Durante o Fim escrita por Van Vet


Capítulo 19
Segundo Dia - Rony




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   Nada permanecia bem entre eles. A conversa na sala não era nem perto do que Rony poderia considerar uma conversa produtiva, como a terapeuta diria. Entretanto, ele sentiu o peso de uma bola de chumbo deixando seu estômago depois de dizer para Hermione  que tinha esperanças. Por que era tão difícil demonstrar os mesmo sentimentos de sempre, ultimamente?

 

    Depois de se apegar por vários minutos refletindo os detalhes do diálogo entre o casal, Rony achou por bem descer. Zelar por sua integridade antes que fosse tarde demais. Ele ainda não tinha a mais remota ideia da razão de ter a casa destruída e a vida da sua família na corda bamba, e nem tentava somar o prejuízo do seu patrimônio posto em escombros. O que o afligia era não saber se o garoto Phil sobreviveu, se o cheiro de gente queimada ia sair da sua pele mesmo após um banho e se aquilo ia voltar para terminar com eles o que começou.

 

    Uma vez de volta ao porão, ele não acendeu as luzes, apenas seguiu para a silhueta  adormecida da esposa e dos filhos, próximos à janelinha. Rose dormia ao lado de Hugo, que se encostava no braço da mãe. Rony observou-os um pouco. Os filhos estavam serenos, já a morena vivia um sono agitado, o cenho levemente franzido e os olhos inquietos por debaixo das pálpebras. Ela devia estar tendo pesadelos. O ruivo deitou-se rente a esposa, encostou a mão delicadamente no braço dela e acariciou de leve. Aos poucos, a respiração da mulher começou a ficar mais calma. Ele adormeceu tateando a gostosa textura da pele de Hermione.

 

    Quando despertou tudo ainda estava escuro. Seu coração batia acelerado e, apesar do ambiente frio naquela parte da casa, suas têmporas encharcaram de suor. Ele se sentou. Todos continuavam completamente adormecidos ao lado. Uma espiada no relógio de ponteiros fosforescentes na parede, à esquerda, indicava 4:18 da manhã. Irritado por já ter acordado, Rony enfiou a cabeça no travesseiro de novo e fechou os olhos. Era preciso dormir, de manhã eles dirigiriam vários quilômetros de novo, para a casa de Gui. Respirou fundo, uma, duas, três, quatro vezes e pensou “Por que eu acordei?”. Além da preocupação óbvia havia algo mais, algo que ele não conseguia identificar.   

 

   Após minutos, sentou de novo e consultou o relógio mais uma vez. Ainda 4:18… Mas aquele relógio estava funcionando mais cedo, pelo que ele recordava. Foi quando, da janelinha superior, teve a percepção que algo se agitava lá fora. A luz dos postes. Rony se pôs de pé rapidamente e se esticou todo, ficando na ponta dos dedos para conseguir enxergar pelo vidro. Os postes estavam sendo chacoalhados por um vento muito forte e, junto desse fenômeno, outro nascia: um som abominável, como o grito produzido por uma laringe mecânica.

 

    Hermione se mexeu nos cobertores, começando a acordar. Rony sacudiu a esposa e disse:   

 

ー PEGA O HUGO E CORRE PRO QUARTINHO!

 

    A morena deu um pulo de prontidão e, sem questioná-lo, agarrou o menino adormecido. Ele fez o mesmo com Rose e o casal correu desesperadamente para um cômodo destinado a produtos de limpeza, ali no porão.

 

  O barulho cresceu até se tornar ensurdecedor, arrebentando vidros e desestabilizando o teto em suas cabeças. Rony não soube se foi pela força dele ou pelo impacto de algo muito pesado caindo no porão que fez com que a porta do cômodo batesse forte. O chão tremeu sob os pés e os pais espremeram as crianças com seus corpos para protegê-los caso o teto desabasse. A porta acabou saindo das dobradiças e batendo nas costas do ruivo, que aguentou a pancada agarrado a filha.

 

ー  Mãe, a gente vai morrer? ー perguntou Hugo depois que a barulheira terminou e a poeira das argamassas começou a levantar. O garoto tinha pânico na voz.

 

   Hermione olhou para o esposo da penumbra, atordoada. Ela estava descabelada e trêmula.

 

ー Seu rosto ー apontou para ele.

 

   Ele soltou o aperto de Rose e levou a mão a testa. Havia sangue escapando por um corte raso na pele, que nem tinha ideia de como ganhou.

 

ー Estou inteiro. E vocês? ー Hermione anuiu, Hugo permanecia grudado à mãe e Rose concordou baixinho.

 

ー Algo caiu na casa ー a morena sussurrou.

 

ー Eu vou ver o que é, fiquem aqui.

 

ー Cuidado! ー ela pediu, mirando-o cheia de súplica.

 

   Rony afastou a porta para o longe com um chute e saiu para o porão novamente. Ou o que havia restado do lugar. O teto dava diretamente na sala, e esta possuía um rombo gigantesco em sua parede leste, debruçando-se para a rua. Aquilo veio caindo vertiginosamente e atravessou a casa dos seus pais com um golpe seco. Ele conseguiria enxergar o céu através do buraco se não houvesse tanta fumaça atrapalhando sua visão. De volta, trazendo o olhar para um segundo exame no porão, o ruivo notou que no lugar onde sua família dormia a segundos antes, agora repousava uma enorme e fumegante turbina de avião.


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