O Anel Claddagh escrita por ferporcel


Capítulo 16
Capítulo 16: Entrega




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Capítulo 16: Entrega

 

Severo, ao receber a primeira carta da Granger que se seguira aquele encontro desastroso, não tinha mais nenhuma opção senão sair de Hogwarts pela duração dos feriados. Ela tentaria encontrá-lo lá, eventualmente. Ela exsudara pena por toda parte, e Severo estava cansado de pena. Ele não precisava disso, não queria isso – nunca iria querer.

 

O lado bom dessa decisão de sair era, é claro, estar longe da pena da Granger, entretanto, o lado não tão bom disso era que ele não tinha mais lugar nenhum para ir exceto seu lar da infância na Rua da Fiação. Ele não tinha escolha. Não havia mais lugar nenhum para ir.

 

Então, para a Rua da Fiação ele foi, convencido de que isso era melhor do que a alternativa. Podia se esconder lá como fizera freqüentemente durante a guerra, e a ignoraria o quanto fosse possível. Isso lhe daria tempo para se recuperar da conversa que eles tiveram, da humilhação que sofrera, e mais o importante de tudo, para criar uma certa imunidade a essa mulher, que fora apenas uma garota irritante não havia muito tempo.

 

O que aconteceu com aquela menina? Ela obviamente se tornara uma mulher perigosa. Sabia como atingi-lo e não tinha medo de usar aquele poder, como a maioria das pessoas. Ela o desafiava, duvidava dele, e o fez se passar por tolo.

 

O pior de tudo era a habilidade da Granger de expô-lo, de forma notável, para si mesmo. Ele fora lá com o objetivo específico de pegar seu anel de volta, e saíra empurrando-o de volta para ela e admitindo sua miséria e que vivia uma vida sem sentido.

 

Sou um fracasso patético de ser humano.

 

Ele sabia disso, e não precisava ser lembrado. Por três dias ele não foi, por três dias ele fora deixado no que se passava por paz na sua vida, achando que a Granger tinha seguido em frente com a vida perfeita dela e o deixado na sua vida miserável.

 

No terceiro dia, a opressão que sentiu e que culpou o fato de estar preso naquela casa deplorável, assombrado por lembranças dolorosas, tornou-se insuportável. Se ele tinha que ser assombrado por lembranças da sua infância, preferia aquelas lá fora, e vestindo uma capa, saiu para uma longa caminhada.

 

Ele percorreu os passos confiantes de um caminho bem conhecido, sem realmente olhar em volta, simplesmente sentindo o ar frio da brisa vindo do descampado rio congelado. O fundo branco, manchado em tons de cinza, combinava com seu humor e aparência, fazendo-o parecer ainda mais parte da paisagem. Mas os olhos de sua mente não viam o mundo monocromático à sua frente, mas sim todo em verdes e azuis, vermelhos vibrantes e marrons confortadores de verões passados na companhia da sua felicidade – porque a Lílian fora a única felicidade na sua vida.

 

Por anos, ele não fora em busca de suas lembranças felizes. Elas sempre estiveram ali, amarradas aos seus maiores erros, mantendo-o forte e vivo.

 

Completo.

 

Agora havia alguma coisa faltando, alguma coisa que ele perdera. Era de enlouquecer, e o levara até o velho parquinho. Não era o mesmo, nem em aparência e nem em sentimento. Ela não estava lá; ele não estava lá. Determinado a não voltar para sua miséria sem encontrar esse pedaço de si, Severo desceu a rua, deixando sua alma guiá-lo até uma casa, mas quando chegou lá, tijolo e grama fria o receberam; nenhum calor, nenhuma alegria, nenhuma culpa, somente indiferença e nada mais.

 

Severo observou a casa onde a Lílian vivera durante a infância com olhos negros que refletiam seu estado de espírito. Ele deu tempo suficiente para os antigos sentimentos se manifestarem, mas eles permaneceram inertes, seu coração intocado. Repassou em sua mente momentos importantes que vivera ali, mas não eram nada além do passado – um passado muito distante.

 

Dando as costas para esse exercício fútil, derrotado, ele voltou para sua casa ordinária, sabendo que nunca mais estaria completo, nem mesmo com as lembranças de Lílian. Entrou na sala de estar repleta de livros esperando ser recebido por uma solidão ainda mais profunda, mas ao invés disso encontrou uma coruja empoleirada no braço do sofá velho.

 

Por um momento, seu coração expandiu com a visão. Depois ele se lembrou que era muito provavelmente de Flitwick – nada para se animar. Mas na hora em que sentiu o pergaminho com os dedos, soube que era dela e parou – seu coração acabara de expandir novamente, e desta vez Severo não podia fazer nada para contê-lo.

 

A mensagem dela não era longa, e se ele olhasse para sua essência, era bem simples: encontre comigo de novo, eu acredito em você.

 

Ele franziu a testa; ela sentia pena dele. Mesmo estando certo daquilo, Severo não jogou a carta dela fora. Ele a dobrou e deixou cair sobre o livro que estivera lendo. Foi para a cozinha, de repente notando que estava com fome.

 

o0oOo0o

 

Era o ultimo dia do ano, mas para o Severo era um dia como outro qualquer. Ele não planejara nada de especial para a noite e não planejaria. Estivera organizando todos os livros que mantinha ali – uma tarefa há muito adiada. Passaram-se três dias desde que Granger escrevera para ele. Se ela era metódica, talvez recebesse a visita de outra coruja antes do dia acabar.

 

Não passava muito do meio dia quando sua previsão se confirmou. Ele sorriu com malícia, satisfeito, pegando a missiva da ave e lendo-a enquanto andava até a cozinha. Parou quase lá, levantando as sobrancelhas para o conteúdo da carta.

 

Granger estava implorando que ele respondesse as cartas, que a encontrasse. Implorando.

 

Severo não sabia o que fazer de uma Hermione Granger suplicante. Novamente, onde estava a grifinória orgulhosa, a menina irritante que fazia questão de ser aquela ajudando os alunos ineptos com seu intelecto superior só para mostrar que não precisava de ajuda nenhuma? A menina metida se fora?

 

Severo continuou seu caminho para a pequena cozinha de sua casa, tentando compreender com quem estava lidando. Quando voltou para a sala de visitas trazendo uma xícara de chá, estava perdido em pensamentos, os livros por toda parte esquecidos.

 

Tentou esquecer a menina e focar sua atenção na mulher que encontrara no Caldeirão Furado. Tentou repassar em sua mente todas as expressões dela, os gestos. Ela tinha olhos castanhos expressivos, que traiam os pensamentos dela sem a necessidade de Legilimência. As mãos dela eram delicadas, pequenas e pareciam macias.

 

Somente então Severo se lembrou do anel. Pegou-o de surpresa, não porque não a vira usando-o naquele dia, mas porque ele não pensara nele há algum tempo. Franziu a testa com a realização. Isso tudo era por causa de seu anel, afinal de contas.

 

Seja como fosse, Severo dobrou a carta e deixou-a no sofá quando se levantou. Ele não tinha intenção de responder, então não importava o que provocara esse comportamento. O Inferno podia congelar e Severo não dava a mínima.

 

Trabalhou o dia todo nos seus livros, mas à noite, perto da meia-noite, escolheu uma boa garrafa de vinho trouxa e serviu um pouco num copo de vidro comum. Rolou o líquido na língua, saboreando-o enquanto o velho relógio anunciava o final do ano.

 

Subiu para o segundo andar não muito depois, preparando-se para uma boa noite de sono. Antes de Morfeu o arrastar para a inconsciência, a visão de olhos castanhos olhando intensamente para ele, junto com a lembrança das cartas, fez um sorriso crescer nos cantos da sua boca.

 

Severo sonhou naquela noite, mas não se lembrou de nada na manhã seguinte.

 

o0oOo0o

 

Hogwarts era seguro novamente, ou assim sugeriu a carta que Flitwick enviara. Granger visitara o castelo ontem, procurando por ele, e fora para casa frustrada, ou assim ele esperava.

 

Essa situação começava a entretê-lo. A Granger estava enlouquecendo com o desprezo da pena dela. Ela implorara, fora atrás dele. Era bom para ela beber um pouco do próprio veneno, sendo torturada assim como o torturara cada vez que lhe negara o anel.

 

O que ela faria depois? Essa nova Hermione Granger era muito mais interessante do que sua versão mais nova. Ele não precisava mais se esconder; tinha a vantagem agora. Então decidiu que podia deixar a Rua da Fiação. Era sexta-feira, e podia aproveitar o castelo livre de alunos por uma última semana antes do novo semestre começar. Devotaria um pouco do seu tempo para sua pesquisa negligenciada, e esperaria o próximo passo da Granger.

 

Porque ele não tinha dúvidas que sendo a grifinória que era, ela não desistiria até conseguir o que queria, seja lá o que fosse.

 

o0oOo0o

 

Uma batida na porta do seu escritório perturbou Severo. O semestre começara hoje e eleja estava sendo exposto a alunos irritantes.

 

— Entre — chamou irritado.

 

Arrependeu-se no momento em que a porta abriu para admitir seu martírio, Harry maldito Potter.

 

— Precisamos conversar — Potter o informou.

 

Severo ergueu uma sobrancelha à audácia dele. — Eu certamente não preciso conversar com você, Potter. Na verdade, não preciso e não quero. — Severo dispensou Potter com aquilo e voltou para as redações que corrigia.

 

— Estou aqui em nome de outra pessoa — Potter continuou, tomando a cadeira em frente à mesa sem ser convidado, como sempre. — Vim entregar uma carta e preciso que leia antes de eu ir embora.

 

Severo bufou apesar de sua simulação de ignorar o homem. — Você realmente deveria perguntar sobre as corujas, Potter. Elas são aves muito capazes, muito eficientes na entrega de correspondência.

 

Uma carta caiu sobre as redações que corrigia. Severo levantou os olhos com desprezo. Abriu a boca para falar, mas Potter foi mais rápido.

 

— Quer que eu saia, então leia a carta. — O calvário de Severo cruzou os braços sobre o peito e reclinou-se na cadeira.

 

Severo olhou feio para ele, pegando o pergaminho que Potter acabara de jogar para ele para jogar de volta quando sentiu a qualidade do papel. Olhou para o envelope e estreitou os olhos.

 

— O que é isso? — perguntou suspeito. Era obviamente uma carta da Granger, mas Severo tinha que perguntar. O que o Potter tinha a ver com isso?

 

— É uma carta, professor, e uma que o senhor deve ler antes que eu possa ir embora.

 

Os olhos de Severo permaneceram estreitos enquanto olhava fixamente para o Potter. — Posso ver que é uma carta, seu idiota. O que você tem a ver com isso?

 

— Por que não lê e descobre? — Potter sorriu com malícia.

 

— Quem mandou você aqui? — Severo queria saber quanto o Potter sabia.

 

— Professor, apenas abra a carta — Potter disse, perecendo irritado.

 

Já curioso demais, Severo abriu a carta da Granger.

 

Professor Snape,

 

Sei que não quer me encontrar, não sou estúpida, mas não pense que pode me ignorar e evitar para sempre. O senhor saiu antes de terminarmos nossa conversa. Não foi minha intenção assustar ou insultá-lo.

 

O anel é seu, não tenho dúvidas agora. Estava só tentando entender a importância que ele tinha para o senhor, mas acho que fui longe demais. Não queria que fosse embora daquele jeito, e estive procurando pelo senhor desde então para me desculpar.

 

Então, me desculpe.

 

Severo suspirou.

 

Eu sei como o anel Claddagh é importante para o senhor – muito mais do que para mim. Mesmo não sabendo o motivo, quero que o tenha de volta. Estou passando um mês na Bulgária, mas peça ao Harry pela bolsinha; ele está com ela.

 

Ela deu o anel para o Potter! Ela contou para ele! Severo nem sabia o que o fez continuar lendo.

 

Aliás, ele não sabe o que está acontecendo. Eu não violaria sua privacidade assim, não poderia. Se ele agir como se soubesse de alguma coisa, é porque ele quer que o senhor deixe escapar alguma informação, é uma técnica auror. Mas tenho certeza que o senhor já sabe tudo isso.

 

Antes de deixá-lo, tenho uma última coisa para pedir: responda as minhas cartas, por favor.

 

Atenciosamente,

 

Hermione

 

Severo não sabia se era o pedido ou como ela assinara a carta, mas ele sentiu vontade de sorrir. Não o fez, mas o sentimento estava ali.

 

Potter olhava fixamente para ele, estava ciente disso. Dobrou a carta e encontrou o olhar dele.

 

— Acho que tem algo mais para mim.

 

Potter tirou uma bolsinha de dentro das vestes e ofereceu-a para Severo. Ele a pegou, mas não abriu, colocando-a na gaveta da mesa.

 

— Pode ir embora agora, Potter — dispensou o mensageiro.

 

— Acho que a Hermione estará esperando uma resposta — Potter disse.

 

— Isso não é da sua conta. Fez sua entrega, agora vá brincar de coruja em outro lugar. — Severo se levantou, colocou as mãos na mesa, e ergueu uma sobrancelha para o Potter.

 

Potter suspirou e levantou-se para sair. Quando parou no meio do caminho e olhou para trás, pronto para dizer alguma coisa, Severo clamou:

 

— Fora.

 

Desta vez ele foi, amaldiçoando baixinho, e Severo estava livre para transformar seu sorriso malicioso num sorriso de verdade quando a porta bateu.

 


 

No próximo capítulo... Hermione tenta viver sem o anel e o seu dono.


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