O Sol em meio à tempestade escrita por nsbenzo


Capítulo 52
Capítulo 51


Notas iniciais do capítulo

Boa leitura, seus lindos *-*
Capítulo grandão pra vocês.
Mas tá fofo, apesar de não ser o tipo de fofura que vocês querem kkk



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— Eu estou bem! – forcei a minha voz a sair alta, mas o som pareceu esquisito com uma ponta de rouquidão. – É só uma gripe. – insisti, me encolhendo no sofá, cobrindo melhor o meu corpo com meu cobertor.

— Já faz dias que essa gripe só piora, Katniss. Você precisa de um médico. – disse Madge, em tom preocupado.

— Enquanto eu estiver conseguindo me manter em pé para dar aula, não preciso de um médico. – retruquei. – Só estou deitada agora, porque estou aproveitando da minha semana de folga para me acomodar em meu precioso sofá.

— Não me venha com essa. Desde o dia seguinte a chuva que você tomou, quando não estava na escola, estava deitada em qualquer canto do apartamento. – disse ela, claramente nervosa com minha resistência. – Me diz o que você está sentindo, pelo menos.

— Dor de cabeça, por você falar demais. – retruquei de mau humor, sentando-me com certa dificuldade. – Se eu sentir que estou à beira da morte, eu te aviso, e você me leva ao hospital. – dei um sorriso sarcástico.

— Que horror. – Madge fez uma careta, mas não pareceu se importar com a minha má educação. – Comeu alguma coisa hoje? – indagou, sentando-se ao meu lado.

Quando pensei em responder, meu celular apitou sobre a mesa de centro, fazendo meu estômago dar uma cambalhota completa, deixando-me enjoada.

— O que foi? – ela perguntou, talvez notando meu olhar congelado no aparelho.

Respirei fundo, e soltei todo o ar pela boca, antes de pegar o celular, certificando-me que eu estava mais do que certa sobre quem era o dono da mensagem.

— É o Peeta? – Madge perguntou, enquanto eu encarava a tela, que começava a escurecer pela minha demora para desbloqueá-la.

Afirmei silenciosamente com a cabeça, colocando as pernas sobre o sofá, e as dobrei, deixando os joelhos na altura do peito. Soltei o celular sobre meu colo, deixando-o ser amparado por meu cobertor, que ainda cobria minhas pernas.

— Quando você brigou com a Annie, você mantinha o celular desligado... – ela comentou duvidosa.

Suspirei, e fitei a televisão, que passava Tom e Jerry.

— Um dia depois que terminamos, ele pediu para conversarmos. Ele quis saber como eu estava... Nisso ele notou o início da minha gripe. – comecei a explicar, ainda com os olhos parados no desenho animado. – Como eu pedi para que ele me deixasse em paz, e ele prometeu que o faria, me surpreendi com um mensagem dele no dia seguinte, perguntando se eu estava melhor. Eu demorei um tempo encarando o celular, e quando pensei em voltar a desliga-lo, foi como se ele lesse meus pensamentos, mesmo estando longe. Ele me mandou outra mensagem dizendo que se eu não o respondesse, ele bateria em minha porta, até que eu me cansasse da insistência dele, e acabasse abrindo. Então eu disse que estava bem, mas minha mentira não durou muito. Ele não me parava pelos corredores da escola, mas sempre passava por mim, me estudando como se conseguisse ler cada pedacinho de mim. Então ele continuou a me mandar mensagens só perguntando se eu estava melhor da gripe... E eu continuei a mentir, dizendo que estava bem. Com certeza ele sabe que não estou sendo sincera, mas acho que ele encara como um sinal de “ela ao menos está viva”, então não insiste em prosseguir com uma conversa, talvez imaginando que eu não o responderia mais.

Madge permaneceu calada depois do meu relato, e eu não fiz questão de olha-la.

Ele não estava facilitando em nada minha decisão de nos mantermos longe, demonstrando tanta preocupação, mas eu preferia responde-lo por mensagem, do que ter que encarar aqueles olhos azuis tão de perto.

— Por que vocês terminaram mesmo? – ela finalmente se manifestou, então eu virei a cabeça para encara-la.

— Ainda não quero falar sobre isso. – respondi sem muita emoção.

Duas batidas em minha porta, e logo ela se abriu. Olhei pra trás, e Gale entrava no apartamento.

— Está se sentindo melhor? – perguntou, me estudando com seu olhar preocupado.

— Céus! Como vocês são chatos. – resmunguei, olhando para a televisão. – Até parece que nunca me viram gripada.

— Na verdade... Faz anos que não te vejo assim. – Gale respondeu, e pude ouvi-lo se aproximar. – Tem certeza que é só por causa da chuva? – perguntou, e com minha visão periférica pude vê-lo sentar na poltrona.

— Tenho. – retruquei. – Rouquidão, febre, dor no corpo, garganta inflamada. O que mais poderia ser? – perguntei retoricamente, ainda atenta ao desenho.

— Por isso você deve ir ao médico. – Madge insistiu.

— Você não estuda medicina? – perguntei, olhando em sua direção. – Me arranje algo pra gripe na farmácia. – pisquei com o olho direito pra ela.

Meu celular voltou a apitar, e dessa vez precisei conter minha apreensão para pega-lo.

Gale sabia do término, e eu fiz questão de fazê-lo achar que havia sido uma simples escolha minha. Ele não parecia acreditar muito no que eu tinha dito, mas ao menos vinha respeitando minha decisão de não dar detalhes. E eu sabia que o fato de eu parecer bem na frente dele, a não ser pela gripe, era um dos motivos de sua não insistência. Claro que Madge estava me ajudando com isso, e guardava pra ela o que eu acabava deixando transparecer, quando ela me encontrava esparramada na cama ou no sofá com algumas lágrimas rebeldes escapando de meus olhos.

— Se quiser posso tentar comprar alguma coisa. – Gale se manifestou, levantando-se da poltrona. Ele encarou o relógio prata em seu pulso. – Tenho praticamente meia hora sobrando de almoço. – ele voltou a me olhar, e depois olhou Madge. – Peço algo pra gripe?

— Sim. Descreva os sintomas que Katniss disse. Aproveite que ela está aceitando ajuda.

Fiz uma careta, mas resolvi não dizer nada. Apenas desbloqueei o aparelho, e abri minha conversa com ele.

Boa tarde. Se sente melhor? [12:42 PM]

Você tá aí? [12:49 PM]

Me permiti suspirar ao perceber que Gale havia saído. Lentamente, comecei a escrever a resposta.

Estou bem [12:52 PM]

Minha mensagem foi visualizada assim que enviei. Logo ele já não estava mais online, e eu simplesmente desliguei a tela do celular, jogando-o de qualquer jeito no outro sofá.

Eu sempre dava a mesma resposta, e ele sempre parecia se contentar com isso. O único problema é que meu estômago dava um nó sempre que meu celular apitava, e pra desata-lo, demorava longos minutos. Isso quando ele simplesmente decidia que não desataria. Então eu ficava enjoada pelo resto do dia.

— Posso dizer que esse é o término mais estranho que eu já vi. – Madge comentou.

— Como assim? – questionei, olhando pra ela.

— Você parece muito magoada ainda, mas mesmo assim o responde.

— Ou eu o respondo por mensagem, ou preciso responde-lo cara a cara. Trabalhamos no mesmo lugar. Eu não conseguiria fugir dele. – respirei fundo. – E como já faz quatro dias desde que nos esbarramos pelo corredor, ele fica um pouco mais agitado quando demoro pra responder. Não o quero batendo na minha porta. – murmurei, esfregando minhas mãos suadas no cobertor.

Minha roupa estava colada em meu corpo, e eu não tinha certeza se estava com frio ou com calor. Já havia tomado um banho quando acordei, mas nada tirava aquela sensação esquisita.

Fazia quase uma semana que eu estava gripada, e por mais que eu insistisse em dizer que estava bem, eu me sentia pior a cada dia que passava. Minhas aulas se resumiam em atividades onde eu não precisava falar muito com meus alunos, e que eu não precisasse ficar muito tempo em pé. Meu apetite era quase nulo, mas eu me obrigava a empurrar algumas coisas pra dentro, mesmo quando meu estômago parecia não existir. E eu sentia um buraco oco e dolorido no peito, que era o causador das minhas lágrimas que viviam escapando sem que eu percebesse.

Talvez, no momento em que tive a primeira visão de alguns segundos com todas minhas memórias com ele, algo dentro de mim realmente tenha morrido. Talvez eu só não tenha descoberto o que ainda.

Batidas frenéticas foram dadas em uma porta que não era a minha, por isso, nem me movi no sofá.

Madge?! Você tá aí? — a voz de Annabelle chamou do lado de fora.

Arqueei as sobrancelhas, e olhei para Mad, que parecia tão surpresa quanto eu.

Desde que eu voltei para o meu apartamento, minha irmã não havia aparecido nenhuma vez no prédio.

— Depois eu ligo pra ela. – Madge disse em voz baixa.

Annabelle voltou a bater na porta ao lado.

Mad?!— ela insistiu em chamar. – Eu sei que você está ai!

Suspirei, e me cobri melhor com o cobertor, deixando meu corpo deslizar devagar, até que minhas costas estivessem quase completamente apoiadas no assento.

— Vai lá. Em algum momento ela descobriria que eu voltei pra cá. – disse com desânimo.

— Certeza? – Madge perguntou.

— Sim. – respondi, olhando pra televisão.

— Tudo bem. – Mad disse, levantando-se e foi até a porta. – Eu estou aqui, Annie. – ela avisou ao abri-la.

O que você está fazendo...?— a voz de Annabelle foi aumentando o volume enquanto falava, anunciando que estava se aproximando, e de repente morreu. – Katniss? – ela disse em dúvida.

— Depende do ponto de vista. – respondi, sem ter nada melhor pra dizer.

— Aconteceu alguma coisa? – Madge perguntou.

— É que... – ela hesitou. – Eu só queria saber se você queria sair pra almoçar. Delly vai receber alguns empresários no restaurante hoje. O Finnick teve que ir cedo pra adiantar algumas coisas, e... – ela deu uma pausa. – Katniss. – meu nome saiu com certa impaciência de sua boca.

Franzi o cenho pela entonação que Annabelle havia usado, e lentamente, comecei a empurrar o corpo para cima usando as solas dos pés, que estavam apoiadas no chão, e as mãos, que eu havia espalmado no assento. Virei a cabeça para olha-la, notando seu olhar curioso.

— Você está bem? – perguntou.

— Ótima. – respondi, voltando a encarar a televisão. – Por quê? – indaguei.

— Você parece péssima. – Annabelle comentou.

— Ah, está falando do meu novo look? – perguntei ainda sem olha-la. – Eu chamo de “por que está se preocupando agora?”.

Annabelle suspirou pesadamente, demonstrando impaciência, mas eu não fiz questão de lhe dar atenção.

— Podemos conversar, Katniss? – ela questionou.

De repente meus lábios pareceram secos demais, e eu precisei umedece-los com a ponta da língua. Eu estava em condições disso?

— Katniss. – Annabelle insistiu.

— Não acho que é o melhor momento, Annie. – Madge disse ao meu favor.

Algo se agitou dentro de mim, fazendo com que eu me livrasse do meu cobertor, jogando-o para o lado, e logo me coloquei em pé, mesmo sentindo uma pequena tontura rondar minha cabeça.

— Na verdade, acho que este é o melhor momento. – retruquei. – Entre, Annabelle. – convidei ao notar que ela estava parada embaixo do batente da porta. – Pode nos deixar a sós, Mad? – pedi educadamente, alcançando o controle da televisão para desliga-la.

— Você tem certeza do que está fazendo, Katniss? – minha amiga perguntou, enquanto eu caminhava com passos arrastados em direção a cozinha.

— Tão certa quanto dois mais dois são cinco. – dei de ombros, alcançando uma garrafinha de água na geladeira. – Mas eu preciso ouvir o que minha irmã tem a dizer, certo, Annabelle? – questionei, ainda de costas.

— Certo. – ela concordou, mas parecia em dúvida.

— Peça para o Gale deixar o remédio com você, Madge. Depois você me traz. – falei, virando a tampinha algumas vezes até abri-la, e dei um pequeno gole na água gelada, que desceu rasgando em minha garganta dolorida.

— Tudo bem. – Madge disse vencida, depois de dar um longo suspiro. – Qualquer coisa é só me chamar. – avisou, batendo a porta, anunciando sua saída.

— E então? – falei, colocando a garrafa já fechada sobre a pia. – Sou toda ouvidos. – completei.

Virei-me, encontrando Annabelle parada no meio da sala, com os braços cruzados, e os lábios entre abertos, tornando nítido seu nervosismo. Ela permaneceu calada, me avaliando minuciosamente.

— Annabelle. – chamei sua atenção, usando a pia para escorar meu quadril.

Minha irmã suspirou, antes de finalmente falar.

— Eu sei que pode não valer muita coisa agora, mas eu sinto muito por esconder de você sobre o papai. – ela começou, e eu não esbocei nenhuma reação. – Você estava frágil, e o Peeta estava se esforçando para fazer com que você se sentisse bem. Não podia soltar essa informação em cima de você. Não parecia certo.

Seus olhos pareciam brilhar com lágrimas, mas eu não podia confiar em minha visão, considerando a distância entre nós duas.

Inúmeras lembranças com ele cuidando de mim, depois da morte do meu pai, dançaram por minha mente, deixando-me angustiada. Cruzei os braços, desconfortável, e os apertei ao meu redor.

— Era melhor eu saber assim que aconteceu, do que ter que descobrir daquela forma. – as palavras saíram da minha boca com certa força.

Algo apitou em minha cabeça, mandando-me calar a boca. Eu não estava falando só de Annabelle.

Mordi meu lábio inferior, sentindo os olhos arderem. Em seguida, suspirei.

— Você não tinha o direito de escolher isso por mim. Estamos falando do papai. Você sabe o quanto eu o amo. – continuei a falar, deixando que o pouco de coerência que restava em meu cérebro, tomasse conta do discurso. – O que mais me deixou com raiva, foi você ter escondido, como se tentasse acobertar Manoela. Como se tivesse esperanças de que se eu não soubesse de tudo, quem sabe eu poderia acolhe-la como você fez... – balancei lentamente a cabeça. – Você a trouxe de volta, mesmo sabendo que de certa forma, ela é a culpada pela morte do papai. – as lágrimas se formaram em meus olhos, mas eu os fechei, para evitar que caíssem. – O que te fez pensar que eu a aceitaria de volta, Annabelle? – perguntei, erguendo as pálpebras.

— Eu não sei. – ela respondeu, andando devagar até mim. – Ela é a nossa mãe, Niss.

— Talvez ela seja a sua mãe, Annabelle, mas com certeza não é a minha. – assim que Annabelle se aproximou o suficiente, eu desencostei da pia, e passei por ela. – Eu mal me lembrava dela. – falei, virando-me, e vendo minha irmã se virar para me olhar. – Ela nos deixou por motivos egoístas. Manoela não nos amava. – encostei a lateral do corpo no sofá. – E ela não nos ama agora. – completei. – Você só vai enxergar isso, quando se decepcionar de verdade com ela. E, sinceramente, eu não queria que você se machucasse ao perceber que Manoela não passa de uma pessoa aproveitadora.

— Não acho que você esteja certa sobre isso, Katniss. – Annabelle disse com certa convicção.

— Infelizmente, tenho quase certeza de que estou certa. Só não sei exatamente o que ela pode tirar da gente. – franzi o cenho. – A não ser que o papai tenha nos deixado uma herança secreta, que eu não saiba. – falei com sarcasmo.

— Katniss... – Annabelle soltou em tom de súplica.

— Só estou pensando nas possibilidades. – dei levemente de ombros.

— Quando você se tornou essa pessoa fria? – ela questionou. – Essa Katniss que estou vendo agora, não se parece nada com a minha irmã caçula.

— Desisti de ser boa demais com os outros. – respondi. – São as pessoas boas demais que se ferram, e eu cansei de me ferrar. De me sentir em pedaços toda a vez que me decepcionam. É como se eu nunca conseguisse estar cem por cento inteira. Chega em um ponto da vida, que a gente cansa de se sentir mal pelas coisas que os outros causam, e ouvindo você falar agora, eu percebi que eu não tenho culpa das merdas que as pessoas fazem. Eu não tenho culpa se as pessoas quebram promessas. A única culpa que eu tenho é por minha ingenuidade em achar que a presença de amor significa a ausência de decepções.

— Você acha que eu nunca me decepcionei? – Annabelle questionou. – Infelizmente acontece, Katniss. Esse é o mundo em que vivemos. Não dá pra saber quando irá acontecer, mas vai. Sempre vai. E se você não aceitar que essas coisas acontecem, você viverá trancada nesse apartamento, repelindo todas as pessoas que realmente se importam, só por serem imperfeitas.

— Eu não quero perfeição em ninguém, Annabelle. Seria hipocrisia, uma pessoa tão quebrada e com defeitos como eu, pedir por pessoas perfeitas na minha vida. – retruquei, sentindo meus olhos queimarem. – Eu só queria que alguém realmente levasse em consideração meus sentimentos. Porque usar os argumentos: “não te contei porque não queria te magoar” ou “porque não queria te perder”, não cola pra mim. Esconder as coisas é a pior forma de demonstrar que se importa com alguém. – soltei tudo energicamente, sentindo meu coração acelerado.

Eu não sentia mais a dor em meu corpo, ou a fraqueza em minhas pernas. Era como se de repente eu estivesse sendo movida por outra coisa, que não fosse o sangue bombeado por meu coração.

Minha irmã permaneceu calada, talvez ao perceber as lágrimas caindo de meus olhos antes mesmo de eu notar que elas haviam se formado. O líquido quente descia devagar, tornando-se frio conforme escorria por minhas bochechas.

— O problema não é só comigo, é? – ela questionou em voz baixa, parecendo apreensiva.

Permaneci calada para sua pergunta por um instante, apenas para me permitir respirar fundo algumas vezes, tentando acalmar a fagulha quente que se acendera em meu estômago, e secar a umidade em minhas bochechas com as pontas dos dedos.

— Não. – respondi com a voz mais suave. – O problema não é só com você. – concordei, alcançando o alto da cabeça com a mão direita. – Eu só... – dei uma pausa, enquanto meus dedos se embrenhavam em meus fios de cabelo. – Você pode ir embora, por favor? – pedi, fechando os olhos.

— Niss...

Abaixei a mão e abri os olhos para fitar minha irmã.

— Eu não estava preparada pra isso. Devia ter dado ouvidos a Madge. – murmurei, negando lentamente com a cabeça. – Vai embora, Annabelle. Eu não quero descontar tudo em você, apesar de você merecer ouvir. – suspirei. – Anda. – caminhei até a porta e a escancarei.

Virei para olha-la quando não ouvi o som de seus passos.

Annabelle estava parada no mesmo lugar, encarando-me com a testa franzida.

— Aconteceu algo entre você e o Peeta? – perguntou.

Senti o nó em minha garganta se formar rapidamente, e novas lágrimas nublaram minha visão.

— Não quero falar sobre ele. – respondi. – Apenas vá embora. – pedi, desviando meu olhar pra frente.

— Vocês brigaram? – insistiu, e dessa vez pude ouvi-la se aproximar. – Por isso você está tão mal?

— Vai embora, Annabelle. – soltei entre dentes, encarando-a em seguida. – Eu não quero falar sobre isso com ninguém, muito menos com você. – cuspi as palavras com raiva. – Se você quer que eu te perdoe, tudo bem. Eu perdoo. Agora me deixa em paz. – falei tudo com pressa, apertando a maçaneta.

Annabelle ficou frente a frente comigo, e me olhou nos olhos.

Ela não disse nada. Apenas me obrigou a soltar a maçaneta, quando me puxou pra um abraço apertado.

Por breves segundos relutei em aceitar sua forma de me confortar, porém, eu estava me sentindo tão triste, que quando me dei conta, eu já retribuía o abraço com a mesma força que ela. Meu rosto havia se escondido em seu ombro, e eu me permiti chorar. Chorar tudo o que eu precisava, mas vinha segurando nos últimos dias. Chorar por tudo o que me machucava por dentro. Chorar por tudo o que eu não havia chorado durante a minha vida toda.

Ficamos daquele jeito por um bom tempo. Eu estava praticamente agarrada a Annie, e ela acariciava minhas costas, em uma tentativa de me acalmar.

— Eu sinto muito, Niss. – ela decidiu falar em voz baixa. – Não consigo nem imaginar como tudo está sendo difícil pra você. Ao invés de cuidar de você, eu só te trouxe mais problemas. – Annabelle se afastou levemente, obrigando-me a erguer a cabeça pra olha-la. – Eu realmente estou arrependida. Mais ainda por vê-la nesse estado. Como irmã mais velha, eu estou sendo um fracasso.

Continuei em silêncio, ainda com os braços ao redor da minha irmã, enquanto meu cérebro trabalhava com rapidez.

Eu não podia continuar a repelir Annabelle, tendo a oportunidade de tê-la de volta em minha vida. Talvez, se eu estivesse em outra situação, até pudesse bancar a cabeça dura, e não aceitaria seu pedido de perdão. Porém, vasculhando minha cabeça, pude chegar à conclusão de que eu estava tão destruída com o término do meu namoro, que não tinha mais espaço para sentir raiva de Annie. No fundo, todo o meu discurso deveria ter sido direcionado para outra pessoa. Alguém que havia me machucado recentemente, de uma maneira tão profunda, que eu me sentia idiota por me preocupar em responder suas mensagens.

— Está sim. – eu a soltei do abraço. – Você agiu com egoísmo ao tomar decisões sem meu consentimento. – disse, tentando secar meu rosto com as mangas da blusa. – Mas... Eu não consigo guardar mágoa de duas pessoas ao mesmo tempo. – falei mais para mim do que pra ela, e ela não fez menção de perguntar nada. – Eu... Eu acho que podemos... Trabalhar essa coisa de perdão. – sugeri. – Mas sem pressão. Eu preciso... Mandar algumas coisas pra longe da minha cabeça. Mas... Podemos tentar voltar a conviver. Eu... – respirei fundo e devagar. – Eu só tenho uma condição. – escondi as mãos nos bolsos da minha calça de moletom.

— Qual? – ela perguntou apreensiva.

— Pra convivermos melhor, você precisará respeitar meu espaço. – disse devagar. – Não me obrigue a falar do que eu não quiser falar. Conversar sobre meus sentimentos sempre foi difícil. – dei uma pausa, enquanto suspirava. – Ultimamente as coisas só pioraram, então... Muitas coisas eu não vou me sentir confortável para falar, e...

— Eu já entendi. – Annie me interrompeu. – Vou ser menos invasiva e controladora. – ela sorriu culpada. – Conversaremos somente sobre o que você quiser. – concordou rapidamente, me fazendo unir levemente as sobrancelhas. – Tudo bem... Eu também vou trabalhar nisso. – ela afirmou, dando um meio sorriso.

— Obrigada.

Tentei sorrir de volta, mas a fraqueza tinha voltado para o meu corpo, e eu sentia que estava sendo sugada novamente para baixo, por isso, algo me dizia que tinha sido mais uma careta do que um sorriso.

— Você ainda quer ficar sozinha? – perguntou.

Mordi o lábio inferior e cruzei os braços.

— Na realidade... É a última coisa que eu quero. – confessei em voz baixa.

Minha irmã sorriu novamente.

— Então vou chamar a Madge. Tenho muitas coisas pra te contar sobre a gravidez. – ela disse animada. – Você tem comida? – questionou, enquanto caminhava pra fora.

— Não. – respondi.

— Vou pedir alguma coisa então. Estou com vontade de comer comida mexicana. – continuou a tagarelar, andando pelo corredor. – Madge! Vamos comer comida mexicana. Você tem o número? – ela disse em voz alta, enquanto batia na porta ao lado.

Caminhei, até conseguir enxerga-la do lado de fora, e encostei a lateral do corpo no batente, ainda com os braços cruzados.

— Comida mexicana? – Madge questionou depois de abrir a porta. – Muito apimentada pra mim, e eu já almocei. Veja se eles tem sobremesa.

— Mas eu não tenho o número. – Annie resmungou.

— Tem algo chamado internet. Não sei se vocês conhecem. – decidi me manifestar, chamando a atenção das duas.

Annabelle rolou os olhos ao me olhar, e Madge riu baixo.

— Venham pra cá. – desencostei do batente, e soltei os braços. – Procuramos pelo número.

— Quais são os tipos de sobremesa mexicana? – Madge perguntou ainda do lado de fora.

Caminhei com passos arrastados para o sofá, e sentei cuidadosamente nele, depois de alcançar meu celular sobre o sofá de dois lugares.

— Sei lá. Use a internet. – Annie provocou, já dentro do apartamento.

— E afinal de contas, o que você está fazendo andando por ai, em pleno dia de serviço? – Mad questionou.

— Fui ao médico de manhã. Ganhei o dia de folga. – Annie explicou.

Não demorei nada para começar a pesquisar o número de um delivery, mesmo sem sentir um pingo de fome.

— Eu trouxe seu remédio, Kat. – Madge avisou.

— Tudo bem. – falei sem vontade. – Obrigada.

— É melhor você tomar agora. – ela sugeriu. – Vou buscar sua água.

Assenti silenciosamente com a cabeça, e continuei minha pesquisa, ouvindo as duas tagarelarem, depois que Mad perguntou sobre a visita de Annie ao obstetra, enquanto andavam juntas para a cozinha.

Eu sabia que levaria um bom tempo para que eu não me sentisse tão despedaçada, mas com a presença das duas, era como se eu estivesse menos incompleta. Madge e Annabelle talvez pudessem trazer um pouco de normalidade aos meus dias, e era nisso que eu me agarraria.


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Notas finais do capítulo

Muito obrigada pelo carinho de vocês. Principalmente aos que se prontificaram em recomendar minha fanfic ♥
Isso que tem me motivado a continuar a escrever.
Vocês são demais.
Beijos amores ♥