Eu ainda posso ouvir o som da sua voz.

É assim que o sonho começa todas as noites. O sonho de amor um amor perdido, frustrado, um amor abandonado.

De repente estamos lá mais uma vez. No parque, rodeados de luzes coloridas e pessoas - que por um breve momento conseguiram esquecer de todos os outros problemas da vida e focar apenas naqueles minutos em que apreciavam com a felicidade mais pura seus filhos se lambuzarem com algodões-doces ou maçãs-do-amor - só eu, você e uma imensidão de rostos aleatórios que nem se fossem juntos em um só poderiam assimilar sua felicidade à que estávamos sentindo naquele momento. O céu girava e as estrelas formavam um redemoinho, no entanto, eram os seus olhos castanhos e simples que prendiam minha atenção, que me faziam esquecer meu medo de altura e todas as outras coisas bobas que me amedrontavam, seus belos olhos castanhos que transbordavam carinho.

Esse foi o início. Foi lindo. Foram as estrelas mais belas do céu.

Agora estamos no topo da colina, onde você me disse pela primeira vez que me amava. O brilho do sol não poderia ser comparado ao que eu senti naquele momento. Você criou em mim uma galáxia inteira de possibilidades. Lá, com o vento gélido do outono correndo através de nós, o cheiro do rio e do campo de girassóis ao nosso redor. Não havia mais ninguém, aquele era o nosso lugar, era àquele local que pertencíamos, só existíamos nós dois, o mundo era nosso, todo o amor era nosso. Poderia ter sido mais perfeito? Mas naquela colina ficou o amor, ele permaneceu lá, entrecortado e enterrado abaixo de um girassol que jamais encarava o sol.

Aí se deu o meio, a metade, a metade de tudo, na metade de nossas vidas nós enterramos as metades dos nossos corações. Mas, infelizmente, juntamos metades que não encaixavam uma na outra.

Porém, o tempo passa, o tempo muda, ele é inconstante e, com você, eu aprendi que as pessoas podem ser tão inconstantes quanto ele.

Então, aqui estamos nós, no meio do quarto com apenas o som da chuva se fazendo ouvir, estávamos tão distantes, divididos, caídos aos pedaços. Você queria seguir outro caminho, meu amor não era o suficiente, você sempre queria mais e eu era uma pessoa rasa demais para alguém dar um mergulho eterno de certezas e convicções.

Esse foi o fim de tudo. O fim do nosso amor, da nossa história.

Nós éramos notas musicais dissonantes, nunca fomos um próton e um elétron, jamais tivemos harmonia, sempre estivemos em dissonância, somos notas musicais que não foram feitas para estarem juntas. E só agora eu noto isso.

Todas as noites eu vejo você sair por aquela porta, levando consigo a metade do meu coração que ainda me pertencia. Todas as noites eu ainda te amo.

Você queria uma certeza e, infelizmente, eu só pude dar esta tarde demais.