Lusco Fusco escrita por isa


Capítulo 4
Here Comes Trouble


Notas iniciais do capítulo

Bom, essa é uma fanfic que eu comecei a postar em 2016. A ideia era que fosse uma coisa despretensiosa e o resultado é que cá estou eu, mil anos depois, finalmente pronta para finalizá-la. Eu não sei mesmo se isso vai ser lido, mas estou muito, muito contente mesmo de, depois de postar esse e mais alguns capítulos, finalmente marcar o arquivo como "concluído". :)



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As long as I live, all you need to know is: this old dog ain't about to forget all we've had and all that's next.

 

Eu precisei de três meses, trinta e nove encontros e sete experiências sem roupas com Izzie para tomar a minha primeira decisão estupida.

— Oh, merda, merda, merda. – murmurei enquanto andava pela calçada. Talvez fosse um ataque de pânico, talvez não. Eu estava hiperventilando e puxando o cabelo em todas as direções enquanto me aproximava da casa de Jodie Dawson, o que provavelmente não era a decisão mais inteligente. Eu queria parecer apresentável, mas não tinha certeza se isso era possível, apesar do suéter de caxemira em um tom sóbrio e calças jeans regulares. Eu estava com a inquietante sensação de que algo iria me denunciar e até o fim da noite alguém gritaria “já sei, você é um bruxo!”, e ainda que isso fosse apenas a minha mente culpada trabalhando contra mim, eu não conseguia me tranquilizar o suficiente.

Sair correndo, no entanto, não era uma opção – por mais que eu desejasse isso.

Respirei fundo e contemplei a fachada da casa geminada. Eu já havia parado ali na frente antes, mas nunca com a intenção de entrar e jamais com o intuito de conhecer a avó da minha namorada (por mais que eu agradecesse a sua existência, uma vez que era o motivo da estadia de Isobel no mesmo espaço geográfico em que eu vivia).

— Albus! – uma senhora de cabelo curto me recebeu, antes mesmo que eu pudesse bater a porta ou me identificar.

— O... Oi. – respondi, resistindo a vontade de dizer “me desculpe, a senhora cometeu um engano”.

— Entre querido, entre. – ela me puxou para dentro e, para alguém com braços tão finos, me surpreendi com a sua força. Vovó com certeza gostaria dela. Por algum motivo, isso apenas piorava minha dor de estomago.

— Obrigado, sra. Dawson. – eu pigarreei e tentei não olhar para todos os lados na tentativa desesperada de avistar Isobel. Mesmo assim ela pareceu adivinhar meus pensamentos:

— Izzie estará aqui embaixo já, já. – me informou. – Olivia telefonou a pouco, então ela se atrasou para o banho.

Eu assenti com a cabeça, tentando refletir em que estado isso deixaria Isobel. Sempre que ela falava com a irmã, as emoções eram conflitantes e podiam variar com a intensidade do que ela costumava chamar de “força latina” em ironia. Apesar disso, ela a adorava, dava para perceber, com todo o instinto que uma irmã mais velha pode ter. Talvez James devesse tomar algumas notas com ela.

— Enquanto isso, me acompanhe até a cozinha, sim? – sua avó segurou a minha mão e me mostrou o caminho. Jodie Dawson tinha uma casinha aconchegante, que variava entre tons de amarelo e marrom, o que me remetia imediatamente a sala comunal da lufa lufa, especialmente pelas plantas espalhadas pela casa. Em um momento de distração, eu quase me vi mencionando isso, mas parei a tempo, sabendo que seria não apenas uma referência perdida quanto esquisita. Ela me apontou uma cadeira de ferro artesanal e eu me sentei, pensando que mamãe acharia aquilo adorável se pudesse ver.

— Você está bem, meu filho? – a sra. Dawson perguntou e eu enxuguei o suor da testa com as costas da mão antes de assentir.

— Um pouco nervoso. – admiti e ela abriu um sorriso gentil.

— Oh, querido, não precisa disso. – “exceto se você estiver escondendo alguma coisa importante que deveríamos saber” eu a imaginei completando e isso me fez ficar zonzo. – Você aceita um pouco de chá?

— Sim, por favor. – eu agradeci, pensando que seria bom limpar a garganta. Para a minha felicidade, isso aconteceu no mesmo instante em que escutei passos apressados na escada. Uma piscada de olho depois e ali estava o alivio e o motivo (paradoxal, eu sei) de todas as minhas aflições.

Izzie sorriu e se sentou ao meu lado.

— Você está consciente de que esta é apenas a minha avó e não um fantasma ou algo de difícil assimilação assim, correto?

— Me desculpem. – eu pedi. Eu queria poder esclarecer que estava perfeitamente familiarizado com fantasmas de modo que eles não me davam medo de modo algum, diferente de conhecer a única representante da família de Isobel. – Sra. Dawson é um prazer te conhecer. Por favor, não se deixe enganar pela minha falta de tato.

Ela me abriu outro sorriso gentil e eu pensei que se eu não morresse de culpa ali mesmo, nada mais poderia me matar.

— Ele é adorável, Isobel.

— Eu sei, vovó. – Izzie respondeu, genuinamente feliz, do mesmo modo que havia ficado quando eu me ofereci para essa visita em um momento de clara desordem mental. Mas, assim, como naquela vez, vê-la assim, toda solar, recompensava.

Eu mal podia acreditar na minha sorte, num geral. Quando nós atravessamos o primeiro mês e ela continuou saindo comigo, eu me senti aliviado. Embora improvável, aquele era um cenário possível. Mas depois do segundo mês, tudo tinha apenas um aspecto miraculoso e eu estava aproveitando todos os minutos antes daquilo tomar o rumo natural das coisas para mim, isto é, um fim complicado e possivelmente doloroso causado direta ou indiretamente por conta da minha inaptidão para a vida.

Mas não ali, não naquele dia. Izzie me ajudou a jogar conversa fora como um ser humano comum e depois eu fui convidado a passar a noite. Não era estranho, nós dois éramos jovens adultos, mas eu sabia que me meteria em encrenca séria com mamãe, uma vez que eu ainda morava com Gina e Harry. Havia alguns aparelhos celulares perdidos por lá, eu sabia, então digitei uma mensagem, mais para parecer uma pessoa regular para Izzie do que por acreditar que alguém em casa em algum momento pensaria em checar aparelhos trouxas. Eu estava impossibilitado de mandar uma coruja ou me valer de qualquer recurso mágico e sabia que teria problemas. Ainda assim, bom, valia a pena.

O quarto de Isobel tinha um tom sem graça de bege que eu sabia que ela não havia escolhido, a julgar pelo pouco tempo que estava ali. Apesar disso, havia detalhes que evocavam a sua personalidade, como as bandeirinhas coloridas que pendiam do teto, a pilha de livros disposta nas três prateleiras de vidro, textos em português colados na mesinha de computador e pôsteres de doctor who, da escritora chilena Isabel Allende e de um desenho brasileiro chamado irmão de alguém (Joe? Joel? James? Eu nunca conseguia me recordar).

Nós assistimos episódios de Doctor Who – porque, admito, eu sou um cara influenciável. Ela só precisou de uma semana para me convencer e agora eu sou um fã tentando escapar de spoilers. A ideia era que a gente assistisse uns cinco ou seis episódios antes de cair no sono, mas em algum momento eu percebi que embora eu respeitasse e gostasse muito do programa, eu podia aproveitar melhor o meu tempo e espaço fazendo minhas mãos viajarem por territórios felizmente já conhecidos do corpo da minha namorada. Além do mais, havia um pequeno bônus egóico em conseguir que Isobel desgrudasse os olhos de David Tennant para se concentrar em mim.

*

No dia seguinte eu aparatei bem cedo na cozinha da minha casa, julgando ser o lugar mais seguro para evitar a ira de mamãe (uma vez que ela fugia da cozinha como dementadores fogem de patronos), mas acho que ela sabia que essa seria minha jogada, porque estava de pé em frente a mesa de jantar, com os braços cruzados.

— Albus-Severus-Potter. – ela disse espaçadamente e com um aceno rápido de varinha, fez com que uma cadeira viesse em minha direção. Eu tropecei e me sentei, como ela queria. – Onde você estava?

— Na casa de Isobel, mamãe, eu já te disse. – Lily que respondeu por mim, esvoaçando pela cozinha como se flutuasse. Seu estado de humor sereno me irritou e eu precisei fazer força para não fazer nada que pudesse agravar o estado de fúria de mamãe.

— Lily, eu estou falando com o seu irmão.

— Mas ela está certa. – eu suspirei. – E eu sinto muito não ter avisado. – decidi emendar com o meu tom mais humilde para aumentar minhas chances de ser perdoado.

— Por que você não nos avisou? – ela inquiriu, ainda impassível, mas com um tom um pouco mais condescendente.

— Porque ele deixou a varinha propositalmente em casa para que a namorada dele não se assustasse com o fato de que ele é um bruxo e coisa e tal. – A voz de Lily novamente irrompeu ali por perto, embora ela fosse esperta o suficiente para não aparecer no cômodo.

— Lily, eu já... – minha mãe começou a dizer, mas então parou no meio da frase, processando a informação. – Isso é verdade, filho?

— Não. – eu disse de imediato, mas mediante o olhar clínico de mamãe havia poucas escapatórias. – Sim. – suspirei, me sentindo patético. – Não é que eu me envergonhe nem nada assim, eu apenas não pensei em como contar ainda. Parece muito cedo e ao mesmo tempo, muito tarde.

— Ah meu amor... – minha mãe passou as mãos pelo meu cabelo, em parte para prestar solidariedade, em parte porque ela nunca desistiria de tentar penteá-lo. – Isso pode te gerar problemas.

E assim, quase como se o destino estivesse apenas esperando minha mãe dizer isso, os problemas começaram.


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