupada. E se a porta abrir?
ー Nós trancamos, oras ー disse Rony tranquilamente sorvendo seu refrigerante.
ー A maçaneta não está boa, Rony! Se isso for algo a mais que uma chuva…
ー O Obi-wan está sozinho lá dentro de casa! ー completou Rose, de repente tomada de pânico, lembrando do seu gato de estimação.
O primo, Alvo, ficou encarregado de pegar Obi-wan - um Ragdoll ronronante - na manhã seguinte e levar para a casa dos tios de Rose enquanto a família fazia a viagem renovadora, que no fim das contas a menina tinha certeza que terminaria em nada, ou melhor, em divórcio. O que seu gato, seu bichano do coração, tinha a ver com tudo aquilo? Se a porta abrisse, Obi-wan, mesmo castrado, sentiria uma curiosidade felina de saber quais atrativos a vida das ruas podia oferecer. E se fosse um tornado, quais chances um gato doméstico de seis quilos, oito anos e uma falha na cauda tinha contra essa força da natureza?
ー Oh, Rose. Obi-wan vai ficar bem! ー exclamou o pai começando a se exasperar.
ー Não vai, não! Eu quero voltar ー a adolescente exigiu.
ー Tá vendo, por que você faz isso, hein Hermione? Essas coisas são de propósito, né? Por que me fez gastar dinheiro, fazer o maldito depósito se no fim iria arrumar todo tipo de empecilho para essa viagem não acontecer?
ー A culpa é minha agora. Não tem nada a ver com o mundo caindo na nossa cabeça e uma droga de uma porta que você não chamou ninguém para arrumar nem quando estávamos com um compromisso marcado com dez dias de ausência.
ー Eu não vou voltar! ー o pai sentenciou batendo a lata de refrigerante na mesa.
ー Vai sim! ー Rose rebateu elevando o tom da voz.
ー Onde foram parar seus limite, Rose? Sou seu pai!
ー Para, Ronald. Ela está nervosa.
Os demais comensais, nas mesas próximas, interromperam suas refeições para encararem o drama familiar gratuito.
ー Ela tá mimada, isso sim ー ele apontou o dedo na cara de Hermione fazendo as bochechas da mulher se avermelharem ー Chega, todos para o carro! Quanto mais rápido chegarmos mais rápido voltamos.
ー EU NÃO VOU PARA LUGAR NENHUM ENQUANTO MEU GATO ESTIVER CORRENDO PERIGO! ー Rose gritou, fora de si, o corpo trêmulo, lágrimas gordas saltando pelos cantos dos olhos.
Cega pelo desespero a jovem teve apenas percepções de sua mãe a abraçando, Hugo soluçando e o pai se afastando para o estacionamento e dizendo palavras como “nunca mais” e “pesadelo”.
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