A Lenda de Yuan escrita por Seok


Capítulo 3
Preparar para decolar!


Notas iniciais do capítulo

A fanfic já está pronta, porém, visando dar mais realismo ao capítulo e a história em si, atualizarei toda sexta feira, às 18:00.

Espero que gostem, a ação ficará para o próximo capítulo. xD



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Meu dia começou mais agitado do que eu ansiava.

O atual líder de Ba Sing Se me convocara para o antigo palácio do Rei da Terra. As coisas começaram a mudar muito rápido, e eu ainda não sabia como lidar com mudanças — nunca soube; e, talvez, nunca saberei.

Eu adoraria ter acordado como sempre, mas o que me aconteceu foi algo completamente oposto disso. Minha mãe invadiu o quarto e disse que a guarnição já havia chegado. Imaginei ser algo simples, privado e bem reservado, mas não era nada disso. Haviam quatro membros do Dai Li e uma carruagem movida por dois Cavalos-Avestruz aguardavam-me do lado externo de minha casa.  Meu irmão perguntou se podia ir junto, mas o membro do Dai Li — que aparentava ser o líder do esquadrão — simplesmente maneou a cabeça negativamente, o que vem com que Shun ficasse extremamente irritado. Pudera, afinal, era minha vez de receber a atenção.

Foi até divertido fazer um passeio pela carruagem e conhecer mais da minha própria cidade, já que na maioria das vezes, eu só podia andar de trem e ter uma visão superficial de Ba Sing Se. Pude perceber a mudança na paisagem conforme nos aproximávamos do anel superior, as casas bonitas realmente me chamavam atenção. Na noite anterior, quando a festa fora interrompida, Fang me disse onde morava e pediu para que eu passasse lá assim que possível. Por mais que toda a atenção que eu estava recebendo fosse até legal, eu não conseguia parar de pensar em como as coisas estavam indo de mal à pior. Eu não queria ser o Avatar. Eu só queria ter uma vida normal, me tornar um homem de negócios e fazer o meu nome. Agora tudo estava prestes a mudar. As pessoas começariam a me cobrar mais ainda. Pensei, até mesmo, na possibilidade do mundo não precisar de um Avatar…

Após algum tempo preso em meus mais profundos pensamentos, quase tão vívidos quanto meu próprio medo e ansiedade, finalmente fui interrompido ao chegar no antigo Palácio Real, onde fica o atual chefe da cidade. Desde que o Príncipe Wu abdicou, todos os estados do Reino da Terra se tornaram independentes, cada um com seu líder. Os membros do Dai Li estavam nos quatro pontos cardeais da carruagem, as mãos unidas por baixo do sobretudo longo e uma sombra intimidadora projetada pelo chapéu largo e circular que cada um deles usava. Era estranho, pois mesmo que não olhassem diretamente para mim, eu conseguia me sentir observado e cercado como uma presa pronta para ser abatida a qualquer instante. Os militares mantinham sua respiração tão calma e silenciosa que passariam despercebidos em meio à escuridão. Decidi parar de prestar atenção nisso e admirei o palácio real de perto.

Foi a primeira vez em que eu vi algo tão magnífico e grande. Três grandes estruturas cor de marfim, adornadas com ouro puro e um grande símbolo do Reino da Terra no centro, igualmente feito do mais puro ouro. Haviam três entradas e dois tapetes extensos e verde-esmeralda que seguiam para dentro do palácio. Os jardins eram perfeitamente bem cuidados, plantas milimetricamente cortadas, como se medidas por uma régua. Depois de algum tempo vislumbrando a grande imensidão que, ironicamente, fazia com que eu me sentisse tão pequeno, finalmente entrei. Passei por diversos corredores, até finalmente encontrar uma porta gigantesca e retangular, e não precisava ser nenhum gênio para saber que aquela era a sala onde o líder do estado estava. Primeiro, os agentes do Dai Li entraram e, em seguida, eu.

A sala do trono era diferente do livro de história, talvez porque a maioria dos artefatos reais viraram a própria história e foram levados para um museu ou algo do gênero. Agora, mais parecia com um escritório do que com qualquer outra coisa que eu possa comparar. O chefe do estado, Ting, era um homem de visual impecável. Possuía cabelos grisalhos e um olhar forte, digno de um líder, pensei. Ainda que portador de uma expressão tão rígida, sua seriedade pareceu dissipar-se quando, ao me ver, ele levantou-se de sua cadeira, inclinou o corpo e uniu uma palma da mão à outra, e eu, em respeito, repeti o mesmo gesto. Outras duas pessoas também estavam na sala, com o mesmo manto azulado do homem que eu vira anteriormente, e ele era um dos dois; ambos membros da Lótus Branca.

— É uma honra finalmente conhecê-lo, Avatar Yuan. — cordialmente, ele cumprimentou-me.

— Igualmente, senhor.

— Sente-se, por favor. — Ele voltou a depositar seu corpo em seu devido assento e apontou para a poltrona que estava diante de sua mesa. Eu obedeci seu pedido. — Você deve saber o motivo de estar aqui, suponho?

— Não, senhor. Eu só soube que queria me ver, mais nada.

— Agora que descobrimos que você é o Avatar, precisa partir para Cidade República e treinar com os mestres de dominação — disse ele, como se fosse a coisa mais óbvia do mundo. — Mas, como foi-me dito, você é do anel inferior e não tem recursos financeiros para uma viagem e nem para uma hospedagem na grande cidade. Eu o convoquei para poder conhecê-lo, claro, mas também para lhe oferecer o necessário para sua partida.

— Senhor, eu… acho que ainda não estou pronto.

— Você completou dezesseis anos — interviu um dos membros do Lótus Branco. — Todos os Avatares até hoje iniciaram seus treinos ao concluir o décimo sexto aniversário.

— Mas eu não pedi para ser o Avatar. — Desviei minha atenção para o idoso que chamou minha atenção. — Eu nunca nem quis ser um dominador, se você quer saber.

— E o que pretende fazer sobre isso? — continuou ele. —  Você não pode fugir de quem é.

— Eu preciso de tempo. Tempo para me acostumar com isso tudo.

— O mundo já ficou tempo demais sem o Avatar, e algumas coisas estão começando a… — antes que pudesse concluir, ele mordeu a própria língua, como se acabasse de falar um palavrão. Fez-se um súbito silêncio em toda a sala.

— Jovem Avatar, não é seguro para você viver no anel inferior — o senhor Ting rompeu o clima medonho ao falar, olhando-me com firmeza. — Você precisa partir para a Cidade República. Já está tudo pronto e seus pais partirão com você. Todos vocês terão uma vida melhor, garanto isso.

— Senhor. — Eu apertei meu maxilar com os dentes, forçando-os um contra o outro. — Não me chame de Avatar, por favor. Sou o Yuan. Yuan.

O outro membro da Lótus Branca arqueou a sobrancelha, e tive a impressão de que ele sentiu vontade de sorrir. Eu não sabia seu nome, mas senti uma estranha conexão com ele, como se já o conhecesse. Aparentava ser bem velho, assim como o outro, mas suas rugas de expressão eram iguais as de quem passara boa parte da vida rindo. Sua pele era bem mais escura que a minha, quase negra, e os olhos verdes eram verdes. Era bem evidente que era um nativo do Reino da Terra. Ele me encarou por alguns instantes com um certo brilho no olhar, e então, com um sorriso apaziguante, finalmente falou:

— Os Avatares são tão diferentes, apesar de serem a mesma pessoa… Eu nunca imaginei que, um dia, Korra não ficaria animada em ser o Avatar.

Todos os presentes na sala se entreolharam, e acho que um consentimento silencioso aconteceu entre todos. Apenas eu estava alheio ao que estava acontecendo, algo que não me surpreendia, já que eu praticamente não tinha história de vida nenhuma e todos ali eram bastante velhos.

— Eu te conheço? — não pude conter minha língua, e as palavras foram atiradas para fora da minha boca.

— Eu já tentei dar em cima de você uma vez… — Ele segurou algumas risadas. — E agora, te ver como um menino, é tão engraçado e estranho. Mas seus olhos continuam os mesmos, Korra. Eu sou seu velho companheiro, o príncipe Wu.

Era para ser um momento emocionante, mas tudo que consegui pensar foi em um cara idoso dando em cima de mim em uma vida passada. Acho que fiquei arrepiado, mas não por que meu ‘’espírito avatar’’ estava o reconhecendo, e sim porque fiquei com muito, muito nojo. Tentei disfarçar, embora não soubesse muito bem o que dizer, então permaneci em silêncio.

— Avat-... Yuan, você entende que precisa ir para a Cidade República? — Ting, o líder, questionou-me outra vez.

Pensar em dar uma condição de vida melhor para a minha família pareceu uma boa oportunidade. Mesmo que eles não me tratassem como deveria e darem mais atenção ao meu irmão, continuava sendo minha família. Foi como estar em conflito comigo mesmo. Desde pequeno, ouvi histórias e até mesmo aprendi que o Avatar era um espírito bondoso e que se importava com todas as pessoas, mas eu nunca me senti conectado ao mundo dessa forma. Nunca me senti parte dele. Sempre fui deslocado, tímido e na minha - exceto com amigos -, apesar de possuir uma personalidade um tanto quanto explosiva às vezes — como duas partes de uma mesma pessoa, uma personalidade dupla. A sala continuou em silêncio, e pude sentir que uma tensão se instalou ali. Eu parecia estar perdido em meus próprios pensamentos, até torcer os lábios e cuspir as palavras:

— Eu vou. Quando irei partir?

— Ao anoitecer. Você pode optar entre ficar no centro da cidade ou na Ilha do Templo do Ar, junto aos filhos do falecido Mestre Tenzin.

— Quero levar uma pessoa comigo. Eu posso?

— Se essa pessoa estiver de acordo, como quiser.

— Terminamos?

— Sim. — responderam em uníssono.

Eu me levantei e me curvei novamente, e quando estava prestes a passar pela grande porta, ouvi um assobio logo atrás.

— Boa sorte, Yuan — disse-me o príncipe Wu. — Mestre Hu irá acompanhá-lo. — E indicou o outro membro da Lótus Branca ao seu lado, o mesmo que discutira comigo. — Você será treinado pelos antigos discípulos da Avatar Korra, excelentes dobradores. Eles estão em seu aguardo, pequeno.

Decidi partir para fora do palácio antes que explodisse de raiva e fui encontrar meu amigo, como prometido.

 

 

A casa de Fang era incrivelmente incrível. Era quase como uma mansão, e quando bati na porta, não foi ele quem me atendeu, e sim uma serviçal que lá trabalhava. E não era só a casa do meu amigo que era incrível, todas do anel superior eram de tamanhos exorbitantes, algo muito além da minha realidade. Eu tive que esperar até que ele fosse chamado, e assim que me viu, recebeu-me com um largo sorriso. Eu não retribuí, já que estava um pouco preocupado e ansioso — de uma maneira ruim — com a tão abrupta mudança.

— Você veio mesmo! Mas não me parece muito feliz. O que houve?

— Está tão na cara?

— É, está.

— Eu vou ter que ir para a Cidade República, Fang.

— Ah… — Seu sorriso pareceu morrer aos poucos, até que um largo suspiro escapou de seus lábios. — E eu acabei de te conhecer. Isso é um pouco chato.

— É por isso que eu vim. Os líderes da cidade disseram que eu posso trazer alguém. Você tinha mencionado que não tinha ninguém para te ensinar a dobrar a água como deveria, então… — Eu toquei meus dedos indicadores uns nos outros, um pouco nervoso. — Imaginei que talvez você fosse gostar da ideia. O que acha?

— Acho que meus pais nunca me deixariam ir — respondeu Fang, sincero. Ele pareceu pensar um pouco antes de continuar. — Bem, talvez deixem, se eu disser que estou acompanhado do Avatar.

Senti meu rosto contrair involuntariamente. Sem qualquer intenção ou por um motivo além da minha compreensão, pude notar uma elevação na entonação da minha voz.

— Por que TODO mundo fica me chamando de Avatar? Eu sou o Yuan. Será que tem como parar de me chamar de Avatar?  — as palavras explodiram para fora da minha boca. Fang arregalou os olhos e pareceu recuar um pouco, talvez meu comportamento o tivesse assustado sem que eu pudesse perceber.

— Calma, foi só uma sugestão…

Eu acertei minha própria testa com um tapa.

— Desculpa. Não quis ser grosso. Eu só… não estou lidando muito bem com essas coisas. Seus pais estão em casa?

Fang fez que sim e abriu espaço para que eu pudesse entrar.

Se a parte externa da casa dele já era incrível, por dentro era mais impressionante ainda. Lustres, esculturas, pinturas, móveis de primeira linha e tapetes feitos com materiais que eu sequer conhecia a existência. Percorremos todo o interior de sua casa até sair nos fundos, onde tinha um belo jardim e um lago circular, com trilhas de pedra até ele. Próxima à água, uma mulher de cabelos castanho-arruivados movimentava os braços como se estivesse empurrando e puxando, e a água do pequeno lago obedecia os seus comandos. Praticava a dobra d’água.

— Mãe, temos uma visita especial.

A mãe de Fang cessou as movimentações e a agitação no lago encontrou seu fim, retomando seu fluxo normal. Ela aparentava ser uma moça extremamente de bem com o mundo, fato evidenciado em sua expressão bondosa.

— Seu amigo novo, querido? — indagou ela.

— Sim, mãe. Mas adivinha quem é ele?

— Pela cor dos olhos… — Ela semicerrou um pouco seu olhar na minha direção, como se me estudasse curiosamente. — Um dobrador de terra, assim como seu irmão. Vocês se conheceram na academia?

— Sim. Mas ele não é só um dobrador de terra. Ele é o Avatar!

Até mesmo ela pareceu ficar surpresa. Eu não entendia o motivo de um título ter tanto peso ou influência sobre as pessoas, para mim, era algo completamente besta. A mãe de Fang pareceu refletir acerca de algumas coisas e se aproximou, cumprimentando com a vênia costumeira.

— É um prazer recebê-lo, Avatar. O que te traz aqui?

— Bem, senhora… — eu comecei. — Fang me contou que quer melhorar sua dominação de água, mas não encontra mestres em Ba Sing Se. Os membros da Lótus Branca e o chefe da cidade me pediram para partir para Cidade República, e me deram autorização de levá-lo, se a senhora permitisse. — Procurei ser o mais sereno possível. Esperava que adiantasse de algo.

— Levar meu filho para aquela cidade? — A mãe de Fang parecia detestar a ideia. Negativou com a cabeça. — É extremamente perigosa! 

— Ficaremos sob proteção dos filhos do Mestre Tenzin, filho do Avatar Aang. Não teremos problemas com segurança, senhora. Sei que é uma decisão difícil, mas… também está sendo difícil para mim — eu disse, de coração, a voz marcada pela preocupação. Abaixei meu olhar para o chão. — Abandonar tudo que conheci, todos os amigos que eu tenho aqui…

A mãe de Fang me olhou com uma certa compaixão no olhar. Ela mordeu os lábios e transferiu o olhar de seu filho para mim, alternando-o repetitivamente. Parecia pensar seriamente no que estava prestes a dizer.

— Filho, você realmente deseja isso?

— Mãe, sabe que eu sempre quis me tornar um mestre. E agora eu posso! — Fang mais parecia estar prestes a explodir de expectativa e ansiedade. — O Avatar Aang e seus amigos tinham entre doze e quatorze anos quando viajaram pelo mundo, e era período de guerra. Eles entraram para a história. Nós ficaremos seguros.

— É melhor arrumar suas coisas, então. Tenho certeza que seu pai irá concordar com a minha decisão.

— Obrigado, senhora. — Eu me curvei novamente e uni as mãos, permanecendo um pouco mais de tempo nessa posição, com os olhos fechados.

— Será uma experiência única para o meu filho poder viajar com o Avatar. Quando irão partir?

— Ao anoitecer. O presidente já preparou tudo.

— Boa sorte, Avatar.

 

                                                   […]

 

De volta em casa, meus pais já haviam arrumado suas próprias malas, e aquele membro do Lótus Branco que eu, por sinal, odiava, também já estava lá, aguardando por mim. Claro, ainda assim, ele era um honorável membro de uma organização conhecida, então senti-me na completa obrigação de cumprimentá-lo, antes de seguir para o meu quarto. Quando entrei, meu irmão estava de braços cruzados sobre a janela, observando a paisagem além dela.

— Está ansioso, Shun?

Ele não respondeu, imaginei não ter ouvido, então cheguei mais perto e toquei seu ombro.

— Irmão?

Ele se virou abruptamente e empurrou minha mão, sem demonstrar qualquer delicadeza no ato. Foi fácil notar a raiva em sua expressão. Suas palavras explodiram, repletas de rancor:

— Eu pareço estar ansioso?! — Os punhos fechados pareciam prontos para me dar um soco. — Minha vida inteira está prestes a mudar porque VOCÊ é o Avatar! — ele gritou, apontando para mim em seguida. 

— Eu não pedi isso. Shun, você sabe… — tentei dizer, meu timbre vacilante. — Eu nunca me interessei por essas coisas.

— Um pirralho indisciplinado e sem talento nenhum pra dominação é o Avatar. O que você vai fazer?! O mundo está condenado se algum dia precisar de você!

Meu rosto pareceu arder, não de raiva, mas de tristeza. Senti um arrepio percorrer todo o meu corpo, anunciando a presença de possíveis lágrimas, que eu esforcei-me ao máximo para conter.

— Você vai chorar? — ele provocou-me, como se fosse divertido ver que eu estava à beira de lágrimas. — Então chora, ''todo-poderoso'' Avatar. Isso só mostra que você é um fraco.

Cada palavra parecia fazer com que meu coração sangrasse. Shun era egocêntrico, grosseiro e impiedoso, mas ainda era meu irmão. E eu o amava. E ouvir coisas tão duras de alguém que é importante para nós, é tão doloroso quanto receber uma rocha direto no estômago. Eu não sabia o que dizer. Só fiquei lá, em silêncio, enquanto ele me encarava.

— Como eu esperava. — concluiu. — Você é patético.

E, então, saiu do quarto e fechou a porta com um estrondo. Assim que ele finalmente desapareceu por trás da porta, pude deixar que as lágrimas árduamente contidas demarcassem meu rosto. Eu apertei os olhos e mordi os lábios, pois, no final, eu sabia que ele estava certo. Eu, de longe, sou o pior Avatar de todos.


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