Samurai NOT escrita por phmmoura


Capítulo 5
Capítulo 5




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— Estou feliz — o samurai disse, fazendo uma reverência com a cabeça para Tadayoshi. — Acreditava que hoje eu teria o trabalho ingrato de supervisionar uns bandidos matando pessoas inocentes e talvez queimar algumas casas. No entanto, graças a você, eu não terei nenhum derramamento de sangue sem sentido. — Apesar de suas palavras, a voz sempre teve um tom amigável e animado. Mas a sede de sangue emanando dele não diminuiu nem um pouco. — Mas acima de tudo, vejo que poderei apreciar uma luta interessante.

Os olhos do samurai não deixaram Tadayoshi, nem mesmo enquanto ele levou o cavalo até uma casa e amarrou as rédeas. Ele é mais cauteloso do que mostra, Tadayoshi notou, sua mão coçando para sacar a katana. Se acalme, ele disse para si mesmo, respirando fundo. Preciso ganhar algum tempo primeiro.

O samurai tirou a capa, dobrou algumas vezes e colocou na cela. Um rapaz, não mais do que alguns anos mais velho Tadayoshi, com cabelos pretos chegando a sua cintura amarrados atrás da cabeça. A hakama, roupas de samurai, azul e preta confirmavam as suspeitas de Tadayoshi. Com o rosto livre de cicatrizes, feições delicadas e barba recém feita, ele quase parecia alguém vindo de um conto de heróis.

Mas ele não é um herói. Apesar da aparência, Tadayoshi conseguia sentir. Ele é mesmo um samurai… e um bem forte. Não era apenas a sede de sangue e o comportamento calmo do inimigo que deixava o espadachim apreensivo. A bainha na cintura do samurai também o deixava preocupado; madeira tingida com vermelho vivo e um dragão dourado pintado. Quando ele sacou a katana, Tadayoshi não conseguiu deixar de fechar os olhos, apertar os lábios e xingar sua sorte de novo.

O silêncio ficou ainda mais evidente; os moradores estavam paralisados demais para fazer qualquer barulho. Até mesmo o espadachim teve problemas para encontrar palavras. A katana do samurai não era apenas diferente das que foram deixadas para trás. Era uma espada de alta qualidade. A lâmina polida refletia a luz do sol, o fio tão afiada que tremulava levemente. Quase como se procurasse uma vítima… espero que não seja eu, Tadayoshi pensou, uma risada vazia ecoando em sua cabeça. Ele encarou a lâmina de novo e engoliu seco. Com minha sorte, é uma espada Muramasa também.

Respirando fundo, Tadayoshi tirou a bainha do buraco de suas roupas. A diferença entre a sua e a do samurai eram gritantes. A do espadachim tinha visto dias melhores; a madeira estava desgastada e lascada em vários pontos, e a cor já tinha desaparecido, enquanto a samurai brilhava vermelho. Mas quando Tadayoshi sacou a katana pela primeira vez em dias, todos podiam perceber. Também era uma espada de alto nível.

— A sua presença confirma minhas suspeitas — Tadayoshi disse, jogando a bainha de lado e circulando o inimigo. O samurai fez o mesmo, sempre mantendo a mesma distância do espadachim. — Seu senhor traiu o superior dele e quer destruir essa vila para abrir caminho para a fortaleza. Estou certo?

Apesar de odiar esse tipo de pessoas, ele tentou manter a voz calma. Não devo irritá-lo. Pelo menos não agora. Preciso conseguir o máximo de tempo que der.

— Deve ser horrível servir um senhor nojento. Não sei como você ainda não cometeu seppuku pra preservar sua honra e essas outras merdas que só os samurais se importam. — As palavras escaparam seus lábios antes que ele pudesse impedi-las. Droga… eu e minha boca grande, Tadayoshi pensou, tentado e falhado em conter seu sorriso.

O rosto do samurai se contorceu de raiva por um instante. Ele fechou os olhos, pressionou os lábios e respirou fundo.

— As palavras de um mero ronin não me afetarão. Mas eu aconselho a você não ousar falar mal do meu senhor.

Tadayoshi estalou a língua. Ele não respondeu a minha provocação… Ou é tão sereno quanto parece ou já está acostumado a esse tipo de luta… Vou testar ele um pouco mais.

— Um ronin? — ele repetiu a palavra da forma mais irritante que conseguia. — Não me lembro de ter sido cachorro de alguém pra ser chamado de ronin.

Mesmo o samurai conseguindo manter o rosto sem expressão, o deboche foi demais para ele. Ele saltou para frente e cobriu a distância entre eles num piscar de olhos, mirando sua espada no pescoço de Tadayoshi.

Rápido! Mesmo esperando, a velocidade do samurai o surpreendeu, mas o espadachim ainda assim reagiu a tempo. Tadayoshi levantou a espada e bloqueou o golpe, o metal rangendo. Sem dar tempo para seu oponente contra atacar, ele girou a perna esquerda, mirando o chute nas costelas do samurai. Por um momento ele sentiu seu pé conectando, mas antes que atingisse em cheio, o inimigo saltou para o lado oposto, diminuindo o impacto. Merda

— Você realmente tem alguma habilidade para acompanhar essa sua boca — o samurai disse, sorrindo. — Por favor, me mostre até aonde ela vai.

Ele resumiu seus ataques, cada um potente, preciso e mirado nos pontos vitais de Tadayoshi. Mas diferente do bandido do outro dia, o samurai não deixava aberturas para contra-ataques. Diagonal esquerda. Lateral direita. Uma estocada no rosto. Corte vertical.

Tadayoshi defendeu todos, mas isso teve seu custo.

— Então minha sorte é podre mesmo. — Tadayoshi falou, defendendo um ataque mirado na sua cabeça, quase sem ar. Ele saltou para trás para conseguir distância e tempo para descansar. — Você é forte demais. Não pensei que acharia alguém como você por aqui. Se eu soubesse, teria ido na outra direção. — Ele continuou falando para conseguir mais tempo.

Pela primeira vez o samurai não o seguiu, nem preparou qualquer ataque. Pelo contrário, ele embainhou sua katana.

— Posso dizer o mesmo. Você é mesmo um adversário digno, então não me envergonharei por mais tempo e me apresentarei apropriadamente. O nome pelo qual atendo é Konkawa Jirou Yoshitada.

Tadayoshi estalou a língua de novo. Ele está me dando seu nome completo…

— Obrigado pela cortesia — ele disse numa voz seca. O espadachim preparou sua postura e respirou fundo. — Eu sou só Tadayoshi.

— Será um prazer lutar contra você, Tadayoshi-dono. — Konkawa fez uma reverência.

Não quer dizer me matar? O espadachim pensou, se preparando.

No momento em que terminou a reverência e levantou a cabeça, o espadachim correu. Mesmo com sua katana ainda embainhada, ele estava rápido do que antes. Quando a distância entres desapareceu, Konkawa sacou a espada, visando o lado direito de Tadayoshi.

Iai? Merda! Não vai dar tempo! Tadayoshi levantou sua espada numa posição de defesa e pulou para o lado oposto, tentando evitar o ataque. Mas o golpe era potente demais, veloz demais e ele reagiu instantes tarde demais. Apesar de conseguir defender, o espadachim não pode parar o golpe completamente, e a lâmina alcançou seu corpo. O ferimento não era profundo, mas sangrava.

Rangendo os dentes e ignorando a dor, Tadayoshi levantou sua defesa de novo, preparado para o próximo ataque… mas não teve nada. O samurai tinha parado de atacar. Tudo que Konkawa fazia era encarar o espadachim, os olhos arregalados e o rosto perdendo um pouco da cor.

— Essa cicatriz… e o nome…

Tadayoshi seguiu o olhar do samurai, percebendo quase em seguida o que fez seu inimigo parar de atacar. Ele fechou os olhos e lamentou. O golpe não só tinha ferido o espadachim, mas também tinha foi demais para suas roupa; o corte tinha rasgado o lado direito do quimono e exposto seu estômago. Sua mão se mexeu para cobri-la por reflexo, mas era tarde demais. Todos já tinham visto as seis cicatrizes, três na vertical e três na horizontal, cruzando entre si.

Ele quase podia ver a mente do samurai trabalhando. Primeiro, os olhos dele arregalaram quando entendeu. Então raiva preencheu seu rosto. Mas foi por apenas um instante; Konkawa conseguiu supri-la. E então um sorriso cruzou seus lábios. Um sombrio, cheio de desprezo, ódio e intenção assassina.

Ele quase parece um predador encontrando a presa mais deliciosa do mundo, Tadayoshi pensou, um sorriso amargo em seus lábios. Mas ele não tinha tempo para isso; o espadachim sabia o que viria em seguida. Ele limpou o sangue dos dedos nas roupas e colocou a mão de volta no cabo.

— Os Deuses devem estar do meu lado — Konkawa disse, rindo.

Se as palavras eram para ele ou para os céus, Tadayoshi não tinha certeza. Mas apesar da felicidade em sua voz, o samurai nunca mostrou nenhuma abertura em sua defesa. Merda… mesmo desse jeito ele não abaixa a guarda, Tadayoshi pensou, mordendo os lábios.

— Para me presentearem com a chance de recuperar a honra da minha família ao matar você, um homem desprezível e sem qualquer honra o ou lealdade como você sem honra e lealdade. — Qualquer traço de felicidade tinha desaparecido, substituído por um ódio tão grande que o samurai não tentava esconder. — Alguém que matou seu próprio mestre, alguém que matou o grande Yasuhiro-sama!

O silêncio ficou mais pesado. Os moradores não tinham feito nenhum som por um tempo, paralisados assistindo a luta que estava decidindo o futuro deles. Mas depois que o samurai disse aquelas palavras, a atmosfera mudou.

Mesmo sem olhar, Tadayoshi conseguia sentir. Estou arriscando minha vida pra salvá-los e eles me olham com esses olhos, o espadachim pensou quando arriscou olhar para os moradores, a raiva o preenchendo. Algo tinha mudado em seus rostos. Quando a luta começou, eles estavam cheio de terror, mas tinha alguma esperança neles. Esperanças que ele, um completo estranho, poderia e iria salvá-los. Mas agora ela tinha desaparecido, primeiro substituída por confusão e então ódio.

Sempre é assim, Tadayoshi pensou, cheio de arrependimento. No momento em que as pessoas descobrem quem eu sou, e o que eu fiz… Ele fechou os olhos e expirou pelo nariz. Eu deveria deixá-los à sua sorte, o pensamento cruzou sua mente por um instante, e então ele bufou. Pena que não tem chances dele me deixar ir embora, o espadachim sabia e voltou sua atenção para o samurai.

Konkawa colocou a mão no cabo de sua katana e inclinou seu corpo para frente, mas ficou onde estava. Ele está procurando por alguma abertura, Tadayoshi percebeu e certificou-se que suas defesas tinham nenhuma.

Nenhum deles se mexeu, um esperando pelo outro. Merda… não devia ter gastado tanto tempo com os bandidos, Tadayoshi pensou, seus músculos doendo, seus braços pesados e o suor descendo pelo seu rosto e costas. Sua katana nunca pareceu tão pesada, mas mesmo assim, ela não tremia nenhum pouco.

Ele não tinha ideia de quanto tempo tinha passado. Tudo que Tadayoshi sabia era que o inimigo diante de seus olhos tinham mudado. Esse samurai não quer me matar por causa de sua missão, nem por causa da recompensa ou fama. Não é mesmo pela honra. Esse homem realmente me odeia.

Ódio não era desconhecido para Tadayoshi; ele o conhecia desde que era criança. Mas depois que seu mestre o encontrou e o criou, o espadachim tinha esquecido. A última vez que vi olhos como esse foi naquele dia… quando meu mestre… quando eu…

O samurai correu, tão rápido que cobriu a distância entre eles antes que Tadayoshi percebesse. Quando chegou perto o suficiente, Konkawa sacou a espada, mais rápido do que antes. E mais forte!

Mesmo levantando a espada, Tadayoshi não conseguiu defender. A katana o alcançou de novo, mais profundo dessa vez. Mas o samurai não atacou de novo. Ao invés disso, ele passou pelo espadachim e continuou avançando. Ele embainhou a espada, parou e virou, correndo de novo e atacando Tadayoshi em seguida.

O espadachim conseguiu defender dessa vez, mas antes que pudesse contra-atacar ou até mesmo pensar em outra coisa, o samurai já tinha desaparecido, apenas para virar e atacar novamente.

Konkawa nunca parava, embainhando a espada e preparando o próximo ataque com uma velocidade incrível. De novo e de novo, cada vez seus ataques um pouco mais rápidos e mais fortes.

Tadayoshi mal conseguia acompanhar e levantar sua defesa a tempo. Em pouco tempo o corpo do espadachim estava coberto de ferimentos. Graças ao seus reflexos, eles eram superficiais, mas eles sangrando tanto que a espada do samurai estava tingida de vermelho. O meu sangue está deixando o saque mais veloz, Tadayoshi percebeu, tentando ignorar a dor. Era impossível; doía apenas respirar.

Antes de iniciar seu próximo ataque, o samurai mais uma vez encarou diretamente nos olhos de Tadayoshi, observando as defesas do espadachim e reagindo de acordo…

E então Tadayoshi finalmente viu seu ponto fraco.

Konkawa atacou e já tinha ido, mas vez Tadayoshi girou e foi atrás dele. Num piscar de olhos, o espadachim estava diante do seu inimigo, a espada mirando a cabeça.

O samurai já tinha parado e preparado seu próximo ataque, mas quando viu Tadayoshi, ele sacou sua espada e defendeu o ataque com facilidade.

Mas o espadachim já esperava por isso. Ele passou pelo samurai e girou, colocando suas costas contra as costas de Konkawa.

Agora, Tadayoshi pensou. Enquanto empurrava o samurai com as costas, ele jogou a espada para mão esquerda e colocou todo seu peso para o mesmo lado quase ao mesmo tempo.

O samurai reagiu um instante depois, virando para o lado oposto.

— Urgh! — o samurai grunhiu e parou. Sangue encharcava suas roupas e pingava no chão. A mão de Konkawa deixou a espada e foi para suas costas, seus dedos fechando ao redor da mão de Tadayoshi e a faca que o espadachim segurava.

— Seus olhos são bons. Bons demais, na verdade — Tadayoshi disse ainda de costas, empurrando a faca mais fundo. Mesmo assim, o samurai não gritou. — Sempre que atacava, você me encarava nos olhos. Eu sabia que você iria ver quando joguei a espada, mas nunca veria essa faquinha — Tadayoshi puxou lâmina.

Konkawa caiu de joelhos, sua mão apertando o ferimento. Mas enquanto tossia sangue, até mesmo ele percebeu que era fatal. O samurai perdeu um pouco de cor, sua respiração ficou mais lenta e seu rosto contorceu com dor, mas ele ainda assim se recusou a cair no chão.

Enquanto limpava a faca com um pedaço de seu quimono arruinado, Tadayoshi andou até estar cara a cara com o homem moribundo.

— O seu senhor é o senhor da fortaleza ao leste daqui? Ele traiu seu suserano?

Jirou tossiu mais sangue, mas a dor deixou seu rosto, e ele encarou Tadayoshi com toda a dignidade que conseguiu juntar.

— Posso ter perdido essa luta e… — sua respiração ficou superficial, — e minha vida está chegando no fim… mas não irei desonrar minha família e me tornar um traidor. — Ele respirou fundo. — Eu vou morrer como meu pai, um samurai! — ele conseguiu gritar, encarando Tadayoshi nos olhos.

O espadachim olhou para o samurai com o rosto vazio.

— Sabia que responderia algo assim — ele disse e guardou a faca dentro das suas roupas. — Mas eu estava curioso. Então pelo menos me responda isso. Qual é o nome da sua katana?

Não era o que o samurai esperava, seus olhos arregalando. Ele entendeu o que Tadayoshi quis dizer e mordeu os lábios. Seu corpo perdeu o resto das forças e Konkawa para trás.

— Por favor me perdoe pai. A espada que você amou será maculada por um traidor — o samurai disse para os céus e então virou para Tadayoshi, chorando. — Se tem alguma decência em você, não desonre Asahi com as suas mãos.

Ele está mais com raiva pela espada do que pela morte, Tadayoshi pensou enquanto encarava o inimigo caído e então o espadachim percebeu.

— Consegue se mexer? — Konkawa levantou o braço esquerdo com dificuldades. — Posso fazer por você – Tadayoshi disse, seus olhos vazios.

O samurai fechou os olhos e balançou a cabeça. Com a mão esquerda, ele sacou o tanto na cintura e colocou acima de seu abdômen. Respirando fundo, ele se esfaqueou, rangendo os dentes para segurar o grito. Mesmo que seu braço tremesse, ele deslizou a pequena lamina devagar, abrindo seu estômago de um lado ao outro, o sangue tingindo as roupas e o chão.

O braço de Konkawa ficou flácido, o tanto escapado pelos seus dedos. Mesmo que seu peito parou de se mover e ele perdeu a pouca cor que restava em seu rosto, o samurai morreu sem largar sua katana.


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