ー Já que você não vai ouvir a sua mãe, fica do meu lado ー ele pediu quando Rose começou a caminhar junto.

ー Tá legal ー a adolescente deu de ombros, acompanhando o pai.

 Eles contornaram a fuselagem da aeronave há uma boa distância. A grande máquina voadora jazia fumegante, mas estava silenciosa. Rose encarava aquilo se controlando para não ficar boquiaberta. Ver um avião imenso, destroçado no meio da rua, era algo que o cérebro considerava uma anomalia na sua ideia de mundo. A menina olhou para o céu, os primeiros raios de sol começando a dar as caras,  e enxergou a chegada de um dia nublado e triste. Um dia para não querer estar morando no planeta Terra.  

ー Ei, você tá bem? ー Rony berrou para alguém que se movia saindo da porta de desembarque, virada para cima.

   Pai e filha viram um homem encostar-se na lataria do boeing e deslizar para a rua com algo pesado agarrado na mão. Quando ele tocou o solo, o ruivo correu para acudi-lo.

ー Tá machucado?

ー Hã… Não, obrigado ー o homem, de traços latinos e fora de forma respondeu ofegante, exibindo um corte profundo aberto no seu supercílio.

ー Seu rosto tá sangrando ー Rose o informou.

ー Como?

ー Ela disse que seu rosto está sangrando ー Rony repetiu num tom de voz mais elevado.

   O homem olhou-a confusamente e pressionou o corte com os dedos, que respingava sangue na gola da sua camisa. A garota notou que ele vestia uma espécie de uniforme: camisa azul clara com um logotipo bordado. Na mão, o sujeito agarrava firmemente uma câmera filmadora de proporção profissional, que deveria pesar muitos quilos.

ー Você estava naquele avião? ー o pai perguntou ao outro.  

ー Hã?

ー Eu perguntei se você estava naquele avião ー o pai repetiu quase gritando ー Tem mais… sobreviventes?

ー O voo não encheu, mas todo mundo lá… ー e levou a mão a garganta fazendo um sinal bastante famoso de significava o fim de um ciclo. Quando o sujeito fez esse movimento, Rose notou sua orelha direita escorrendo sangue. Era por isso que ele não escutava bem.

ー Por que caíram? ー o ruivo perguntava sempre alto.

 O latino apoiou a câmera no ombro como um cinegrafista profissional e bateu carinhosamente na lente.

ー Eu captei vários movimentos deles. Eles derrubaram o avião, mas eu sobrevivi para expor esses cretinos. As melhores imagens disponíveis em rede nacional são mérito meu, cara! ー o câmera riu nervosamente ー Vamos expor esses desgraçados para todo mundo de uma vez por todas!

ー Que desgraçados?

  Enquanto o pai se esforçava para arrancar informações do homem e do seu estado de espírito lunático, Rose viu um furgão branco contornando a rua em ruínas e aproximando-se deles. Na lateral do carro o mesmo logotipo da camiseta do sujeito estava pintada em escala muito maior. A garota finalmente reconheceu as letras dentro de um arco simplório como sendo do Canal 15 News LW. O furgão brecou escandalosamente diante deles e Rony pegou a filha pelo ombro, afastando-a de algum perigo. A porta do veículo abriu com força e uma mulher magrinha e elétrica surgiu de dentro.

ー Carlos, achamos que você tinha morrida dessa vez, porra! ー ela exclamou, exaltada.

   Dentro do automóvel Rose viu a luz esbranquiçada de diversos monitores de computador instalados no lugar de bancos.

ー Eu consegui, Melissa. Você tem que ver essa imagem. A NY News vai nos pagar uma nota nessa filmagem ー O câmera de tímpano furado, Carlos, ergueu seu objeto de trabalho com grande cuidado e entrou no furgão depois da mulher lhe dar espaço.

ー E vocês, estavam lá também? ー ela perguntou para Rose e o pai, apontando para o boeing. Melissa continuava sentada no banco, prestes a fechar a porta na cara deles a qualquer instante.

ー Não, nós moramos há uma quadra daqui ー Rony comentou, cauteloso.

ー Como assim, morando aqui? Essa área entrou em quarentena desde as dez da noite. Os Tripods contaminaram tudo nesse lado do estado. Em breve estarão exatamente aqui.

ー Tripods? ー o pai repetiu, confuso.

   Melissa, que precisava usar óculos de grau, tirou-os e limpou as lentes furiosamente na camiseta. Rose percebeu que a mulher não era tão velha quanto ela achou, e que essa impressão deveria ter ocorrido devido às imensas olheiras arroxeadas debaixo dos olhos dela.

ー Moço, você e sua família estão correndo perigo. Não sabem mesmo o que anda acontecendo?

ー Não, droga! ー Rony se exasperou ー Minha casa foi atacada em Tampa ontem de manhã, dirigi o dia todo para a casa dos meus pais nesse bairro e não os encontrei. Eu ligo a televisão só tem reprises imbecis, eu ligo o rádio ouço chiado, eu tento ligar para alguém ou acessar a internet e não há rede. Minha família quase morreu duas vezes e eu ainda não tenho resposta nenhuma. O que diabos são Tripods?!

   A mulher encarou-os aflitamente, se decidindo, e então anunciou:

ー Certo, eu vou mostrar, mas não consigo ficar explicando muito. Essa área logo, logo será contaminada. Vem, olhem isso ー e apontou para um dos seus computadores dentro do furgão.