O cara da sala ao lado escrita por choosefeelpeace


Capítulo 17
Capítulo 16




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Quando abri meus olhos, não reconheci onde estava, de imediato, mas ao piscar algumas vezes, eram como se pedaços de cenas da noite anterior retornassem pouco a pouco.

Foi quando o choque veio.

Eu estava na cama de Ryan.

Sutilmente, sentei e movi minhas pernas para fora, me lembrando de como foi sair do estúdio dele enquanto o moreno dormia. Outra vez, não sabia como enfrentá-lo. 

Apesar de não ter estado com mais ninguém depois da primeira vez com ele, o que aconteceu não estava nos meus planos — e provavelmente nem nos dele. Eu só não conseguia controlar a necessidade de estar perto daqueles olhos que brilhavam como pérolas negras para mim ou daquele sorriso que era como um céu sem nuvens. Sua intensidade fazia meu coração vibrar. 

Eu precisava ter mais auto controle, afinal, teríamos um longo dia pela frente e eu não estava ali para diversões. Agarrei o lençol sobre a cama e me enrolei quando uma voz preencheu o ambiente.

 

— Vai fugir outra vez sem me dar bom dia? — Sua voz era divertida e rouca, matinal.

— Eu só estava indo... — Gaguejei, apontando o banheiro.

— Sei. — Riu, desacreditado. — Não esperava menos da Regina, mas agora? — Curvou seu corpo para frente, encontrando meu olhar. — Essa não é Regina.

 

Não respondi e ele avançou, buscando um beijo lento e demorado. Minha respiração pesou e quando me dei conta meus dedos se entrelaçavam pelo seu cabelo. Eu precisava de mais cinco minutos de confusão com ele, de soltar meu sentimentalismo todo. Era tudo tão pesado e tentar negar certas coisas para mim mesma só fazia tudo isso virar uma tonelada sobre meus ombros.

Gostava de seus beijos e do seu carinho. Gostava de brigar com Ryan, mas, mais ainda, gostava dos nossos instantes de paz. 

Eu só queria acreditar que não haviam culpados ou jogos nessa história.

O som da campainha irrompeu o ambiente, encerrando nosso beijo. Não houveram palavras, pedidos ou cobranças de sua parte, naquele momento. Apenas um sorriso. Um grandioso sorriso.

No corredor, deixaram o nosso café da manhã de campeões, com tudo do melhor para começar o dia — cortesia da revista. Enquanto Ryan se dispôs à manejar os carrinhos para dentro, vesti sua camiseta da noite anterior. Os rasgos pareciam maiores em mim, mas o tecido cobria todo o necessário. Ele sorriu quando me percebeu esperar por ele naqueles trajes. Havia uma felicidade inocente entre nós e queria contribuir com isso. 

Não estava difícil.

 

•••

 

O sol rebatia por cada parte de Las Vegas e ficar no quarto seria um grande desperdício. Namorei cada hotel que podia ver da varanda do meu quarto e me decidi não demorar à descer para desfrutar o máximo possível sobre tudo.

Vesti algo confortável e me dirigi à porta, quando meu celular vibrou com uma ligação de Diane.

 

 Anna, querida! Como vai tudo em Vegas?

— Tudo ótimo e colorido como sempre. — Ri, destrancando a porta, deixando o celular no ombro. — E New York?

— Mais calmo que por aí, estou certa disso. Ah, queria pedir desculpas por não te avisar da companhia de Ryan, por antecedência. Sei que vocês tem uma... Pendência.

— Não, tudo bem! — Fui direto ao elevador que se abria liberando pessoas e me recebendo. — Nós estamos nos dando bem, não vai ser um problema.

— Me avise se algo der errado, certo? Darei um jeito de substituir um de vocês.

— Obrigada pela preocupação. É só até amanhã de qualquer forma. — Sorri, mas o pensamento me incomodou.

— É mesmo... Me diga, acha que tem um bom material? Foi ao Hard Rock para se aquecer?

— Acho que posso lidar com a matéria, Diane. E estou saindo do hotel agora. Espero conseguir mais inspirações.

— Essa é a minha garota! Me avise tudo. Beijo e boa sorte.

— Obrigada! Um beijo.

 

Passeando pelo hall, pude ver Ryan na calçada, tirando algumas fotos da paisagem e de pessoas caminhando livremente. Esperei que um último click ecoasse e beijei sua bochecha enquanto via o resultado na tela.

 

— Você é tão talentoso.

— Deixa eu ter certeza. — Virou rapidamente para mim, tirando uma foto.

— Não! — Dei risada e coloquei a mão na frente, mas ele havia sido rápido.

— Parece que sou talentoso e rápido. — Disse, admirando a tela. — E você é linda.

— Pelo menos você não está com a Polaroid, não imprimiu outra foto minha.

— Ainda. — Piscou.

 

Durante todo o dia, passeamos pelos hotéis, restaurantes, vimos algumas atrações e andamos sem rumo. Aquele era o tipo de lugar que não fazia cobranças e era exatamente o que eu precisava, então deixei que a correnteza me levasse, como se eu tivesse em estado líquido.

À noite, tínhamos a única obrigação, então, depois de pegar um mini caderno, estava pronta para assumir a posição de colunista, autora ou editora — não importava o nome ou a condição que me fossem atribuídos depois disso. Eu precisava, antes, cumprir a tarefa.

O fato era, após uma grande insistência no meio da tarde, Ryan me convenceu à comprar uma máscara para me adequar ao ambiente. Fomos à uma loja de fantasias e ele se deliciou ao ver aquela infinidade de coisas, selecionando uma roupa clichê de policial. Optei pelo básico, mas meu olhar pareceu intimidador quando a máscara vestiu meu rosto. Haviam arames em sua armação, como se tornasse a mesma uma borboleta, cobrindo parcialmente meu rosto, me trazendo mais autoconfiança. Um pouco de maquiagem e uma boa roupa, estava pronta e bem à frente do Hard Rock Hotel.

O lugar era fascinante! Estar ali é como se sentir uma estrela do rock, admirando uma porção de guitarras expostas, pôsteres e as músicas que te levam à outra década. O hotel estava repleto de pessoas que pareciam nem sempre dividir um mesmo gosto, mas estavam ali pelo mesmo proposito — e bem mais da maioria, fantasiados.

Desviei de fantasias com sangue, zumbis e qualquer pessoa com partes falsas do corpo vindo em minha direção. Cada vez que escondia meu rosto, Ryan gargalhava, me abraçando em seguida, ganhando um soco de leve no abdômen. Ele podia ser o melhor, mas sabia como ninguém tentar me tirar do sério.

O moreno me deixou algum tempo sozinha enquanto buscava nossas bebidas e eu tentei me ambientar. As pessoas riam e desfilavam seus trajes, se misturavam à outros grupos e tiravam fotos o tempo todo.

Uma múmia passou ao meu lado, elogiando minha máscara e eu demorei um instante antes de agradecer porque estava rindo.

Meu medo não tinha razão de ser. Eram pessoas vestidas apenas.

Ryan voltou com dois copos e me ofereceu um. Degustamos com calma e um pouco antes do meu copo acabar, as luzes se abaixaram e um som estrondoso anunciava que o espetáculo estava começando.

Acrobatas dançavam em arcos de metal e em faixas presas no teto. A decoração trazia sombras de morcegos feitas com jogos de luzes. As cores vermelho e roxo eram predominantes no ambiente. Meu corpo começou à ceder e gostou de tudo aquilo. Ryan tirava infinitas fotos e eu anotava algumas coisas enquanto meu queixo não estava caído observando a festa que parecia maior à cada ato.

Dentro da minha vida pacata, nunca viveria algo daquela magnitude. Nem menos tomaria decisões que parecessem tão equivocadas — como ter estado com Ryan tão rápido. 

Depois da vida me jogar um balde de água fria sobre a palavra casamento, eu comecei à entender, depois das lágrimas, que, talvez, aquela não fosse a vida que eu, realmente, queria para mim.

Meu sonho não era ser uma dona de casa das que ficam o dia todo aguardando o marido. Não. Naquele prévio momento, eu pretendia casar na urgência de parar de viver em uma garagem e me chocou quando me dei conta disso. A vida com Jonathan era mínima. Era tudo sobre seus sonhos e realizações. Sobre ele ganhar prêmios e reconhecimentos. Eu não era seu prêmio, era seu comodismo. O que eu queria da vida era bem mais do que isso, como o instante que estava vivendo. Era ter minha própria vida e interesses, me realizar no que havia estudado por anos. Estava óbvio que não sabia tudo sobre ser uma editora e que tudo o que era no momento, era uma secretária faz tudo, mas estava aprendendo com as minhas próprias cabeçadas. E com isso, também me refiro à palavra amor. Gostava de Kyle o suficiente para sair de mãos dadas e nos demonstrar ao ar livre, mas o tipo de sentimento que guardava por ele parecia ser tão inocente que nunca havíamos passado disso. Com Ryan, apesar de guardar essa relação com medo de me jogar em algo tão cedo, eu tinha mais. Queria mais. Era tudo sobre aquele olhar me dizendo que eu era boa o suficiente para o que quer que fosse. Em New York, conheci pessoas que apostaram em mim sem me conhecer e criei um mundo novo sem precisar depender de alguém.

Eu construí meu mundo.

Essa independência me atingiu como um raio e me fez corajosa. Venci cada um dos meus dias ruins e medos. Como ali. Apreciando uma festa da qual sempre tive receio.

Foi então que descobri que meu medo só existia porque nunca tinha conseguido lidar com os monstros dentro e fora de mim, mas isso estava mudando.

 

•••

 

A madrugada chegou rapidamente enquanto as músicas passavam de uma para a outra, sem descanso. A festa não terminaria antes das seis da manhã, mas o show ao qual nos convidaram havia terminado há certo tempo. Conseguimos um lugar em uma das mesas para que ele conferisse suas fotos e eu descrevesse no papel um pouco mais do que havia testemunhado. O fato de eu ter derramado algumas lágrimas durante o evento pensando em um resumo da minha vida parecia ter me dado um bloqueio de escritor — bem quando eu não podia ter. Sem mais o que fazer, pedi que fossemos para o hotel depois que ele revisasse seu material e colhesse o que faltava.

Nós estávamos instalados relativamente perto do Hard Rock, então não tardou para que pudesse tirar meus saltos no nosso elevador.

 

— Obrigada pela aventura hoje. Não foi tão ruim assim. — Sorri para ele, indo para o meu quarto e tentando pegar a chave enquanto segurava os sapatos, a bolsa e meu caderno.

— Percebi que gostou, mas te notei um pouco triste, como se tivesse chorado. — Fez uma pausa como se saísse de suas lembranças. — Anna, espera! Não quer entrar e me contar sobre isso? Você pareceu não escrever tanto, posso te ajudar com isso, também. 

— Ryan... — Virei para ele e abaixei os ombros. — Eu meio que chorei, mesmo e por tudo. Não, não por medo do Halloween. — Dei uma risadinha, vendo a dúvida em seus olhos. — Mas eu nunca tinha tido nada na minha profissão, vim a Las Vegas só quando completei 18 anos! Sem contar essa relação rápida que tenho com você. Nada disso sou eu ou era eu, mas a vida muda sem que possamos controlar. — Dei mais alguns passos, me aproximando dele. — Tive algo bonito com Kyle e pulei direto em você, sei que parece que sou assim, mas quero ir devagar. Brincar com as pessoas? Essa não sou eu.

— Prometo que não precisamos fazer nada essa noite, realmente quero te ajudar, o tempo está contra você para escrever tudo isso. — Sua mão tocou meu rosto. — Você não brincou com ninguém, Anna. Como um ser humano, você viveu momentos à fim de buscar o melhor para si. Nenhum de nós vamos te julgar. Nenhum de nós poderíamos. Podemos entrar agora?

 

Confirmei com a cabeça uma vez e a porta se abriu para que eu entrasse primeiro. Depositei minhas coisas na mesa e roubei uma de suas camisas de super herói, partindo para o banheiro e me livrando do vestido.

E então, certo tempo depois, estávamos nós na cama de casal com ela toda desajeitada.

Não.

Não para isso.

Haviam papéis com anotações, outros amassados e algumas fotos que Ryan imprimiu como mágica.

 

— Horrível e horripilante? Isso é tudo? — Riu com uma folha em mãos. — Você repetiu essas palavras três vezes!

— Onde está a parte de me ajudar? Na sua risada? — Puxei e amassei o papel, jogando-o para se misturar com os outros.

— Tudo bem, desculpa. Vamos devagar! — Agarrou uma das fotos do início do espetáculo com piromania. — O que vê aqui? O que lembra?

— Um show mágico de luzes que se introduziu em um tom de âmbar. E depois variava entre vermelho e roxo, às vezes azul. — Sentei de joelhos.

— Ótimo, segue. — Instigou, animado.

— A partir daí, o âmbar era visto explodindo em fogos subindo pelas laterais do palco, em bambolês ou da própria boca dos dançarinos, trazendo a base fervente de uma festa onde o fogo lidera grande parte de filmes e contos. — Sorri. A frase fluiu de repente e agarrei o caderno, anotando.

— Boa, Anna! Ou Regina, quem quer que você seja, agora. — Apontou o resquício de batom vermelho nos meus lábios e pegou outra foto do espetáculos com atores. — Vai!

— Ok. — Tomei uma breve respiração. — Se você espera por algo horrível e aterrorizante, este não é o lugar para você. O Hard Rock Hotel oferece magia e vislumbre quanto ao seu show de cores e espetáculos que são um lembrete vívido de que esse é um dia destinado à cultura bem como à imaginação. Esse é o lugar ideal para deixar a mente fluir e se deliciar com uma festa que apresenta o Halloween com luxúria e beleza peculiar. Os atores, que parecem saídos de um espetáculo da Broadway te oferecem uma experiência fascinante e real, mesmo dentro da fantasia. — Bati palminhas e escrevi rapidamente ao passo que ele me ditava trechos que havia esquecido.

 

E então veio uma foto seguida de outra e minha mente começou à trabalhar em um passo que nunca vi. Ryan me olhava por um tempo à fio depois de me mostrar cada foto. Ele parecia satisfeito com o que via e ouvia. Seu sorriso vivo dizia isso.

Sem contar que ele me dava algumas palavras novas e palpites para melhorar o artigo. Ele parecia bom em descrever uma cena e isso me faltava ainda. Seguiu me explicando que era um hábito descrever suas fotos à fim de saber o que procurar e perceber na próxima vez que fosse no mesmo lugar, tirar outra foto.

Então quer dizer que ele visitava alguns lugares mais de uma vez para tirar fotos e procurar detalhes nelas?

Como o que?

Não houve tempo para maiores conversas, o sol adentrava o quarto sem culpa e tínhamos, apenas, um par de horas para dormir antes de voltar para casa.

Meu artigo estava tecnicamente pronto. Sabia que chegaria em casa e ajeitaria algum detalhe aqui e ali, mas, naquele momento, era tudo o que meu sono, Ryan e eu poderíamos dar. Organizei os papéis, joguei outra tonelada fora e ele guardou suas fotos em uma pasta opaca, com algumas repartições em saquinhos plásticos. Ele era organizado. Bem mais do que eu.

Meu corpo descansou na cama e ele me assistia deitar. A ansiedade me cobriu quando o olhei, mesmo sabendo de sua promessa — a de que não faríamos nada.

 

— Em algumas horas estaremos em casa, você está bem para voltar? — Escovou meu cabelo com a ponta dos dedos.

— Eu acho. — Sorri, sentindo os olhos pesarem. — Só pensei demais, como sempre e sabe que dessa vez me fez bem? Dessa vez, me fez bem.

— Vegas tem esse efeito. — Suspirou. — Aqui você percebe quem você é e até onde pode ir. Você é grande, Anna. É grande sozinha, por você mesma. Saiba disso. — Bateu o dedo de leve na ponta do meu nariz.

— Obrigada por fazer parte dessa minha viagem, como profissional e pessoa. — Pisquei lento e o olhei. — Você tem um efeito bom em mim. 

— Você é o meu efeito bom, Anna.

 

Ryan beijou minha testa e meus olhos fecharam para receber seu carinho.

Paz era a melhor experiência que estava garantindo com tudo isso.


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