O cara da sala ao lado escrita por choosefeelpeace


Capítulo 14
Capítulo 13




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Aquela noite enviava ventos fortes que desbravei, um à um enquanto ia para casa. Deixava para trás as vozes chamando meu nome e tentando remendar o que não havia conserto.

Devia ter percebido os sinais de Jennifer dias antes. Começamos tão bem, com parceria e sorrisos, mas, aos poucos, eu não a via mais. Apenas ao lado de Alex — e esse era o problema em questão.

Eu gostaria de dizer para ela que por mais que meu melhor amigo tivesse um coração enorme, talvez não fosse um bom momento para namorá-lo. Não posso afirmar se toda sua descontração vem de si mesmo ou se contraiu uma aversão à namoros e pessoas fixas por causa de um passado ruim. Não sei mesmo!

E ela teria de descobrir isso. Um passo por vez, antes que se decidisse se isso valia a pena. É claro que ele vale... Mas ela pulou passos que podem fazer falta depois. Aliás, talvez ela nem seja correspondida!

Queria poder explicar todas essas coisas e ajudar aos dois. À ele, para ver se consegue se fixar em alguém ao invés de procurar por casos secretos errados. E à ela, pois gostar de alguém nunca é uma tarefa fácil. 

Ainda mais gostar de alguém que trabalha com você. Eu sei como é.

Digo... Não que eu goste de Ryan, eu só entendo.

Entretanto, não pude conter algumas lágrimas que vazaram pelo meu rosto. Toda essa cena não existia na minha vida durante anos e agora? Estou presa em um quadrado amoroso onde, no máximo uso duas pontas.

Minhas pernas cambalearam até em casa e apenas pude respirar aliviada quando entrei no elevador. Estava na minha zona de conforto. Chegaria na minha casa e estaria longe de qualquer julgamento. E de pessoas.

Foi ali mesmo que passei o resto da noite e o Sábado inteiro sem colocar sequer a ponta dos dedos para fora.

Alex trouxe alguns amigos para sua casa, aquela noite. As vozes eram mistas, mas eu não consegui perceber a de Jennifer em nenhum momento.

 

— Anna! Estou te esperando na minha casa, trouxeram comida bacana. — Alex gritou através da porta, depois de bater várias vezes e eu não responder ou abrir. — E tem cerveja!

 

Segui encarando a TV e um comercial de produto milagroso facial, depois de ter corrido por todos os canais sem achar nada. É claro que eu não iria à sua casa. Não importa quem estivesse ou qual comida tivessem levado — ainda que minha barriga roncasse —, estar perto de qualquer pessoa da Glam estava fora dos meus planos.

 

— Anna, vem comer! Eu te dou um balão de coração! — Disse, horas depois.

 

Não arrisquei. 

Permaneci estática até que dormi, ignorando todo o barulho ao redor. Era melhor assim, eu não era mesmo tão importante e quem sabe quem nais estava nessa festa?

No dia seguinte, preparei uma massa deliciosa só para mim, com a escolha de molhos do meu gosto. É bom se amar e se dar um mimo, às vezes. E eu precisava de uma certa dose de auto mimos e de entender que não fiz nada errado.

Não joguei com pessoas.

Não sou Ryan que é cheio de mulheres e dorme com todas porque é o bonitão da cidade. 

Não disse que ele é bonito, eu apenas... Disse.

 

— Anna?

 

A voz, dessa vez, era de Kyle, baixa e preocupada. Cruzou minha mente não abrir a porta para ninguém, mas o que ele fez de errado para mim? Não há nenhum motivo para que me afaste da única pessoa que não tem nada a ver com essa história.

Quando abri, suas sobrancelhas estavam mais juntas e seus braços cruzados ao redor de seu peitoral. Sua preocupação era evidente.

 

— Pode entrar, estava fazendo o almoço. — Fiz uma pausa, quando notei que seu rosto não suavizava. — Está tudo bem?

— Não. Você não me atende desde que saí da sua empresa, o que houve? Forcei a barra demais aparecendo onde não devia? Encrenquei você?

— Não! Não, eu... — Cocei a testa à fim de me lembrar onde havia abandonado o celular. — Aconteceram coisas, aquele dia. Desculpe, mesmo.

— Sou todo ouvidos.

 

Abaixei o fogo e o arrastei para o meu tão querido sofá. Quando comecei à falar, senti que poderia e deveria ter feito isso antes. Por que demoramos tanto em dizer para alguém que estamos machucados? Por que não expulsamos as palavras daqui de dentro para que elas parem de machucar procurando um jeito de sair?

Comecei contando minha situação com Jennifer. Tudo parecia bem até que não estava mais — e ignorei os indícios dela ter se afastado dias antes. E, então, parti para a explicação sobre minha amizade com Alex que nada mais é do que isso. Por alguma razão, a minha maluquice cabe na vida dele e ele se diverte comigo. É claro que aquela história de que éramos namorados deveria ter sido derrubada à tempos — eu avisei! —, mas parecia que todos haviam esquecido.

Menos Jennifer.

E, para explicar porque a linda loira estava tão irritada pelo meu tal poder, faltava a parte esquisita de explicar... Onde Ryan entrava.

Kyle sabia que eu tive alguém logo que cheguei. Não escondi isso dele, à não ser pelo nome, mas nunca pensei que se conheciam. E que dividiriam indicações de restaurante logo mais. 

Como esconder coisas parecia não ser mesmo meu forte, antes que Jennifer surgisse dentro da minha casa através de alguma mágica computadorizada, desandei a falar.

 

— E então ela achou que eu não só fazia jogo duplo com Alex e você, mas sim triplo, porque não havia terminado realmente com Ryan. — Retorci os lábios.

— Jogo duplo. — Deu uma risadinha que antecedeu perguntas. — Ryan? Wentz?

— Sim. Eu sei, desculpa. Deveria ter dito antes... — Suspirei e abaixei o olhar. — Desculpa.

— Para de se desculpar o tempo todo comigo. Não se deve desculpas por ser quem é ou por fazer coisas na sua própria vida que não interferiram na de ninguém! — Agarrou minha mão no meu colo. — Ele é o cara que você contou antes, então?

— Ryan é o cara do bar. — Assenti.

— Ele é uma pessoa boa, passou por coisas... — Olhou para cima, refrescando a memória. — Mas se você disse que acabou, então confio em você.

— Completamente acabado! Temos uma relação estranha, você deve perceber. — Ri, desajeitada. — Acho que ele se sente na obrigação de cuidar de mim, mas fora isso, ele tem a garota dele e eu...

— Me tem.

 

Sorri e trocamos um beijo doce antes de convidá-lo para almoçar. Ele parecera incrivelmente bem com tudo que contei e eu com mil quilos a menos nas costas. Dizer a verdade é sempre a melhor opção. 

Ao longo do almoço, ele revelou que havia juntado o quebra cabeça dias antes, devido ao meu desconforto com Ryan, mas que sabia que eu era sincera sobre meus sentimentos e não me cobrava nada alem disso.

Nota mental: Kyle é o ser mais fofo do planeta!

Depois que ambos cuidamos da cozinha, um silêncio confortável pairou sobre nós e comecei à me dar conta que também sabia menos do que queria sobre ele. Lembrei, inclusive de Ryan o defendendo. Ambos se conheciam desde antes e até o moreno sabia mais do meu projeto de namorado do que eu.

 

— Será que... — Coloquei o cabelo atrás da orelha, medindo as próximas palavras. — Agora que você sabe realmente tudo sobre mim, posso ter mais sobre você também?

— O que quiser. É só perguntar. — Sorriu e apertou minha bochecha.

— Antes de mim, você teve alguém, certo? — Estreitei os olhos e ele riu um pouco, confirmando. — Há quanto tempo atrás?

— A última e única relação séria que tive faz mais de dois anos e meio. — Suspirou. — Dali para frente, optei em não colocar nomes no que eu tiver, então a última pessoa que tive antes de você foi há quatro meses.

— E o que houve com elas?

— A garota que me relacionei, que dei tudo de mim, foi uma coisa adolescente. Primeiro amor, primeira namorada. Nos conhecemos no colegial e fomos até onde deu, ficamos noivos. — Abriu um sorriso que murchou, de repente. — Até que eu não pareci mais tão atraente, eu acho e ela conheceu outro, se transformou e ficou com ele. Ela... Foi embora da cidade.

— Eu sei exatamente o que sentiu. Sinto tanto, Kyle.

— Está tudo bem! Ela ter ido me fez sair da minha preguiça. Tentei procurá-la, até e, sem sucesso, passei à estudar mais, dar mais duro em mim, na minha vida e não deixar que a rotina me consumisse à ponto de me tornar invisível para mais ninguém ou até para mim mesmo.

— E a outra garota?

— Foi uma coisa rápida, amiga da minha irmã. Ela até está namorando, agora.

— Uau! — Sorri.

— Pois é. E Anna, por eu também saber o que você sente, acho melhor que continuemos assim, sem rótulos. Você sabe o quanto te admiro e como me faz bem, justamente por isso quero que aproveitarmos isso que temos, sem pensar que o outro vai embora. 

— É isso que quero com você. Estar aqui sem me preocupar. É pensar nessa paz e mais nada. Obrigada por isso.

— Obrigado por também ser isso para mim.

 

Permanecemos no sofá um longo tempo, entre beijos e séries. 

Foi romântico e especial. As dúvidas que haviam surgido sobre ele, estavam se desmanchando ali mesmo. Kyle é um homem bom que teve desilusões e não quer machucar ninguém por conta disso — o que parece difícil no mundo. 

Quantas pessoas que têm apenas um dia ruim e fazem disso motivo suficiente para destruir o mundo ao seu redor?

Nós tínhamos mais do que um péssimo dia e, mesmo assim, queríamos nos curar.

 

•••

 

Não senti o Domingo passar e me decidir, no dia posterior se ia ou não trabalhar e ser a vergonha do prédio era a pior parte. Talvez eu devesse mesmo faltar e ser despedida por justa causa, assim evitava conviver com aquelas pessoas, além de deixar Jennifer ser a dona do andar e voltar à fazer todos os trabalhos, assim como Roger tinha certeza de que era melhor.

Meu Deus, Roger! Ele estava no bar e viu tudo. Meu peito apertou imaginando como o mesmo estaria se sentindo certo de que sou um erro. Suas garras deviam estar prontas para o meu pescoço e suas palavras prontas para convencer Diane que ficaria melhor sem mim.

É isso. 

Vou faltar.

 

— Anna, abra! Sei que está aí. — Alex disse, depois de bater à porta.

 

Estava acordada, mexendo o sachê de chá dentro da xícara pela milésima vez, mas havia tomado minha decisão, então continuei com a grande tarefa à minha frente.

Se eu estava me demitindo, teria que arrumar outro emprego.

 

— Vamos, Anna, abra!

 

Do que eu sei trabalhar? Resposta: nada. Mal sei cuidar de uma casa e não acho que seja um dom. Eu colocaria fogo em uma qualquer dia desses.

 

— Você não vai trabalhar? Por causa de Jennifer? Não acredito! Está tudo bem, ninguém liga para o que aconteceu.

 

Será que vou ter que voltar à New Jersey? E o pior... Voltar à ver Jonathan cruzando a rua com quem sabe quem e ficar dando tchauzinho como se fossemos ex amigos e nada terrível tivesse acontecido. 

Que grande futuro o meu.

De volta para a garagem.

 

— Ok, bem adulta você! Fique aí! Não vai mudar nada, só despertar mais curiosidade, mas o que eu sei, né? Bom dia, Senhora Eu Sou Adulta Quando Quero.

 

Alex bateu a porta do elevador e me encolhi com o barulho. Ele vai entender depois que é o melhor. Claro que nos veríamos aqui, algumas vezes, mas seria menos frequente.

Quando cheguei à Glam depois da minha falta, alguns olhares me acompanharam até o elevador. Nada que me espantasse. Como Alex mesmo havia dito, eu faltar causaria curiosidade, mas eu estava bem com isso.

Provavelmente fosse uma das últimas vezes que veria todas aquelas pessoas juntas.

Arrumei minha mesa, mantendo meus pertences unidos e de apenas um lado, pronta para arrumar uma caixa para colocá-los dentro.

Diane chegou atrasada e seu olhar perfurou o meu enquanto se aproximava de sua sala.

 

— Termine seus afazeres e entre, por favor.

— Sim, um momento.

 

Alex saiu da sala de Ryan carregando algumas fotos impressas e nos espiou, mas não disse nada. 

Sequer uma piadinha. 

E isso é grave.

Bem grave.

Se isso fosse um desenho, haveria uma nuvem negra bem acima da minha cabeça, mas na vida real, apenas o silêncio era suficiente.

Adentrei a sala e fechei a porta lentamente, como se tivesse empurrando todo meu ar para fora. Minha chefe estava com parte do terno preto para cima, deixando o braço exposto sobre a mesa.

Ao mesmo tempo que parecia confortável em sua própria sala, sua expressão estava tensa.

Ela, então, retirou o óculos e curvou seu corpo para a frente.

 

— Você pensa que vou perguntar porque não veio ontem e a resposta é não. O que quero saber é por que não me disse que Roger fez pressão mental em você?

— Diane, eu... — Tentei procurar palavras e então percebi. — Quem te contou isso?

— Importa mesmo? Ryan me contou e Alex confirmou.

— Eles não tinham direito de espalhar isso.

— Se você tivesse aparecido aqui ontem, teria direito de opinar em alguma coisa, mas como você sumiu, ambos tentaram criar motivos para a sua falta.

— E falaram demais.

— Por que não me contou, Anna? Acha que pode lidar com um homem daquele porte sozinha? Ele é chefe da sua chefe e influente suficiente para nunca mais te deixar conseguir um emprego em qualquer revista do país!

— Mas por que ele faria isso? Não fiz nada com ele!

— É por isso mesmo. — Afirmou. — Se você se mostra frágil para algumas pessoas, elas simplesmente abocanham você. Roger fez isso, Jennifer fez isso. E alguém no seu passado também, segundo o seu artigo. Anna, isso precisa parar.

— Espera, espera. — Chacoalhei as mãos. — Desculpa, Diane, mas que tipo de conversa é essa?

— É uma conversa de treinamento profissional e pessoal, porque, algumas vezes eles andam juntos. Você precisa agarrar o controle da sua vida e gritar quando algo não estiver bem.

— E você não vai me despedir? — Fiz uma careta.

— Por você ter faltado ontem? — Riu. — É óbvio que não! Não foi fácil te substituir, mas o castigo de Jennifer foi executar o trabalho duplo.

— Deve estar me odiando, agora. — Rolei os olhos, agradecida pela ideia da minha chefe.

— Ninguém está odiando você! Esse sentimento de coitadinha precisa sair daí se quer trabalhar nessa revista. Todo ano fazemos festa, alguém bebe e passa vexame. Na segunda-feira ninguém liga porque a maioria fez isso. Acostume-se e relaxe.

 

Sorri, sabendo que fiz uma cara estranha, mas tentei parecer entender o que ela estava dizendo. O mundo da moda é mais estranho do que fui preparada à esperar.

 

— E quanto à Roger? O que fez?

— Conversei com ele, sem dizer o que houve, é claro, mas exaltei suas qualidades. — Sacudiu a cabeça, despreocupada. — Ele não acreditou tanto, então decidi que vou te dar mais poder, para demonstrar à todos porque quero você aqui e no quanto confio no seu talento.

— É sério? — Levantei, dando um pulinho. — Como? Obrigada! 

— Deixe começarmos a nova edição e prometo te deixar saber. Agora volte ao trabalho e anuncie quando for faltar!

— Pode deixar! Obrigada!

 

Saí, como se estivesse flutuando. Sorria para mim mesma e para como havia ganho algum crédito, mesmo não tendo feito nada. Alguém acreditava em mim e isso era inspirador.

Antes de me sentar, vi que Ryan voltava de seu estúdio, rumo à sua sala e decidi saber o que havia acontecido. Sua expressão suavizou no momento que me viu bem.

 

— Ryan! Você foi falar com Diane sobre Roger? Por que?

— Porque você sumiu e mesmo que em parte tenha sido por nós, sei que temia pelo seu emprego, principalmente porque ele viu tudo. — Me apontou, erguendo as grossas sobrancelhas.

— Tem razão, eu só não queria que ela soubesse assim, mas... Você tem razão, acho que fez bem. — Suspirei.

— É mesmo? Então não está brava comigo? — Riu.

— Não, acho que não. Ela me tratou tão bem e me disse coisas tão boas. Praticamente me promoveu!

— Uau, Anna. Você merece. — Sorriu, apertando levemente minha bochecha.

— Obrigada, de verdade.

 

Meus braços passaram rapidamente ao redor de seu pescoço em um abraço desajeitado e ele me tirou do chão, rindo no mesmo momento que eu. Ele estava feliz por mim e eu estava feliz por algo que ele teve culpa, pela primeira vez.

Ryan me colocou no chão e uma vergonha bateu de repente em nossos rostos, afastando nossos corpos um pouquinho.

E meu celular tocou estrondosamente sobre a mesa.

 

— Eu... — Apontei a mesa. — Celular.

— Tinha certeza que era seu. — Riu, entrando em sua sala. — Te vejo depois.

 

Corri para atender e no visor marcava "Rachel". Meu dia não podia ser melhor.

 

— Rachel? Oi!

— Oi! Que saudades de você. Escuta, estou ligando para te avisar que amanhã à noite é aniversário do Pete! Ele vai voltar à tempo então me ajuda a criar uma mini festa?

— É claro! Teremos um aniversário!

— Por isso que te amo.

— Também te amo.

 

Acho que estou no controle, agora.

Mal posso esperar uma festa com meus amigos, dessa vez.


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