Capítulo I - Rainha

Acordei com um “click”.

Ou melhor, com um instinto que movia a nossa espécie há mais de dois mil anos. Minha rainha precisava de mim.

Levantei-me com certa pressa, e assim que os meus pés tocaram o chão a porta foi aberta e duas operárias entraram carregando uma bacia e outra segurava um vestido e sapatos.

— Nossa rainha já está acordada? — Perguntei para a operária mais próxima, as outras duas estavam despejando a água quente na banheira.

— Ainda não, senhora. — Ela respondeu enquanto tirava as minhas roupas, as outras já haviam terminado de encher a banheira e aguardavam pacientemente para me lavarem.

O banho foi rápido e logo em seguida um vestido era deslizado sobre o meu corpo e sapatos eram colocados em meus pés. O dia seria longo e eu me sentia estranhamente tensa.

Eu caminhava rapidamente pelos corredores iluminados do palácio, faltava pouco para o dia amanhecer, mas mesmo assim parecia ser dia por conta da enorme quantidade de velas e candelabros nos corredores.

Cheguei às portas do quarto real no exato momento em que uma operária vinha carregando uma bandeja com o café da manhã de vossa majestade: eu quase havia falhado na minha tarefa mais importante.

Ela me entregou a bandeja e abriu as portas, entrei apressadamente e ouvi o barulho das portas se fechando atrás de mim com uma leve batida.

Adentrei mais o quarto e vi a rainha dormindo na cama, o quarto ainda estava escuro devido às cortinas não terem sido abertas, coloquei a bandeja em cima de uma mesa e me encaminhei para as janelas.

As cortinas eram leves, e se moveram facilmente com o meu toque, o sol nascia no horizonte e ouvi o barulho dos lençóis se mexendo.

A rainha estava acordada e se levantou arrumando os longos cabelos loiros, ela podia ter acabado de acordar, mas uma tensão inconfundível estava estampada na sua expressão quando ela se aproximou de mim e começou a observar a paisagem.

— Minha senhora está tensa, aconteceu alguma coisa? — Questionei enquanto a analisava com os olhos a procura de algum ferimento ou algo do tipo, não era do seu feitio estar perturbada, ainda mais logo cedo na manhã.

— Recebi este telegrama ontem à noite. — Arqueei uma sobrancelha quando ela me estendeu um telegrama recentemente aberto e com um selo real que eu não conhecia.

Peguei o envelope e li o conteúdo da carta, a mensagem era de uma jovem rainha que estava procurando um território para fixar o seu reino e ela gostaria de conversar com a minha senhora sobre ocupar uma terra próxima do nosso reino.

— Não sabia que as Vespas estavam na época de acasalamento. — Disse depois de ler o telegrama, rainhas jovens significavam períodos de acasalamento já que era somente nessa época que princesas, agora capazes de se reproduzir, saiam do seu reino de nascimento para fundar o seu próprio.

— Não estão. — Minha rainha disse firmemente. — O reino das Vespas mais próximo de nós está a quase uma semana de viajem e eu tive uma conferência com a rainha deles há um mês. O Acasalamento só estava estimado para o próximo outono.

Essa nova informação me deixou incomodada e as minhas asas se sacudiram nas minhas costas, uma rainha jovem fora da época de Acasalamento podia significar que outro reino estava começando a se aproximar das nossas terras e uma guerra com Vespas significava muitas baixas, baixas que o nosso reino não poderia agüentar, não quando estávamos prosperando tanto.

— Ada — Levantei a cabeça quando a ouvi chamando o meu nome. — Reúna a minha guarda pessoal, iremos nos encontrar na Grande Árvore.

A Grande Árvore ficava nos limites do palácio, uma velha árvore que existia há muito tempo e possuía folhas vermelhas durante o ano inteiro, longe o bastante da cidade real e perto o suficiente para um ataque caso algo saísse do controle.

— Trouxe seu café da manhã. — Falei depois de alguns minutos de silêncio e vi vossa majestade virar a cabeça na direção da mesa onde eu havia deixado a bandeja.

Me encaminhei até lá e trouxe o prato para perto dela: cinco cubinhos feitos de geléia real e um copo d’água. Era o único alimento que ela consumia e o único necessário para sua sobrevivência, como rainha ela se alimentava exclusivamente de geléia real, uma substancia produzida pelas operárias que reforçava os feromônios de rainha.

Assim que ela comeu os cubinhos senti uma leve vibração no ar me atingir, e automaticamente abaixei a cabeça em submissão, meu corpo reconhecia quem era a dominante no local, quando levantei meu olhar alguns segundos depois e percebi que ela havia relaxado consideravelmente se comparado com a tensão de quando tinha acordado.

O cabelo tinha ganhado mais brilho e ficado levemente mais dourado, o mesmo para os olhos, além da pele ter retomado a aparência suave que sempre parecia ter, ela estava com os olhos fechados e quando os abriu novamente, sorriu para mim.

A nossa rainha era mais alta do que todos nós e as diferenças entre ela e o resto de nós era notada com facilidade: os cabelos loiros caiam soltos e livres até encontrarem o chão, os olhos eram dourados assim como mel que produzíamos e ela era alta, possuía dois metros enquanto nós possuíamos um e sessenta, tirando os machos que tinham um e oitenta em sua maioria.

A rainha Arella, a Rainha Dourada como era chamada, era estonteante, além de ser fortemente amada por todos os seus súditos, ela era extremamente protetora com todos e sempre visava o que era melhor para o reino.

— Se prepare para o nosso encontro com essa rainha jovem. — Ela disse calmamente enquanto voltava a sua atenção para a janela, a Cidade Dourada se estendia radiante e brilhando fortemente com a luz do sol. — Eu não estou com nenhuma intenção de deixar o meu reino cair.