Black Desert escrita por Kallin


Capítulo 14
Um Atalho para Respostas




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Contornando rapidamente o primeiro beco, eu andava ao som dos meus rápidos passos nas poças de água fria que escorriam da parte de trás dos canos das construções. Minhas sandálias não eram sozinhas, suficiente para evitar que meus pés se molhassem e se sujassem com a areia molhada e seca que eram levantadas. Diferente do caminho que eu havia tomado para chegar até lá, eu dobrei em uma outra rua tomando um rumo totalmente diferente (um atalho, por assim dizer). Usando meu firme cajado que balançava em minha mão, eu me apoiava para em poucos movimentos subir velozmente nos balcões e blocos altos que assim como tudo ao meu redor era completamente negro, entregando que um dia essas coisas também já foram parte de outras construções -construções que não resistiram ao tempo e às mudanças.
Aquele caminho conhecido como "Escadarias" parecia um largo labirinto escuro e desnivelado, contornado pelas paredes e janelas iluminadas de vários outros prédios habitados. Acima dessa passagem ainda se via antigas fiações precárias e bagunçadas se cruzando de todos os lados cortando a vista das estrelas e entregando a forma obsoleta em que a energia da cidade ainda era distribuída em algumas partes... Algumas delas até tinham panos velhos e rasgados dependurados, fossem como sinais de antigos varais, ou apenas como uma forma de entregar a intensidade dos ventos para alertar as pessoas de uma possível tempestade de areia vindo na nossa direção. Enquanto eu corria por esse espesso metal e subia cada um dos lances com dificuldade, também procurava bater com meu cajado no chão negro que ainda refletia a pouca luz das estrelas e da lua, tentando ter certeza de que não haveriam buracos ou degraus na minha frente que eu não notasse. Aquela era uma das várias passagens difíceis por entre os becos que funcionavam muito bem como atalhos entre a Cidade Baixa e o Gargalo, mas só se você tivesse a condição física de subir sem nenhuma ajuda nesses blocos alinhadamente empilhados, parecendo escadarias de gigantes aonde cada único degrau batia na altura meu peito. Eles realmente eram os restos e escombros de várias construções derrubadas pelo tempo e pela história da Citadela, muitos criando essas rotas que os próprios Skreas também usaram para se locomover rápido aqui dentro na época em que essa região foi inicialmente habitada por eles... talvez seja por isso que eles próprios nunca tenham se importado de tirá-los daqui, já que esse caminho só é difícil para os humanos mesmo... De manhã era muito mais fácil andar por essa passagem do que a noite, mas eu não tinha tempo a perder tomando qualquer outro caminho...! Para mim, eu já tinha perdido tempo demais por ter ficado na clínica esperando, completamente alheio à esse enorme problema que pode estar acontecendo sem que ninguém de fora saiba...!

Se a BlackHole realmente tiver atacado os Skreas, dependendo do que eles fizeram a contrarresposta da outra raça vai ser diferente, podendo até ser nenhuma caso eles tenham contido a BlackHole ali mesmo... Eu preciso pensar assim para poder acreditar que não foi nada sério, como uma esperança momentânea até eu chegar aonde preciso.
Não são só os humanos que procuram evitar uma nova revolta, os Skreas são muito racionais a ponto de saberem ponderar a necessidade disso ou não... Por isso eles não tomam atitudes sérias atoa (apenas nós humanos somos capazes disso, afinal... nós é que somos a raça impulsiva). Bem, até se algum deles tiver sido ferido nessa emboscada, o problema ainda será inteiramente da BlackHole e não da cidade... Mas se algo pior tiver acontecido...
"Ahh...! Eu realmente não sei! Preciso parar de tentar adivinhar, e ir direto lá!"
Balançando a minha cabeça, eu tentei parar de pensar tanto!... Revoltas e guerras acabam me fazendo pensar na pessoa que não posso pensar...! Não quero me lembrar dela, não agora, e nem futuramente também... lamentar o que ficou no passado não combina comigo.

Finalmente chegando no topo daquela pilha de blocos, com a força do meu corpo já um pouco gasta eu bati com ansiedade algumas vezes no chão usando meu cajado, ponderando sobre a direção certa à se tomar. No escuro era um pouco mais difícil encontrar o rumo certo... Haviam algumas passagens para várias direções, tanto perto de onde eu havia parado, como por todo o caminho que eu percorri. Mas finalmente eu me virei um pouco e tomei uma estreita passagem à minha direita que saia daquele corredor... Seguindo por ela, eu comecei a pular de alguns dos blocos descendo a pilha de escombros e caindo com cuidado do último andar que era mais alto do que o resto, esse andar que no final era sustentado por um andaime de madeira com escadas. (Essas eram adaptações que as pessoas fizeram para conseguir subir por esse caminho de volta... mas não tenho tempo para usá-las da forma adequada.)
Eu sei que pode ser exagero meu, já que mesmo que tenha algo ruim rolando, minha pressa não irá ajudar à evitar mais nada do que já foi feito... Porém se talvez eu for rápido o suficiente eu possa evitar ainda mais coisas de acontecerem...!

Desde a última revolta eu aprendi o valioso poder da informação, e como dava para também usar isso ao meu favor para proteger as pessoas ao meu redor. Isso só me fazia ter mais e mais o arrependimento de não ter visto problema na ignorância quando mais novo, até aquela época realmente chegar... Se não tivesse sido por isso, talvez eu tivesse sido capaz de protegê-la...
"Não vou me arriscar de cometer o mesmo erro novamente... Agora vou sempre estar à frente de tudo, não importa o quanto me custe, ou o quanto realmente isso me importe."
Comparado à mim, Sal e Ebraín também eram pessoas que sempre buscavam estar informados... mas eles próprios tinham os seus limites, principalmente se o custo fosse cruzar o caminho de grupos como a BlackHole para conseguir essas respostas. Era por isso que provavelmente ao ter ouvido o nome deles, nenhum dos dois quis se aprofundar na história daquele homem tanto quanto eu. Estar em um grupo limita demais as pessoas, e te faz dar muita importância para os estranhos que também tentam se aproximar... E é por isso que eu vivo aqui por conta própria, porque liberdade é uma vantagem que eu preciso ter para poder conseguir alcançar as coisas que eu quero.

Finalmente as apertadas ruas desertas dos becos começaram a se iluminar mais e mais com as luzes das casas habitadas, o chão começara a ser agora coberto de pedras, cruzamentos e passagens se tornavam menos estreitos, escadas e passagens se dividiam sobre as luzes das estrelas e da rua, e algumas raras pessoas podiam ser vistas ainda transitando em anonimato, provavelmente tentando chegar até suas casas...
Passando por algumas grades de tela pela metade que tentava bloquear as passagens e caixas de lixo largadas e empilhadas nos cantos, eu notava o sinal de que finalmente cheguei nos "Distritos", um lugar extremamente agradável de se morar sem que você precisasse ter muito dinheiro, aonde não havia comércio, mas apenas prédios usados como moradia pelas pessoas. O lugar era bem iluminado durante aquele horário ainda, e mesmo que houvessem poucas pessoas nas vielas e ruas que se cortavam, os movimentos e sons vindo de dentro dos prédios davam vida ao lugar, não te fazendo se sentir em uma área perigosa. Eu já tive algumas chances de morar nos Distritos, mas essa é uma zona familiar demais para o meu estilo de vida, por isso eu jamais deixei a Cidade Baixa até hoje.
Cruzando mais algumas ruas com uma pressa moderada para não chamar muita atenção, eu olhava para a luz da lua refletida nas pedras do chão que facilmente me indicavam uma direção, a direção de algo que nem todo mundo sabia sobre.
Seguindo por um tempo naquele caminho, eu apenas notava no quão de repente a luz e a escuridão que até então me cercavam pareciam começar a tentar disputar as ruas em um eterno conflito característico desse lugar. E em meio a esse misto de muita iluminação e muitas sombras, era fácil também reparar pessoas suspeitas encostadas nas paredes e escondidas no escuro, me encarando nada amigavelmente enquanto eu passava. Eu segurava com força meu bastão, pisando com força no chão esperando que nenhum deles decidisse me abordar. Mas por sorte, a maioria deles não iria me incomodar se eu não os incomodasse.
Finalmente eu cheguei no fim daquela rua que dava exatamente para a frente de um modesto prédio velho de 2 andares circundado por um espaço aberto... Aquele vazio ao redor dele fazia a luz da lua facilmente descer e iluminar por completo o contorno da edificação e as pedras do chão, antes que ela fosse amparada por outros prédios mais altos. Considerando que a maioria dos prédios da Citadela eram próximos demais para que até a luz da lua conseguisse iluminar direito, aquela construção realmente se sobressaia de um modo diferente.
Do nada, enquanto eu seguia em frente olhando para aquela construção, dois homens grandes surgiram na minha frente e me pararam antes mesmo da saída do beco.

— "Parada aí. Esse não é um lugar para uma Odalisca, dê meia volta e volte para o bordel de onde você veio."
— "Alguém como você não tem assuntos para resolver aqui, vá embora."

Os dois homens falaram com autoridade, mas soltando leves risos enquanto pensavam se realmente iriam me deixar ir embora tão facilmente, sem antes tentarem me agarrar alí mesmo (acredito, eu conheço esse tipo). É por isso que eu raramente dou papo -vestido dessa forma-, para não ter que gastar meu tempo dando uma surra em idiotas como esses.
Não dando espaço para eles continuarem a agir como idiotas, eu logo tirei a parte do manto que cobria minha cabeça e os encarei sem o menor interesse de perder meu tempo.

— "Não sou uma Odalisca. E quero falar com o Gale."

Os dois homens enormes (que pareciam ter de músculo aquilo que não tinham de cérebro) se entreolharam perdendo totalmente a pose ao verem que eu não era uma mulher, e ainda mais depois de notarem o porque que eu estava realmente ali. Do nada, sem aviso, ambos começaram a rir com vontade cruzando seus braços e se movendo mais próximos um do outro tapando totalmente a passagem, como se não agora fossem sair da minha frente mesmo.

— "Hahahah! O que um pirralho como você iria querer com ele??"
— "Essa é boa! Hahahah, ele acha que vamos deixar ele ver o Gale só porque ele pediu!"
— "Ei ei, será que ele foi enviado como um "presente" para o Gale? Olha só como está vestido!"
— "Hahahaha! Escuta aqui garoto... Você veio ao lugar errado... Dê meia volta e vá embora."

Começando a ficar irritado com aqueles dois idiotas me zombando, eu segurei com mais e mais firmeza o meu bastão já não conseguindo engolir mais aquilo...! Nem todos os membros da BlackHole agiam como babacas, mas os que agiam conseguiam acabar com a minha paciência muito rapidamente!
Finalmente vendo que não conseguiria passar por ali da forma fácil, eu agilmente raspei a ponta do meu bastão no chão abaixando um pouco minha postura e me colocando pronto para pular em cima daqueles dois e dar uma surra neles sem aviso! Mal eles notaram o meu movimento seus corpos foram instintivamente para trás como se procurassem os dois as suas armas que também estavam escondidas em suas costas.

— "Parem por aí... Podem deixar ele passar."

Antes que eu partisse para cima daqueles dois desajeitados sem nenhuma pena, duas mãos finas e delicadas surgiram de trás deles segurando seus braços e afastando-os cada um para um lado como se fosse a coisa mais fácil do mundo.
No mesmo instante todos relaxamos as nossas posturas, e sem perder tempo também, eu puxei a alça retrátil do meu bastão para fora dele cruzando-a pelo meu corpo e prendendo-o de volta nas minhas costas. Eu não ia precisar mais dele por um tempo porque sabia exatamente quem havia acabado de se intrometer entre nós.
Encarando aqueles dois idiotas que facilmente obedeceram as ordens vindas de uma voz feminina e muito severa, eu sem pensar abaixei sutilmente minha cabeça reverenciando a mulher que surgia entre aqueles dois com um respeito que eu definitivamente não tinha pelo resto dos membros daquela gangue.

— "A próxima vez que alguém aparecer aqui não resolvam por si mesmos se a pessoa vai ou não entrar. Me avisem e deixem que eu decida isso, afinal é para isso que eu estou aqui essa noite, para que idiotas não tenham que tomar decisões no meu lugar."
— "M-mas Tessa...!"

Ouvindo um dos homens balbuciar com receio, Tessa soltou um olhar silencioso e furioso por baixo de seus finos óculos que era capaz de transformar até o maior dos homens em um cãozinho indefeso e assustado. O homem rapidamente se calou e olhou para baixo, decidindo não contrariar nem mais um pouco aquela mulher de poderosa e assustadora atitude.

— "Eu não quero ter novamente o trabalho de procurar por novos seguranças, então não tentem ficar batendo em qualquer desconhecido que apareça aqui ou vão acabar mortos que nem os dois últimos idiotas que ignoraram minhas ordens."
— "Delicada como sempre, Tessa."

Eu acabei soltando a frase ao que a mulher se aproximava com seu olhar totalmente fixado em mim, ignorando todo o resto... Aquela era Tessa, a secretária e braço direito do líder da BlackHole. Ela era bem assustadora em suas atitudes e em sua forma de falar, sempre direta e objetiva sem demonstrar a menor emoção ou simpatia -definitivamente nunca simpatia.
Tessa era uma jovem mulher da minha altura que esbanjava um ar sério de secretária, ela tinha um cabelo castanho avermelhado e liso que sempre tentava deixar preso em um perfeito coque, mas que não durava muito já que ela nunca estava parada por tempo suficiente em um único lugar, sendo as mechas de frente do seu cabelo as primeiras a se soltarem ou ficarem folgadamente caídas pelo seu rosto, contornando-o sem ainda sim atrapalhá-la -diferente do meu que às vezes ficava na frente dos meus olhos. Seus olhos eram escuros, mas não se notava eles direito já que ela também usava o tempo todo seus delicados óculos de armação bem fina. Suas roupas eram bem escuras em contraste com sua pele clara, lembrando em cima um vestido de alça bem alinhado em seu corpo... um tanto elegante porém prático até mesmo para a ação se preciso (E sim, ela sabia muito bem entrar em ação). Algumas faixas amarradas na cintura compunham o vestido. e dava para se notar muito claramente preso nelas um revólver que Tessa não tinha o menor medo de deixar exposto, não importa o quão perigoso fosse se um Skrea o visse. Aquilo em particular era um tanto intimidador, mas não tanto quanto depois que você realmente a via usando ele... ela sabe mirar muito bem. Além disso ela também usava calças bem finas por baixo de tudo aquilo que não davam para se notar a não ser que ela se movimentasse bastante.
Tessa também usava alguns poucos braceletes em seus braços que eram comuns entre as mulheres da cidade, e sempre carregava um caderno com anotações que provavelmente servia como sua agenda para gerenciar as atividades da BlackHole com perfeição.
Tessa me lembrava um pouco Saret em seu jeito forte, e atitude afiada, mas diferente de Saret eu jamais vi Tessa demonstrar compaixão por outra pessoa... ela é uma pessoa fria. E saber disso me fazia sentir um pouco perturbado, especialmente quando ela resolvia gastar seu tempo para suspeitosamente me tratar bem.
"...Se bem que eu não a considero a pior pessoa dessa gangue com quem eu poderia lidar."


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