Teoria do caos escrita por Angelina Dourado


Capítulo 22
Estudo da Natureza das Almas - Por Dr.WD Gaster (Parte III)


Notas iniciais do capítulo

Sinto muito pelos que estão ansiosos para o ''Depois da Queda'', mas vamos aproveitar um último vestígio de Gaster ainda... Vivo? Corpóreo? Enfim, aqui está a última parte destes extras!
Boa leitura!



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Doutor WD Gaster sabia muito bem que deveria pensar mais sobre as consequências de suas ações. Mas isso parecia ser algo que ele não era capaz de aprender, não importando quantas vezes aquilo já se repetira. Sabia que deveria parar com aquilo, mas pelo jeito seu subconsciente o fazia tornar sua vida mais complicada.

Criar uma criança sendo o cientista real era difícil. Criar duas crianças sendo o cientista real era uma tarefa que ele acreditava ser impossível.

Que havia pensado muito antes de resolver repetir o experimento ele realmente fez, mas a curiosidade parecia gritar dentro da mente do doutor que acabava por se render a ela. Dissera a si mesmo que não repetiria os mesmos erros de outra vez, que faria tudo com muito mais cautela.

Não deu certo, claro.

Apesar de ter conseguido manter a alma estável por mais tempo, ela se materializou de qualquer forma. Tornou-se um garotinho barulhento e que praticamente não dormia, tirando o pouco das horas de sono que restavam do cientista. Gaster podia visualizar em sua mente a reação de Semi Serif caso estivesse vivo, a expressão de perplexidade junto a uma piadinha sem graça para acalmar os ânimos. Aquilo não tornava a situação melhor.

Felizmente, nem tudo se resumia a falhas. Havia conseguido dados novos e interessantíssimos acerca das almas, só faltava saber no que elas poderiam lhe ser úteis... Já havia começado a comparar os dados com as de almas humanas e os resultados foram satisfatórios, entretanto o doutor se viu em uma incógnita que não conseguia passar além deste ponto.

 - Ei, Gaster. Gaster. Gaster. Gaster. Gaster... – A cada chamado dito ele recebia mais uma cutucada. Tentava ignorar Sans passando o seu olhar apenas para a papelada em sua mesa, mas o garoto era irritante e insistente e fazia sua concentração se esvair muito rápido.

— [O que foi, Sans?] – Disse em um suspiro, afastando-se da mesa e encarando o garotinho ao seu lado. Sans lhe olhou confuso, ainda não compreendia os estranhos sons que vinham da boca do doutor, era mais fácil aprender sinais do que estática. Assim, Gaster repetira a pergunta de forma que Sans compreendesse. – O que você quer?

— A coisa tá chorando de novo. – Respondeu com uma clareza impressionante para seus três anos. Apesar de ser uma criança bem inativa, Sans era extremamente avançado em diversos aspectos, fazendo com que Gaster tivesse esperança de um futuro dele na ciência.

Não é uma coisa Sans, é um esqueleto assim como eu e você. — Respondeu levantando-se, se dirigindo até o quarto ao lado para socorrer o mais novo que chorava sem parar.  O bebê dormira pouco como sempre, não gostava de ficar sozinho e por isso começara a clamar por atenção. – Poderia dizer que ele é seu irmão de certa forma.

— E você? É nosso irmão também? O que você é de nós? O que nós somos? – Sans começou a perguntar enquanto tentava acompanhar o doutor que retornava ao escritório, desta vez com seu irmão nos braços. Aquelas eram perguntas um tanto filosóficas demais, óbvio que o menor não tinha se dado conta disso e estava apenas sendo curioso, mas foi o suficiente para fazer a mente do doutor ficar em branco por alguns segundos.

Principalmente com a questão ‘’O que você é de nós?’’, aquilo o trazia um estranho desconforto e evitava pensar muito sobre isso. Provavelmente era uma forma que sua mente buscara para se sentir menos responsável pelos dois enquanto a realidade lhe mostrava o contrário.

Chega de perguntas. — Gesticulou firmemente enquanto tentava equilibrar o menor com apenas um braço. Sans lhe olhou com o canto dos olhos, insatisfeito com a falta de respostas, mas resolvendo não discutir apenas cruzou os braços e fazendo cara de birra.

Podia ser difícil trabalhar junto com os dois, mas com o tempo o doutor vira que não era impossível. Era de longe a melhor pessoa para lidar com crianças, mas sentia que lentamente poderia aprender a conviver com eles.

Seus óculos chamavam muito a atenção do menor, que esticava os bracinhos tentando alcança-los, ás vezes até se arriscando a ficar em pé para pegá-los.  Enquanto virava as páginas de projetos escritos pelos outros cientistas do laboratório, afastava as mãozinhas de suas lentes. Um processo repetitivo onde caso alguém estivesse olhando poderia até mesmo achar cômico.

Quando Gaster imaginou que estivesse pegando o jeito da coisa e conseguindo se concentrar, mesmo que naquele processo repetitivo, mais um empecilho lhe apareceu, se iniciando com uma vozinha fina e aguda ao seu lado:

— Deixa eu ver! – Antes que o cientista pudesse impedir, Sans já estava escalando suas pernas e arrumando um espaço ao lado do irmão e fuçando os papéis na mesa. Gaster ia protestar, mas fora impedindo pelas garras traiçoeiras do bebê em seu colo que retirara seus óculos para lambuzar as lentes com seus dedos.

Por um momento apenas bufou descontente, tendo apenas duas coisas passando por sua mente:

‘’Tenho que tentar resolver esta situação, ou jamais trabalharei novamente. ‘’

E não menos importante:

‘’Preciso arranjar camisetas listradas para os dois. ’’

Resolveu deixar o trabalho de lado, ter uma conversa séria com Sans sobre intrometer-se no trabalho alheio e depois fazer algo que ao menos parecesse com um jantar. Tentaria retomar as análises quando os dois estivessem dormindo, afinal, antes mesmo da existência das crianças Gaster já estava acostumado a madrugar em meio à pilha de trabalho.

Achava-se a pessoa menos apta a cuidar de crianças no mundo, mas sentia-se aliviado ao vê-los dormindo são e salvos, significava que conseguira passar por mais um dia e que provavelmente conseguiria os outros que viriam pela frente.

De qualquer forma, tinha que voltar ao trabalho.

Colocou-se de volta ao escritório, com o ambiente completamente escuro e apenas com a luz de um abajur focando-se nas planilhas – sentia que aquilo o fazia se concentrar mais – tentava conciliar seus planos para o resfriamento do CORE junto com a revisão dos trabalhos sobre a Barreira feitos pelos outros cientistas, se tivesse sorte e fosse rápido poderia ter umas quatro horas de sono.

A teoria era fácil, mas na prática Gaster apenas olhava a primeira coisa que batesse o olho e lhe chamasse mais a sua atenção. Não era a toa que sua demora em entregar projetos fosse famosa por todo o subsolo.

Mas isso não era nada comparada a sua genialidade, isso era algo do qual gostava de se gabar.

Não gostava muito de analisar as pesquisas dos outros, chamava muito mais sua atenção os seus próprios planos. Entretanto desta vez o doutor achou mais interessante do que de costume um dos estudos de seus estagiários. Não parecia muito útil, mas era deveras curioso, era uma comparação entre a energia mágica da Barreira e a estranha força das almas humanas. Apenas confirmava o que já sabiam: precisavam de sete almas humanas para quebrar a barreira.

Já havia desistido do projeto de Almas, pois vira que a natureza das almas era muito imprecisa e aleatória, não conseguiria criar um elemento artificial e muito menos controlar uma alma. Mas resolveu comparar os resultados de sua pesquisa com os dados da Barreira, talvez encontrasse alguma forma de fortalecer uma alma de monstro? Já começava a ficar sem ideias...

Começou os cálculos apenas para confirmar o que já tinha certeza, entretanto assim que se vira indo mais adiante, certos resultados começaram a lhe chamar a atenção...  E sua surpresa foi quando os comparou aos das almas humanas, chegando a uma conclusão que jamais imaginara passar por sua mente:

A lenda que tanto ouvira quando criança era totalmente real.

Que Asriel morrera ao tentar salvar seu irmão humano era real, entretanto havia muitas dúvidas que pairavam sobre aquela lenda. Alguns diziam que era um ocorrido raro, outros que não havia acontecido exatamente como a lenda dizia. Na verdade havia ocorrido há tanto tempo, e tão poucos viram com seus próprios olhos, que ninguém tinha certeza de nada. O sumiço da rainha também era algo com uma discussão em aberto, já que muitos diziam que ia muito além da guerra declarada aos humanos.

Asgore jamais confirmara ou negara aquilo, na verdade fugia do assunto como uma lesma foge do sal. Mas naquele momento, WD Gaster desejava tirar algumas satisfações.

Pois uma alma humana e uma alma de monstro juntas poderiam atravessar a Barreira. Esta era uma informação que não poderia ser ignorada, não quando a liberdade de todos estava envolvida.

O cientista real se sentia em uma encruzilhada. Refez as contas diversas vezes, querendo ter certeza que não estava delirando, refletindo diversas vezes sobre o que faria com a informação. O dia chegara a amanhecer e o esqueletinho a choramingar, Sans chegara pedindo café da manhã e suas quatro horas de sono haviam sido adiadas mais uma vez. Mas não precisou também da manhã toda para decidir-se, a escolha era óbvia:

Estava na hora de tomar chá com o rei.

                                                                         ***

Gaster não era um grande fã de chás, ele era do tipo que preferia café. Mas era sabido por todo o subsolo que esta era uma das paixões do rei, e consequentemente a melhor forma de iniciar uma conversa com o mesmo.

Marcar uma hora do chá com Asgore foi mais rápido e fácil do que o cientista real imaginou. Teve que deixar os garotos com alguns funcionários, pois no dia seguinte já estava diante da majestade.

— Eu estava esperando pelo dia que você finalmente aceitaria meu convite para o chá, Doutor WD Gaster! – Asgore disse empolgado enquanto servia as xícaras. A luz da capital entrava pelas janelas e batia contra as porcelanas, quase que lembrando o sol que há muito tempo não era visto pelos habitantes do subsolo. – Toda conversa fica melhor com uma boa xícara de chá!

Na realidade a conversa era o maior desafio para o doutor. Sabia exatamente como apresentar o assunto, tendo todas as palavras em sua mente, entretanto eram poucos os que entendiam o seu modo de falar. Não era como se ele fosse incapaz de falar como os outros monstros – afinal ele não tinha Gaster como seu segundo nome por nada -, mas acabava se tornando um processo muito mais difícil do que parecia.

— Vossa m-majestade... – Tentou iniciar, soando mais baixo e travado do que esperava, era como se o ‘’G’’ no meio do ‘’Aster’’ o impedisse de prosseguir. Sentia-se estúpido falando daquela forma, mas não era como se tivesse muita escolha. – O.... Os mais novos e-estudos feitos por minha equi... Equipe...

— Pare doutor, não é necessário. – Asgore disse com sua voz autoritária e ao mesmo tempo cordial, como a de um verdadeiro líder. Em seguida mostrou um amigável sorriso no rosto, fazendo o sinal de ‘’Olá!’’ com as mãos. – Viu só? Estou aprendendo a língua de sinais! Não gosto de ver você se forçando a toa para falar, por isso estou fazendo aulas para poder te compreender. Ah e, por favor, doutor, me chame apenas de Asgore, soa mais amigável.

Fico grato com o gesto, Asgore. É muito gentil de sua parte. — Para Gaster aquilo realmente era tocante, ser compreendido era um desafio diário que precisava enfrentar sozinho. Ajuda nesses casos era sempre bem vinda.

— Que é isso Wingdings, faço qualquer coisa pelos habitantes do subsolo.

O cientista apesar de extremamente agradecido, não se surpreendeu tanto assim com o gesto, afinal aquele era o rei Asgore. Provavelmente a pessoa mais gentil que já pisou naquele mundo, disposto a fazer qualquer coisa pelo bem estar de seus súditos. Era um homem de respeito, com toda a certeza.

E era exatamente por isso que Gaster não compreendia por que ele teria escondido por tanto tempo a informação que havia descoberto. Nessa hora, poderiam estar aproveitando o verdadeiro sol da superfície.

 - O que venho lhe dizer trata-se de um assunto delicado. — Gesticulou da forma mais confiante possível, enquanto o rei dos monstros prestava a máxima atenção em seus movimentos. – Espero que com isso não esteja causando algum tipo de transtorno... Por hora apenas peço que interprete os meus sinais.

— Está me deixando curioso doutor, do que se trata? – Asgore questionou antes de bebericar mais um pouco do chá, enquanto Gaster nem sequer ainda havia tocado no seu. Estava mais nervoso do que o esperado.

Novos estudo feitos por minha equipe estão revelando resultados satisfatórios a respeito da natureza da Barreira, entretanto ainda não há nada próximo o bastante de um plano alternativo ás almas humanas para quebra-la. Alguns testes foram feitos em busca disso, mas não obtiveram êxito. — Os testes em questão fizeram com que Gaster lembra-se de arranjar camisas listradas para eles, esperava que aquela conversa não fosse tão longa e tivesse um rumo aceitável.

— Oh... Isso é uma pena.

Entretanto, houve uma nova descoberta feita por mim ao analisar as pesquisas. Não podemos quebrar a Barreira, mas poderíamos ultrapassá-la, nem que algum de nós fosse à superfície apenas para conseguir almas o suficiente para enfim acabar com essa maldição. O curioso desse caso, é que o método para isso não é tão desconhecido assim, na realidade... É bem conhecido por todos, só não era sabido de sua verdadeira eficácia.

Asgore ficou calado, olhava da xícara para os vitrais ao lado, num estado pensativo. Já havia previsto o rumo que aquela conversa estava dando, sabendo que logo deveria explicar-se perante Gaster.

— Uma alma monstro junto a uma humana é capaz de ultrapassar a barreira. Mas esta informação ficou por muito tempo subentendida no que muitos acreditavam ser uma lenda. — Seus ossos tremiam levemente, o doutor sentia que estava entrando em um caminho delicado, era possível ver os olhos bondosos de Asgore tornando-se vazios e enigmáticos. – Entende por que estou aqui? Apenas busco por algumas respostas.

O doutor não percebeu, mas Asgore estremeceu ao ouvir aquilo. Sua feição mudou para algo entre a surpresa e a derrota, dando um longo suspiro antes de se explicar:

— Há coisas que não devem ser repetidas. Jamais. – O rei disse pesadamente, seus olhos pareciam estar distantes em algum lugar do passado. – Perder minhas crianças por causa disso foi a coisa mais difícil que aconteceu para mim, como uma ferida que nunca se cicatrizou. Temo pelo que os humanos poderiam fazer, pelo que poderia acontecer comigo e a todos nós. Há muito poder envolvido, algo que até mesmo eu tenho minhas dúvidas se conseguiria controlar.

— Sinto medo, sim, medo. Eu, o rei de todos os monstro temo pela segurança de todos, e é por isso que que decidi nunca mais tocar neste assunto novamente. Entende por que fiz isso Wingdings? Compreende a dor da perda de um filho?

A imagem de Sans chorando em frente ao laser apareceu involuntariamente em sua cabeça, um tremor passou por toda sua espinha ao se dar conta disso. Por um momento ficou apenas estático, tentando conciliares as palavras de Asgore e acalmar os seus próprios pensamentos. Aquilo estava sendo mais complicado do que imaginou, muito mais emocional do que político por assim dizer.

Mas sabia que não podia forçar Asgore a fazer aquilo, por algum estranho motivo apenas entendia o que se passava na mente do rei.

Darei um jeito nisso. Procurarei outra forma, prometo. — Respondeu sem muito pensar, a dita promessa saindo salgada de sua boca, como um remédio amargo que foi obrigado a ser engolido. Apesar de suas palavras pesadas para si mesmo, aquilo pareceu acalmar e alegrar Asgore que respondeu apenas com um sorriso amável enquanto erguia sua xícara mais uma vez.

— Você é brilhante doutor WD Gaster, acredito em você!

E naquela hora duas coisas passaram pela mente do cientista real:

Se o comércio ainda estava aberto há esta hora para conseguir as camisas listradas.

E se seria capaz de acreditar em si mesmo.


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Notas finais do capítulo

Bem, este é o último capítulo destes especiais, o próximo capítulo será oficialmente o primeiro do ''Depois da Queda''. Preparem-se para novas intrigas e a aparição de alguns personagens já bem conhecidos no jogo...
Comentários são sempre bem vindos! ^-^



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