O Anel Claddagh escrita por ferporcel


Capítulo 1
Capítulo 1: Pertences




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Capítulo 1: Pertences

 

O barulho no Salão Principal era alto e alegre – até demais se você perguntasse a Severo Snape, professor de Defesa Contra as Artes das Trevas. Ele deveria ficar em seus aposentos para as refeições quando Harry Potter estava em Hogwarts. Se ao menos o moleque os avisasse quando viria, ajudaria muito.

 

Do jeito que as coisas estavam, Severo sofreria uma noite barulhenta. Desde o final da guerra e de sua recuperação da Batalha de Hogwarts, não havia um dia que Potter estivesse por perto que o homem irritante perdia a oportunidade de visitá-lo. Ele tentara explicar que não precisava ou queria a amizade dele em várias ocasiões, mas este... novo Harry Potter parecia ter feito uma questão de vida ou morte ser civil e amigável com ele.

 

Ah sim, lá vem ele.

 

— Boa noite, Severo.

 

Severo resmungou um cumprimento.

 

Potter deu um riso curto. — Posso ver que está bem.

 

O que há de errado com esse moleque?

 

— Olha, eu queria saber se podemos nos reunir depois do jantar; tem um assunto que eu preciso tratar com você.

 

Claro que tinha. Severo suspirou, procurando um desculpa para escapar da reunião.

 

— Não vou tomar muito do seu tempo — Potter o assegurou. — É assunto do Ministério.

 

O maldito Ministério. Desde que Potter se tornara um auror, ele tem usado o Ministério com desculpa para reunir-se com ele o mais freqüentemente quando racionalmente possível, e no final, tudo o que ele queria conversar era sobre a mãe dele. Lílian não estava satisfeita com todos os seus sacrifícios anteriores, ou era o que parecia. Ela ainda queria puni-lo pelos seus erros ao empurrar o filho Potter dela para cima dele depois de todo esse tempo.

 

— Está bem, mas eu só tenho um momento para perder com você, Potter — ele finalmente concordou.

 

— Prometo que não tomará muito tempo.

 

Severo bufou, já conhecendo aquele sorriso calculado bem demais. Por que, Merlin? Por quê?

 

Ele se levantou e andou a passos largos para fora do Salão Principal, deixando Potter para segui-lo como podia. Severo tomou um momento para deliciar-se em como o Potter ficou sem fôlego antes de abrir a porta do seu escritório para eles. Harry se sentou sem ser convidado, como sempre.

 

— Você esperava minha mãe quando vocês andavam juntos, ou ela tinha que correr para acompanhá-lo também?

 

Lá vamos nós.

 

— E eu vou ficar sabendo como isso afeta o Ministério em breve, tenho certeza — Severo dispensou.

 

— Acho que isso é um sim para a última pergunta. — Harry sorriu.

 

— Eu não tenho tempo para jogar conversa fora, Potter. Se você realmente tem algo de alguma importância para dizer, eu aconselho que o faça agora, antes que eu lhe ponha para correr.

 

— Nada de chá?

 

Severo, em pé do lado oposto ao de Potter na mesa, inclinou-se ameaçadoramente com as palmas das mãos no tampo para balancear seu peso. Ele realmente esperava que o moleque irritante entendesse a mensagem e andasse logo com qual fosse a desculpa que ele tinha para esta reunião.

 

— Está bem, está bem — Potter disse defensivamente —, estou aqui para lhe contar que o último estágio burocrático com respeito às investigações em seus pertences foi finalizado ontem. Você pode pegar os seus livros de volta, finalmente.

 

Outro sorriso, como se ter de volta alguns livros velhos de Artes das Trevas fosse como ter um Natal todos os dias.

 

— Se isso é tudo, deixe os livros e suma da minha frente.

 

— Ah, mas eu não trouxe os livros comigo.

 

Severo revirou os olhos. Se ao menos o moleque tivesse herdado mais que o verde dos olhos de Lílian – digamos, por exemplo, o cérebro dela. Severo tomou a cadeira atrás de sua mesa e ocupou as mãos arrumando pergaminhos, depois as descansou cruzadas sobre as páginas. Resignado, olhou para Potter.

 

— Você não está aqui só para entregar essa mensagem. Até você sabe o que uma coruja é e como usar uma.

 

Potter suspirou. — É tão espantoso assim que eu queira lhe visitar? Pensei que você iria gostar de saber que o Ministério não tem mais nada que possa usar contra você, e eu queria dar-lhe a notícia pessoalmente. É tão errado assim?

 

— Quantas vezes eu terei que lhe dizer que o fato de você ser filho da Lílian não faz de você um amigo em potencial, Potter? — Severo enfatizou o sobrenome errado enquanto olhava feio para ele e depois fingiu ler o pergaminho do topo em sua mesa. — A mensagem foi entregue; seu trabalho aqui está feito. Agora, saia.

 

Severo ouviu mais do que viu Potter se levantar e andar até a porta. Infelizmente, o moleque tinha mais alguma coisa para acrescentar antes de deixá-lo em paz.

 

— Eu ia me oferecer para trazer a papelada para você assinar aqui, mas já que você não gosta das minhas visitas, será requisitado que se encontre com o Diretor da Comissão para Assuntos de Guerra algum dia na próxima semana. Eu só estava tentando poupar-lhe uma viagem a Londres, mas parece que você gosta de viajar. Boa noite, Snape.

 

Moleque! Severo não esperava por um lance tão sonserino de seu algoz grifinório atual. Talvez ele tivesse herdado algo além dos olhos de Lílian afinal de contas: sua crueldade. O que Potter não sabia era que Severo não era só um Mestre em Poções, mas também um em sutileza, crueldade e vingança.

 

Olhou de volta para o pergaminho sob suas mãos – um estudo sobre venenos, sua nova especialidade. Era esperado que ele atestasse sua validade antes que o Jornal de Poções e Venenos o publicasse. Suas melhores idéias sempre vinham quando ele estava num laboratório de Poções, e uma viagem para as masmorras parecia em ordem. Levantou-se, "chamou" um livro relevante de uma prateleira, e deixou o escritório. Severo tinha planos a fazer.

 

o0oOo0o

 

Severo entregou sua varinha para a jovem bruxa e esperou que fosse devolvida. Não gostava deste procedimento. Na verdade, ele não gostava de nenhum dos procedimentos do Ministério e evitava visitar o lugar o máximo possível. Tivera sorte nos últimos cinco anos e não estaria ali hoje se Harry maldito Potter não tivesse feito um desafio tão insuportável. Porque fora um desafio, e enquanto Severo vivesse, aquele moleque jamais teria a última palavra em nada.

 

Foi até os elevadores sem nem mesmo um olhar de relance para os lados. Foco era a chave para uma visita bem sucedida ao Ministério. Ele pegaria o elevador, desceria no andar certo, encontraria essa pessoa dos Assuntos de Guerra e daria o fora dali.

 

A voz anunciou o andar do Departamento de Execução das Leis Mágicas e Severo saltou, seguindo um par de aviões de papel. Havia um pequeno balcão de recepção, e uma jovem bruxa se virou para recebê-lo. O sorriso acolhedor dela se dissolveu assim que o reconheceu.

 

Nada de sorrisos para mim, estou vendo. Seria uma idéia triste se não fosse engraçado.

 

— Estou aqui para ver o Diretor da Comissão para Assuntos de Guerra.

 

Agitada... ainda é engraçado, mesmo que mais para irritante. Severo tentou se lembrar do nome dela. Ela fora uma lufa-lufa...Summers? Não, Summerby.

 

— Srta. Summerby — ela se retraiu —, se não for pedir muito, diga-me onde posso encontrar o Diretor da Comissão para Assuntos de Guerra; você pode agir como uma irritante aluna do primeiro ano depois disso — ele zombou.

 

— Terceira mesa à esquerda, professor — ela conseguiu dizer.

 

Severo saiu na direção que ela apontara, concentrado em acabar o mais rápido possível com isso. Claro, isso foi antes de...

 

— Prof. Snape! Que prazer!

 

Potter! Claro que é Potter! Ele urrou em frustração. — Você é o Diretor da maldita Comissão para os malditos Assuntos de Guerra. — Olhou feio por sobre o nariz para a perdição de sua existência continuada.

 

— Surpreso? — Potter sorriu com malícia.

 

— Não vou entrar nos seus joguinhos, Potter. Dê-me o que é meu para que eu possa dar o fora daqui, e deixe-me em paz.

 

— Para que a pressa, professor? Por favor, sente-se. Aceita um chá?

 

Severo olhou desdenhosamente para a cadeira que Potter oferecera. Ele só pode estar brincando — pensou. — Fique com os livros, Potter. — Virou-se para ir embora.

 

— Não, espere! Sinto muito.

 

Severo parou e olhou por sobre o ombro para o Moleque Que Sobreviveu, que estava agora em pé ao lado da mesa. — Não, não sente — Severo declarou.

 

— Qual o problema de sentar para tomar uma xícara de chá, professor? Só estou tentando ser educado.

 

— Estou aqui pelos meus pertences, Potter, não para cortesia. Se você não se importa, eu gostaria de pegá-los e ir embora.

 

— Está bem — Potter concordou, quieto por um momento. Ele se ocupou em procurar por algo na bagunça dele até produzir um pedaço de pergaminho e oferecê-lo para ele. — Não vou usar isso contra você se quiser se sentar para ler antes de assinar.

 

Severo pegou o pergaminho e sentou-se. Ele não assinaria nada com o selo do Ministério sem antes ler cuidadosamente. Pelo canto dos olhos, ele seguia os movimentos de Potter, e quando o moleque amaldiçoou baixinho, Severo esqueceu o pergaminho por um momento.

 

— Towler — Potter chamou o homem que passava por seu cubículo. O homem parou para ouvir. — Pode pedir para a Granger me trazer o livro quando passar por ela?

 

— Ótimo, você tem emprestado meus pertences. Que esplêndido — Severo murmurou, mas só porque tinha certeza que o Potter podia ouvi-lo. Depois decidiu ler o documento antes e indignar-se com o comportamento do Potter mais tarde, quando ele seria capaz de azará-lo apropriadamente.

 

Chegara ao final do documento quando o cubículo foi invadido por um protesto alto.

 

— Harry, você disse que eu tinha até amanhã para ler o-

 

— Sinto ter que abreviar o seu assalto sobre os meus pertences, Srta. Granger — ele disse, a cabeça inclinada sobre o documento, quando ela falhou em completar seu protesto. Ele assinou o pergaminho e ofereceu-o ao Potter. Encolheu os livros que Potter separara, colocando-os num bolso de suas vestes pretas. Ele se levantou para ir embora e só então se virou para encarar Granger.

 

Ela parecia vexada, como deveria estar, e estendia o livro para ele. Ela visivelmente tentava reganhar um pouco de seu ar de desafio, endireitando os ombros e erguendo o queixo. — Estava sob custódia do Ministério até agora. Eu estava simplesmente cumprindo com o meu dever.

 

Ele ergueu uma sobrancelha àquilo; ela era uma péssima mentirosa. Ele baixou os olhos para o livro e o agarrou.

 

Foi quando ele viu.

 

Ele segurou o livro sem puxá-lo, olhando fixamente pasmo para a mão segurando a outra ponta dele – mais especificamente para o dedão sobre a capa. Lá estava ele! Ela estava usando ele! Disciplinou suas feições em tempo, ou assim esperou, e finalmente agarrou o livro, fazendo-a largá-lo. Severo olhou da mão dela para o rosto dela, franzindo a testa. Antes que pudesse fazer ou dizer alguma coisa, ela assentiu com a cabeça e saiu, levando seu pertence mais valioso com ela.

 

Droga!

 

O único pertence que ele perdera durante a guerra com que realmente se importava era o anel atualmente adornando a mão de Granger.

 

— Está se sentindo bem, professor?

 

A pergunta de Potter o trouxe de volta de suas contemplações. O desdito estava zombando dele novamente. Com o Potter e todos os outros aurores ali... ele não podia fazer nada a respeito.

 

— Nunca estive melhor — ele respondeu. — É só isso?

 

— Sim, esses são os últimos itens seus em nossa custódia.

 

Severo saiu a passos largos sem nem olhar de relance para trás antes que fizesse algo de que se arrependeria depois, algo que fora bem cuidadoso para não fazer desde que a guerra terminara. O anel não estava perdido, pelo menos não para o mundo, o que era uma forma de alívio. Entretanto, ele parecia perdido para ele no momento. Potter dissera que eles não tinham mais nenhum de seus pertences com eles, mas Granger tinha o anel. Meu anel! — acrescentou para si mesmo. Severo queria voltar lá, tirá-lo da mão dela e pegá-lo de volta. Como ela ousa usá-lo? Não é dela; ela não tem nenhum direito de usá-lo!

 

Ele estava no átrio e nem percebera, tamanha era sua fúria. Um par de bruxas pareciam aterrorizadas ao avistá-lo, e ele parou – não por causa das expressões de horror delas, mas porque ele não sabia como sua varinha escorregara para sua mão. Ele a escorregou de volta para dentro da manga e começou a andar novamente. Assim que pôde, aparatou para Hogsmeade.

 

o0oOo0o

 

Severo abriu os olhos para a visão da Casa dos Gritos ao invés dos portões da escola. Fechou os olhos novamente com um suspiro; parecia que as horas, dias que passara procurando pelo seu então perdido anel o afetara quando se concentrara no destino. Ele podia aparatar para os portões de Hogwarts então, mas decidiu andar. Ele precisava do tempo para esfriar a cabeça e decidir o que fazer agora que tinha finalmente encontrado o anel.

 

Chegou às portas do castelo sem nenhuma única idéia aplicável sobre como reivindicar o anel como dele. De fato, havia uma maneira, mas ele não iria se humilhar desnecessariamente. Ele tinha que fazer Granger entregar o anel para ele de vontade própria. Como? Ele teria que descobrir.

 

Severo foi direto para os seus aposentos, mesmo que fosse para ele ficar em seu escritório até a hora do jantar. Considerando que nenhum aluno era louco o suficiente para procurar por ele fora da sala de aula mesmo, e os outros professores podiam encontrar o caminho pelas masmorras se precisassem dele, Severo achou que era seguro perder a hora de atendimento ao aluno. Mais seguro, na verdade; ele precisava de um lugar com proteções onde pudesse descarregar sua frustração em paz.

 

Muitos itens explodidos e reparados, muita inquietação, e muitas palavras de frustração depois, Severo estava pronto para admitir a derrota. Ele tinha tido uma idéia que não envolvia muita humilhação, mas lhe custaria algum tempo. Tempo precioso, se alguém lhe perguntasse. Ele precisava do anel.

 

Com um suspiro, ele se sentou à mesa e pegou um pedaço de pergaminho, esticando-o sobre o mata-borrão. Pegou uma pena pontiaguda e começou a escrever. Na terceira tentativa, ele tinha uma carta pronta para ser enviada. Antes que sua coragem o abandonasse, ele foi até o corujal e mandou a carta.

 

Agora, tudo que ele podia fazer era esperar.

 


 

No próximo capítulo... O plano de Severo é revelado em sua primeira carta para Hermione.


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