Beatriz e Daniel escrita por Olavih


Capítulo 1
O começo


Notas iniciais do capítulo

Esse casal é inspirado no desenho da Pami (facebook: the paperline), espero que gostem e entendam que não é porque somos opostos que não podemos conviver e, quem sabe, nos apaixonar? Boa leitura!



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Se tiver algo que Pedro carrega consigo é carisma. Ele sempre sorri para todos ao seu redor e faz piadas com todas as situações possíveis, nunca se deixando abalar. Era comum para aquela classe do terceiro ano do ensino médio ver o sorriso zombeteiro na primeira aula e aquele bom dia escandaloso que ele dava toda vez que chegava. Naquela terça-feira, no entanto, Pedro chegou um tanto diferente.

— Bom dia. — disse ele, borocoxô. Jogou a mochila de qualquer jeito na cadeira e desabou sobre ela. Beatriz, Pedro, Paula e Arthur, seus amigos mais próximos e que estavam sentados formando uma rodinha ao redor dele, franziram o cenho, todos ao mesmo tempo. Pedro foi o primeiro a perguntar o que tinha de errado com o amigo.

— Cara você está péssimo, o que houve?

— Péssimas estão as coisas lá em casa. Eu não aguento mais minha mãe! Caramba, depois que ela pariu aquelas garotas ela se tornou insuportável. Vocês não tem ideia; é o dia todo: Pedro pegue isso! Pedro faça aquilo! Pedro limpa essas coisas direito, seu inútil. Argh faça você então! — ele grunhiu, assustando a todos. Aquele definitivamente não era o comportamento do Pedro sempre risonho.

— Caramba! Parecem bem ruins mesmo. — comentou Paula.

— E cada vez piora. — Pedro bufou, deitando a cabeça na mesa. Beatriz, a mais próxima dele, passou a mão em seus ombros como consolo.

— Eu sei que é difícil, mas tente ter paciência com ela também. Afinal já ouvi falar que após a gravidez a mulher tem a queda do hormônio da felicidade. É normal, vai! — Triz, como gostava de ser chamada, falou tentando consolá-lo. Ela não estava acostumada a esse tipo de coisa, mas deu seu melhor.

— Seria tão mais fácil se fosse meu pai... — ele resmungou, ainda para baixo.

— Tá aí algo que eu não entendo! Por que a mulher ganha meses para se recuperar do pós-parto enquanto o homem tem que trabalhar? Eles não falam tanto de igualdade? Cadê os direitos iguais nessas horas? — pronunciou Daniel, com seu típico tom arrogante. Triz revirou os olhos.

— Não sei Daniel. Que tal você carregar um filho nove meses na barriga e depois amamenta-lo por mais seis meses? Assim você pode me dizer quanto tempo cada um merece de licença maternidade!

— Parabéns, Triz, tome aqui seu troféu de mãe solteira. — apesar de suas palavras duras, Daniel aparentava não saber onde colocar sua face de tanta vergonha. — Se liga se não fossem por nós, homens, colocar a sementinha aí nem criança não ia ter.

— Está querendo dizer que a gente tem que agradecer vocês por terem nos engravidado? — perguntou Triz um tanto alterada.

— Alerta furacão. — anunciou Paula levando um sorriso de Pedro.

— Estou querendo dizer que este filho é mais nosso que de vocês, mulheres. Quer dizer, vamos imaginar a gravidez como uma máquina de refrigerante. Nós somos o fornecedor, vocês a máquina. Ou seja, só a portadora. Temos mais direito que vocês.

O silêncio que se instaurou foi um tanto constrangedor. Ninguém conseguia se pronunciar, pois todos estavam concentrados na face indignada de Beatriz. Ela estava tão revoltada que mal respirava. Todo aquele discurso machista havia feito sua aparência ficar mais esverdeada como se ela estivesse subitamente enjoada do amigo. Então, ela soltou uma risada sem humor.

— É nessas horas que eu sou a favor dos métodos anticonceptivos. Você acha mesmo que podemos comparar uma gravidez a uma máquina de refrigerante? Porque se esse for o caso, o médico é o dono do bebê e não nós. Além disso, numa gravidez sem o gene dos dois não há como formar um ser humano, com ou sem portador...

Uma longa discussão se sucedeu, não parando nem quando o sinal tocou. Segundos depois o professor de filosofia apareceu. Ele tinha cabelos e barba enormes, um sorriso sinistro e uma voz arrastada que fazia todos caírem no sono instantaneamente. Ele sempre chegava coçando os olhos, com uma preguiça extraordinária. Entretanto, como aquele dia estava recheado de surpresas, o professor ficou subitamente alarmado com a discussão calorosa de seus alunos que pareciam quase se atacar.

— Ei, o que está acontecendo aqui? — ele perguntou, franzindo o cenho e metendo-se entre eles.

— Esse porco machista acha que numa gravidez o homem é mais dono do filho que a mulher.

— E ela é só uma feminista mal amada que deveria arrumar um namorado ao invés de ficar fazendo protestos inúteis.

Quando pareceu que eles estavam prestes a começar uma nova discussão, o professor gritou novamente.

— Já chega! Parem os dois ou sairão da minha sala imediatamente. — à contra gosto ambos se calaram. — ótimo. Eu sei que nunca fazemos nada assim, mas hoje na aula teremos uma surpresa: um debate! E adivinhem o tema? Machismo contra feminismo. Vamos fazer assim: esse lado da sala é feminista e este outro é machista. Vamos, se mexam e escolham o seu lado. — então, juntando as mãos e sorrindo maleficamente o professor soltou um bordão: — que os jogos comecem!

***

— Você fez o que? — perguntou Lavínia, melhor amiga de Triz. Sentadas na praça de alimentação de um shopping qualquer, as duas amigas desfrutavam de um delicioso Milk shake enquanto Triz contava-lhe as aventuras da semana.

— Eu mandei ele se reproduzir consigo mesmo. Qual é, o cara é um babaca completo. Acha que pode falar qualquer merda e ainda vai ter garota atrás dele. Ele merece saber que não é bem assim. — Triz bebericou seu Milk Shake, subitamente revoltada. Parecia que era só tocar no nome desse garoto e sua pressão já subia.

—Triz não seja tão exagerada. Quer dizer, eu sei que ele foi um completo ridículo nesse quesito, mas você mesma vive dizendo que ele é determinado e tem um bom papo.

— Bom todas essas “qualidades” foram por água abaixo quatro dias atrás. E o pior nem foi à discussão em si, eu até adorei. — ela sorriu zombeteira. — o pior é que eu estou de castigo por ter sido expulsa da aula do professor.

— Caramba, nem acredito. — riu Lavínia. — Triz, a sempre certa, expulsa por discussão e linguagem inadequada!

— Você falando assim até parece que eu não falo palavrão nunca. — Triz resmungou, afundando na cadeira.

— Não nesse nível e definitivamente não na frente de todos. Ah como eu queria ter sido uma mosquinha para ter visto toda aquela cena. — Vinia bebeu sua bebida com um sorriso travesso no rosto. Triz acabou espelhando-o. Elas continuaram conversando sobre coisas aleatórias até que uma voz bastante conhecida por Triz falou atrás dela.

— Ora, ora... Eu sempre suspeitei da sua sexualidade, Triz, mas nunca do seu bom gosto. Essa é sua namorada? — Daniel apareceu no campo de visão da amiga quando ela se virou. Ele não estava sozinho: Arthur, Pedro, Milena, Paula e José estavam junto deles e todos retorceram o rosto com suas palavras. Daniel sabia ser bastante chato quando tentava.

— Ao contrário de você, Daniel, que não pode ver algo que já vai encostando a boca, eu sou bastante seletiva. E meus alvos geralmente são homens. Com... Você sabe... Cérebro. — ela frisou bem a última palavra olhando-o de cima a baixo.

Como já dissera para Vinia antes, ela achava Daniel bonito. Não tão bonito quanto Pedro, mas ele tinha seu charme. Olhos verdes, cabelos pretos e grossos arrumados num corte com topete. Ele tinha uma barba de canto que acompanhava todo seu rosto e formava um cavanhaque ao redor de sua boca. Ele era do tamanho de Triz, o que a fazia tirar sarro dele às vezes. E tinha um sorriso simples e encantador, mas que ia pelo ralo graças a sua arrogância.

— Nesse caso — ele virou-se para Vinia que sorriu como uma menininha de treze anos ao conversar com o garoto mais bonito do colégio. — Sou Daniel Marques. E queria pedir para não ouvir o que a Triz fala, sabe? Ela e eu não estamos no nosso melhor momento.

— Como se algum dia já estivéssemos. — a morena resmungou. Brigas como aquela ocorrida em sala de aula sempre aconteciam entre os dois. Por pensarem tão diferentes e não terem travas nas bocas eles viviam debatendo um com o outro; entretanto, nenhuma vez teve tamanha proporção ou público.

— Prazer, sou Lavínia. E é difícil não escutar. Sou sua melhor amiga, sabe? — ela sorriu tímida. Triz segurou a vontade de bater nela. Eles trocaram um aperto de mão recheado com uma troca de olhares bastante sedutora. Triz pigarreou para cortar o clima.

— Por Deus, Vinia, parece que já se esqueceu de tudo que eu falei sobre ele.

— Ah, então andaram falando de mim? Interessante. Quem sabe no fundo do seu coração não há um amor por mim querendo transbordar por você hein, Beatriz?

— Nem nos seus maiores sonhos, Daniel.

—Argh, chega! Tive que aguentar isso a semana toda vocês não vão destruir meu aniversário também. — Pedro se pronunciou pela primeira vez desde que chegaram. Triz arregalou os olhos, envergonhada por ter esquecido o aniversário de seu amigo. Ela levantou-se e o abraçou.

— Caramba, parabéns. Muitos anos de vida. Se eu tivesse lembrado teria comprado alguma coisa. — ela falou quando eles se afastaram.

— Ainda dá tempo de você me dar algo. — Triz corou com a fala dele, mas Pedro rapidamente prosseguiu. — parando de brigar com o meu amigo e aceitando o meu convite de ir jogar paintball com a gente, hoje.

— Hoje? Você quer dizer, agora?

— É. Vai ser super divertido, vai! — ele insistiu. Todos se sentaram e Pedro ainda segurava as mãos de Triz enquanto tentava persuadi-la. Ela não viu, mas do outro lado da mesa Daniel torceu o nariz, incomodado com aquele gesto.

— Eu... Eu não sei. Eu vim com a Vinia e...

— Não tem problema, ela vai também. Vamos, por favor! — arregalando seus olhos castanhos escuros e fazendo um beicinho digno de Oscar, Pedro conseguiu convencer Triz. Ela olhou para a amiga que apenas lhe ofereceu um sorriso como se dissesse “claro, sem problemas”.

— Ok, nós vamos! — ele comemorou arrancando risadas de todos ali. Pegando suas coisas as meninas se levantaram e seguiram o grupo até o paintball.

***

— Sabe que eu nunca joguei paintball antes? — perguntou Vinia falando para ninguém especificamente.

— É bem fácil, na verdade. Você tem que segurar a arma assim, ó. — Pedro aproximou-se de Vinia, posicionando-se atrás dela e lhe dando a arma. Ela a segurou e por trás ele segurou a mão dela, mostrando-a como fazer com o objeto. Enquanto arrumava seu uniforme, Triz observava a cena com uma expressão carrancuda.

— Ciúmes, Valente? — sussurrou Daniel no ouvido de Triz. Ela se reprimiu por arrepiar e se afastou, revirando os olhos.

— Não seja ridículo.

— Bem... Você parece bem enciumada com a ceninha deles ali.

— Pedro eu somos só amigos. Nada mais que isso. — ela afirmou, mas seu coração deu uma pequena pontada. Sem querer entender o que sentiu ela escolheu sua arma, pronta para o combate.

— Então, como vai ser? Duas equipes de quatro? — perguntou Milena.

— Estava pensando em algo como meninas contra meninos. — comentou Arthur.

— Para a Triz e o Daniel poderem se matar a vontade? Não, obrigado. Esses dois já foram amigos, agora tem que aprender a ser isso novamente.

— Quer parar de falar na gente como se não estivéssemos aqui? — perguntou Triz, um tanto zangada com a afirmação de Pedro. Os presentes sorriram, com exceção de Daniel que também estava carrancudo.

— Bem então eu sugiro: Milena, Arthur, Paula e José em um time e Triz, Lavínia, Pedro e eu em outro. O que acham? — Daniel perguntou. Todos deram de ombros embora Triz ainda olhasse pesarosa para Daniel.

Ela poderia mata-lo durante o jogo, claro. Mas aí está um problema com essa garota: ela era extremamente competitiva. E não deixaria seu time perder apenas por que ela e Daniel não estavam no melhor de seus momentos. Não, ela levaria esse jogo com responsabilidade. Mesmo a contra gosto. Mesmo que sua vontade fosse de acertar Daniel com inúmeras bolas de tinta.

—Então o que estão esperando, maricas? Vamos começar logo esse jogo! — gritou Paula e eles gritaram de volta.

***

Quando faltavam vinte minutos para a hora deles acabarem, Triz se perdeu do resto da multidão. O problema foi que eles escolheram o modo caça a bandeira e, ao se separarem, Triz deve ter cruzado a esquina errada, porque há dez minutos não via ninguém. Ela andava sempre alerta, claro, mantendo a arma pronta, mas não sabia mais para qual lugar seguir. E aqueles corredores eram tão confusos...

Enquanto decidia para onde ir ela escutou um barulho perto de si. Devia estar a dois metros e naquele ambiente meio escuro tudo ali parecia aterrorizante. Ela levantou a arma, segurando-a firme contra si. Seja o que for, vai levar tinta na cara pensou ela, um tanto divertida. Andou mais um pouco até que levantou de uma vez.

— Parado! — gritou a outra pessoa. Com um susto e sem saber direito quem era, Triz deu um tiro certeiro no coração da criatura que no fim se revelou como Daniel. A roupa branca ficou toda suja e ele tirou a máscara, totalmente indignado. — Triz!

— Desculpa! Você me assustou com essa frase de policial malvado. — ela disse e também tirou sua máscara. Eles se aproximaram driblando os obstáculos colocados especificamente para dificultar a transação na sala. Ficaram de frente um para o outro a um metro apenas de distância.

— Droga agora vai perder, porque você atirou em um dos da sua equipe!

— Droga! — ela praguejou, culpando-se também. — Mas o que está fazendo aqui afinal?

— Eu me perdi dos outros. Estava procurando um jeito de achar a bandeira quando nos deparamos com outros de outro bando. Foi uma loucura. Daí eu saí no meio da confusão e acabei aqui. Atirado pela minha própria colega de equipe.

— Ah para de drama, foi sem querer. — Ela largou a arma no chão junto com uma bolsa que todos ganharam cheia de balões de tinta. Assim que se livrou do peso começou a massagear o próprio ombro. — Se bem que eu acho que o Pedro e a Vinia nem vão notar. Eles estão muito entretidos um no outro.

—Nem me fala. — Daniel revirou os olhos. — Não aguento toda aquela coisa de: “Ah, você me salvou”, “não se preocupe, estarei aqui para te dar retaguarda”; beija essa garota logo e para de viadagem! — apesar de não concordar com Daniel em certo ponto, Triz riu de sua imitação.

— Nem me fala. Acho que se ficasse mais cinco segundos na frente deles eu teria diabetes de tanto doce.

Foi a vez de Daniel rir. Eles se encararam por um bom tempo deixando o clima mais ameno. Triz quase enxergou o Daniel que ela gostava ali. Até que o garoto, em um movimento rápido, retirou da bolsa um dos balões e o pressionou em cima da cabeça dela, derramando o líquido todinho em seu cabelo curto. Por cinco segundos, Triz ficou com os olhos fechados, sentindo a tinta descer-lhe o cabelo. Depois, veio a fúria.

—MAS QUE DIABOS! ISSO É TINTA PARA TECIDO, DANIEL! TINTA PARA TECIDO NÃO SAI FÁCIL DO CABELO. — ela tentou passar a mão no cabelo para tirar o excesso, mas só estava piorando. A tinta era vermelha como o rosto de Triz estava no momento.

— Não seja exagerada, passa detergente nisso que eu tenho certeza q eu passa. — ele deu de ombros como se não fosse nada. — além disso, eu estava dando a minha vingança, por isso.  — ele disse apontando para a mancha em sua roupa branca.

— É a roupa do paintball preparada especialmente para essas ocasiões. O MEU CABELO NÃO FOI FEITO PARA AGUENTAR ESSAS TINTAS!

— Olha para uma feminista você está se saindo uma baita superficial.

— Ah cala a boca, Daniel. — ela disse emburrada. — antes ser feminista que ser um porco machista como você.

— Pelo menos eu não sou teimoso!

— Antes teimosa que idiota! — ela se aproximou, atacando-o.

— Mal amada! — a proximidade deles era tanta que seus narizes quase se encostavam.

— Não sei como alguém tem coragem de beijar essa boca.

— Assim, ó. — e passando a mão em sua nuca, Daniel selou seus lábios.

Triz tentou relutar, ela tentou mesmo. Colocou a mão em seu peito, mordeu seu lábio, mas nada parecia adiantar. Daniel continuou passando a mão em sua cintura e a trazendo para com ele, beijando sua boca com fervor e mão ainda firme em sua nuca. Apenas quando ele teve certeza que ela não resistiria mais ele aprofundou o beijo levando-a cada vez para trás até chegarem a uma parede.

Triz desfrutou da sensação de ter seu corpo pressionado, as respirações se misturando e a saliva dele percorrendo livremente sua boca. Seus instintos falaram mais alto e ela passou a mão por sua nuca prendendo-o ali enquanto a outra tentava arranhar suas costas. Respirações entrecortadas, beijos fervorosos. Por um minuto ambos se esqueceram de quem estava beijando. Ambos se esqueceram de que nutriam certo ódio pelos defeitos alheios, as ideias que eles eram tão contra. E se entregaram a aquele momento agarrando-o com força.

Triz foi a primeira a recobrar a consciência dos seus atos. E, agora que ele também já estava mais entregue ela conseguiu empurrá-lo para longe, segurando os lábios e olhando para o chão, subitamente envergonhada. Afinal onde havia ido parar seu juízo? Onde estava sua razão quando ela mais precisou?

Daniel também não parecia nem um pouco mais recuperado. Ele respirava com dificuldade e olhava para a garota, ainda incrédulo, tentando conter a vontade de volta para aqueles lábios. Triz, a garota que tinha sua altura e os olhos castanhos mais graciosos que ele já conhecera. Era também a garota que mais o desafiava não só com palavras, mas com gestos e ele descobriu que gostava daquilo. Ela nunca se intimidava e sempre parecia preparada para qualquer palavra dele. E era justamente essa falta de fragilidade que mais o atraía até ela.

— Triz... Triz eu... — ele balbuciou, sem saber o que dizer. Se estivessem em seu juízo normal, Triz provavelmente teria rido dele. Afinal Daniel sempre sabia o que falar. E ela sempre sabia como replicar. Mas diante de situação como prosseguir? O que dizer? E, sem ter a chance de explicar aquilo que ele nem mesmo conseguia entender, Daniel assistiu Triz sair correndo como uma rajada de vento. Correndo para longe dele.

***

Naquele jantar, Triz estava mais silenciosa que o normal. Não brigou com Bruna, sua irmã, quando esta roubou uma de suas batatas fritas e nem elogiou a mãe quando esta chegou com brincos novos. E Triz sempre reparava em pequenos detalhes como aqueles porque ela gostava de ver o sorriso que sua mãe soltava após ouvir as palavras da filha.

Todas repararam em Triz, mas nenhuma teve coragem de comentar. E, absorta em seus pensamentos, Triz mal tocara em sua comida, pensando em o quanto aquela semana havia dado sinais de que seria estranha. Suspirou cansada quando pegou outra batata frita e colocou preguiçosamente na boca. E, quando sua mãe estava prestes a perguntar o que de errado estava acontecendo elas ouviram a campainha tocar.

Levantando de pressa, Triz gritou por cima do ombro que ela mesma atenderia. Pensando que era Vinia, ela abriu a porta com uma expectativa enorme. E, assim como um balão, essa expectativa arrebentou-se ao ver Daniel a sua frente.

Ele usava uma toca cinza que, estranhamente, combinava com seus olhos verdes. Carregava um olhar apreensivo e balançava seu corpo para frente e para trás como se tivesse repetindo mentalmente um mantra. Suspirando, Triz conteve a onda de frustração e nervosismo. E, ao ouvir seu nome sendo chamado, ela só respondeu.

— É só um amigo, mãe, coisa rápida. — então fechou a porta atrás de si, ficando frente a frente com Daniel novamente. Cenas do beijo se passavam em sua mente e ela evitou o seu olhar. — o que está fazendo aqui?

— Eu queria te pedir desculpas.

— Não precisa, não foi um beijo tão ruim afinal de contas. — mentalmente, Triz se amaldiçoou por às vezes ter a boca mais rápido que a cabeça. A expressão de arrependimento de Daniel vacilou alguns segundos antes dele voltar a falar.

— Não só por isso. Eu fui um idiota com você desde... Desde sempre. Sei que suas ideias muitas vezes divergem das minhas, mas somos civilizados e acima de tudo amigos. É isso que amigos fazem, certo? Aceitam um ao outro como são. — o tom suave dele impressionou Triz. Ela normalmente ouvia apenas arrogância sair daqueles lábios finos. Mas descobriu que gostava daquele tom. Um sorriso singelo surgiu em seu rosto.

— Sem problemas. Desculpe-me também, por todas aquelas coisa horríveis que eu te falei na sala. Eu exagerei. — ele riu mais descontraído.

— Foi até divertido te ver alterada. Para ser honesto, é sempre divertido te ver alterada.

— Bem, você é um dos poucos que consegue. — ela deu de ombros.

— Bom. Porque você também é uma das poucas que consegue me tirar as palavras. — hesitante, a mão de Daniel tocou o queixo de Triz. Estava um pouco fria e suada, mas era firme e levantou a cabeça dela até que o olhar deles se encontrou. O resto de razão dentro dela conseguiu expressar:

— Como aquele de hoje mais cedo? — um sorriso travesso como o de Triz naquele momento surgiu nos lábios de Daniel.

— Como aquele. — e quando o silêncio finalmente se instaurou, Triz não conseguiu se contiver. Passou a mão em sua nuca, imitando o gesto que ele mesmo fez e beijou-o.

Mais tranquilamente eles conseguiram sentir o beijo dessa vez. Não havia apenas desejo ou instinto. Aquilo era algo controlado e aproveitado. Era uma surpresa, mas um sentimento teimava em brotar naqueles corações secos. E quando se separaram Daniel sorriu-lhe afastando-se lentamente.

— Te vejo segunda na escola, mal amada. — ela sorriu-lhe em resposta rezando para que aquele apelido não pegasse.

— Até mais, porco machista.


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Notas finais do capítulo

E então, gostaram? Não se esqueçam de comentar, é rapidinho e vai me deixar muuito feliz. Beijos!



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