O cara da sala ao lado escrita por choosefeelpeace


Capítulo 21
Capítulo 20




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Podia sentir a vibração na voz de Ryan e suas expectativas quando acessou o site. O material estava cru, visto que havíamos feito apenas o básico com a foto e o programador adicionou informações adicionais, porém simples antes de que eu apertasse a tecla que mudaria o numero das coisas.

 

— Uau, Anna! Como você fez? Não tenho palavras para agradecer! Onde você está? — Disse um animado Ryan do outro lado da linha.

— Ainda na Glam, mas indo para casa. — Minha voz não devolveu a animação, estava preocupada. — Você gostou? Não se importou que eu tenha mexido nos seus arquivos?

— Por que ficaria? Não tenho mais nada à esconder de você e quis me ajudar. Eu aprecio isso, obrigado.

— Hum, tudo bem. — Respondi corada, com todos os olhares sobre mim. — Nos vemos depois.

 

As expectativas ao meu redor eram tão grandes quanto as minhas e eu entendia aquilo. Apesar das nossas diferenças, tanto naquela noite quanto sobre personalidades, todos haviam sido altruístas.

Os programadores, que poderiam perder seu emprego.

Audrey, que chegara cansada de uma longa viagem e tinha uma vida à ser refeita do outro lado do país.

E, bem, eu. Que, apesar de estar irritada por Seline ter conseguido o que queria, fiz o necessário para tentar trazer o sorriso de Ryan para o seu rosto novamente.

 

— Ele aprovou!

 

E todos comemoraram ao meu redor.

 

•••

 

No dia seguinte, ao chegar, duas viaturas estavam paradas em frente à Glam e dois policiais me barrraram na porta.

Eu ia ser presa pela matéria sobre Mary?

 

— Parada. O que faz aqui, Senhorita?

— Eu... Trabalho aqui?

— Isso foi uma pergunta?

— O que está acontecendo aqui?

— Sua credencial, por favor.

 

Revirei minha bolsa e não encontrei. Ótimo. Realmente seria presa.

Até que ouvi uma voz conhecida.

 

— Ela está comigo, Alex Wilson. — Me entregou um café para poder apresentar a credencial.

— Estão liberados.

 

Assim que entramos, ele tirou o café da minha mão. Deveria ser para Diane, exceto pelo fato que em sua outra mão havia outro copo lacrado.

 

— O que está acontecendo por aqui? — Perguntei.

— Não recebeu o memorando? A Glam sofreu um atentado cibernético essa noite. Em outras palavras, fomos hackeados.

— Entendo. — Minha voz não parecia tão surpresa. — Se foi na Internet, por que temos a polícia de modo físico aqui ao invés de um técnico?

— Porque alguém reativou o caso de uma garota desaparecida e não param de ligar aqui, oferecendo provas. A polícia está interceptando as ligações e colhendo todas.

— Estão ligando? — Minha voz saiu alta e surpresa quando as portas do elevador se fecharam.

— De onde saiu essa empolgação? De cheirar café? — Estreitou os olhos. — Poderia jurar que você tem algo com isso, mas a garota da foto não tem nada a ver com você.

 

Quando abri a boca para lhe responder, a porta do elevador se abriu nos revelando o nosso andar. 

Minha mesa se tornou uma mini delegacia, com policiais usando uma escuta e atendendo as chamadas.

Roger estava em pé no fim do corredor. Era o sinal exato de que algo estava errado. E ele, possesso.

 

— Entreviste os programadores, Diane! A polícia foi clara dizendo que a alteração partiu do nosso IP! — Gritou ele.

— Eu entrevistei! Duas vezes! O que quer que eu faça?

— Demita-os. Imediatamente.

— Acalmem-se, senhores! Isso está trazendo um bom retorno para a revista. — Alex se meteu na conversa, distribuindo os cafés aos dois. — Não é o que importa?

— Espero que seja. — Roger apoiou uma mão na cintura enquanto bebericava seu café, me olhando. — Pierce.

— Bom dia, o que posso fazer por vocês?

— Policial Shell, a secretária chegou. — Editora Júnior, eu quis corrigir. — Ela pode atender agora, é a obrigação dela.

 

Preferi não responder ou demonstrar minha falta de alegria com a sua presença e me dirigi ao meu lugar, tomando as devidas dicas sobre como atender e o que responder.

Ryan dependia de que eu fizesse esse trabalho completamente bem.

 

— A parte ruim. — Seguiu o policial. — É que você pode receber cerca de quinhentas chamadas, mas as dicas reais quase nunca cruzam a marca de três.

— Então por que as outras pessoas ligam?

— Por que a mente nos engana e se imaginamos algo, às vezes aquilo parece real para nós. Ou até mesmo porque querem atenção.

— O Senhor quer dizer que mesmo nesses casos existem trotes?

— É o que mais há, honestamente. — O telefone tocou. — Faça um bom trabalho.

 

Atendi ligações à cada cinco minutos. Todos comentavam que o caso estava na TV. Que a polícia fora obrigada à oferecer apoio total e as autoridades não deixariam de investigar o caso.

Haviam rumores de que retiraríamos a edição da semana para lançar outra dedicada ao caso Mary. Era mentira, mas as vendas subiram depressa.

Notei que Ryan não havia chegado ainda. Provavelmente estava trabalhando em algo que surgiu de repente ou estava sem condições de aparecer na revista.

Ou apareceu antes de mim e foi mandado embora.

Meu coração acelerou, mas não havia modos de conversar com ele tendo a polícia sobre mim, assim como os olhos desconfiados de Roger.

 

— Por que acho que essa menina tem algo a ver? Você a entrevistou?

— Dê um pouco de paz para a garota, ela está se esforçando! E a resposta é não, não a entrevistei. — Diane respondeu.

— Ela estava nas filmagens! Aperte a garota.

 

Comecei à tossir pelo susto.

Fui ingênua pensando que não iriam além, procurando culpados ou chegando em Ryan ou em mim.

Deveria me entregar.

 

•••

 

As chamadas deram um intervalo e os policiais foram tomar um café. Apoiei as mãos na mesa e abaixei a cabeça. Estava exausta. E precisava pensar em algo rápido.

A verdade é o caminho, mas como?

 

— Ela tem algo à ver com Ryan, não é? — Jennifer se aproximou.

— Como sabe? — Estava sem forças para construir uma mentira.

— Trabalho aqui há mais tempo, Anna. Tenho certeza que vi esse rosto entre as fotos dele, mas não sei em que contexto porque ela nunca esteve aqui. Ele a matou?

— Meu Deus, não! É sua irmã.

— Oh. — Ela se arrependeu no ato. — Contem comigo. Não sei como posso ajudar, mas se quiser que eu atenda o telefone, pelo menos, você me tem.

— Obrigada. — Fiz uma pausa. — Depois de tudo, é um detalhe legal da sua parte.

— Entendo as coisas com mais clareza e vejo que você gosta dele de verdade. — Arriscou um sorriso.

 

E eu retribui.

O momento não durou, pois o barulho do elevador me distraiu e os passos largos vindo em direção à nós.

 

— Anna! Não acredito no que virou isso tudo. — Ryan sorriu e me abraçou. — Oi, Jenny, conseguiram alguma coisa?

— Colheram várias provas, Anna vai te explicar. — Piscou para ele. — Boa sorte aos dois!

— Obrigado. E você, hein? Não posso nem explicar o quanto estou agradecido. — Acariciou meu rosto com o polegar. — Independente do resultado.

— Eu não desistiria de te ajudar. Eu e... Todas as pessoas que se meteram nisso. Não sei o que vai acontecer, mas o caso está na TV, espalhado pela Internet! Vamos tentar, Ryan. — Abracei-o, transmitindo minha força.

 

A porta da sala de Diane se abriu atrás de nós e nos viu abraçados. Ofereceu-nos um sorriso acolhedor.

 

— Diane, — Ryan começou. — obrigado por me ajudar com a minha irmã e manter o caso no ar.

 

Ah, droga. Eu esqueci de avisar...

 

— Mary, a garota desaparecida, é sua irmã? — Perguntou, surpresa.

— O fotógrafo Wentz teve a ver com o atentado hacker, então? — Roger apareceu atrás dela. — Ele não estava nas filmagens!

 

Diane me deu um olhar, como se tivesse entendido tudo.

 

— Ryan, nos acompanhe, por favor. Precisamos de informações complementares. Anna, chame os programadores e o policial Shell.

— Um momento.

 

Enquanto ligava, Ryan entrava na sala sem deixar de me olhar.

Ele também entendeu que algo estava fora do lugar.

O problema era que isso poderia deixá-lo fora da revista.

 

•••

 

— Estamos estourando em vendas. Dizem que foi a nossa melhor jogada, fascinante!

 

Roger caminhava de um lado para o outro, comemorando enquanto Alex e eu estávamos sentados, assistindo seu grande show na sala de reuniões.

 

— Querem uma edição sobre a garota. Como vamos fazer? O que vamos entregar à eles? O que vocês tem em mente? — Diane perguntou, batendo a borda da caneta contra a mesa.

— Temos que encontrar a garota! — Roger disse. — Quero uma capa com ela, uma entrevista. Dizem que criamos essa história para divulgar a Glam. Então vamos dar isso à eles.

— Que filme você pensa que está? Cinderela? — Alex perguntou. — Nem sabemos se a garota está viva.

— Se não estiver, arrumamos uma sósia. — Disse, despreocupado.

— Desculpa, mas o que? — Me exaltei. — Você pretende mentir para o seu público? Pisar nas ilusões do Ryan? Fazer todos nós, inclusive a polícia, mentir apenas por estética e jogada de marketing? Não, não vou compactuar com isso.

— Foi você! — Me encarou.

— Fui eu! — Gritei irritada. — Porque me doeu ver um irmão chorar pela irmã tendo um veículo de comunicação como esse e ninguém usar nada para ajudar. — Olhei Diane. — Usei um programa de computador para envelhecer a garota e isso foi tudo. Nunca pensei em colocar no site sem autorização, foi um acidente! Os programadores só quiseram me ajudar.

— Você está tão demitida, Pierce. — Roger disse. — Viu o que nos causou?

— O que ela fez, Roger? Usou os recursos da revista em pró de fazer o bem e, sem querer, nos deu a maior tiragem de venda dos últimos dois anos. Parabéns, Anna.

— E vai defendê-la outra vez! — Rolou os olhos para mim e bateu as mãos na mesa, me assustando. — Escuta bem, Pierce, é melhor que sua sorte continue te rondando porque o tempo corre e a próxima edição está logo ali. Ache a garota!

— Você pensa que é simples assim? Que não usaram vários recursos ao longo desses anos? Que vamos conseguir algo inédito em duas semanas que não conseguiram em dois anos só porque você quer? — Enfrentei-o.

— Não era a sua intenção? É bom que você tenha um plano B e um plano C, D, E... Ou P de Para fora!

— Abaixa o tom com ela, Roger. Não estou gostando desse seu caráter. E quando eu não gosto de uma coisa, eu chuto. — Disse Alex.

— Deixe ele, Alex, eu não ligo. Vou fazer o meu trabalho e colorir a próxima edição com o abecedário todo. Vamos!

 

Aos protestos de Roger, deixamos a sala.

Não podia acreditar que eu o enfrentei. E que meu trabalho parecia estar com os dias contados.

 

•••

 

Quando cheguei em casa me afundei no sofá, pensando em idéias para a edição seguinte. Não acho que o look "Desaparecida" seria tendência ou que "O sumiço da semana" fosse politicamente correto.

Droga, no que fui me meter?

Meus pensamentos deram lugar à campainha.

Era Audrey.

Sua roupa estava levemente confortável, mas ainda em seu estilo chic. Ela devia estar arrumando seu apartamento, mas tentou não deixar isso transparecer.

Eu a ajudaria, sem dúvida. Que egoísmo o meu pedir um favor sem retribuir.

 

— Te esperei chegar, contei as horas para isso. Como foi?

— Um dia lotado, eu diria. — Abri mais a porta, dando-lhe passagem. — Meus chefes descobriram. Quer dizer, eu acabei confessando antes que alguém se desse mal.

— Aquele cara da maçã deveria se dar bem mal, Anna! 

— Você sabe que não. — Ri e caminhei até a cozinha para nos preparar um chá. Eu também merecia. 

— E conseguiram alguma coisa com a divulgação? 

— Tirando a polícia na nossa cola o dia inteiro? Ah, sim, dezenas de pistas. Estão averiguando todas. Devem haver umas cinquenta ou até mais.

— Isso é ótimo, Anna! — Se animou.

— Eu sei. — Não consegui controlar meu sorriso. — Agora é esperar que eles averiguem. Como foi seu dia?

— Com menos emoção que o seu, eu garanto. Obrigada. — Disse, quando eu entreguei-lhe a xícara e caminhamos até a sala. — Me ocupei da mudança, com Jonas, mas arrumei um tempo para ligar para Rachel e contar as boas novas!

— Isso é ótimo! — Comemorei. — Você sempre arruma um tempo para tudo.

— Foi o que ela disse. — Riu. — E sugeriu que nos encontrássemos. As três. Em um jantar.

— Eu adoraria. — Suspirei. — Só que com todo esse caso, meu chefe vilão de quadrinhos deixou a edição inteira nas minhas costas como se eu fosse uma editora executiva! Preciso gerar conteúdo para o caso de que Mary apareça. Ou não. Em duas semanas? Provavelmente não.

— Não desacredite do que fizemos, Anna. O caso mobilizou o país! Geraremos o conteúdo, mas você vai precisar jantar em algum momento, não? E, sejamos sinceras, nem você ou Ryan têm de estar sentados, encarando a porta, como se Mary fosse aparecer à qualquer instante.

 

A campainha tocou.

 

— Algo mais à acrescentar, escritora? — Disse rindo, ao levantar.

— A vida é como um livro, querida. Guarde isso com você. — Sorriu.

 

Do outro lado da porta estava Kyle. O alto e bonito, porém sempre apressado e movimentado Kyle. 

Confesso que senti falta daquele sorriso iluminando meus dias e de seus pensamentos únicos. E sabia que nos havíamos prometido uma amizade bonita, mas não o vi desde então.

 

— Anna! Estava esperando você chegar. Como está? — Sua voz soava como se tivesse descido um lance de escada correndo quando me abraçou.

— Ironicamente, você é a segunda pessoa que me disse isso hoje. — Ri, devolvendo-lhe o afeto. — Estou bem e você?

— Bem! Bem, eu acho. Queria falar com você sobre o que a Glam fez por Mary, você tem um momento? Posso voltar em outra hora. — Respondeu, avistando Audrey.

— Oh, Mary. Sim, sim, entre! Audrey me ajudou com a campanha.

— Longa história. — Respondeu Audrey, balançando a mão. — Não se preocupe comigo, sou vizinha, posso voltar em outra hora.

— Bem-vinda ao prédio! Pode ficar, se você ajudou Mary e Anna será um prazer tê-la aqui. É coisa rápida. — Abraçou-a, do jeito Kyle de ser. — Prazer, Kyle.

— Audrey. Kyle, Kyle Wood? — Ela nos olhou como se tivesse lembrado a história.

— Isso, Anna deve ter falado de mim. — Riu. — Então, garotas, fofocas à parte, eu li o artigo da Glam sobre a Mary, desde o primeiro, até as alterações que fizeram horas atrás, acredito que com a ajuda do Ryan.

— Isso, eles o interrogaram. — Confirmei, acenando para que ele se sentasse.

— Eu queria oferecer uma coisa adicional nesse pacote. Não sei se a sua chefe gostaria ou permitiria, mas eu tenho um site de informações sobre Mary. Desde fotos, vídeos, à gostos pessoais como música, comida, lugares favoritos, etc. — Ele notou meu espanto e sorriu. — Eu sei, um pouco estranho. Estive meio... Ocupado durante esses anos.

— Mas espera. — Levantei as mãos. — Você nunca achou que ela fugiu por vontade própria ou algo assim?

— Do modo no qual ela estava, talvez, influenciada à tomar esse risco, mas nunca ligar para os pais? Isso pareceu estranho para mim. Eu sei que pareço um stalker e alguém que não sabe lidar com o fim de um relacionamento, mas, por via das dúvidas, criei o site.

— Eu acho ótimo, sabe que nunca julgaria você. — Dei-lhe um sorriso acolhedor. — Você teve suas razões e toda essa história é estranha.

— Eu sei, o problema é que não tinha formas de divulgar esse site antes, mas acho que seria uma ajuda a mais. Se alguém a visse nos lugares que eu cito ou cantando alguma música dali, podem reconhecer.

— Eu acho interessante, Anna. — Audrey irrompeu na conversa. — Seu chefe não quer agilidade? Os sites podem trabalhar juntos. Quando entrarem na matéria, pode haver uma marcação que transfira para o site dele. Existem pessoas legais no mundo e dispostas à ajudar, então toda a informação possível é o que merecem.

— Vocês tem razão. Ryan sabe? — Olhei para Kyle.

— Sabe! Inclusive tem material e até entrevista com ele no site. Trabalhamos nisso, juntos, por um tempo. Sei que ouvir isso pode soar estranho para você. — Riu. — O site é voceviumary.com.

— Vou ligar no departamento dos programadores. Isso vai acontecer, Kyle.

 

E vai ter que funcionar.


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