A Lenda de Yuan escrita por Seok


Capítulo 7
Solstício de Inverno


Notas iniciais do capítulo

Espero que estejam gostando da fanfic, e agradeço de coração pelos comentários. Me incentivam muito, muito mesmo, porque o fandom de Avatar não é tão grande no mundo das fanfics. Obrigado por acompanharem, espero não os decepcionar!



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Novamente, preso em um mundo totalmente contrário à minha realidade, em sonhos, voltei a ter visões. Disseram-me que um Avatar pode ter devaneios sobre sua vida passada, mas não me parecia tão fácil. As imagens passavam, rápidas, como se eu estivesse assistindo um filme cortado. Entre as cenas desconexas que me apareciam, pude ver o mesmo cometa, passando tão perto de mim que realmente acreditei que fosse me acertar. Depois, fui transportado para uma grande sala, que parecia um depósito, e algo me chamou a atenção.

Uma garota jovem, pele morena e olhos azuis estava sendo carregada por um rapaz de cabelos pretos. Ambos usavam roupas dos igualitários, e a moça estava apagada. O garoto corria, desesperado, como se fosse uma presa indefesa fugindo de seu predador. O rapaz parou repentinamente, como se suas pernas estivessem coladas ao chão, e a menina em seus braços foi arremessada com o freio repentino. Atrás da dupla, um homem encapuzado apareceu, portando uma máscara no rosto — a mesma máscara que eu vira em meus antigos pesadelos. Vê-lo assim, tão de perto, fez com que todo meu corpo arrepiasse, e meu coração batia cada vez mais forte, à medida que ele se aproximava do menino. O encapuzado levantou a mão e o rapaz seguiu seus movimentos, tendo seu corpo direcionado contra as paredes e o telhado; sem dúvidas, era dobra de sangue. O rosto do menino transpassava dor, e eu não o culpava. Depois de brincar com sua presa, o homem falou:

— Estou impressionado. Ninguém nunca conseguiu usar dobra em mim daquele jeito.

E, então, fez com que o corpo do rapaz se contorcesse dolorosamente. O dobrador emitiu grunhidos de dor, seu corpo inteiro se movimentava contra sua vontade. Ele tentava lutar, mas era inútil. O misterioso homem controlava cada gesto, e fez com que o rapaz ficasse de joelhos e cabeça erguida. Aproximava-se em passos lentos, como se apreciasse cada instante de sua pavorosa demonstração de poder. A máscara, que portava um sorriso quase imperceptível, possuía uma sombra apavorante no rosto de seu portador, conforme ele se aproximava impiedosamente. Falou, em um tom tranquilo, não poupando esforços em parecer irônico:

— É quase uma pena tirar a dobra de alguém tão talentoso.

E sua mão encontrou caminho na direção do rosto do dobrador impotente. Ficou a um triz de tocá-lo na testa.

— Quase.

Eu desejei poder fazer algo. Eu estava incapaz de ajudá-lo. Não sabia se aquilo era real ou verdadeiro; eu presenciava a cena, mas não conseguia gritar. Minha garganta parecia estar fechada e a boca costurada. Meus pés não se moviam, como se colados ao chão por algo além do meu controle. A outra garota, a morena, pareceu recuperar sua consciência e levantou em um susto. Em uníssono, como se partilhando da mesma mente, gritamos:

— Não!

E eu acordei em um sobressalto, assim como da última vez, ofegante. Olhei pela janela e vi o sol por entre as nuvens cinzentas, e o mar não estava mais tão assustadoramente calmo. Agora, era possível ouvir o som das ondas quebrando à margem da ilha. As águas refletiam o sol e as nuvens, como vidro liso. Minha cabeça doía, como se tudo aquilo que eu acabara de presenciar fosse real — e eu agradeci por não ser. Levei algum tempo para conseguir controlar minha respiração, parecia que o meu corpo ainda estava preso no sonho, ainda em pleno desespero.

Ser o Avatar cada vez me causava mais problemas. Eu costumava pensar em como minha vida era menos complicada quando eu era apenas o Yuan, do Reino da Terra; nada mais, nada menos. Não conseguia deixar de imaginar como seria se minha vida tivesse seguido seu rumo. Lamentar, no entanto, não parecia me fazer muito bem. Decidi focar no que estava prestes a acontecer: o Solstício de Inverno. Finalmente minhas dúvidas seriam sanadas por alguém com uma sabedoria que eu não posso imaginar. Alguém que conheceu a dor, mas também conheceu o amor. Alguém que passou por inúmeros desafios que colocaram à prova sua determinação. Eu, finalmente, contataria Korra pela primeira vez. O rádio no meu quarto estava ligado em uma estação qualquer, contudo, a voz mudou da rede de notícias para algo mais frígido. Uma entonação rouca, seca, invadiu todo o meu quarto; a mesma voz que me ameaçara semanas antes. Meu estômago se revirou.

— Companheiros de Cidade República… Por anos, os igualitários foram obrigados a retornar para as sombras, alheios a tudo que acontecia em sua cidade. — ele deu início. — Depois da morte da Avatar Korra, finalmente conseguimos tempo para nos reerguer, mas não estamos sozinhos. O cometa, há muito esquecido, voltará. E Cidade República ruirá. Ninguém poderá ficar contra nós, nem mesmo o Avatar.

E a transmissão teve fim.

Eu fiquei ali, olhando o tempo passar, por alguns instantes. A porta do meu quarto abriu violentamente, e imaginei que a pessoa que a abriu também escutara o rádio. Ikki, filha de Tenzin, evidenciava preocupação exacerbada no olhar. Parecia querer ter certeza de que eu estava seguro. Seus olhos estudaram cada canto do meu quarto, cada detalhe, até pousarem em mim. Decidi colocar o lençol, já que não queria um ‘’acidente’’ como aquele do Fang.

— Está preparado, Yuan?

Ainda que ela não falasse para quê, eu tinha certeza que referia-se ao solstício. Fiz que sim com a cabeça.

— Ótimo, mas você não poderá ir sozinho. Providenciaremos uma segurança apropriada para você. Dependendo do que Korra lhe disser… — ela mordeu os lábios, parecendo nervosa. — Teremos que antecipar seus treinos.

— Mas o Avatar não precisa ser mestre em um elemento de cada vez?

— Não exatamente. Meu avô, o Avatar Aang, aprendeu todos os elementos em um ano. Claro, ele não era um mestre, mas conseguiu se virar contra o Senhor do Fogo. Korra aprendeu os elementos quando era apenas uma criança.

Ouvir aquelas coisas fez com que eu me sentisse pior ainda. Os que vieram antes de mim pareciam ser tão incríveis, e eu não era nada. Não tinha nenhuma habilidade especial. Eu era só… só o Yuan. Nada além disso.

— Entendi.

Tentei mascarar minha frustração ao falar, entretanto, em vão. Creio que Ikki percebeu, pois suas feições adquiriram um ar mais passional.

— Mas cada Avatar é único — acrescentou Ikki. —Todos eles cometeram erros, nenhum foi perfeito. Eu sei que um dia você irá florescer, como uma flor na alvorada.

— Obrigado, Ikki — eu respondi, sincero. — Quem irá me levar ao Templo de Korra? Os guardas do Lótus Branco?

— Não só eles. O chefe da polícia de Cidade República concordou em fornecer alguns de seus dobradores para lhe acompanhar.

— E quem é o chefe?

— Ele é o filho de Lin Beifong, se chama Tao Beifong.

— Da família de Toph Beifong?

Acho que arregalei os olhos sem querer. Mesmo que Toph tenha nascido há muitos anos atrás, ela ainda era um nome conhecido no Reino da Terra. A primeira dobradora de metal. A primeira chefe de polícia de Republic City. A maior dobradora de terra de todos os tempos.

— Isso. — Ikki sorriu. — Parece que os Beifong gostam de negócios em família.

E começou a rir. Eu não entendi muito bem a piada, ou, talvez, eu que não tenho um bom senso humor. Ela parou de rir e deu um pigarro.

— Vou deixar você se arrumar, rapazinho.

E saiu do quarto, sorridente como sempre.

Eu me arrumei e saí, logo depois. Algumas partes do meu corpo ainda estavam doloridas por conta da batalha no dia anterior contra o espírito rebelde. Eu decidi comer um pouco e me preparar para o dia que estava por vir. Eu quase cruzei com Fang e Seoyin no pátio, mas consegui me esconder antes que me vissem. Por algum motivo, não queria vê-los. Ou, pelo menos, não queria vê-los juntos. Era desagradável, por alguma razão. Estavam sempre sorrindo quando conversavam, e pareciam falar de assuntos que, pelo que pude ouvir por cima, eu não fazia a mínima ideia sobre o que era.

Deitei sob a sombra de uma das árvores e apreciei o cheiro das flores do jardim. Todas eram únicas, tanto em cor, quanto no odor. Os jardins eram um belo lugar para repousar e assistir o tempo passar. Somados ao som das ondas quebrando delicadamente na costa, me davam vontade de dormir. Eu já estava fechando meus olhos, até que uma voz conhecida chamou:

— Yuan?

Era Rohan. Esfreguei minha mão no rosto, tentando inutilmente afastar a sonolência, e olhei para o mestre do ar.

— O que foi?

— Eles chegaram. É hora de partir.

Fiz que sim com a cabeça e levantei. Nos céus, pude ver um dirigível da polícia da Cidade República, entalhado com metal. Uma corda descia até algum ponto, que imaginei ser para onde eu deveria ir.

                                                                     [...]

 

O templo de Korra era um dos lugares mais bonitos que eu já vira. Tinha diversos alicerces de mármore branco ao longo de sua estrutura, e acima deles, uma extensão azulada como um castelo. Ela erguia-se vários metros no céu, parecido com uma versão azul do templo do Avatar Roku. Não me pergunte como eu sabia disso, eu só sabia. O pátio era demarcado por jardins, enfeitados com pérolas brilhantes e outras coisas do fundo do mar. Bem no centro, tinha um símbolo da tribo da água desenhado, e na entrada, duas fontes de água constante jorravam harmoniosamente. Já tendo nos levado em segurança, o dirigível abriu seu caminho no céu de volta à sabe-se lá onde. Somente eu e Shun estávamos lá, e Ikki me dera as instruções de como seria: a luz atinge a estátua e Korra fala comigo.

Meus pais quiseram me acompanhar, entretanto, Ikki disse que era uma experiência que eu deveria ter sozinho, e que muitas pessoas só iam chamar atenção e me atrapalhar. Shun, contudo, foi teimoso e institiu para que pudesse vir, o que me deixou feliz, no fim das contas. Era bom ter o meu irmão comigo em um momento tão especial.

Não estava movimentado, seis pessoas no máximo, e todas elas realizando tarefas de zelar pelo templo, tais como polir o chão, o telhado, coisas assim. Subi por uma escada circular que levava à diversos andares, até finalmente me deparar com uma porta fechada, entalhada com os símbolos da tribo da água. Os templos antigos detinham uma forma de acesso extremamente restrito, como os Templos do Ar, onde somente um dobrador de ar poderia abrir uma das portas. Esse, no entanto, não tinha esse empecilho. Estava evoluído, já que agora as nações estavam em perfeita sintonia e muitos dobradores e não dobradores viviam na Cidade República.

Olhei para Shun e uma espécie de compreensão existiu entre nós dois. Ele fez que sim com a cabeça e eu finalmente entrei.

A porta se fechou. Um grande brilho iluminou toda a sua estrutura, gerando uma claridade ainda mais forte no salão. A estátua de Korra estava lá, como me disseram, e a Avatar usava um manto da tribo da água e as mãos unidas na região próxima do estômago. Parecia olhar para mim, mesmo sabendo que aquilo não era nada além de uma estátua. Notei uma luz vermelha se projetando acima da minha cabeça e atingindo pouco acima das mãos. Era o sol.

Ele, no entanto, nadapareceu adiantar. A estátua de Korra continuou lá, sem que nada acontecesse. A luz já estava atingindo a estátua pouco abaixo da boca, perto do pescoço.

— Avatar Korra? Você pode me ouvir?

Nada.

Nenhuma resposta.

Ei, Korra, pensei. Agora seria uma boa hora.

A luminescência que atingia o mármore subia cada vez mais, e eu percorri meu olhar por cada centímetro do pequeno santuário, procurando por algum detalhe, qualquer coisa que indicasse o que eu precisava fazer. Não encontrei nada que pudesse me ajudar. Cerrei meus punhos e dei de costas. Estava prestes a sair quando ouvi um som logo atrás de mim. A fina centelha de luz que antes atingia a boca da estátua, agora estava em seus olhos. Um brilho tomou conta da região, como se acendesse como uma repentina chama. Tão repentino quanto o brilho, fui encoberto por uma tênue camada de neblina e, ao dissipar-se, pude assistir a mudança na paisagem ao meu redor.

Era um lugar completamente novo, como se a parte oca de uma árvore. Eu estava dentro dela, e pude ver os ramos e galhos erguendo-se ao redor de mim. Mas não foi isso que me impressionou mais. Uma garota — não, não uma garota, uma mulher — me observava, ostentando um sorriso singelo e receptivo. Os olhos, tão azuis quanto o mar, contrastavam com sua pele negra, e seus cabelos eram curtos e tão negros quanto a noite. Eu a reconheci de imediato. Era a garota dos meus sonhos, a garota da estátua: era a Avatar Korra.

— É ótimo vê-lo, Yuan.

Eu fiquei estupefato, atônito, qualquer adjetivo possível. Eu sabia que Korra tinha morrido já velha, pois sua morte virara notícia em todo o globo, mas ela se apresentava para mim como uma dobradora na flor da idade, exalando vitalidade e força. Ainda que exibisse um sorriso sincero nos lábios, era fácil de notar que tinha expressões fortes, alguém que você certamente não escolheria como um oponente na arena.

— Tenho uma coisa de extrema importância para te dizer, Yuan. — disse-me Korra. — Por isso você tem tido tantos sonhos.

— O que é?

— Há muitos anos, o Senhor do Fogo Sozin percebeu o extraordinário poder de um cometa que passa próximo do mundo — começou a Avatar. —  Os dobradores de fogo também perceberam seu poder, e usaram para lançar o primeiro ataque mortal às outras nações.

— Eu sei dessa história. Mas o que tem a ver? O Avatar Aang já terminou a guerra há muito, muito tempo.

— Sim… mas isso não é tudo.

Seu rosto ganhou um ar de preocupação antes que continuasse. Ela me olhou firmemente, não que fosse minha culpa, mas estava realmente tensa. Entretanto, falou calma e sabiamente, como se tivesse o discurso planejado:

— No meu tempo, enfrentei uma ameaça anti-dominação, que visava igualizar o mundo. Seu líder, Amon, era um homem mascarado que possuía a habilidade única de retirar a dominação de um dobrador, para sempre.

No momento em que a ouvi falar sobre o tal homem mascarado, liguei os pontos. Percebi que ela era a garota que eu vira em meus sonhos, e era isso que ela estava tentando me alertar. Todo o meu corpo se arrepiou, vítima do medo, mas Korra prosseguiu:

— Não se sabe o que aconteceu com ele, mas nunca mais foi visto. O movimento igualitário, por outro lado, era forte demais para desaparecer junto com ele. Muitos ainda seguiam e seguem esse caminho, nas sombras.

— Por isso eu quase fui capturado quando aqueles dois mascarados me atingiram com socos?

— Sim. O solstício está terminando, Yuan. Tenho que terminar o que tenho para lhe dizer.

Eu fiz que sim com a cabeça, agora tão nervoso quanto a Avatar. Ela continuou, então:

— Os igualitários e extremistas da Nação do Fogo estão se juntando para destruir o ciclo Avatar de uma vez por todas. Eles visam tomar toda a Cidade República e a Nação do Fogo, para tornar o mundo uma única grande potência, de não dominadores e dominadores de fogo. O cometa Sozin voltará no fim do verão, Yuan, e não se sabe o que os dobradores de fogo que se escondem planejam fazer, mas temo que seja algo grave. Você precisa aprender os elementos antes do cometa chegar.

— COMO?! O QUÊ? Korra, eu nem sei dobrar o ar ainda, muito menos a água. Eu não vou conseguir. E ainda que consiga, eu sou fraco.

— Sei que você conseguirá. Nós fomos mestre de todos os elementos inúmeras vezes com o passar do tempo. E agora seremos outra vez.

Pensar que ela estava certa me fez arrepiar, não de medo, mas sim por uma sensação completamente diferente. Era sábia, mais do que qualquer um que eu já conhecera. Sabia como tocar meu coração, e ainda que fossemos pessoas diferentes, partilhávamos do mesmo espírito.

— Por fim, você precisará da sabedoria dos que vieram antes de mim — acrescentou. — Existe um espírito que habita as proximidades da Árvore do Tempo. Ele é o espírito da memória, e tem sua força vital ligada à essa árvore. Eu não pude contatá-lo. Não houve tempo. É por isso que preciso passar esta tarefa para você.

Ela estendeu os braços, indicando o interior de raízes. No que deveria ser um telhado, diversas imagens etéreas e azuláceas se formaram, parecendo flashs de um filme. Identifiquei cenas do meu passado e a cena da vida de Korra que eu presenciara em meu sonho.

— Só ele pode restaurar sua conexão com os Avatares anteriores. Seguiremos caminhos diferentes, Yuan. Por pouco tempo.

— Mas como eu falo com você? Korra, eu nunca pedi pra ser o Avatar…

Os olhos de Korra adquiriram um ar mais passional, como se entendesse como eu me sentia. Ela suspirou e, como últimas palavras, disse:

— Eu sou você. Sei que conseguirá falar comigo de novo. Também sei que você é forte, mas tem medo de aceitar quem é e por isso não encontrou seu equilíbrio.

Vi-me, então transportado para uma imensidão azul. Meu corpo flutuava, tomado por uma pigmentação roxa. Era como estar debaixo d’água, meus cabelos cintilavam pelos ares em lugar algum e em todos os lugares ao mesmo tempo. Korra estava à minha frente, seu corpo também pairava na infinidade ao nosso redor, contudo, ela ostentava uma cor azul por todo o seu corpo.

— Você florescerá, Yuan. Até breve, jovem Avatar.

E a cortina de fumaça voltou a me encobrir. O templo de Korra estava tomado por uma luz azul clara, poderosa. Seus olhos apagaram quando a luz saiu da estátua, e eu estava sozinho no santuário, como se nada tivesse acontecido. Minha cabeça pipocava com as inúmeras questões que eu ainda tinha, ainda que parte das minhas dúvidas tivessem sido sanadas por Korra, ainda havia muita coisa para perguntar.

Shun e eu estávamos saindo do templo e eu o contei sobre o ocorrido no santuário e sobre as coisas que Korra me dissera. Ele não esboçou reação alguma em momento algum, só assentiu com a cabeça. Parecia não gostar muito sobre o assunto de Avatar, embora tenha dito para os meus pais que se importava. Passamos por uma dupla de funcionários que poliam o mármore e cuidavam de seu bem estar.

Infelizmente, não eram funcionários.

Todos os pelos do meu corpo arrepiaram no instante em que ouví um estalar elétrico atrás de mim. Shun e eu nos entreolhamos em uma fração de segundos e arremessamos nossos corpos para as laterais. Algo passou zunindo por meus ouvidos, mas não tive tempo para decifrar o que era. Não levou muito tempo para que nos erguessemos e, a alguns metros de nós dois, os que eu imaginei serem funcionários estavam munidos com boladeiras e luvas com uma esfera azul na ponta.

Um deles investiu, apressado, mas Shun foi mais esperto. Pisou no chão e ergueu três rochas e, no mesmo ímpeto, chutou o ar, disparando as três contra o agora descoberto como igualitário. O ginasta parecia esperar por isso e saltou por cima da rocha, contudo, meu irmão o surpreendeu ao erguer uma pilastra de terra bem em seu ponto de aterrissagem, atirando o impostor para longe, aparentemente zonzo.

Outro vinha na minha direção, e uma ideia me correu pela cabeça: eles não sabiam quem de nós era o Avatar. Nos rodeavam, como se estudassem cada detalhe. Mas o que estava para acontecer era ainda pior.

Três homens apareceram na entrada do templo, cercando a entrada. Eles não usavam apetrechos ou armamentos, no entanto, os olhos quase dourados em conjunto das roupas avermelhadas evidenciavam seu parentesco excêntrico: eram dobrador de fogo.

Eu e meu irmão estávamos cercados. Era uma armadilha. Não tinha como chegarem ali tão rápido e se posicionarem, muito menos tinham como saber que eu estava ali. Alguém passara essa informação para eles, mas não tinha tempo para me preocupar.

Não falavam absolutamente nada, como se um entendimento pré-estabelecido existisse. Não precisavam bolar um plano, pois já o tinham. O dobrador de fogo do meio disparou uma esfera de chamas contra Shun, pelas costas, mas eu pude percebê-la em tempo. Coloquei-me na rota do fogo e ergui um muro de terra, aparando as chamas.

— Você cuida dos dobradores de fogo! — exclamou. — Eu pego esses aqui.

Não precisei responder.

Chutei o ar e biparti meu muro de terra, atirando os dois escombros contra os dobradores de fogo. Dois saíram da rota, mas um deles, aparentemente mais lento que os outros, foi arremessado aos capotes. Não havia tempo para comemorar; os dois dobradores de fogo assumiram minha lateral e arremessaram duas rajadas de fogo em minha direção. Não havia tempo e nem espaço para me defender daquilo sem usar a dobra de fogo.

No momento em que as chamas me atingiram, apossei-me delas e girei os braços, obrigando as labaredas a me obedeceram em uma espiral antes de se dissparem. Assumi postura de luta novamente, aguardando o avanço da dupla — algo que aprendi desde pequeno em meus treinos de dobra de terra.

O da direita encurtou nossa distância e arremessou outra rajada de chamas contra mim, enquanto o da esquerda tentou me flaquear para que eu não recuasse. Ergui um bloco de terra abaixo de mim e expulsei meu próprio corpo nos ares, girando em meu próprio eixo e disparando uma projétil de chamas em formato meia-lua contra o dobrador que me atacara. Ele defendeu, mas antes que tivesse oportunidade, prendi seus pés à terra com o uso da dominação, como uma pequena elevação, que reteu seus movimentos no momento em que tentou andar.

Foi minha oportunidade perfeita. Fechei o punho de baixo para cima e ergui uma outra pilastra de terra em vertical contra o estômago do dobrador de fogo, arremessando-o violentamente contra a parede.

No entanto, me empolguei demais e esqueci do dobrador atrás de mim.

Antes que eu pudesse me virar para bloquear as chamas, uma parede de terra ergueu-se bem na linha de fogo. Estendi meu olhar por toda a direção até encontrar meu irmão com leve espaçamento entre as pernas e um dos braços erguidos, o que evidenciava uma única coisa: ele quem fizera o muro. Pouco além dele, os outros dois igulitários estavam inconscientes, um deles com metade do corpo afundada na terra.

O único dobrador de fogo restante sorriu. Era astuto, mais do que os outros.

— Agora sabemos qual dos dois é o Avatar.

Olhei para Shun e pude ver que ele estava com um símbolo estranho no braço direito. Provavelmente foi uma lesão sofrida em combate, mas mais parecia uma marca feita em ferro quente. Não precisava ser um gênio para saber que um dos igualitários nocauteados o marcara, e em troca ele o afundou na terra. Com certeza era para, caso algum dia nós estivéssemos juntos, pudessem me capturar ao invés dele.

O dobrador de fogo, astuto, girou os pés em movimentos circulares e a palma da mão no chão, como um movimento de dança, e ergueu uma cortina de chamas ao nosso redor. Quando ela desapareceu, ele não mais estava lá. Pensei que, no fundo, Korra estava certa. Talvez eu fosse realmente forte e não me aceitava. Só o tempo poderia dizer.

 A polícia de Cidade República não poderia ficar me vigiando todo o tempo, então não os culpei por terem ido embora. A cidade está, sem dúvidas, perigosa; e o Lótus Branco não é responsável para serem os guardas pessoais do Avatar. Eu precisava saber me virar sozinho... Era a única forma de realmente me proteger.

Algo muito sério estava para me acontecer, de qualquer forma. Eu precisava levar as notícias o mais rápido possível para Ikki, Rohan e o Lótus Branco. Alguém, provavelmente alguém do círculo de confiança estava nos espionando.


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