A Lenda de Yuan escrita por Seok


Capítulo 13
Segunda Temporada - O Vilarejo JiHao - Parte Um


Notas iniciais do capítulo

Saudações, dobradores e não-dobradores do Brasil!
Eu estive sumido, né?
Devo admitir: levei anos (dois, para ser mais preciso), para bolar uma história digna de carregar ''A Lenda de...'' em sua composição. Dei o meu melhor. Escrevi e reescrevi. Foram noites em claro para criar uma verdadeira lenda, entretanto, como o Avatar Roku disse para Aang: foi um trabalho amargo, mas os resultados valeram a pena.

É com imenso prazer que eu torno a apresentá-los e introduzi-los à Lenda de Yuan, e, dessa vez, cumprindo todas as exigências que vocês me fizeram, sendo a principal delas: mostrar o ponto de vista dos outros personagens principais. Para isso, adaptei o estilo de Rick Riordan (quem leu Heróis do Olimpo sabe do que estou falando); cada personagem conta com seu próprio estilo de narrar a história, expressando personalidades distintas e singularidades que os tornam unicamente especiais.
Além disso, se você achou que a Primeira Temporada estava bem escrita, prepare-se para se surpreender! Eu me esforcei ao limite para aumentar ainda mais minha qualidade de escrita e conceder uma experiência magnífica e prazerosa — acredite, você sequer perceberá a diferença de uma fanfiction para um livro verdadeiro.

Devo acrescentar que: o período de postagem será de um capítulo por semana, embora cada narração (por exemplo: Yuan, Fang e Seoyin, respectivamente) seja liberada em três dias distintos. Não entendeu? É simples: o ponto de vista de Yuan será liberado na segunda-feira, o de Fang na quarta-feira e o de Seoyin na sexta-feira.Os três, porém, farão parte do mesmo capítulo. Todos estarão narrando acontecimentos distintos, como podemos ver na série Avatar - afinal, nunca tem uma coisa só acontecendo e é isso que pretendo evidenciar aqui. Cada capítulo contará com três (em raros casos, quatro) pontos de vista diferentes.

Sem mais delongas, desejo-lhes a melhor das leituras!



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                                             Yuan

 

 

O Avatar está banido de Cidade República.

Depois das eleições, o novo presidente — um dobrador de fogo chamado Vonkk — alegou que sua cidade não precisava de um Avatar incompetente. É. Acredita-se que os votos foram manipulados, mas não era popular falar isso em voz alta. Os que falavam, começavam a desaparecer, e isso perdura até hoje; o mesmo aconteceu com pessoas de grande poder, como os Conselheiros, pouco tempo antes do novo presidente assumir. Alguma força estranha estava agindo das sombras, indubitavelmente. Cidade República estava rodeada pelo caos, pois as Forças Unidas estavam a favor do presidente, por alguma razão, e as novas leis concebiam poderes totais ao líder da cidade; como uma ditadura, mas não como a de Kuvira, a Grande Unificadora, e sim algo mais tirano, cruel. A Nação do Fogo e as Tribos da Água se mantiveram neutras, assim como Ba Sing Se. Seus líderes disseram que uma guerra contra Cidade República e as Forças Unidas seria uma batalha de níveis catastróficos, e milhares de vidas seriam perdidas. E, também, seus chefes estavam ocupados com seus próprios estados.

Os dobradores de fogo e não dobradores que se aliassem aos igualitários, que agora não estão mais rodeados por uma neblina de mistério, teriam regalias e benefícios na cidade, enquanto os outros — dobradores de terra, água e ar — precisavam declarar lealdade ao presidente, do contrário, seriam perseguidos e presos. Não poderiam votar, comprar coisas, arrumar emprego e coisas do gênero: benefícios de um cidadão comum. Não se sabe o porquê de as Forças Unidas auxiliarem o presidente. Além disso, o líder cortou relações com a Nação do Fogo. Ninguém compreendeu o motivo. Por fim, a Ilha do Templo do Ar foi evacuada, os dobradores de ar partiram para os templos, temendo um novo extermínio. Muitos dobradores também pediram ir junto, temendo a situação da cidade e, como os dobradores de ar tem um coração gentil, lotaram os bisões.

Só o Avatar tem força o suficiente para dar fim à essas atrocidades. Mas eu ainda não era um Avatar totalmente realizado, e não tinha força o suficiente — e nem domínio do Estado Avatar  (eu aprendi o que era isso quando Ikki me explicou) — para me opor à tamanha força política e bélica.

O melhor a fazer foi fugir.

Alguns meses se passaram e o inverno ficou para trás. Estamos quase no fim da primavera. Eu estou vivendo escondido no Reino da Terra. Eu precisava estar pronto antes do fim do verão, se não quisesse permitir que o pior acontecesse. Como Korra disse, não se sabe o que os seguidores pró-Ozai poderiam fazer, ainda mais agora, com uma potência tão forte quando a Cidade República. Não pude me refugiar em Ba Sing Se, pois muitos conheciam minha identidade e não se sabe o que pode acontecer. O Dai Li não é confiável. Estou, então, passando por cidades pequenas, e pequenas vilas, onde minha identidade não é conhecida.

Diferente das histórias do Avatar Aang, eu não tenho um bisão, e se locomover sem ele é uma tarefa difícil. Estou viajando junto de Fang e Seoyin; meu irmão e meus pais seguiram para o Templo do Ar do Norte, onde ficariam seguros. Meus dois amigos não são um casal assumido, apesar de eu achar que sim. Fang e eu nunca falamos do nosso beijo, aliás. Nunca tocamos nesse assunto, pois as pessoas tendem a ser intolerantes e eu temia que Fang fosse assim também. De qualquer forma, sempre que eu estou com os meus amigos, eu me sinto isolado, sozinho. Eles parecem tão felizes sem mim e eu sinto como se não devesse incomodar. Dói, é claro. Dói bastante. Mas não é uma dor física, só… me machuca, sabe? Bem no peito. É como se eu tentasse engolir alguma coisa muito quente e não pudesse respirar direito. Pensar nisso me deixa triste, de verdade, mas fico feliz por eles.

Fang treinara bastante em Cidade República e se tornara um bom dobrador de água, se comparar com quando o conheci. Desde então, tem se aperfeiçoado sozinho, embora estivesse longe de ser mestre. Ele tem tentado me ensinar a dominação, mas ela é especialmente desafiadora. Não consigo controlar nem uma pequena onda, com o básico de ‘’empurrar e puxar.’’ Já Seoyin, é uma excelente dobradora de ar e tem me ensinado bastante. Ela não tem suas tatuagens ainda, mas era tão boa quanto sua idade lhe permitia ser. Ela me ensina sobre a cultura dos antigos Nômades do Ar, e coisas como o ‘’Festival de Yangchen.’’ Ela disse que poderíamos comemorar e que não estávamos muito longe.

Eu tenho meditado bastante, também. Passo boa parte do meu tempo meditando, buscando entender meus chakras e me conectar com as energias do mundo. É o que eu mais gosto de fazer, para ser franco, mais do que dominação. Antes, eu me sentia desconectado de todo o mundo, mas parece que quanto mais você apanha e se levanta, mais forte você fica. Eu sei, sou suspeito para falar, mas tenho me sentido muito mais maduro do que meses atrás.

Entretanto, para cada notícia boa, vêm duas ruins.

Ultimamente, meus pesadelos têm sido extremamente reais. Vejo meu reflexo, mas não sinto como se fosse eu. Os olhos brilham em um vermelho intenso, aterrorizante, e posso sentir uma aura de dolorosa e escura emanando dele.

E, quando não é assim, eu me vejo preso no Estado Avatar. Os olhos brancos e brilhantes são inconfundíveis, mas a expressão no rosto é algo que passa muito longe de algo que eu faria. É como se eu — ele — estivesse sentindo ódio, uma fúria incontrolável. Muitas das vezes, ele me ataca e eu sempre acordo em um sobressalto.

É desesperador, porque Fang disse que eu fico exatamente assim: totalmente fora de controle, assustador, como se não fosse eu.

Contei à Seoyin uma vez, e ela me disse que o Avatar pode sentir a energia dos espíritos — seja sua felicidade, dor, raiva ou qualquer outra coisa que estejam sentido. E com esse reflexo não era diferente. Muitas vezes, quando acordo, eu ainda o vejo; não sei se estou sonhando ou dormindo, mas posso vê-lo na escuridão de meu quarto. Ele não diz nada. Não se move. Apenas me observa, e todo meu corpo se arrepia. Eu queria pedir ajuda à Korra, mas não sei como. Não sem o Solstício. Ainda não sou forte o suficiente de espírito para isso.

Atualmente, nós estamos em um vilarejo do Reino da Terra — JiHao — em um pequeno chalé. O vilarejo foi construído à beira do mar. Ninguém sabe quem somos, embora uma senhora tenha me parado na rua para falar que eu sou muito parecido com o neto dela.
Eu estou deitado no colchão e brincando com algumas moedinhas e dobra de ar, fazendo-as girar e girar, o que era interessante. Por algum motivo, eu sinto que já fiz isso antes. Só não me lembro quando.

A tranquilidade paira sobre minha cabeça e eu sou capaz de ouvir os passarinhos cantando uma melodia suave e acolhedora. O sol entra pela fresta da janela do pequeno chalé e golpeia parte do meu rosto em um calor aconchegante e único. A porta do casebre abre e Fang aparece com uma pequena cesta em mãos. Suprimentos, imaginei.

— Bom dia — diz Fang enquanto deposita a cesta em uma pequena bancada. Eu respondo com um aceno da cabeça, no entanto, ele não olha diretamente para mim. Todas as vezes desde… bem, você sabe (sendo mais específico, quando eu lhe roubei um beijo), quando ficamos sozinhos, consigo sentir uma certa tensão e constrangimento por ambas as partes. Não é como se não nos gostássemos: somos amigos, sim, porém acho que ele tem receio de que eu tente algo do tipo novamente. É claro que eu não faria isso. E, sendo sincero, acho que eu fico irritado com a ideia de que Fang acha que eu seria capaz de tentar de novo.

— Você viu a Seo? — pergunto, em uma tentativa de ‘’quebrar o gelo’’. Eu paro de brincar com as moedas e, quando o faço, assisto-as caírem sobre o colchão.

— Pra ser sincero, não — responde Fang, ainda com um interesse bastante repentino em nossa cesta de suprimentos. — Não a vejo desde ontem a noite, na hora de dormir. Acho que ela acordou antes de nós dois e saiu.

— Pra onde ela iria logo pela manhã? — Eu coloco uma das mãos no queixo, pensativo. Não consigo imaginar em nenhum lugar onde Seoyin pode estar. Ela não é de sair cedo sem avisar.

— Vai saber. — Fang  me olha. É a primeira vez desde que chegou no chalé que ele finalmente parece perceber que não está falando com uma sombra ou com uma estátua. — Dobradores de ar têm seus costumes. Ela pode ter ido meditar ou algo do tipo. Devíamos procurá-la?

— Acho que é uma boa ideia procurar. Juntos vamos chamar muita atenção. Eu vou procurar nos arredores do vilarejo e você procura aqui no centro, tudo bem?

— Tudo bem. A gente se encontra aqui se não acharmos nada.

A entrada do chalé se fecha depois da saída de Fang. Eu me estico, estalo o pescoço e levanto. Meu cabelo ainda está um pouco molhado do banho e eu estou com a minha roupa favorita: uma blusa com manga em somente um dos braços, de modo a deixar o outro totalmente despido. Amarro minha bandana, balanço a cabeça e bagunço meus cabelos com os dedos, do jeito que eu gosto. Meu jeito de arrumar parece que eu acabei de sair da praia, e, devo admitir, é bem estiloso.

As campinas do vilarejo JiHao são uma vasta extensão de verde. Gramas bem-cuidadas, árvores grandes e repletas de frutos e arbustos recheados de flores de tamanhos e cores distintos uns dos outros. As gotas de orvalho ainda umedeciam as plantinhas, e ao olhar para cima, sou capaz de ver um céu limpo na clareira: azul, com poucas nuvens brancas e, é claro, o Sol resplandecente na manhã.

A clareira é um espaço de grama baixa rodeada por arbustos e árvores, com espaço para ver o céu e fazer com que a luz do Sol preencha todo o círculo demarcado pela vegetação.

O silêncio é quebrado única e exclusivamente pela melodia dos pássaros, e o som dos esquilos que saem de suas tocas para procurar comida. Mesmo certo de que estou sozinho ali, com exceção dos pequenos animais, sinto uma forte energia espiritual emanando daquele lugar; vinda do nada, e de todos os lugares ao mesmo tempo. Fecho os olhos e agradeço às estrelas por ser agraciado com a sensibilidade que me torna capaz de experienciar momentos únicos como este. Se Seoyin estiver por aqui, acho que não me surpreenderia. É compreensível.

Sou, porém, retirado de meus devaneios quando ouço algo se movendo na mata. Uma flecha passa rasgando por cima do meu ombro, e eu tenho que me jogar contra o chão para não ser alvo dela. Olho para o lugar de onde ela veio e não enxergo nada senão arbustos e árvores.

— Tem alguém aí? — pergunto.

Meu coração dispara. Acabo me lembrando daquela vez, no mundo dos espíritos, quando fui atacado em meio à escuridão.

No entanto, sou surpreendido quando um Tigre-Leopardo irrompe da mata. Ele é grande, rajado em laranja, preto e branco. Seus olhos são profundos, marrom-esverdeados, e tenho a sensação de que sou capaz de ver um Yuan muito assustado em seu reflexo.

Seria um encontro incrível — surpreendentemente inesperado — se não fosse por um fator que eu não tinha percebido até então: ele estava muito ferido.

Uma flecha cravada na pata traseira e também em seu dorso. As pelagens estão comprometidas pelo que imagino se tratar de golpes de espadas que não tiveram precisão suficiente para matá-lo, mas o bastante para abrir cortes no animal. Ele me olha, alarmado, e solta um guincho de dor.

‘’Ele está por aqui! Sigam o sangue!’’, ouço alguém gritar de algum lugar por dentro da campina. O Tigre-Leopardo tenta fugir de mim, entretanto, suas forças parecem estar no limite. Ele capota pelo chão e manca pela clareira, tentando se afastar de mim e, ao mesmo tempo, da trilha que deixou para trás. Tenho certeza de que ele acha que o farei mal.

Meu coração se enche de preocupação. Eu não posso deixá-lo aqui. Não desse jeito. Estendo as duas mãos para ele, mostrando as palmas, como se em pedido silencioso.

— Calma, rapaz. — Eu tento lhe passar confiança através da voz, que sai trêmula. — Eu não vou te machucar, tudo bem?

Ele faz um som que mais parece com um miado de dor — será que Tigres-Leopardo miam? — e parece chegar à conclusão de que não conseguiria fugir por mais tempo.

Cinco homens saem da mata. Eles trajam roupas do Reino da Terra, verde e marrom, e cada um é mais feio que o outro. Todos empunham armamentos de caça: lanças, machados, arcos e adagas.

— Cadê ele?! — Um dos homens percorre os olhos pelo ambiente e constata a presença do Tigre-Leopardo caído próximo de mim, apontando. — Lá!

Como alguém consegue ser tão cruel? Era só o que me faltava. Eu não vou deixar as coisas assim.

— Por que estão fazendo isso?! — eu questiono, com a minha voz saindo repleta de amargura. — É só um bichinho assustado!

— Não é da sua conta, moleque! — diz outro, empunhando uma lança e apontando-a para mim. — Sabe quanto ouro vale um desses? Vaza!

— É melhor escutar o que o meu amigo aqui está dizendo — comenta o que empunhava um par de machados. — Se não quiser virar filé.

Os cinco erguem seus armamentos contra mim. Lança, machados, arco-e-flecha, adagas e martelo. Eles não estão aqui para brincadeira. Estão prontos para tornar isso algo muito mais sério se eu não sair do caminho.

Mas eu não vou.

Deslizo os pés pelo chão, firmando a base na perna esquerda e montando uma guarda um tanto quanto baixa, mais voltada para a defesa do que para o ataque. Concomitante a isso, posiciono o dorso dos antebraços para cima e mantenho as palmas das mãos viradas para mim. Um estilo atípico da dobra de terra, aperfeiçoado por horas de treino afinco com o Chefe Beifong. Eles terão que passar por cima de mim.

— Eu não vou a lugar algum — digo, a voz firme. É uma das poucas vezes em que a costumeira serenidade abandona meu rosto. Às vezes acho que tenho mais de Korra em mim do que eu penso. Ou tento não pensar.

— PEGUEM ELE! — eles rugem em uníssono.

Os cinco integrantes do esquadrão mercenário me cercam. Estou rodeado. Mesmo se quisesse fugir, não conseguiria. Minha única alternativa é lutar.

O primeiro deles, que empunhava um par de adagas, encurta a distância comigo. Ele é rápido. O som de suas lâminas passa zunindo por cima da minha cabeça quando eu abaixo, ouvindo o rasgar do aço pelo vento. Ao mesmo tempo, dou-lhe uma rasteira e o faço rodopiar. Estico as duas mãos com os punhos fechados quando ele cai, criando uma precipitação de terra voltada para cima que se choca contra o bandido, isolando-o contra uma árvore.

Essa deve ter doído, penso. Mas nas não posso hesitar. Preciso ser inabalável como uma rocha.

Dois deles passam a me rodear em uma dança cautelosa, parecendo atentos aos meus movimentos. Eu giro ao redor de mim mesmo e faço com que meus braços sigam o movimento do corpo, criando elevações de terra que arremessam os dois mercenários para cima. Eles caem violentamente contra o chão e demoram um pouco para se erguer.

Percebo que o mercenário que empunha martelo permanece atrás, embora eu não tenha tempo para pensar muito bem no porquê: afinal, no momento em que me distraí, o arqueiro disparou contra mim e sua flecha passa raspando em meu braço direito, abrindo um corte irritante ali.

O de lança e o dos machados recuperam o equilíbrio. O dos machados avança e tenta me acertar com uma série de golpes, mas suas habilidades são visivelmente inferiores às minhas. Talvez as aulas com meu mestre em Ba Sing Se tenham servido de algo, no fim das contas. Meu corpo ginga conforme o machado avança, como se estivéssemos dançando. Eu me jogo para a diagonal dele e ‘’agarro’ o chão, criando um deslizamento de terra que compromete o equilíbrio do bandido, derrubando-o.

Oportunidade perfeita. Soco o ar duas vezes com o punho fechado e termino abrindo-os, criando, mais uma vez, uma precipitação voltada para cima que colide contra o ‘’machadão’’ e o faz capotar no chão várias vezes.

Ainda no chão, o cara-da-lança tenta me acertar com uma estocada direta. Eu envolvo meus punhos nas pedras que estão presentes no solo e formo uma espécie de luva, que uso para desviar o caminho do armamento adversário. Com a força garantida pelo meu novo acessório, seguro a lâmina da lança com uma das mãos e, ao soltar, volto um soco ascendente direto contra o queixo do seu empunhador, zonzeando-o. Não dou espaço para recuperações. Impulsiono-me para cima em um salto e arquiteto um chute duplo direto no estômago, arremessando-o para longe. Consequentemente, eu caio no chão, mas não demoro para me erguer e montar base novamente, a mesma do começo da luta.

Resta somente eu, o arqueiro e o homem do martelo que, por algum motivo, não atacou até agora. O atirador posiciona três flechas no cordel e fecha um dos olhos, e eu quase sou capaz de sentir sua respiração desacelerar. Se eu for pego, a luta acaba.

Não posso lhe dar essa chance. Não dou.

Ele dispara.

Suspendo as mãos para cima e dou um forte pisão no solo, comandando que um muro de terra erga-se, muro este responsável por aparar os projéteis. Eu o parto em dois com um chute e arremesso uma metade para cada um dos dois adversários, esperando acertá-los. Foi Shun, meu irmão, que me ensinou esse movimento.

O arqueiro não consegue evadir a tempo.

Já o homem do martelo… bem, ele me surpreende. Ele quebra a metade arremessada contra ele com um golpe de sua arma e cospe no chão, rodopiando seu arsenal com um ar de casual arrogância.

Ele endurece a postura. Suas pernas estão espaçadas, o martelo em uma das mãos e o braço oposto dobrado para cima. Uma posição um tanto quanto comum e agressiva da dobra de terra. A posição do meu irmão. Eu o observo. A adrenalina fervilha em meus ouvidos. Acho que consigo sentir — e ouvir — meu coração batendo. Nós parecemos mais estar presos em um baile, estudando um ao outro com máxima cautela.

O adversário dá o primeiro golpe.

Ele choca sua arma múltiplas vezes contra o chão, arremessando pedregulhos contra mim em diversos ângulos. Uso minha dominação para me propelir agilmente pelo cenário, deslizando e me movendo com habilidade e sutileza. As pedras arremessadas se partem no chão em algum ponto atrás de mim.

É aí que sou surpreendido.

Eu não era seu único alvo. Olho por cima do ombro e minha cabeça fica confusa. O Tigre-Leopardo está com uma das patas presas sob uma pedra, incapaz de se mover. Meu cérebro parece ficar embaçado.

Eu cometi um erro terrível.

Um pilar de terra irrompe do chão contra mim, bem no estômago, furtando-me o fôlego e me fazendo capotar no chão algumas vezes. Minha respiração está prejudicada. E dói… como dói.

Meu inimigo sorri. Um sorriso triunfante e arrogante.

— Duas presas em uma só caçada.

A raiva toma conta de mim. Esse sorriso… essa arrogância… Não posso simplesmente aceitar. Eu sou um Avatar natural do Reino da Terra. Ela é minha especialidade. Mesmo que meu inimigo tenha jogado sujo… Não posso permitir que alguém tão mau saia impune dos seus atos. Preciso fazer jús a quem eu sou.

Meu ar parece estar voltando. Estou no chão na mesma posição de um animal de quatro patas, sem forças para erguer-me. O cansaço, porém, é mascarado pela fúria incessante que eu passo a sentir. Minha adrenalina está disparada.

Eu soco a terra com toda minha força. Uma cratera se abre ao meu redor e diversos pedregulhos de tamanho considerável se desprendem do solo em várias direções. O dobrador de terra lança-se para fora do alcance das rochas.

Como Beifong ensinou.

Visualize e ataque.

No momento em que seu corpo está no ar, vejo a oportunidade de ouro. Dou dois socos no vácuo e duas pilastras de terra isolam meu adversário com brutalidade, em cheio. Ele cai ao chão.

E é quando ele cai que eu ergo-me mais uma vez. Estou todo suado e sujo de poeira e, é claro, terra.

— Saia daqui e não perturbe mais animais indefesos. — Minha voz sai áustera. Repleta de confiança, assim como meu irmão fazia no passado. — Da próxima vez, lute com alguém do seu tamanho.

O homem me olha. Posso sentir a ira em seu rosto. Ele abaixa a cabeça e cada um dos seus companheiros se ajudam, recuperando as armas. Eles se entreolham e parecem entrar em um consenso. Então, recuam e desaparecem da clareira.

O Tigre-Leopardo ruge em resposta, contudo, ele parece estar sem forças para orquestrar um som de ampla magnitude. Ele mia em conseguinte. Eu ordeno que a pedra saia de cima de sua pata com um movimento da mão e me aproximo, fletindo os joelhos.

No exato instante que nossos olhares se cruzam, não vejo mais um Yuan assustado no reflexo. Sou encarado, sim, mas não por mim mesmo. Sinto que estou olhando para a alma do Tigre-Leopardo, e ele para a minha. Uma conexão sublime se forma entre nós dois, e eu tenho a sensação de que ele está me agradecendo, ainda que não falemos o mesmo idioma.

Tomo coragem para coçar uma de suas orelhas e ele ronrona.

— Você está a salvo agora — eu digo, acariciando o grandalhão. — Tenho um amigo que pode cuidar de você. Tudo vai ficar bem. Eu prometo.


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