Deixe-me te amar escrita por Nathália Francine


Capítulo 5
Cinco




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Entrei me jogando na cama.

— Você é muito folgado.

Eu ri e observei enquanto ela beijava a cabeça do gato.

— Comportem-se. Eu já volto.

Antes que eu pudesse perguntar, ela já tinha saído. Dez minutos depois, voltou de cara feia, logo atrás dela vinha um homem e negro com cara fechada. Assim que ele olhou a porta começou a rir.

Amy o fuzilou com o olhar.

— Amy, como isso aconteceu?

Ela se sentou nos pés da cama entre meus coturnos.

— Tyler, você pode ajudar ou não?

— Peça com jeitinho.

— Por favor Tyler. Eu não posso ficar sem uma porta!

Ele sorriu novamente:

— Vou pegar as ferramentas.

Assim que ele se foi eu a cutuquei de leve com a ponta do coturno.

— Quem é?

Ela continuava olhando para frente.

— Tyler. É um dos clientes da minha vizinha.

— Clientes?

Ela me olhou por cima do ombro.

— Você não é tão inocente assim.

Tyler voltou e depois de meia hora, a porta já estava funcionando novamente.

— Pronto. Nova em folha!

— Obrigado Tyler.

— Não se preocupe. Não sei bem o que aconteceu, mas espero que caso volte a acontecer, eu esteja aqui pra arrancar a perna do desgraçado.

Amy riu e observou Tyler indo em direção a mesa aonde estava o desenho que ela havia feito de mim.

— Uau! Quem é esse? Seu namorado?

— Você sabe que eu não namoro...

— É eu sei...essa sua mania de se bastar. Mas olha...é um gatinho!

Eu me sentei na cama e Draco veio para perto de mim.

— Está vendo pulguento? Eu sou um gatinho!

Amy me fuzilou com o olhar de um jeito discreto.

— Amy, onde você o viu?

Ela o olhou.

— Em lugar nenhum. É uma criação.

Ele assoviou.

— Você inventou um namorado bonito mesmo...mas acho que se ele existisse vocês não ficariam juntos. Ele parece meio rebelde, e você – ele a olhou com doçura – é como uma flor delicada. Ele provavelmente destruiria seu coração.

Ela riu.

— Que bom que ele não existe então.

Um outro homem entrou e sorriu para Tyler.

Ele usava um pulôver tão branco quanto sua pele, uma calça jeans escura com um sapa tênis. Era o oposto de Tyler, que usava jeans e camiseta velha com um tênis qualquer.

— Amy, você pode parar de roubar meu marido?

— Desculpe Roberto, é que minha porta me deixou na mão.

Tyler se aproximou de Roberto e o puxou para fora lançando um beijo para Amy e dizendo:

— Caso você esteja mentindo, aproveite esse menino. Afinal – ele beijou Roberto – os opostos se atraem.

Amy riu e fechou a porta logo em seguida.

— Muito bem pulguento, saia da cama pois sua dona vai me aproveitar.

E novamente, outro galo causado pelo coturno dela.

— Mais que droga garota! Não era bem assim que ele disse pra você me aproveitar!

Ela foi para traz do biombo rindo.

— Esse é o único modo que eu quero te aproveitar.

Deitei na cama novamente e ela saiu usando uma calça de pijama branca com coelhinhos cor de rosas desenhados e uma camiseta (grande demais para ela) preta com alguns respingos desbotados.

— Uau!

Ela fez uma pose sensual. Como uma modelo seduzindo o fotografo.

— Eu sei.

Nós rimos e ela saltitou para a cozinha.

— Então...vamos ver o que temos para o jantar. Que tal...yaksoba?

— Prefiro uma pizza.

— Você não tem preferencias nessa casa. Draco, que tal yaksoba pro jantar?

— Espera aí, eu não tenho direitos, mas o saco de pulgas tem?

— Ele não tem pulgas e se você continuar me irritando eu vou jogar uma frigideira na sua cabeça!

— Ta bom, ta bom. Já chega os dois chifres que você me deu.

Ouvimos um barulho no andar de cima.

— Começou...

— O que começou?

— A sessão.

Eu ergui a sobrancelha e ela suspirou.

— Cristal, minha vizinha de cima, é uma garota amigável.

— Achei que eles eram gays.

— E são. Mas Roberto gosta, de vez em quando, de ter uma mulher, e Tyler aceitou apenas Cristal.

— Por que?

— Não sei.

Mas eu sabia. Eu vi no momento em que Tyler entrou com Amy.

Ele a amava. Mas era um amor protetor. Terno.

Ele daria a vida para vê-la feliz. Por isso aceitou Cristal: para ficar perto de Amy.

Um gemido feio cotou o ar.

— Tudo bem...vamos ouvir música?

Ela apertou o play de um toca fitas velho e When You Were Young do The Killers abafou todos os outros barulhos.

You sit there in your heartache

(Você se senta lá em sua mágoa)

 

Waiting on some beautiful boy

(Esperando algum menino bonito)

 

To save you from your old ways

(Para te salvar do seu jeito antigo)

 

You play forgiveness

(Você brinca perdoando)

 

Watch it now- here he comes

(Preste atenção agora - aqui vem ele)

 



He doesn't look a thing like Jesus

(Ele não parece nem um pouco com Jesus)

 

But he talks like a gentlemen

(Mas ele fala como um cavalheiro)

 

Like you imagined when you were young

(Do jeito que você imaginou quando você era jovem)

 

 

 

Ela cantava e pulava na cozinha enquanto preparava o jantar. O gato a olhava e saltava atrás de suas pernas como se estivessem dançando. Eu tirei os sapatos e cruzei as penas na cama. Observei ela perdida em seu mundo e a voz do Tyler me veio à cabeça: “- Essa sua mania de se bastar.” Eu observei mais um pouco, Amy não tinha mania de se bastar. Ela apenas não precisava de ninguém. Apenas de seu apartamento minúsculo velho, com suas coisas velhas e o saco de pulgas que dormia em cima de seus cabelos a noite.

— EI! Você ainda está ai?

Ela balançava as mãos.

— Oi.

— Você come?

Ela enfiou um prato em baixo do meu nariz.

— Engulo...

Assim que peguei o prato e ela se sentou ao meu lado na cama, o gato pulou entre nós.

— Saco de pulgas, isso daqui deve estar envenenado. Sua dona esqueceu que eu já estou morto.

— Cala essa maldita boca e come. Draco, desce!

Como eu já disse, não preciso comer, mas eu não diria não para aquele prato todo colorido com um cheiro maravilhoso!

O gosto estava bom e depois que comemos, ela deitou com o prato apoiado na barriga e acabou dormindo.

Eu lavei a louça e coloquei leite para o gato. Peguei ela no colo e coloquei ela no lugar certo. A cobri e deixei Draco se ajeitar no seu lugar de sempre. Brinquei com uma mecha do seu cabelo e esperei até ver o sono dela se aprofundar e então abri a Porta que me levou até minha casa.

Assim que cheguei, conversei com minhas filhas, olhei a sala de flechas cada vez mais cheia e brilhante e quando fui para meu quarto Arly bateu na porta.

— Entre.

— Oi Senhor.

Sentei na cama e abri os braços para que ela me abraçasse.

— Como está?

— Melhor.

— Ótimo...assim que amanhecer, vamos sair.

Ela concordou com a cabeça. Olhei ao redor e vi que elas andaram limpando meu quarto.

— De quem foi a ideia de arrumar meu ninho?

Ela cruzou os braços e me olhou indignada.

— Senhor, isso aqui parecia um chiqueiro!

Eu ri e me deitei.

— Deite aqui pirralha.

Ela se deitou no meu peito e dormiu.

No meio da noite, me levantei, tomei um banho e coloquei uma calça jeans e uma camisa de manga longa preta. Caminhei pelo silencio e fui para o outro lado da casa, o pátio era como um píer de cerâmica branca longo e vazio. Sentei na beirada e olhei o mar se unindo com o céu. As estrelas refletiam nas aguas calmas e a lua parecia uma enorme perola branca.

Deitei no chão frio e fechei os olhos.

“- O que eu estou fazendo? Como tudo isso aconteceu? Amy, Arly...por que tudo isso? Por que agora? Como ela me vê? Quem tanto sabe disso? E Arly...tão diferente de todas. O mesmo dom que eu. Isso não faz sentido! Como ela pode ouvir as Canções? E ela e Caleb? Como isso...os dois. Logo um Ser do Morte! Mas que droga! Por que os filhos mais novos dão sempre mais trabalho? Por que não fiz homens? Por que minhas flechas deram a vida a meninas? Ela vai se machucar. Ah mas que droga! Como um Cupido, um ser do Amor, pode ter tanto drama pra resolver?”

Ouvi um barulho no céu e olhei. Estrelas dançavam no céu escuro como piche. Se mexiam como em um baile seduzindo seus prováveis companheiros, damas encabuladas movimentando-se discretamente, mas de um modo profundo. Uma dança quase irresistível. Quase mortal. O brilho da lua se intensificou e as estrelas maiores a cercaram como cavaleiros protegendo sua rainha.

 Sempre consegui tranquilidade olhando a lua. Mesmo quando ela não estava visível. Quando eu a procurava e ela estava minguante, sua tristeza me alcançava e quando se enchia dominando o céu, as flores brotavam com mais vida e as meninas dançavam com a luz da lua iluminando cada canto da ilha.

Sorri encabulado, me levantei e fiz uma reverencia para o céu.

— Obrigado, minha senhora. Obrigado por ouvir um pobre Ser perdido que não sabe o que fazer com sua filha mais nova recém apaixonada e com uma Material que cozinha muito bem mas tem uma mania de me acertar com sapatos. E que dorme de conchinha com um saco de pulgas.

A lua brilhou novamente e as estrelas maiores que a cercavam, caíram como cadentes espalhando suas caldas em todas as direções.

Fiquei ali sentado até ela ir embora, e o céu ser colorido pelo laranja avermelhado do sol.

Arly se aproximou de mim coçando o olho e bocejando.

— Bom dia papai.

Eu sorri.

— Bom dia minha filha.

Ela ficou ao meu lado com a cabeça encostada no meu braço.

— Por que não dormiu?

— Não preciso dormir. Faço isso de vez em quando apenas.

— Por que eu tenho sono?

— Por que você é uma Ser de um Imaterial. Não sei explicar muito bem...apenas é assim.

Ela me olhou.

— Seres do Amor nascem de uma flecha sua...não é?

Eu acariciei seu cabelo.

— Sim. Passei dias e noites moldando cada flecha de cada uma de vocês.

— Quem moldou a sua?

— Como assim?

— Se você nos fez...quem fez você? Quem fez o Sr. Morte? Ou o Sr. Vida?

— Eu...eu não sei dizer. Um dia eu simplesmente apareci aqui. Eu sabia quem era e o que deveria fazer...é só disso que me lembro.

Ela concordou com a cabeça e olhou para o céu azul sem nuvens e eu fiz a mesma coisa.

O sol me dava coragem e clareava meus pensamentos para decisões difíceis. Eu sabia, mesmo em um dia nublado, que ele estava lá e eu me inspirava nele para cuidar das minhas filhas. Sempre que elas precisassem, eu seria o Sol delas. Mesmo elas não me vendo, mesmo eu não estando ao lado delas...eu queria que elas soubessem que eu sempre iria estar ali por elas. E o que mais me tranquilizava, era que elas sabiam. O meu maior orgulho, minha maior felicidade, era quando uma delas vinha até mim e me pedia ajuda. Meu maior medo era que uma das minhas filhas perdesse a fé em mim. Perdesse a fé no Amor. Eu nunca desfiz nenhuma filha minha e eu rogava ao Sol para que elas tivessem força e coragem de nunca errarem ao ponto de isso acontecer.

Arly se levantou e eu a olhei:

— O senhor é um bom pai.

Eu me levantei e a peguei no colo a abraçando.

— Obrigada meu amor. Agora vamos ver suas irmãs.

Conversei com todas as meninas e abri um Porta para o Cameron Highlands na Malásia.

Assim que passamos de mão dadas, Arly suspirou de um jeito forçado de mais:

— Uau! Esse lugar é lindo!

— Você já veio aqui não é?

Ela se encolheu.

— Sim...uma vez por semana na verdade.

— A trabalho?

— Não exatamente.

Eu ri e ela me olhou.

— Tudo bem, eu vivia na França.

— Por que parou de ir?

— Por causa dela.

Eu fechei a cara ao ver a Sra Naftalina se aproximar com um vestido roxo e o cabelo branco cacheado com tranças.

Ela se aproximou de nós e sorriu pegando uma mexa do cabelo da Arly nos dedos pálidos com as unhas rosa.

— A mais nova do adorado Cupido...

Arly se afastou e se escondeu atrás de mim.

— Inspiração, fique longe da minha filha!

Ela sorriu:

— Ora Cupido, por que você é sempre tão ignorante comigo?

— Por que você vive querendo estragar qualquer coisa minha.

 Ela se aproximou de mim e passou os braços pelo meu pescoço.

 - Eu só quero ficar com você. Assim como você e Ódio ficaram juntos.

A citação daquela época me fez gelar. Eu a empurrei para longe e antes que pudesse falar algo, senti seu perfume frio e doce.


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