A Escolhida do Destino escrita por Dama dos Mundos


Capítulo 7
Vidas entrelaçadas


Notas iniciais do capítulo

Boa leitura para todos. :3



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Era uma mulher jovem, de pele morena e olhos castanhos avermelhados, os quais pareciam chamas quando estava tomada pela fúria. Não que sua ira fosse particularmente assustadora, afinal Iris era intimidadora até quando estava de bom humor.

Os cabelos castanhos, cortados em camadas e alinhados em um rabo de cavalo, eram incapazes de esconder seu olhar preocupado. Não tivera contato com Crós desde que este partira, e por mais que a comunicação entre-mundos fosse defeituosa, esse fato não a deixava mais calma.

As engrenagens já estavam girando…

Peças começavam a mover-se…

Kit Black poderia estar morta ou não, e pensar sobre isso dava-lhe dor de cabeça. Não foram rápidos o bastante para prever os planos de Haradja, e isso poderia mudar tudo. Argumentos envolvendo destino e profecia não eram suficientes para aplacar seu receio. Era tão simples pôr tudo a perder…

Um bip-bip começou a soar, tirando-lhe de sua abstração. Ignorou-o por um tempo, já sabendo quem estava chamando-a, mas a insistência do som irritava-a. Pensou em jogar aquela coisa – um comunicador portátil, que cabia na palma da mão e tinha a aparência de uma caixinha de pó de arroz preta com um dragão vermelho na tampa – na parede mais próxima.

Então lembrou-se que seria uma atitude infantil, e que ficariam enchendo-a por uma eternidade ao destruir um dos aparelhos de comunicação da sede. Expirou profundamente e abriu-o, apertando um botão na parte inferior para que a pequena tela acoplada em cima acende-se. A imagem de uma figura familiar a ela surgiu, e a mulher revirou os olhos. — Iris falando.

— Amável como sempre. — a voz masculina veio em resposta, mas apesar do tom sarcástico habitual, ela podia sentir a tensão atravessar os quilômetros que os separavam. — Já teve notícias de Crós?

— Já lhe disse que não tenho a obrigação de ser amigável com você, senhor. — ela frisou a última palavra com um toque de zombaria, e prosseguiu, um pouco mais branda. Afinal, sabia muito bem que a situação era muito pior para ele do que para si mesma. — Sinto dizer que não consegui manter comunicação. Aaron está trabalhando para resolver isso.

O homem do outro lado pressionou os lábios. Seus olhos pousaram em um ponto qualquer, não em direção a câmera que transmitia a sua imagem. Estava decepcionado, mais com a resposta do que com ela, Iris imaginara. — Eu já lhe disse para não me chamar de “senhor” com esse seu tom prepotente.

Ótimo. Lá estava ele, irritando-a outra vez. Era por isso que ignorava suas ligações, era uma ótima maneira de manter a sanidade. O problema era que não dava para se evitar o Senhor do Palácio de Granito por muito tempo, principalmente quando era ele que delegava a maior parte das missões da Equipe Black.

O normal seria ela responder com mais meia dúzia de xingamentos nem um pouco maduros, mas ele não estava bem. Não ficaria bem até que aquela história toda se resolvesse, até que Kit Black estivesse em segurança contra qualquer ataque de Haraja. Essa foi a única razão que fez com que Iris segura-se sua língua, deixando o silêncio imperar por algum tempo.

Foi o homem que quebrou-o, como era de se esperar. — Vai entrar em contato se tiver notícias, não é?

— Sim. Irei. — respondeu, fechando o comunicador antes que aquele diálogo se estendesse demais. Deixou-se afundar na poltrona macia em que estava sentada, seu rosto nublando-se, enquanto direcionava seu olhar para o teto.

Sentia falta de tempos passados. Quando as coisas eram mais simples, quando não tinha de chamar aquele idiota de senhor, quando a vida de uma jovem inocente não estava em risco. Embora sempre soubesse que as coisas chegariam a esse ponto, era sempre doloroso lembrar.

Tinha de mover-se, havia muito a ser feito.

Saltando para o chão, forçou as suas pernas à levarem-na até Aaron. Queria resolver aquilo o quanto antes, afinal o dia do teste já se avizinhava. Ignorando o peso que habitava suas costas fazia meses, Iris seguiu em direção a mais um dia cansativo.

A mais uma luta praticamente perdida…

 

K

 

Alyson despertou e pareceu-lhe que não havia pregado seus olhos.

Ela apagara assim que conseguira acomodar-se em uma das poltronas para ouvir as explicações de Crós, enquanto Chloe debatia com o piloto a possibilidade de mudarem de rota, em direção à Paris. O cansaço vencera-a no primeiro round, e ela nem fez esforço para lutar contra ele. Infelizmente, sua noite de sono não tivera efeito nenhum. Continuava exausta, dolorida e ainda com perguntas pululando em sua cabeça.

Crós também havia recolhido-se, depois de usar tanta magia precisava de descanso. Ken tirara um cochilo rápido e se oferecera para tomar o lugar do piloto, já que este precisava dormir um pouco. Sasha tagarelava com Chloe sobre vários tópicos diferentes, até o ponto em que as duas estavam cansadas o bastante para decidirem fechar os olhos.

Com isso, a manhã encontrou o jato rumando para a Cidade Luz, enquanto o grupo de jovens se reunia para trocar informações. Em um dado momento, Kensuke trocara novamente com o piloto e agora podiam entrar em assuntos mais importantes… como, por exemplo, a razão de Crós estar ali.

— Eu imagino que Altair não tenha entrado em muitos detalhes. — o feiticeiro começou, os dedos das mãos batendo suavemente sobre suas pernas. — Mas, bom… é presumível que algo assim aconteceria, Kairos enviou-o mais como uma salvaguarda. Da situação geral de Diamond e dos guardiões ele sabe muito pouco.

— Sim, mas qual é a situação toda? — interrompeu Alyson, movendo as orelhas, inquieta. Esperava que alguém pudesse lhe dar respostas úteis.

— Vou resumir e ser o mais objetivo possível. Há alguns anos, mais ou menos na época de seu nascimento, Haradja ascendeu como uma tirana, tomando posse de um território e pondo-se a aliciar vários tipos de criaturas maldosas, trazendo-as para sua causa. Sabemos que sua intenção é usar esse exército para conquistar todo o Reino, embora não tenhamos certeza de qual seria seu objetivo final: destruição ou controle. Ainda assim, todas as batalhas que já travamos contra tais inimigos terminaram em muitas baixas. Ela permanece estagnada no mesmo local, tentando aumentar sua área de influência, mas não é um processo fácil, afinal temos pessoas cuidando diretamente para que tal coisa não ocorra.

“Quando você, Alyson Valoem – ou Kit Black, como é conhecida na nossa terra – nasceu, uma profecia foi proferida. Que apenas pelas suas mãos Haradja cairia. Por essa razão, vários planos a longo prazo foram feitos. Como criança, você certamente não teria força o bastante para vencê-la, então precisava ficar segura pelo menos até quando seus poderes começassem a despertar. Nós aumentamos as defesas e a vigilância, e então criei um encanto como gatilho, algo que pudesse avisar-nos quando sua hora chegasse. Infelizmente, escapava de nosso conhecimento qualquer outra situação que o Destino guardara para você. Sua morte foi prevista, mas acreditávamos que algum de seus poderes despertaria antes dela acontecer, nos dando tempo para salvá-la… infelizmente, isso não aconteceu.”

“Quando chegou a nosso conhecimento que Driguem havia sido enviado para matá-la, já era tarde demais. Parti assim que recebi a informação, ignorando o encantamento. Quando atravessei para este mundo usando um portal, o encantamento se ativou e soube que você havia despertado. Ainda assim, seu sangue tem muitos dons escondidos, então não fazia ideia de qual habilidade teria causado isso. Mantendo a única informação que prevalecia a seu respeito – que estava morando em uma cidadezinha no Brasil – tive que andar praticamente às cegas, até encontrar Chloe.”

“Como já lhes disse, eu sou um feiticeiro. Minha função é escoltá-la até um outro colega meu, que guarda… hum, como vou explicar isso? Um tipo de arma que pode ajudá-la na sua missão? Não é bem isso, mas deixemos para explicar melhor mais tarde. Depois, a levarei para Diamond e a apresentarei aos nossos outros aliados. A ideia é deixar esta dimensão o mais rápido possível, aqui você é muito mais vulnerável do que em Diamond.”

— Uau. — Alyson franziu o cenho, saturada de informações novamente. Ao menos desta vez elas tinham um pouco mais de propósito. — Sobre esse outro cara que estamos indo encontrar… ele é confiável?

— Tanto quanto eu. A decisão mais viável era enviá-lo para buscá-la diretamente, mas as comunicações entre-mundos são complicadas de manter. Além disso, duvido que ele queira retornar à Diamond.

— E… tem uma razão para isso?

Crós assentiu com a cabeça algumas vezes. — Acho que se apegou a esta realidade, embora eu pessoalmente ache-a massante. Também há outras razões pessoais que impedem-no de voltar para casa. De qualquer forma, espero que ele ainda esteja em posse das pedras.

— Pedras… — coçando a cabeça, Sasha olhava para um ponto do teto qualquer. — Pedras tipo… aquela que você usou para prender o monstro?

— É um exemplo bem próximo, na verdade. — o feiticeiro estreitou os olhos, observando Alyson atentamente. — Se eu revelar o que sei, você não vai surtar, vai?

Uma risadinha nervosa escapou da boca dela. — Er, não claro que não… — fez uma pausa. — Eu deveria?

— Talvez seja melhor eu ir por partes.

— Faça isso. — suplicou Kensuke, imaginando que muitas notícias ruins não poderiam fazer bem à amiga. Chloe escutava em silêncio, afinal Crós só lhe revelara o bastante para que provasse ser confiável. Agora que Alyson estava presente, era inevitável ir cada vez mais fundo no assunto.

A garota fez um sinal para que o feiticeiro continuasse, querendo parecer menos nervosa do que estava, e então ele prosseguiu: — Haradja pertence a uma raça rara, criada pelo Deus das Trevas, Ajax. São conhecidos como imortais, e creio que isso baste para terem uma ideia do quão problemática ela é.

— Imortal… tipo imortalidade? Tipo pessoas que não podem morrer?

Ao mesmo tempo que Sasha fazia esse questionamento, Alyson escondia o rosto nas mãos perplexa.

— Basicamente. Se nós a cortamos, ela se reconstituí, se a explodimos, os pedaços voltam a juntar-se. É imune a doenças e incapaz de envelhecer.

— Como eu venço alguém que não pode sequer morrer? — questionou a garota, abrindo as mãos o bastante para que pudesse enxergar por entre as fendas entre os dedos, sem precisar descobrir a face. Não que ela estivesse contando com a ideia de matar alguém, não sabia se era capaz de algo assim. Mas lutar contra uma mulher maligna que não pode ser morta? Aquilo já era demais!

Crós parecia prestes a revelar mais coisas, mas percebendo o estado emocional dela, preferiu calar-se e voltar ao assunto inicial. — Para isso servem as pedras. Os primeiros imortais que foram criados estavam vinculados a pedras que surgiam junto a eles. Estas pedras são uma forma de mantê-los sob controle, já que servem para selá-los quando for necessário. Seu amadurecimento é completamente aleatório… algumas despertam consciência própria e outra forma física. Outras mantêm-se como simples objetos mágicos. A quantidade delas também não é padronizada, podendo ir de uma a muitas, dependendo do seu dono. Quando todas as pedras de um imortal são reunidas, uma segunda pessoa pode fazer o ritual para aprisioná-lo.

— Se este outro feiticeiro guarda as pedras, por que ele não pode retornar a Diamond apenas para selar Haradja? — interrogou Kensuke.

— Não é tão simples assim. Primeiro, ele não está em posse de todas elas, só de algumas que conseguimos juntar com o decorrer dos anos, até que decidisse trazê-las para este plano e mantê-las em segurança e sigilo. Segundo, é preciso ter certa relação com o imortal em questão para prendê-lo. Terceiro… a profecia é clara. Apenas Alyson poderá fazer isso.

— Eu já tive a minha cota de debates sobre profecia e destino nas últimas horas. — Chloe endireitou-se no banco, apoiando uma mão no ombro da amiga. — Ly… não precisa chegar a esse ponto. Eu sei como você é, praticamente incapaz de machucar uma mosca..

— Então eu vou ter de aprender a brigar. — Alyson encarou-a com determinação, ainda que com certa docilidade. As orelhas de gato empinaram-se, ficando bem altas. — Eu sei o caminho que escolhi, Chloe. Vou ficar bem.

Ela não parecia crer muito nessa afirmação, mas fechou os olhos, cruzando as longas pernas. — Faça como quiser. Mas vou apoiá-la, mesmo achando isso uma imprudência total.

— Mas, Chloe… você pode acabar envolvida e se ferir!

— Eu sou a prudente aqui, sempre tenho uma carta ou duas na manga. — encostou um dos cotovelos nos braços de seu banco e apoiou a bochecha na mão. — A propósito… você tem algumas explicações a dar também, senhor Kensuke Himura.

— Eu…? — ele fez-se de desentendido, o que não era muito fácil quando todos os olhares estavam sobre ele.

— Imagino que saiba bem do que estou falando. — a moça de cabelos cacheados reabriu os olhos, encarando-o. Ser encarado por uma pessoa geniosa como ela também não era muito tranquilizante.

— Acho que Alyson não exagerou quando disse que você era perspicaz.

Um sorriso breve cobriu seus lábios. — Então sabe que não será capaz de contornar isso por muito tempo. Diga-nos, caríssimo Ken, qual é sua relação com Driguem?

Alyson estremeceu ao ouvir o nome do assassino… do rapaz que a matara. Seus olhos correram em direção a Kensuke, mas este não parecia prestes a explodir, como imaginara.

— Está tudo bem, Ly. É algo que tem sua relevância nesse caso, não posso realmente esconder isso por mais tempo.

E então, ele começou a narrar sua própria história.

 

O Clã Himura era antigo e misterioso. Dizia-se que a família inteira era forte e treinada no uso das espadas. Que suas lâminas foram criadas para manter os yokais à distância. Em sua terra natal, acreditavam que eram guardiões, ou até mesmo, caçadores de monstros.

A única filha do homem que liderava-os tinha muito peso sobre os ombros. Por ser uma mulher, precisava provar seu valor o tempo inteiro, preparando-se para tomar o posto do pai quando este morre-se, já que não havia um herdeiro homem. De fato, ela tornou-se a espadachim mais habilidosa e letal de todo o clã, e acabou por chamar a atenção de um rapaz, proveniente da Europa.

Os dois apaixonaram-se perdidamente, e da união deles nasceu um casal de gêmeos. Ambos herdaram a aparência europeia do pai, e mais tarde descobriu-se que as habilidades da mãe também fora passada às crianças. Desde a tenra idade, mostraram-se determinados e inteligentes. Acreditava-se que quando se tornassem adultos, facilmente superariam a mulher que os gerara, a qual já havia assumido o posto de líder.

No entanto, algumas pessoas sempre se beneficiam pelos problemas que yokais causam. Gente poderosa com má índole facilmente tira proveito de todo acontecimento que puder. Os Himura sempre foram uma pedra no sapato para eles, mas imaginavam que, se os atrapalhassem demais, sempre poderiam dar-lhes um fim. Isso não aconteceria, é claro, se as duas crianças que podiam superar o poder de sua progenitora amadurecessem.

Unindo o útil ao agradável, os vis enviaram um mercenário para se infiltrar e matar a todos, acabando com o problema antes que este se complicasse. Driguem, um rapazote prodígio, foi escolhido para a missão. A ele foi dada a tarefa de destruir a família inteira, incluindo as crianças. Fingindo ser uma criança abandonada, o pequeno mercenário convenceu o bondoso marido da líder a levá-lo para casa. E, quando ganhou confiança o bastante dos residentes, colocou seu plano em ação.

Ele não contara com a fúria da líder, no entanto. Apesar de atraiçoada e muito ferida, depois de ver o marido morrer com o resto do clã, a mulher voltou-se para os filhos, determinada a protegê-los, nem que morresse tentando. Sua força de vontade foi tão grande que manteve Driguem ocupado enquanto as crianças fugiam. Quando a hemorragia a venceu, ela suplicou aos yokais, aos mesmos que havia matado com o passar dos anos, para que eles salvassem seus filhos.

E, inacreditavelmente, eles atenderam…

As criaturas sobrenaturais desceram um véu sobre os gêmeos, tornando sua passagem segura. Driguem foi incapaz de encontrá-los ao seguir pistas que levavam a lugar nenhum. E, impossibilitado de retornar aos seus empregadores pela missão não concluída, continuou a perseguição, ignorando o fato de nunca conseguir alcançá-los daquela forma. Ele buscou e buscou, usando a tecnologia mais avançada da época, por vários países, mas as crianças haviam desaparecido. Não havia sinal delas em lugar nenhum, mesmo que o assassino soube-se, intuitivamente, que permaneciam vivos.

Driguem decidiu deixá-los de lado por enquanto, concentrando-se em outros trabalhos. E, enquanto a poeira baixava, os últimos integrantes da família Himura habitavam um Templo antigo, propriedade dos espíritos, um lugar onde humanos comuns não eram capazes de achar.

Até o dia que um homem que não tinha nada de comum os encontrou.

Altair havia acabado de chegar àquela realidade. Antes de rumar para o Brasil e encontrar a pequena filha de Kairos, decidiu por fazer algumas viagens. O Destino levou-o ao Templo, e após conhecer os dois jovens que moravam ali, ofereceu-lhes uma chance de voltar à sociedade. O rapaz seguiu-o, disposto a retomar o treinamento, para que quando Driguem voltasse, pudesse colocá-lo em seu devido lugar.

A moça recusou-se. Não por medo, já que ela tornara-se uma jovem corajosa com o passar dos anos. Mas preferia manter-se onde estava por hora… protegendo as coisas que, deixando de lado o próprio orgulho, decidiram salvá-los.

E então os gêmeos Himura se separaram… e passaram anos sem se encontrarem pessoalmente. E, nesse meio tempo, Kensuke conheceu e se aproximou da garota que, teoricamente, precisava salvar.

 

Ken calou-se. Um silêncio denso pairou no avião por um tempo, enquanto os outros processavam a história toda. Para Chloe e Crós, que não tinham contato com o mesmo, a narrativa tinha sido bastante dramática por si só. Alyson deslizou a mão direita para segurar a dele, num gesto simples de consolo. Só então pareceu reparar como a mão do rapaz era estranha… parecia sutilmente defeituosa, como se em algum momento passado tivesse quebrado. Acontece que, seja lá quem cuidara daquele membro, não havia colocado todos os ossos nos lugares certos para que este curasse. A garota amaldiçoou a mente dispersa que fora incapaz de notar tal coisa antes.

Sasha, para variar, focara sua atenção nas coisas menos relevantes. Suas amigas não sabiam se ela era fútil ou se fazia isso para aliviar a tensão, mas costumava funcionar muito bem. — Então existem kitsunes e todas aquelas outras coisas que gostam de colocar nos animes?

— Hum… sim.

— E você tem uma irmã? Por que nunca nos disse? Como ela é?

Alyson franziu as sobrancelhas, perguntando-se aonde aquela conversa ia chegar, mas observou-o atentamente, afinal também se interessara pela dita irmã gêmea. Uma irmã que ele jamais mencionara antes… ignorou a pontinha de frustração em imaginar que Ken não confiava o bastante nela para que contasse sobre a outra Himura.

— Kira é problema. — ele respondeu, parecendo cansado só de pensar. Com a mão livre, pressionou a área dos olhos. — Não vão querer saber.

— Voltando ao que realmente é importante… — Chloe cortou, tamborilando os dedos no braço de sua poltrona. — Eu entendo que Driguem nunca tenha desistido de completar sua missão, mas em que ponto ele e Haradja se encontraram?

— Impossível saber. — Crós mexeu as orelhas, incomodado com algo. — Haradja não sairia da fortaleza em Soledad.

— Ela não possuí o dom? — questionou Alyson.

— Para viagens dimensionais? Sim, possuí. Mas ela é acomodada, e tem um exército ao seu dispôr. Não é o tipo de Rei que vai para o campo de batalha, a menos que saiba que está prestes a vencer. Provavelmente Driguem chegou a Diamond e à sua presença, embora eu não possa deduzir se ele caiu em um portal sem querer ou se foi enviado por algum outro agente dela neste mundo.

— Espere… você afirmou categoricamente que haviam defesas. — Chloe acusou. — Esse tal agente, Driguem, o Gigante de Fogo… nada disso deveria ter conseguido passar por elas.

— Eu lhe disse, sábia jovenzinha… para que abrisse os olhos. Nenhuma defesa é impenetrável. Nenhum feitiço é cem por cento eficaz. Sempre existe uma fraqueza, nem mesmo que esta seja ínfima, incapaz de ser notada. — o feiticeiro jogou a cabeça para trás, pondo-se a encarar o teto do avião. — O que tiver de ser, será…

— Ei, Salem… logo vamos pousar, Poderia me ensinar como faço para voltar ao normal? — Alyson pediu, mudando novamente o assunto. Se Crós era como ela, poderia guiá-la mais facilmente do que se tentasse sozinha – já havia tentado, de qualquer forma, e não fizera nenhuma diferença. O olhar que ele lançou-lhe em seguida, porém, fez com que desistisse da ideia.

— Hein? Por que eu?

— Bom… você é…

— Meio-gato? Minha cara Alyson, eu nasci deste jeito. Sou um híbrido, não o resultado de uma transformação.

As orelhas dela baixaram instantaneamente, e suspirou, derrotada. — Parece que vou ter de usar sobretudo outra vez…

— O que vai ser lastimável. — comentou Chloe, casualmente. — A temperatura está bem alta.

 

K

 

Ela recebeu a mensagem quando descansava no lago próximo ao templo. Sentada na margem, com os pés imersos na água, não foi difícil para a criaturinha alada encontrá-la. Os olhos verdes, selvagens, arregalaram-se ao notar a intrusa: uma pequenina fada, o corpo feito de puro vento, que caberia facilmente na palma de sua mão e carregava com custo um envelope vermelho com o dobro do seu tamanho.

Não havia elementais assim em sua floresta… provavelmente, fora enviada do ocidente. Havia apenas duas pessoas que se dariam ao trabalho de enviar-lhe uma mensagem do outro lado do oceano. Sua boca curvou-se em um esgar. Kensuke tendia a enviar animais, normalmente aves, não seres sobrenaturais. Significava que aquela fadinha era…

Afastou os cabelos do rosto – madeixas douradas, lisas e macias, tão cumpridas que espalhavam-se pela grama quando estava sentada – e ergueu o dedo para que o serzinho pousasse. Uma voz que lembrava o tilintar de sinos deixou o pequeno corpo para falar-lhe: — Uma mensagem de Mestre Altair. Ele não espera resposta.

— Obrigada. — intimamente, porém, ela estava praguejando… quem aquele cara achava que era para dizer se ela devia responder ou não? Pegando o envelope, fez um sinal dispensando a fada. Esta desvaneceu-se em pleno ar, num instante, como se fosse brisa. A mulher apressou-se em ler o bilhete, rezando para que o irmão não estivesse com problemas.

 

As engrenagens começaram a se mover.

Kensuke partirá com a Campeã em breve.

Se quiser mudar sua escolha e acompanhá-lo desta vez, vá para Wiltshire, Inglaterra. Para o Portal de Stonehenge. Eles devem chegar lá no alvorecer de amanhã.

Corra!

 

Kira Himura encarou o pedaço de papel por vários segundos, seu olhar tão perfurante que, se fosse mágico, poderia ter realmente furado a folha. Pondo-se de pé, encarou um dos espíritos que a salvara, tantos anos atrás: uma raposa de nove caldas, com pelagem branca manchada em padrões vermelhos, deitada placidamente abaixo de uma das árvores que ladeavam a clareira. A criatura pareceu lhe dar um olhar significativo em resposta.

A mulher trincou os dentes, levantando-se num átimo, enquanto agarrava as katanas que sempre trazia consigo. Uma que pertencia a ela, e outra que fora deixada a seus cuidados pelo irmão idiota. — Se aquele babaca super-protetor acha que pode sair desta dimensão sem me avisar, está muito enganado!

Em resposta, o ser apenas inclinou a cabeça.

— Não me olhe assim, eu tenho de ensiná-lo uma lição.

Mais uma inclinação. Kira hesitou por um instante, antes de ajoelhar no chão e abraçar o pescoço da criatura. — Eu vou sentir falta de vocês… entenda, não posso deixá-lo ir sozinho. Não por uma segunda vez.

Um ruído baixo escapou do ser, enquanto este esfregava o focinho no rosto dela. Então, quando pôs-se de pé novamente, a raposa acompanhou seus passos no caminho de volta. Sabendo que Kira Himura partiria em definitivo, horas depois.

 

K

 

— Inacreditável…

— Não é? Também fiquei surpreso quando Dayana fez o convite.

Os dois rapazes estavam debatendo em uma biblioteca, a julgar pela quantidade de prateleiras, repletas de livros. Ambos tinham aproximadamente 22 anos, mas a semelhança acabava ai. O primeiro, Mitaray, era quase como um fantasma pálido: os cabelos eram acinzentados, como se sofresse de envelhecimento precoce, ligeiramente espetados. Os olhos também eram cinzas, cor de tempestade. Ainda assim, sua personalidade era calma e reflexiva, suas orações quase sempre educadas, o coração moldado para a gentileza. Dificilmente aquele homem perdia o controle…

Em contrapartida seu parceiro, Hiei, era um vendaval de animação e intenções. Sua pele era queimada pelo sol, os cabelos curtos eram castanhos com um estranho tom avermelhado. Os olhos castanhos muito claros não escondiam nada, pareciam incapazes de enganar. Adorava implicar com o amigo – embora este normalmente o ignora-se. Era brincalhão, carismático e fiel… e costumava reclamar bastante.

— Ainda assim… — Mitaray continuou, sem tirar os olhos do livro que lia. — Para Iris decidir fazer algo como um teste de admissão para a Equipe Black, que normalmente é tão fechada… algo mais deve estar acontecendo. Além disso, nossas missões costumam coincidir, nós somos praticamente membros honorários…

— Mas o teste será no Caminho da Ilusão! Vai ter luta, e monstros, e um labirinto, e será divertido!

— Duvido que Iris montou essa prova para ser divertida. — ele virou uma página. — E o Caminho da Ilusão é um tanto quanto…

— Acho que vocês deveriam tentar. Não perderiam nada com isso, e a Sede Black tem muitos recursos. Isso pode ajudá-los com seu trabalho normal. — um homem bem mais velho que os outros dois entrou no cômodo, apoiando-se no batente da porta. — E Haradja se tornará um grande problema, posso apostar nisso. Quanto mais unidos estiverem com Iris e os outros, melhor será.

Mitaray finalmente desviou a atenção do livro. Hiei desviou os olhos do amigo para encarar o homem. — Mestre Aragorn… está acontecendo alguma coisa que devíamos saber?

— Creio que não. Mas se o Senhor do Palácio de Granito e Iris estão se movimentando, é porque alguma coisa grande está vindo. E também… já faz quase dezoito anos…

— Desde que a profecia foi dita. — Mitaray completou, pensativo. Fechou o livro que estava lendo e levantou com tranquilidade o corpo… como se não estivessem tendo uma conversa muito tensa no momento. Como se fosse apenas um dia absolutamente normal. — Vamos, Hiei… precisamos pegar um trem.

— Quer dizer que vamos participar? — os olhos do rapaz brilharam de animação, e ele voltou-se ao dito mestre. — E você Senhor? Não quer testar a sorte?

— Estou muito velho para esse tipo de coisa. — Aragorn abanou metodicamente a mão. — Vocês se darão bem sozinhos, sendo quem são.

— Eu discordo, Mestre. Acredito que ainda é capaz de fazer muito. — Mitaray apoiou casualmente a mão no ombro do homem, lançando-lhe um sorriso gentil. Depois, passou por ele, tomando o caminho para seu próprio quarto. — Mas é bom, realmente, ter alguém aqui para cuidar da cidade enquanto estivermos fora.

Hiei e Aragorn se entreolharam por alguns instantes, depois do rapaz sair. O primeiro torceu as mãos, num gesto de nervosismo. — Ei, Mestre… acha mesmo que ela pode estar chegando?

O velho deu de ombros. — Pode ser, pode não ser. Só saberemos quando o momento chegar, não é mesmo?


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Notas finais do capítulo

Yo!
Nesse capítulo temos a apresentação de várias personagens, assim como a história de Kensuke. Todas essas novas figuras que surgiram serão importantes mais para frente, então esperem grandes coisas delas.
Se você está gostando da história, não deixe de acompanhar. Se tiver críticas, sugestões ou dicas, podem mandar pelos comentários, isso me ajuda muito a melhorar.
Kisses para todos, e até a próxima! ♥



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