MELLORY — entre Deuses e Reis escrita por Lunally, Artanis


Capítulo 35
Mercado do Basilio


Notas iniciais do capítulo



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O sol mal começava a despontar no céu e as batidas surdas na porta principal do chalé foram ouvidas no interior da casa. Como Kalifas e Dalila saíram para fazer as compras rotineiras da semana, Miguel fora obrigado a descer o inacabável lance de escadas do amplo sobrado. Will esperava, encostado ao parapeito da mureta da varanda externa, mais impaciente do que o usual.

— Você nunca se atrasa, não é mesmo? – O Alfa fez uma pergunta recíproca, olhando, involuntariamente, para seu relógio. A manhã mal se iniciara.

— Não seria de meu feito, nem de seu agrado, eu imagino. – O beta respondeu, entrando na brincadeira. Sempre com sua seriedade sem igual.

— Entre! – Miguel chamou. – Está frio aí fora. – E deu passagem para que o homem alto adentrasse sua residência. Will tirou suas botas antes de pisar no carpete da sala. A primeira neve ocorrera na noite passada, logo após o festival, e por isso, ao caminhar pelas ruas, seus sapatos ficaram encharcados.

Como já frequentava a casa de seu líder a um bom tempo, ele sentou-se à vontade em uma poltrona no canto do cômodo e preparou-se para falar, recebendo toda a atenção devida de Miguel.

— Hoje, enviaremos um quarto de nossos batalhões para Golty, afim de proteger nosso mais novo aliado de uma possível invasão estrangeira, como previamente combinado. – O militar explicou, tentando ser o mais objetivo possível. – Precisamos de seu aval para darmos início às expedições. Você bem sabe. Exigências dos anciões, não minhas. – Will suspirou, entediado.

— Já havia me preparado para esta situação. Deixei os documentos rubricados em meu escritório, vou subir para busca-los, importa-se de esperar aqui? – Miguel questionou, oferecendo uma xícara de café a seu amigo.

— Não mesmo. – O beta consentiu e voltou a se sentar. Esperou, obedientemente, a volta do chefe da FMR, com um pacote repleto de papéis com o brasão real estampado.

— Aqui estão. – Miguel entregou-lhe a papelada. – Faça com que isso chegue, no menor tempo possível, as mãos dos velhos. – O Alfa menor tratava os anciões por esse apelido. Era uma nomenclatura como entre os membros do exército. Na realidade, não davam a mínima para as opiniões dos senhores sábios da cúpula, mas possuíam a obrigação de escutar seus conselhos e desaprovações.

— Claro, Miguel. – Will confirmou o pedido. – As tropas saíram daqui a algumas horas. Espero que não possua problemas para comunicar a seu irmão.

— Irei agora mesmo a casa de Hatori. A cavalo, para ser mais específico. – Estabeleceu o Alfa, deixando a casa juntamente com seu companheiro. Will se despediu com um aceno de mãos e dirigiu-se ao centro da cidade rumo a grande construção de vidro e ferro, para onde deveria levar sua mensagem.

Miguel arriou Pandora rapidamente. Realizava tal tarefa em seu cotidiano e por isso, tratava-se quase de uma ação metódica. Sentiu a aproximação de alguém, esgueirou-se em uma brecha da baia de sua égua para escutar melhor as vozes que estavam por perto.

— Você não irá, Logan! Nem adianta implorar. Serei imparcial a seus apelos. – Miguel conseguiu identificar a sonoridade do bravejo de Serena. A Alfa parecia discutir fervorosamente com o jovem de quinze anos que a acompanhava para mais perto do chalé.

— Isso é muito injusto! Eu venho treinado a tempos! – O garoto argumentava, em revolta.

A Alfa parou de andar. Neste ponto, Miguel já conseguia vê-los. A mulher colocou as mãos sobre os ombros do rapaz e reclinou um pouco a cabeça para encará-lo, firmemente, pronunciou sua sentença:

— Eu não vou te mandar para a morte. Não enquanto ainda for um moleque. – Elevou um pouco a voz. – Pretendo, futuramente, organizar uma guarda pessoal em meu nome e preciso que você esteja verdadeiramente preparado para estar a meus serviços. Por mais que eu seja esposa do Alfa, estou fora de minha terra, desprotegida em certas situações e como você não é um cidadão de Draken, posso treinar-te para que me sirva posteriormente. Quando recuperar meu trono, posso oferecer-lhe uma cidadania. Você se tornaria meu beta de honra, assim como Kalifas. – Serena suspirou, preocupada. – Não quero que se machuque, não agora. Ainda não te treinei o suficiente e seria imprudente mandar-te para uma situação tão complexa quanto a defesa de um país ameaçado. Estamos entendidos, Logan? – A mulher perguntou, cruzando os braços. O garoto demorou a responder, parecia discordar ainda de não poder participar da missão. – Estamos? – A Alfa repetiu alto.

— Sim, senhora. – Ele concordou entre dentes. Serena bagunçou os cabelos platinados de Logan e cumprimentou-o com um soco de encontro ao dele. Sorriu e permitiu que ele se retirasse. Após um breve momento de silêncio, a Alfa disse: - Pode sair, Miguel. Consigo ouvir sua respiração.

Miguel levantou-se, batendo em suas pernas para retirar pequenos pedaços de palha que se agarraram a sua calça. Limpando a garganta, indagou, aparentemente curioso:

— Quer dizer que se sente desprotegida?

Serena andou até ele. – E o senhor estava a me espionar? – Arqueou uma sobrancelha.

— Talvez sim. Talvez não. Nunca revelo minhas táticas. – Miguel fugiu da pergunta.

— Então, eu também não deveria revelar as minhas. – A mulher sabia jogar com as palavras. – Sim, estou em território inimigo, quer você concorde ou não. Muitos drakinianos não me consideram um membro da realeza, por isso, minha segurança está ameaça por um lado. Espero que isso não afete o nosso relacionamento.

— Não sou tão infantil assim. – Miguel consentiu. Para ele era justo e bom que Serena contasse com mais pessoas ao seu redor para protegê-la. – Família é família, negócios a parte. – Completou com um ditado popular dos comerciantes.

A Alfa sorriu. Graças aos deuses, seu marido não era ciumento e muito menos, ignorante. Ele a reconhecia como uma rainha e sabia que havia um povo para o qual ele deveria retornar. – Sabe que dia é hoje? – Serena perguntou, misteriosa.

— Vejamos. – Miguel fingiu pensar. Coçou o queixo, como se realmente não se lembrasse de nada. Terminado os instantes de dúvida, respondeu. – Faz exatos noventa dias que me tornei o homem mais feliz do mundo. – Sorriu vitorioso. Aproximou-se da Alfa. Retirou os cabelos compridos da mulher de sua nuca e colocou, com cuidado em seu pescoço, um colar com um pingente onde dois dragões se completavam. Era o brasão de Draken.

Serena olhou admirada para seu presente. – Por que me deu isso? – Questionou passando os dedos delicadamente sobre as pedras incrustadas.

— Isso. – Miguel apontou para o acessório. – Simboliza que você é oficialmente minha noiva e como tal, deve ser respeitada por todos. Inclusive os drakinianos.

— Pensei que estivéssemos comemorando nosso aniversário de casamento e agora sou uma noiva. Interessante. Será que devo aceitar um pedido tão moderno como este? – A Alfa perguntou a si mesma. Riu com a situação.

— Obviamente que não. Deixe-me fazer algo mais apropriado. – Então, Miguel ajoelhou-se em meio ao celeiro. Pandora relinchou com o movimento inesperado de seu dono. Tomou uma das mãos de Serena e disse, docemente. – Posso ser um Alfa, com todos os meus direitos, poderes e obrigações, mas com você, Serena, sou apenas um maluco apaixonado. Perdidamente louco por seus beijos e por seus abraços. Não posso lhe oferecer o céu, nem prometo uma vida em um mar de rosas. Mas, garanto que terá meu coração. Imortalmente. Porque para sempre é pouco para a infinidade do amor que posso lhe dar. Eu te imploro, minha rainha, que esteja comigo pela eternidade. – Respirou por um instante antes de perguntar. – Deseja se casar comigo, minha senhora?

A Alfa sorriu e puxou o braço do Alfa, fazendo com que ele se levantasse. Miguel ficou confuso por um momento. – Nunca se ajoelhe perante mim, Miguel. Você não é alguém que está abaixo de mim e sim, a pessoa que está ao meu lado. Que segura minha mão com força e não me deixa fugir. É claro que aceito me casar com você, senhor militar. Quantas vezes forem necessárias. Porque você me salvou de mim mesma. Do meu próprio desespero e desamor. Obrigada por existir. – Disse por fim. Uma lágrima singela escorrendo do canto dos seus olhos.

— Esse é o momento que você sorri, querida. – Miguel falou baixinho, enxugando o rosto da Alfa com o polegar. Serena riu. – Prometo fazer-te a mulher mais feliz de todo o universo.

— Você já me faz feliz, Miguel. Muito feliz. – E afagou seus lábios dos do Alfa. – Eu te amo. – Concluiu extasiada.

*

Hatori estava em seu escritório, quando Miguel anunciou sua entrada pelo interfone. Por vias de segurança, o Alfa menor mantinha uma chave mestra para ter acesso a casa de seu irmão, logicamente, para a proteção do mesmo, uma vez que se tratava do líder do reino e qualquer acidente ou atentado que ameaçasse o rei, se tornaria motivo de grande amedrontamento da população. Mas, o militar a utilizava, quando mandava um aviso prévio sobre sua ida a mansão real.

O Alfa maior percebeu a chegada do seu irmão e desceu para vê-lo. A tempos que ambos não brigavam e isso deixava Hatori extremamente contente e satisfeito. Apesar de Miguel supor que seu irmão sempre estivera contra seus ideais, Hatori sempre tentara ouvi-lo e ajuda-lo, mas em certas situações, o caçula revoltava-se devido a sua teimosia incessável.

— Bom dia, irmãozinho! – Miguel brincou esparramando-se no grande sofá da sala.

Hatori sentou-se na outra extremidade, olhava com desaprovação para a comodidade infantil de seu irmão, mas preferiu não o repreender, sempre tentando manter a calma e o autocontrole.

— Pelas minhas suposições, os centuriões partiram hoje, não é? – Perguntou o Alfa maior casualmente, colocando-se a parte da ação dos militares.

— Esse é meu irmão. Sempre precavido. – Miguel observou sorrindo. Estava extremamente alegre por ter seu pedido de casamento aceito mais cedo, porém decidiu não tocar nesse assunto com Hatori, por enquanto. Sabia que seu irmão não veria com muito bons olhos sua união com Serena. – As tropas chegarão a território goltyniano em cerca de quatro dias. Convocamos uma parte da cavalaria para que transportassem alguns mantimentos e armas extras nos lombos dos animais.

— Muito bom. Você e eu partiremos mais tarda, hoje pela noite. Nossa entrada na floresta será menos notada nesse período do dia. – Hatori disse, bebericando um pouco de seu chá.

— É claro. – Miguel confirmou. – Sairemos acompanhados de uma caravana, com cerca de trinta de nossos melhores homens, rumo ao Mercado Basílico. Partiremos pelos portões ocultos da cidade, com acesso exclusivo de tropas reais. É um atalho e nos poupará de enfrentar algumas criaturas indesejadas durante nosso avanço noturno. – Delimitou o Alfa menor. 

— Draken ficará sobre os cuidados de Helias, enquanto estivermos fora. – O Alfa maior esclareceu.

— Eu já imaginava.

— Aconteceu algo? – Hatori perguntou, curioso. – Você está estranhamente sorridente hoje.

— Por hora, lhe deixarei a parte apenas a respeito das questões militares. Quem sabe outro dia, te chamo para tomar um vinho e lhe dou as boas novas? – Miguel manteve-se enigmático.

Hatori suspirou. Seu irmão era repleto de surpresas.

*

Miguel e Hatori estavam já organizados, em partida para o mercado Basílio. Até segunda ordem de Hatori, o responsável por Draken era Helio. E a investigação nos órgãos de poder, principalmente nos anciões continuava.

 A comissão de soldados era guiada pelos alfas, o menor em sua égua: pandora e Hatori em seu corcel: Zeus; ambos tensos e meio perturbados com a situação. O motivo? Guerra? Morte? Conquista? Não exatamente, estava mais associado a mulheres estrangeiras. Ao horizonte se via raios amarelados perdendo a vida, a noite estava nascendo vagarosamente, o inverno se distendia e reinava, pequenos flocos de neve caiam em pouca quantidade e velocidade.

Seguiram um caminho antigo construído para ir especialmente ao mercado Basílio, o mesmo do fatídico dia da morte dos antigos Alfas de Draken. Era inevitável as lembranças e a dor dos jovens, mas era de maior realce a satisfação de vingança, por mais que tinha vários outros motivos para essa invasão, ainda era por satisfação dos alfas. Anos e anos e ele nunca foram autorizados a tomar ao lugar, pelos órgãos de poder de Draken.

O caminho seria longo, mas nada que cansasse os destemidos Drakinianos, qualquer um que os notasse fugiria de medo e pavor por suas presenças. O orgulho se transfigurou em poder; um poder tão genuíno que nada o cessaria.


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Notas finais do capítulo



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