Herdeira da Lua escrita por Julipter, Julipter


Capítulo 8
Capítulo Oito – Hauts et bas


Notas iniciais do capítulo

Então, isso é um capítulo adiantado ou atrasado?
Certo, atrasado.
Desculpem mesmo, emu notebook também resolveu não funcionar no fim de semana passado.
Enfim, talvez eu poste o capítulo nove amanhã ou domingo!



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Itália

Itália é o tipo de pessoa que não consegue focar em muitas coisas ao mesmo tempo.

Ela tendia a vivenciar totalmente o presente em cada momentinho da sua vida.

Por exemplo: poucos minutos atrás, estava completamente concentrada em Adrien e na felicidade que sentia em telo por perto.

E agora, mesmo ainda sem entender os motivos para o irmão estar ali, no outro cômodo, ela estava totalmente concentrada na garota em sua frente.

Itália cruzou os braços, pronta para ouvir o que Julia tinha a dizer.

—Então...? – Ela encorajou.

—Desculpa. É que eu não faço muito isso.

—Não pede perdão?

—Não falo da minha irmã.

Itália recebeu um impacto.

O que estava acontecendo?

Fora ela quem disse coisas sem sentido. Fora ela quem disse coisas das quais não sabia nada sobre.

E era Julia quem estava pedindo desculpas.

—Espera. – Itália disse, antes que Julia começasse. – Isso está errado. Eu é que devia pedir desculpas. Nós não somos tão próximas assim, você nunca me deveu satisfações, mas eu me senti no direito de te questionar. Eu fui a errada, desde o começo. E sobre o Leo, você não é obrigada a gostar dele também e...

—Itália. – A dos olhos coloridos respirou fundo.

—Só tô pedindo perdão. – Ela diz, finalmente. Itália se senta na cama, evitando encarar Julia nos olhos.

—Te perdoei no momento em que saiu correndo. Não é nada disso.

Itália arqueou uma única sobrancelha, confusa. Decidiu por não interrompê-la mais.

—Você pediu que eu te fizesse entender. Eu vim te fazer entender. – Julia sentou-se ao lado de Itália, ainda meio afastada. - Você sabe, a... A minha irmã. Quando nós éramos pequenas, meus pais pensavam que ela tinha um tipo de autismo. Ela era retraída e não interagia muito, criava coisas em sua própria cabeça que tinha certeza serem reais. Eles levaram nós duas a um hospital onde disseram que ela tinha a Síndrome de Asperger. Um tipo de autismo. Mas eles estavam errados. – Julia parou por longos segundos e mordeu o lábio, e Itália percebeu que ela estava pensando se devia continuar. – Estudamos em casa por muitos anos. No ensino fundamental, eu convenci os meus pais a nos deixarem ir pra escola. Tudo correu bem no começo, mas quando nós duas estávamos no sétimo ano, ela se esgotou. Não estudávamos na mesma sala, sabe, aquela coisa de parentes estudarem juntos... Bem, nesse dia, me chamaram na sala e disseram que meus pais iam nos levar pra casa. No carro, ela gritava e chorava e tremia, e eu nunca soube o que aconteceu. O que ela havia fantasiado ou sofrido daquela vez. Nós voltamos ao hospital. Desta vez, um psiquiátrico. “Vitória é esquizofrênica”, foi o que o doutor disse. – Itália se aproximou quando pensou que ela ia desabar ali. Encostou a cabeça no ombro da outra. – Ela não pôde mais ir pra descola desde então. Ela estuda em casa, e eu ajudo ás vezes. Raramente ela tem surtos, e o último foi grave. Vitória arrancou os próprios cabelos. – Julia apertou os punhos no colo. – Nós... Sempre que saímos juntas, as pessoas me perguntam se eu não queria que fôssemos gêmeas idênticas. Só pra eu ser como ela. Só pra eu ter cabelos loiros, pele branca e olhos azuis. E eu fico pensando: o que eu menos quero é ser como ela. Eu não faço ideia do que ela passa. É horrível só de imaginar. Ninguém devia passar por isso.

 

(...)

 

Fazer as pazes traz uma sensação de alívio.

Por mais que você saiba que a relação ainda não é a mesma, você também sabe que aquela pessoa voltou a ser constante na sua vida. E é bom ter pessoas constantes na vida. Aquelas que você sabe que sempre estarão lá.

—Bati! – Exclamou Matteo.

Quando as meninas saíram do quarto, eles haviam acabado de jogar uma rodada. Adrian vencera.

E agora, Matteo. Estavam os cinco jogando.

—Tudo bem, campeões, eu preciso trabalhar. Se importam? – Ela diz, apontando para a porta.

—Tá nos expulsando? – Questiona Leo, ofendido.

—Tô. – Itália deu um sorriso fofo. Irresistível. – Adrien, você vai ficar?

—Vou conhecer o seu estabelecimento de trabalho. – Ele sorriu com entusiasmo.

—Eu estou decepcionado, Itália, você é uma péssima melhor amiga. – Leo cruzou os braços, se fazendo de indignado. – Na próxima vez que jogarmos Mário, você vai ser o Luigi.

Ao falar isso, os três já estavam do lado de fora, e Itália empurrava Leo enquanto Julia e Matteo iam na frente.

—Tenham uma boa tarde! – Ela fechou a porta e se virou para o irmão. – Eu sempre gostei mais do Luigi.

Adrien riu.

—E aí, nós vamos de metrô? – Foi a vez de Itália rir.

—Vamos, eu pago a sua passagem.

 

(...)

 

Adrien lidou muito bem com o ônibus. “Você exagera”, ele disse. “É normal”.

Mas ele não ousou tirar o celular do bolso, não foi?

Tudo bem, Itália estava sendo preconceituosa com a cidade. Mas ela julgava a si mesma como precavida.

Ela adentrou o estabelecimento – muito calma neste segundo dia – e seguiu aos fundos, sem indicar nada a Adrien. O irmão apenas se sentou no balcão.

—Certo, então hoje eu vou cortar batatas. – Itália comentou, e percebeu que alguém ali já fazia o seu trabalho. – Amanda!

—Ah, olá. – Ela disse, casualmente. – Acho que você vai ficar com as cebolas.

—Golpe baixo.  – Itália pegou as cebolas.

—Tarde. – Henri entrou na cozinha, tirando o casaco e indo até a salinha mais a fundo, onde ficavam dois pequenos vestiários; era ali que eles largavam suas mochilas. Ele voltou minutos depois com um avental. – Você trouxe o pendrive? – Perguntou, diretamente a Itália.

—De agora em diante, eu comando. – Ela sorriu e entregou o pendrive ao loiro.

Ele voltou à área dos clientes e logo Imagine Dragons começou a soar pelo ambiente.

Henri era ótimo. Ele tinha um bom gosto musical, fazia uma boa faculdade – ele parecia gostar bastante, falava tanto de lá – e sabia carregar bandejas. E era tudo o que Itália sabia. Ela queria saber mais.

Mas Henri era ótimo, de uma forma ou de outra.

—Então... – Amanda voltou a falar, quando Itália estava quase acabando com as cebolas. – Sobre as coisas que me contou. Você disse que o Niara estava te ajudando. Vi que foi embora com ele hoje. Se sente melhor?

—Na verdade... – Itália sorriu, lavando as mãos. – Tudo está muito melhor hoje.

—Eu não acredito! – Henri voltou, exasperado. – Tem outro francês ali no balcão. Itália, você tem que atender ele... E... – Ele olhou-a fixamente até perceber que a menina estava segurando o riso. – Você o conhece, né?

Itália fez que sim com a cabeça.

Henri pegou um pano de prato e jogou nela.

—Você é tão estraga prazeres em níveis tão extremos.

—Não me culpe pelas suas esperanças exageradas! – Ela riu, sendo atingida na barriga. - Venham, eu vou apresentar ele.

Eles a seguiram até o balcão. Adrien balançava a cabeça no ritmo de On Top of The World.

—Adrien, meu irmão. – Ela apontou para ele. – Amanda, professora. – Fez o mesmo com a mulher, que sorriu simpática. – E o Henri... Bem, é o Henri. – Henri olhou-a confuso, mas logo sorriu pra Adrien. – Vai pedir ou não, peso morto?

—Engraçadinha. Eu quero um Machiatto. – Henri riu.

—É claro que quer. – Henri riu e voltou pra cozinha.

—É um prazer te conhecer, Adrien. A Itália se mostrou uma ótima aluna nesse primeiro mês.

—É bom saber. – Ele sorriu para a irmã.

—Bom, eu tenho que voltar pra lá. As pessoas estão começando a chegar, você já pode ficar por aqui. – Amanda instruiu a Itália antes de sair.

—Você tem alguns minutos antes do horário de pico pra me dar umas explicações. – Itália foi direto ao ponto.

Adrien suspirou e procurou alguma coisa no celular. Ele abriu uma conversa o Whatsapp e entregou o celular para ela. O número não havia sido salvo, então não tinha um nome ali. Mas a foto era do Matteo.

A última mensagem da conversa era de Adrien: Eu chego aí mais ou menos na hora do almoço de vocês.

Itália apertou o celular nas mãos.

—Eu não acredito que ele fez isso! Caramba, Adrien, ele não tinha direito nenhum de te arrastar pra cá... – Ela disse, entregando o aparelho de volta para ele. – Eu não queria te dar problemas... Prejuízo... E a faculdade? O Matteo acha que é assim, que ele pode dizer “eu pago a sua passagem” e você é obrigado a vir? Aquele riquinho metido!

—Itália, você não está feliz por eu estar aqui? – Adrien perguntou, aparentemente sem se importar com os questionamentos da irmã.

—É claro que estou! Eu só acho que...

—Ele fez certo, Itália. Eu tinha que ter vindo no primeiro dia, eu tinha que acompanhar a sua adaptação. Foi errado deixar que viesse sozinha. Tranquei a faculdade – Itália lhe lançou um olhar reprovador, e ele tratou de explicar -,  está tudo bem, vai ser só um mês. Você não me causa problema algum, muito menos prejuízo. Você é a pessoa mais importante da minha vida.

Itália sorriu. Não era justo quando ele dizia essas coisas. Quando ele a olhava com aqueles olhos verdes e dengosos. São os irmãos caçulas que costumam ter habilidades assim. Mas Itália perdeu.

—Além disso, ele só estava preocupado com você.

—Você acha? – Ela pergunta, como se quisesse muito acreditar nisso.

—É óbvio, maninha. Se não se preocupasse, por que me pediria pra atravessar um oceano?

O sininho da porta tocara. Henri apareceu com o café de Adrien e um croassaint. Clichê.

—Clientes. – Ele disse atrás de Itália, ao colocar o prato na bancada, contornando-a com um braço. Seu rosto estava próximo ao dela.

Itália respiro fundo.

Garotos são cheirosos.

—Clientes. – Ela repetiu, como que para afirmar, e se dirigiu a uma das mesas que agora estava ocupada.

(...)

 

—O que vamos jantar? – Adrien perguntou no ônibus (o qual eles milagrosamente conseguiram dois lugares, um ao lado do outro, mas então Itália avistou uma mulher carregando um bebê e a deixou sentar-se em seu lugar na janela).

—Você acabou de comer um croissaint. – Adrien arqueou as sobrancelhas para ela.

—Não está se alimentando direito. – Não parecia uma pergunta. Italia abaixou a cabeça.

—O que te faz pensar isso?

—O fato de você achar que um pedaço de massa numa tarde inteira conta como refeição. O que você tem comido aqui?

—Sopa, sabe, todo tipo de sopa. Sopa é saudável. Sopa de carne, de batata, de tomate... – Ela forçou um sorriso.

—Nos horários certos?

—Eu... – A garota engoliu em seco e tentou deixar o assunto nos eixos. – Posso fazer sopa hoje. Você sempre gostou da minha sopa.

—Certo. Mas vamos fazer compras amanhã.

—Eu não tenho dinheiro.

—Consegui um bom emprego. Um estágio, numa gráfica de história em quadrinhos. Vou te mandar um pouco todo mês.

—Tudo bem.

—E você vai se alimentar direito.

—Tudo bem.

—Não quero fazer cócegas em você e sentir suas costelas. – Itália riu e apertou o nariz dele.

—Tudo bem! – Ela olhou pela janela. Ia começar a chover.

E o verão disse: pois é, agora é a famosa hora de parar.

—É o nosso ponto.

 

(...)

 

Adrien está tomando banho.

E eu me dei conta de que só escrevo aqui quando to me sentindo mal. Isso não é justo.

Eu vou acabar voltando pra França, e daqui alguns anos, vou acabar lendo tudo isso aqui. O Arquivo Brasil. Não quero ter só lembranças ruins.

Então eu estou dizendo que tudo está melhor. Depois da tempestade, vem a calmaria. É esse o ditado? Ou é ao contrário? Bem, não importa. Deu pra entender.

Tudo está melhor porque Adrien está aqui, e mesmo sabendo que ele não vai ficar pra sempre, isso torna tudo mais fácil. Está melhor porque eu entendo meus amigos melhor agora. Eu sei que não posso somente contar com eles. Eles tem que contar comigo também. Sempre. E está melhor porque Matteo (apesar de irritante), me faz bem e me ajuda, do jeito dele. Afinal, eu ainda estaria perdida se Adrien não estivesse aqui, e Adrien não estaria aqui se não fosse por ele. Eu não o entendo ainda, mas sei que ele me faz bem. E eu jamais afastaria alguém que me faz bem.

Estou começando a me acostumar com tudo.

E não é como se Marjorie pudesse ser substituída, mas eu gosto da Amanda.”

 

Itália deixou o computador e foi em direção á cozinha, começar sua revolução culinária.

Ela estava trabalhando num café agora. Cortando coisas. Fritando coisas. Servindo coisas. Como não aprendera a cozinhar mais nada?

Ela sentiu algo frio em seu pescoço, o que a fez se arrepiar. Uma corrente.

Olhou para o próprio dorso e ali estava: seu colar. O dourado. Em formato de bota. Com os escritos Itália.

Se certificou que estava devidamente preso e se virou. Ali estava Adrien, encostado na bancada, sorrindo.

—De todas as coisas, eu não acredito que você se esqueceu de trazer isso.

—Eu deixei na França!? – Ele riu, fazendo que sim com a cabeça. Itália riu também, mas então Adrien ficou sério de repente.

—Precisamos conversar.

—Eu também acho. – Os dois se sentaram à bancada. – Você vai focar só um mês mesmo? Digo, eu sei que vai precisar voltar uma hora, mas eu estava pensando...

—Itália. – Adrien interrompeu. – Eu encontrei a sua mãe.


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