O Sol em meio à tempestade escrita por nsbenzo


Capítulo 50
Capítulo 49


Notas iniciais do capítulo

Oi gente.
Voltei logo.
Eu sei que tem todo aquele negócio de querer me matar por fazer vocês sofrerem, por isso, estou postando esse capítulo mais longo... Pra tentar centralizar a parte mais triste em um capítulo só.
Para quem quiser um empurrãozinho pra fossa, tem um link de uma música nas notas finais, que combina com a situação da Katniss...



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Peeta

— Vamos pra dentro. – disse andando em direção a Johanna.

— Eu não acho que seria uma boa ideia eu entrar. – ela disse quando eu me aproximei.

— Você vai entrar sim. – falei entre dentes, e a segurei pelo braço. – Você veio até aqui atrás de mim. Agora nós vamos conversar. – sai arrastando-a em direção a minha casa, ouvindo-a protestar com palavrões.

Quando já estávamos no meio da sala, eu a soltei.

— Como você achou meu endereço? – foi a primeira pergunta que eu fiz, quando virei para encara-la.

Meu tom de voz era grave e irritado, o que parecia deixar Johanna agitada.

— Te segui ontem, da escola até aqui. – respondeu. – Até vi você com a garota, mas nunca passou pela minha cabeça que ela não sabia de nada. – ela disse com cautela. – Você sempre foi certinho. Não dava nem pra imaginar algo assim.

— O que você quer aqui? – rosnei, fechando as mãos ao lado do corpo, ignorando sua fala.

— Eu vim pedir ajuda. – Johanna soltou a frase, seguida por um suspiro. – Eu estou ferrada, Peeta.

Soltei um riso sem humor.

— Você só pode estar de brincadeira comigo. – fechei os olhos e balancei a cabeça. – Você fodeu com a minha vida, e agora quer ajuda? – questionei entre dentes, erguendo as pálpebras para fita-la. – Acho que a fumaça dos carros de Nova Iorque afetaram seus neurônios. – soltei com sarcasmo.

— Eu sei que fui uma péssima pessoa no tempo em que estivemos juntos. Você nunca mereceu o que eu fiz a você. – Johanna disse sem muita emoção. – Se você me ajudar, podemos dar entrada no divórcio. Com a minha assinatura, e meu depoimento, dizendo como fui uma péssima esposa, você estará livre de mim em um mês ou dois.

— Você está querendo negociar comigo? – perguntei, franzindo o cenho. – Você veio até Detroit, pra pedir minha ajuda, em troca do nosso divórcio? – eu a analisei dos pés à cabeça. – Você acaba de foder com o melhor relacionamento que eu já tive, pra negociar algo que eu estou no meu direito de pedir? – um sorriso sarcástico apareceu em meus lábios. – Você está louca se acha que eu vou concordar com isso.

Ela franziu a testa, e, de repente, algo em sua postura mudou.

— Eu estou de volta a Detroit, Peeta. Os três anos que eu estive fora, podem não significar nada, se eu alegar algumas coisas perante ao juiz. – ela sibilou, não parecendo se importar com o meu olhar incrédulo. – Eu estando aqui, se eu não quiser o divórcio, você ainda estará de mãos atadas. – Johanna disse em tom de ameaça.

Estava claro que toda a cautela fingida havia ido embora, o que deixava nítido que ela realmente precisava de ajuda, por isso havia mudado sua abordagem.

— O que você fez? – perguntei, voltando a segura-la pelo braço. – Ferrou com a vida de alguém em outro estado, e agora estão atrás de você? – pressionei meus dedos contra sua pele. – Ou quem sabe, finalmente temos a polícia na sua cola? – disse em tom provocativo. – Me conta o que você aprontou, Johanna.

Eu me sentia completamente fora de mim, e naquele momento, eu não me importava. Eu estava machucado. Machucado de uma maneira que eu nunca havia estado antes. E a melhor maneira que eu sabia lidar com aquilo, era deixando a raiva tomar conta do meu corpo.

Ela encarou onde eu segurava, e sacudiu o braço bruscamente, obrigando-me a solta-la.

— Eu só conto se você concordar em fazer esse acordo comigo. – Johanna disse, depois de esfregar o local que eu havia apertado, enquanto se distanciava de mim, prostrando-se atrás da poltrona.

— Como posso aceitar fazer um acordo com você, sem saber o que terei que fazer para te ajudar? – questionei nervoso. – E se eu concordar, e precisar desovar um corpo? Ou roubar um idoso? Quem sabe matar um filhote de cachorro? – balancei a cabeça, ignorando a risada baixa dela ao me ouvir dizer aquelas coisas. – Eu nem consigo pensar com coerência pra te dar uma resposta, sem pensar em como eu gostaria de te bater. – conclui entre dentes, passando as mãos no alto da cabeça.

— Posso até imaginar o que sua namorada acharia se você fizesse isso. – Johanna comentou.

Abaixei as mãos e a encarei. A veia em minha têmpora pulsava fortemente, meu maxilar travou, meu coração passou a bater descompassado, meus músculos tornaram-se rígidos, e minhas mãos se fecharam em punhos ao lado do corpo.

Foi como se tudo começasse a fazer sentido em minha cabeça, e só naquele momento caiu a minha ficha.

Katniss sabia a verdade agora, e tinha ido embora. Eu tinha deixado com que ela escapasse por entre meus dedos, por decidir por mim mesmo o que era melhor pra ela. Por esconder algo, que eu já sabia que a machucaria. Eu tinha perdido minha pequena.

— Bom. Não sei se a palavra namorada se encaixa bem nesse contexto. – Johanna voltou a falar. – Amante, talvez?

Eu a encarei, sentindo os olhos arderem. Tudo foi muito rápido, e eu não sei explicar muito bem como aconteceu.

Quando finalmente voltei a mim, minha sala estava revirada, com objetos quebrados e espalhados pelo chão. O vidro da mesa de centro estava trincada, e minhas mãos e pés doíam intensamente.

Minha respiração estava alterada, como se eu tivesse corrido uma maratona, e meus olhos queimavam, em uma mistura de raiva e tristeza.

Eu havia destruído minha sala, só pra tentar alcançar Johanna.

Olhei ao redor, tentando localiza-la. A poltrona que ela usava como proteção contra mim, estava caída de lado no chão, enquanto ela mesmo, havia corrido para perto da saída. Seus olhos estavam mais abertos do que o normal, parecendo uma mistura de surpresa e medo.

Me aproximei dela com passos largos, parando a poucos centímetros de seu corpo. Johanna mudou sua feição rapidamente, e franziu os lábios, sustentando meu olhar raivoso.

— Nunca mais fale sobre Katniss. – a frase saiu rouca e entre dentes. – Você não tem o direito nem de pensar nela. Fique longe de qualquer coisa que tenha a ver com ela, ou eu não respondo por mim. – ameacei. – Só volte a entrar em contato comigo, se quiser assinar a porra do divórcio. Fora isso, é melhor que você se mantenha longe de mim também. – rosnei, sacudindo as mãos doloridas. – Agora vai embora daqui! – exclamei, dando passos pra trás.

Johanna me fitou dos pés à cabeça, antes de abrir a porta, e sair rapidamente por ela.

Eu sabia que ela não me deixaria em paz tão facilmente, mas naquele momento, só uma coisa importava, por isso, eu mesmo saí quase correndo de casa, e entrei em meu carro minutos depois.

Eu precisava tentar falar com Katniss.

 

Katniss

Meu corpo agia como se estivesse em modo automático desde que saí da presença de Peeta, por isso, eu não fazia ideia de como eu havia chegado naquele lugar.

Meus passos eram lentos e cautelosos, como se minha presença ali fosse incomodar alguém, mas a verdade é que não havia ninguém para ser realmente incomodado.

O cemitério estava completamente vazio, e eu me perguntava porque meu cérebro havia me guiado até um local tão triste para se estar naquele momento.

Eu ainda não havia chorado de verdade. Era como se eu estivesse amortecida dos pés à cabeça, apenas fazendo o que meu cérebro ordenava. E como as lágrimas ainda não haviam voltado aos meus olhos, eu continuava lutando para que elas se mantivessem longe deles.

Meu único problema é que segurar o choro estava se tornando sufocante, atrapalhando até mesmo a minha respiração, que estava irregular.

Meus olhos passeavam pelas lápides conforme eu andava, procurando por uma em especial. Quando encontrei o lugar exato que eu deveria parar, permiti que meu olhar repousasse exatamente na pequena foto da lápide feita de mármore.

Me aproximei pela lateral, tomando cuidado para não pisar em cima da grama bem aparada sobre o túmulo, e toquei a pedra fria com as pontas dos dedos.

— Ei, pai. – falei baixo, sentindo as palavras arranharem minha garganta. – Desculpa não ter vindo antes.

Lágrimas espessas se formaram, tornando minha visão turva, mas ainda assim, eu lutava para que elas não caíssem.

— Eu sei que fiquei te devendo uma despedida, mas eu não estava pronta pra isso. – limpei a garganta, e engoli com dificuldade. – Na verdade... Eu ainda não estou.

Agachei devagar, sentindo minha bolsa escorregar por meu braço, e cair ao meu lado.

— Eu também sei que o senhor não pode me responder. Acredite. Eu ainda não fiquei louca. – comentei, esboçando um sorriso. – Mas... – dei uma pausa, cruzando os braços. – Eu precisava muito de um conselho agora. Ou só do seu abraço confortável, sabe? – minha fala acabou saindo quase em um sussurro.

Uma brisa morna me envolveu, balançando meus cabelos. Fiquei por alguns segundos em silêncio, permitindo que a sensação gostosa de ser acariciada pelo vento fraco, tomasse conta do meu corpo e da minha mente. Por um momento, cheguei a acreditar que não estava mais sozinha naquele lugar, mas assim como a brisa veio do nada, ela também se foi. De repente, eu não ouvia nem o som das folhas das árvores balançando. O silêncio tornou-se mais profundo do que quando cheguei ali, e tomou conta lentamente das minhas veias, alcançando meu peito devagar, fazendo com que eu me sentisse mais sozinha do que nunca.

Fechei os olhos com força, e abaixei a cabeça, apertando-me entre meus braços, como se aquilo pudesse me manter inteira.

— Eu sei que o senhor achava que valia a pena dar uma chance a ele. – comecei a falar, mas parei, engasgando-me levemente com o aperto em minha garganta. – Por alguns meses, realmente valeu. – continuei, depois de pigarrear. – Mas então, ele me magoou. – as lágrimas escorreram pelos cantos dos meus olhos. – Ele dizia que me amava, e conseguiu esconder uma esposa de mim. – soltei um riso fraco e sem humor. – E eu confiei tanto nele, que... – dei uma pausa, sentindo meu choro se intensificar.

Era como se só naquele momento, enquanto eu dizia em voz alta, que meu cérebro começasse a assimilar o que realmente havia acontecido, e confesso que não era nada agradável. Eu sentia minha pele pinicar, e meus ossos doerem, como se meu  corpo fosse ceder de alguma maneira.

— Que... – tentei continuar a falar, mas um soluço escapou por entre meus lábios. – Meu Deus... Eu não vou aguentar isso. – descruzei os braços, para tampar a boca com a mão direita.

O barulho do meu choro tornou-se alto, e só era interrompido por soluços profundos, que fazia todo o meu corpo tremer. Minhas pernas começaram a falhar, e antes que elas fraquejassem de verdade, eu me movi, ajoelhando-me, e sentei sobre elas.

Escondi o rosto com as mãos, permitindo-me, por um curto momento, derramar as lágrimas que eu tanto segurava.

Enquanto chorava, eu sentia como se meu coração quebrasse vagarosamente em meu peito, pedaço por pedaço. Da mesma forma como se quebra um vidro, quando alguém pisa nele ou o derruba, porém, em câmera lenta, mostrando primeiramente o vidro inteiro, depois ele trinca, racha, e, por fim, se transforma em pequenos cacos cortantes, espalhados pelo chão.

Passei um bom tempo em lágrimas, até que senti que conseguiria voltar a falar, então, abaixei as mãos para o meu colo, e deixei meu olhar alcançar a lápide novamente.

— Eu confiei tanto nele que eu me sinto destruída agora. – completei minha fala, com a voz embargada. – Eu me sinto tão machucada, que é como se os pedaços do meu coração estivessem me dilacerando de dentro pra fora. – ergui a mão direita, alcançando meus cabelos, e deixei meus dedos se embrenharem nos fios. – Dói fisicamente. Dói em cada partícula do meu corpo. E... Eu não sei se... – gaguejei soluçando. – Se vou conseguir reagir a isso. – puxei meus cabelos com força, soltando-os em seguida.

Continuei a encarar a pequena foto de meu pai, torcendo as mãos em meu colo. Movi meu corpo lentamente, como se um movimento brusco demais pudesse me despedaçar a qualquer momento, e finalmente sentei de verdade na grama, sem me importar se toda a minha calça jeans estaria suja. Dobrei as pernas, e escondi meu rosto entre os joelhos.

— Talvez eu já tenha enlouquecido. Estou falando sozinha. – murmurei em tom abafado.

Balancei a cabeça negativamente e decidi me calar, abraçando minhas pernas contra o peito.

Minutos se passaram, enquanto eu chorava baixinho. Quando senti que o nó em minha garganta parecia menor, acabei erguendo a cabeça, e permiti que meu queixo se apoiasse em meu joelho esquerdo.

— Pela primeira vez, eu acho que não devia ter dado ouvidos ao senhor, pai. – sussurrei, encarando a lápide, sentindo meu peito se apertar um pouco mais. – Mas eu não o culpo por isso. – dei um sorriso triste. – Eu o culpo pelo fato de ter partido, e não estar aqui agora para me consolar. – as lágrimas voltaram a cair de meus olhos.

Apoiei as mãos no chão, apenas para deixar a grama entrar nos vãos dos meus dedos.

Eu sentia a falta do meu pai, mas até então não havia ficado tão nítido pra mim. Até então, eu não tinha realmente ficado sozinha. Mas agora eu estava. Estava completamente sozinha, afinal de contas, eu não confiava cem por cento, em mais ninguém.

Algo frio pingou em minha testa, e escorregou lentamente por minha pele que parecia estar pegando fogo.

Olhei em direção ao céu, e só então pude notar a tempestade que havia se formado enquanto eu me distraía com meu monólogo.

Eu não me movimentei nem um centímetro, mesmo sentindo outras gotas mais grossas começarem a me atingir.

As nuvens eram escuras e pareciam pesadas, e escondia completamente o sol, deixando o céu quase monocromático.

— Mas é claro. Uma tempestade. – comentei com sarcasmo, passando as mãos por meu rosto, sentindo um pouco da terra da grama sujando minha face.

Suspirei pesadamente, e voltei a fitar a lápide de meu pai.

Eu não me importava com a chuva, nem com o fato de que logo a noite chegaria.

Eu ficaria ali, até que eu me sentisse preparada para encarar a solidão do meu apartamento.

 

~||~

 

— O que aconteceu com você? – Madge perguntou, enquanto eu tentava acertar o buraco da fechadura.

— Nada. Só tomei chuva. – respondi, finalmente colocando a chave no lugar certo, e a virei. – Não precisa se preocupar.

— Isso é lama? Já são mais de onze horas. Onde você estava? – interrogou, enquanto eu entrava no apartamento. – Katniss. – Madge chamou, denunciando que havia entrado atrás de mim. – Me conte o que aconteceu. – insistiu.

Andei por meu apartamento, mesmo que meus sapatos estivessem sujando o piso, e que minhas roupas encharcadas estivessem pesadas, pingando constantemente.

— Cadê o Gale? – perguntei ainda de costas pra ela, jogando a bolsa de qualquer jeito sobre a mesa de centro.

— Está te procurando, já que seu celular está desligado. – disse em tom acusatório.

— Por que essa preocupação toda? Eu mal fico em meu apartamento. – passei as mãos por meus cabelos, tentando ajeita-los.

— Peeta esteve aqui. 

Sua resposta fez meu coração reagir de modo louco, porém não da mesma forma que ele sempre reagia ao ouvir aquele nome ou ao sentir seu toque. Foi uma reação dolorida, que fez novas lágrimas aparecerem em meus olhos, por isso eu os fechei.

— Ele bateu por um bom tempo. Estava desesperado. – Madge continuou. – Então ele foi até meu apartamento. Perguntou de você. Dissemos que não tínhamos te visto. Foi quando ele usou a chave que você deu a ele pra entrar aqui. Quando ele se certificou de que você realmente não estava, ele explicou que vocês tinham brigado, o que foi uma surpresa pra mim e pra Gale. – ouvi seus passos, por isso abri os olhos. – Ele não explicou mais nada. Apenas deixou a chave comigo, e me pediu para dar notícias, caso você aparecesse. Ele disse que iria te procurar, e Gale entrou nessa. Foi cada um pra um canto. – Madge finalmente apareceu em minha frente. 

Ela cruzou os braços acima de sua barriga, enquanto seus olhos me estudavam cuidadosamente.

— Parece que você rolou em uma grande poça de água suja. – disse com o cenho franzido.

— Eu terminei com ele. – falei com dificuldade, por culpa do nó que voltava a inflar em minha garganta, ignorando seu comentário.

Madge arregalou os olhos, parecendo realmente chocada, e abriu a boca, pronta pra falar, porém eu fui mais rápida.

— Não quero contar o motivo. Já é doloroso o suficiente em meus pensamentos. Responder perguntas sobre o assunto só me farão sentir pior. – disse apressadamente. – Pode avisa-lo que estou bem, mas que não o quero aqui. 

Madge movia seus olhos agitados, claramente confusa.

— Pode ao menos me dar uma pista? – perguntou.

— Eu só não o conhecia bem o suficiente. – respondi o mais natural possível, depois de engolir o choro com dificuldade. – Mas o que se pode esperar de um relacionamento que começou quase três meses depois de eu vê-lo pela primeira vez​? – questionei com deboche.

Ela arqueou as sobrancelhas.

— Mas não se preocupe, Mad. Eu estou bem. – disse, tentando soar firme. – Apenas me deixe sozinha. Preciso de um banho, e da minha cama. – dei um sorriso, que eu julguei ser o melhor que eu poderia dar naquele momento. – Qualquer coisa, prometo que chamo você.

Madge franziu o cenho.

— Eu vou embora, mas essa chave... – ela tirou o chaveiro azul, que ele havia lhe entregado, do bolso de seu moletom velho. – Fica comigo.

— A vontade. – repliquei, indo em direção ao corredor.

— Gale pode saber disso? – Madge perguntou, me fazendo parar e virar a cabeça em sua direção.

— Por que não poderia? – retruquei com a testa franzida.

— Ele disse ao Peeta que bateria nele, caso ele te magoasse. – Mad explicou.

Por um segundo ou dois, cheguei a cogitar a ideia, julgando que ele merecia alguns socos para aprender a não magoar as pessoas, porém, meu cérebro me permitiu imagina-lo machucado por apanhar de Gale, e aquilo só fez meu peito doer um pouco mais.

— Não conte ao Gale. – pedi. – Na verdade, não conte a ninguém. Caso alguém pergunte, apenas diga que foi uma escolha minha, não dele.

— Aparentemente ele te magoou bastante. Por que quer protege-lo? – perguntou, parecendo curiosa.

— Porque mesmo o odiando no momento, eu ainda o amo. – respondi, voltando a andar. – Mas o fato de amá-lo, também não muda meus motivos para não querer vê-lo por um bom tempo. – completei.

— Acho que eu entendo. – Madge respondeu em voz baixa. – E como poderei me certificar de que você está realmente bem com isso?

Parei em frente a porta do banheiro.

— Passe aqui amanhã cedo, antes de eu ir para o colégio. Podemos tomar café juntas, e você verá que estarei nova em folha. – falei, alcançando a maçaneta.

— Tem comida por aqui? – Madge questionou.

— Claro que não. Traga a sua. – falei, voltando a olha-la. – Tranque a porta quando sair. – pedi, antes de entrar no banheiro e me trancar lá dentro.

Não fazia ideia de como eu estaria nova em folha no dia seguinte, mas eu precisava tentar. A última coisa que eu queria era me mostrar frágil para as outras pessoas.

Eu só precisava reconstruir rapidamente as barreiras ao redor do meu coração, e, quem sabe, aos poucos, eu mesma colar os pedacinhos dele.

 

Peeta

— Alô. – falei depois de colocar o celular no viva voz.

Katniss apareceu. — Madge disse do outro lado, e instantaneamente, meu corpo relaxou, fazendo-me afrouxar levemente o aperto que eu dava em torno do volante. – O que você fez? — a pergunta veio, acompanhada de um tom acusatório.

— Ela não quis te contar? – perguntei de volta, ligando a seta, pronto para estacionar rente ao meio fio.

Desde quando ela conta algo para os outros? — retrucou.

Desliguei o carro, e alcancei o celular, tirando-o do viva voz, e o coloquei na orelha.

Você a magoou. Isso ficou claro. — Madge voltou a falar, fazendo meu coração se apertar.

— Katniss está triste? – questionei na dúvida.

Que tipo de pergunta é essa? — ela perguntou em tom acusatório novamente. – Vocês terminaram. É claro que ela está triste. Eu só quero saber o porquê.

— Eu... Prefiro não responder isso agora. – respondi.

Gale matará você quando descobrir.

Sua frase não pareceu nada como uma ameaça. Era mais como um aviso.

— Talvez eu mereça. – repliquei, olhando o lado de fora do carro. – Você descobriu onde ela estava? – questionei, antes que Madge comentasse algo sobre minha frase.

Não. Katniss não me deu muitas informações. Só me pediu para te avisar que ela estava bem, mas que não queria que você aparecesse.

Permaneci calado, mesmo depois de Madge se calar, observando o pouco movimento das pessoas pela calçada.

Eu havia andando por uma boa parte de Detroit nas últimas horas, ao constatar que Katniss não havia chegado em casa depois de eu deixa-la ir embora.

Era difícil definir todos os sentimentos que eu tinha dentro de mim, desde que eu a ouvi dizer a frase “ninguém importante”. Ver uma pessoa tão delicada e sensível como minha pequena, dizendo aquilo, naquele tom de voz, fez com que eu me sentisse um monstro.

E talvez eu fosse.

Você ainda está aí? — Madge perguntou, chamando a minha atenção.

— Eu sou uma péssima pessoa, Mad. – murmurei, sentindo as lágrimas subirem até meus olhos. – Eu magoei a garota mais doce, inocente, sensível e delicada que eu já conheci. Eu quebrei o coração dela. – disse entre dentes, e bati com o punho fechado contra o volante.

Ela permaneceu em silêncio do outro lado, mas eu ouvia sua respiração, o que era um aviso de que Madge não havia desligado na minha cara.

— Eu nunca a mereci. – falei segundos depois, com a voz embargada.

Na verdade, eu acho que não existe um cara decente que realmente a mereça. — Madge disse. – Katniss tem as imperfeições dela, mas não é nada, comparado a pessoa maravilhosa que ela é.

Suspirei profundamente. Madge estava certa. Talvez ninguém a merecesse de verdade.

— Eu preciso desligar. Tenho que dirigir até em casa. – foi o que consegui dizer em resposta.

Tudo bem. Tchau. — Madge não esperou por resposta, e desligou a chamada.

Precisei respirar fundo algumas vezes, antes de finalmente ligar o carro, e decidir sair com ele.

Haviam inúmeras chamadas perdidas da minha irmã, que estava desesperada desde que eu mandei um pequeno resumo da minha noite por mensagem, enquanto eu dirigia por Detroit.

Por isso, não me surpreendi ao entrar em casa, e vê-la sentada em meu sofá.

— O que aconteceu aqui? – Delly questionou, de braços cruzados, referindo-se a minha sala.

Suspirei, e fechei a porta.

— Peeta. – ela chamou. – O que aconteceu aqui? – repetiu a pergunta, colocando-se de pé.

— Depois que Katniss foi embora, eu arrastei Johanna pra cá, e... – respondi, olhando na direção dela. – Eu estava descontrolado, e falar com ela só piorou tudo. Quando fui perceber, eu já tinha quebrado tudo. – expliquei.

Delly arqueou as sobrancelhas e soltou os braços.

— Você se machucou? – perguntou, andando até mim.

— Não sei. Talvez as mãos. – respondi, notando os olhos de Delly pararem em minhas mãos que estavam ao lado do meu corpo.

— Você machucou a Johanna? – questionou, e pude notar a sombra de um sorriso em sua boca.

— Claro que não, Delly. – disse levemente exasperado. – Por mais que eu a odeie, eu jamais tocaria dessa maneira em uma mulher. – joguei a chave do carro sobre a mesa de centro.

Suspirei profundamente, e balancei a cabeça em negação.

— A culpa é toda minha. – fitei minha irmã, que estava com as sobrancelhas franzidas. – Sim. Eu estou dizendo antes que você diga.

— Eu não vim aqui pra te acusar, Peeta. – Delly disse suavemente. – Eu vim aqui pra cuidar do meu irmão mais velho, que é um idiota por não me ouvir. – ela abriu um pequeno sorriso. – Você já está sofrendo demais, para eu dizer que eu avisei.

— Exatamente. – concordei.

— Então toma um banho. Vou fazer algo pra você comer. – Delly disse, caminhando até minha cozinha.

Decidi não discordar. Apenas caminhei com passos lentos e arrastados até meu quarto.

Eu já estava de banho tomado, sentado na poltrona de Katniss, encarando a rua, quando ouvi minha irmã entrar. Olhei em sua direção, vendo-a carregar uma pequena bandeja.

— Fiz alguns sanduiches pra mim também. – Delly explicou, quando levantei para pegar a bandeja de suas mãos e encarei a quantidade de comida dentro dela.

Ambos sentamos na cama que estava impecavelmente arrumada, e não era graças a mim.

Katniss sempre se ocupava com a parte de esticar os lençóis, enquanto eu preparava nosso café da manhã.

Coloquei a bandeja entre nós dois, e me encostei na guarda da cama.

— Quer me contar como tudo exatamente aconteceu? – perguntou, depois de um sanduiche inteiro em silêncio.

Suspirei, colocando meu copo de suco sobre o criado mudo.

Comecei a explicar desde o momento que chegamos em casa, até o momento em que Madge me ligou dizendo que ela havia aparecido. No final de tudo, eu estava com raiva novamente, sentindo meu maxilar rígido, e meus olhos cheios de lágrimas.

— Ela me odeia. – falei ao notar o silêncio da minha irmã.

— Eu não acho isso. – Delly discordou. – Bom. Talvez odeie agora, mas não acho que seja algo permanente. O foco do término de vocês não foi exatamente a Johanna. – ela observou. – O foco foi o fato de você ter quebrado a confiança de Katniss, o que está claro que é algo precioso demais pra ela, já que ela não costuma confiar nos outros. – explicou, fazendo-me assentir brevemente. – Então, você precisa reconquistar essa confiança.

— Como posso fazer isso, se Katniss me pediu para deixa-la em paz? – questionei.

Delly alcançou outro sanduiche, e deu uma mordida, enquanto eu pegava meu copo de suco.

— Ela só está magoada, Peeta. – minha irmã disse segundos depois. – Logo passa. E quando passar, ela mesma acabará te dando essa brecha.

Franzi o cenho, e encarei meu copo.

— Você acha que eu tenho chances? – perguntei, voltando a olhar para Delly.

— Na semana do seu aniversário, nós passamos um bom tempo juntas. Posso até dizer que fizemos uma certa amizade, apesar dela não falar muito de si mesma. – minha irmã começou a falar. – Mas ela falava o tempo todo de você, e nem parecia notar que estava fazendo isso.

— Mas vocês estavam planejando minha festa. – a interrompi. – É claro que falariam de mim.

Delly rolou os olhos.

— Ela não falava sobre o seu gosto pela cor laranja, ou pelo tipo de comida que você gostaria na festa. – minha irmã alcançou seu próprio copo, e bebeu um pouco do suco. – Estava mais para os detalhes do dia a dia de vocês. Tipo, que você fazia a melhor panqueca do mundo. Que você cuidava tão bem dela, que as vezes ela sentia que não te merecia. Que você era a melhor pessoa que ela já havia conhecido. – Delly concluiu, e se calou por alguns instantes, colocando seu copo de volta na bandeja, e observou-me derramar algumas lágrimas silenciosas, que eu não fiz questão de secar. – Katniss ama você, Peeta. – minha irmã tocou meu ombro e o apertou. – Então, se ainda existe alguém com chances verdadeiras com ela, esse alguém é você.

Continuei em silêncio, sentindo meu coração bater dolorido.

— Não desista dela. – Delly apertou mais forte meu ombro.

Olhei em sua direção.

— Eu não vou.


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Notas finais do capítulo

https://www.youtube.com/watch?v=-Aww1ZV9Xek&feature=youtu.be

Tenham paciência... A tempestade sempre passa...
Beijos