Pelo que se foi escrita por General Bear


Capítulo 1
Pelo que virá


Notas iniciais do capítulo

Então pessoal, mais uma fic feita às pressas, fiz tudo em um dia. Esta era minha opção relâmpago para escrever, então a fiz só para não vasilar, realmente não curti muito o resultado. Mas espero que consigam gostar de alguma coisa.

Talvez os personagens possam estar um pouco OCC, sempre acho que os personagens ficam OCC quando escrevo fanfics xD

No mais o meu tema para a fanfic foi "O Retorno", no anime da Sakura esta carta dava a capacidade de voltar a um momento no passado e assistir tudo que acontecia lá como um fantasma, sem poder alterar ou interagir diretamente com nada (somente com seres de magia extremamente poderosa).

Mas é isso, boa leitura.



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O vulto azulado fundia-se às cores sombrias da noite, havia fantasmas sussurrando no meio daquela solidão. Olhos amarelados e reluzentes venciam a escuridão que assombrava aquele sem fim de corredores vazios. Passos de veludo alemão andavam com sigilo imperscrutável através dos cômodos. Desviava de móveis empoeirados e até mesmo esquivava das tábuas soltas do assoalho que rangeriam sob sua presença. Mas, se o corpo conseguia evitar sem dificuldades quaisquer obstáculos físicos, a mente de Kurt esbarrava dolorosamente nas memórias impregnadas nos vazios daquela mansão mal-assombrada. Cada nova velha lembrança pela qual passava fazia-lhe o coração gelar e as lágrimas inundarem-lhe o olhar dourado.

Suspiros úmidos, sorrisos de asas quebradas, sentimentos gravados na saudade.

O Instituto Jean Grey para Jovens Superdotados estava silencioso naquela madrugada escura. As aulas haviam sido suspensas por tempo indeterminado. A maior parte dos alunos — aqueles que tinham uma família ou um porto seguro fora dali — deveria estar sob a proteção de seus lares neste instante. Poucos mutantes ainda restavam na mansão, isolados em seus quartos, recolhidos em suas dores.

Havia sido uma grande perda.

Hank fora contra a decisão de Ororo em suspender as aulas na última reunião. Kurt não se havia posicionado de nenhum dos lados durante a votação; sua cabeça estava em outro lugar. Mas, verdade seja dita, ficou contente com o recesso. Ninguém ali teria condições de cuidar, ensinar e nem sequer de servir de exemplo para os jovens; não depois do último baque. E estariam vulneráveis demais para confiar a si mesmos a proteção de todos os estudantes. Afinal...

A Mansão-X estava de luto.

Os X-men estavam de luto.

Kurt estava de luto.

O mais difícil de sua segunda vida... ou, talvez, o mais difícil de suas duas vidas.

Mais um luto... Quantos mais teriam? “Parece que o destino de todo x-man, de fato, é dar a vida pela causa mutante.”

Desceu as escadas que davam acesso ao primeiro andar. Por alguns instantes deixou-se observar os quadros nas paredes ou os porta-retratos espalhados por todo o salão. Outro sorriso saudosista quebrou-lhe nos lábios e outro suspiro afogou-se-lhe aos pulmões. Todos riam em algum lugar desperdiçado no tempo.

Sem perceber, Kurt viu-se encarando a primeira foto que havia tirado ao entrar no instituto. O que não daria para voltar para esta época?

Todos estavam felizes, todos sorriam. Fora naquele momento que havia conhecido o real significado de se ter uma família. Entretanto, era impossível lembrar daqueles tempos tão distantes sem perceber que muitos rostos naquela fotografia já não estavam entre eles. Alguns haviam simplesmente partido, outros tinham sido levados. Eles estariam tão felizes naquele tempo se soubessem como seria o futuro? Teriam aproveitado melhor cada instante se soubessem de tudo? Talvez a saudade que tinha daquilo fosse exatamente a da falta de preocupações em sua consciência.

E agora, vagando em meio a toda aquela melancolia, ele conseguia ver o lado de Hank: um pouco mais de vida jovial naquela enorme casa ajudaria a espantar a tristeza incrustada nos cômodos... Além disso, de que valeria todas estas perdas se eles desistissem no final da batalha? Era algo difícil de se saber: como prosseguir? Eram sempre estas as mesmas perguntas que retornavam depois de uma partida. Quando tudo deixaria de parecer em vão? Todas as lutas, todos os sacrifícios? Por que o mundo os odiava tanto, afinal? O que haviam feito de errado além de nascer, além de existir? Haveria algum momento onde tudo valeria a pena?

Esta era mais uma daquelas vezes onde Kurt perguntava-se se tudo não teria sido mais fácil caso jamais tivesse se unido aos X-men, ou se tivesse permanecido nos braços da Igreja, ou até mesmo se tivesse decidido não retornar dos mortos na primeira oportunidade que teve. Aquele momento em que as lembranças dolorosas superavam as memórias de alegria conquistadas com tanto sofrimento.

Mais um murmúrio morreu-lhe dentro do peito.

Era idiotice pensar que tivera alguma escolha. Fez tudo o que fez por eles... E faria tudo novamente sem hesitar; talvez por isso tudo essa dor fosse tão doída.

O mutante tinha conhecimento de que aquilo que estava realizando era um ato de covardia puro e sublime... Pegar o pouco de seus pertences, jogá-los numa bolsa de viagem e desaparecer sem se despedir de ninguém. Tinha certeza de que todos ficariam preocupados, mas tudo seria resolvido quando encontrassem seu bilhete de despedidas; não que a decepção deles fosse menor desta maneira, mas talvez suas falsas explicações amenizassem todos os julgamentos... Kurt nada podia fazer quanto a isto, não tinha coragem suficiente para olhar na cara de ninguém enquanto abandonava o navio afundando, um navio chamado X-men... E agora, depois de todas as lutas, todos os sacrifícios, ele não aguentaria mais continuar assistindo a tudo o que ajudou a construir desmoronar deste modo, peça por peça. “Seria a dor da partida, a dor do abandono e a dor da decepção mais suportáveis que a dor da perda?”

Ele estava disposto arriscar que sim. Não achava que conseguiria passar por aquilo outra vez, e — com total e completa certeza — passaria por aquilo novamente se continuasse na equipe. Precisava partir de vez, dar um basta no luto interminável lá presente.

Kurt não sabia mais se estava vendo fantasmas ou se ele era a assombração ali.

Mas ainda restava mais alguém a assombrar…

 

Os passos silenciosos hesitaram por um longo instante antes de atravessar aquela porta de metal. Os pulmões fraquejaram. Não deveria estar ali, sabia disso, era o tipo de coisa que certamente dificultaria ainda mais sua partida. Provavelmente seria uma ideia melhor somente se teletransportar para fora da mansão e tomar os rumos da estrada. Entretanto, mesmo prometendo a si mesmo que não se despediria de ninguém para evitar novos dissabores, precisaria se despedir dele. Era a única forma ao alcance para tirar todo o martírio incrustado dentro da carne. Devia isto a si mesmo.

A porta rangeu.

Kurt não esperava encontrá-lo ali. Mais provável teria sido ele estar sentado no telhado, com um engradado de cervejas e seu charuto fedorento. Onde eles iniciariam uma conversa banal e passariam a madrugada observando as estrelas.

 

Logan estava deitado na cama, parecia estar em um sono profundo e intangível, a respiração pesada. Kurt demorou alguns instantes para analisar a falta de lógica naquela situação, ele sabia que, apesar de sempre parecer o mais forte, o mais inabalável e o mais implacável de todos os X-men, Logan era o mais afetado pelas perdas. Nunca lidou bem com partidas e sempre que a equipe enfrentava momentos de luto, ele era o primeiro a desaparecer, pegava sua moto e seguia sem qualquer rumo para longe.

O mutante azulado aproximou-se com cautela da cama. Logan estava tão tranquilo descansando que até parecia um pecado pensar em acordá-lo. Então Kurt pousou sua bagagem no assoalho e deitou no leito do carcaju mais perigoso que já havia conhecido, os rostos de frente um pra o outro.

Tratou de somente encarar aquela expressão relaxada, gravar o rosto dele e guardá-lo como uma memória feliz para quando estivesse longe.

— O quê que ‘cê quer aqui, elfo? — A voz rouca dele entoou sonolenta, mas Logan permaneceu com os olhos fechados como se não quisesse acordar.

— Desculpe-me, mein freund. Não queria acordar você.

— ‘Cê fala como se eu não tivesse sentindo esse teu fedor de ovo podre e colônia barata quando ‘cê ainda ‘tava no corredor.

Kurt não soube como responder de cara ao insulto e simplesmente deixou aquele momento descascar um sorriso de satisfação de sua expressão tristonha.

— Então... desembucha logo o que ‘cê veio dizer que eu quero voltar dormir sem esse cheiro de peido de repolho perto de mim.

Blas mir einen! Du, arschloch! — rebateu.

— Hmf! ‘Cê sabe que se isso for um xingamento muito escroto eu vou te dar uma surra, não sabe, orelhudo? — Finalmente Logan mostrou-lhe a cor do olhar, encarando-o com uma falsa seriedade que foi interrompida por um sorriso torto e manhoso.

Os lábios azuis alinharam-se mais uma vez e os dentes brancos mostraram-se com certa felicidade. Era tão fácil estar ali.

Mas logo veio a dor da realidade, como maré violenta aos olhos amarelos.

— Eu vou sentir tanto a tua falta, Ödbacke. — Cerrou os olhos quando as lágrimas começaram a rolar por sua face e molhar o colchão, depois encolheu-se ali nas dores etéreas de seu corpo.

— Eu sei… — Dessa vez o tom dele estava esmorecido. A mão áspera aproximou-se da macia de Kurt. Os dedos entrelaçaram-se num toque fantasma que confortou-lhe a alma.

— Como você aguenta toda essa dor? Tudo isso? Eu sempre me perguntei… Às vezes eu tinha inveja de você quando você subia na sua moto e desaparecia. Eu me perguntava se assim não era mais fácil de enfrentar tudo o que vinha acontecendo por aqui. Mas nunca sei dizer ao certo se minha vontade era ir embora daqui, ou fugir com você… Scott reclamava da tua covardia por isso. A Ororo ficava desolada. A Vampira sabia que cedo ou tarde tu ia pisar aqui de novo(e ela normalmente ‘tava certa)... Eu não entendo, sempre que você partia eu pensava que seria a última vez que eu ia te ver. Sabe? E me arrependia por nunca ter contado tudo que eu queria te contar... Mas então, quando a gente mais precisava, você surgia de lugar nenhum e estava lutando ao nosso lado como se nada tivesse acontecido… Aí todo mundo ficava confiante de novo e dava tudo certo… E eu ficava contente demais para falar contigo. — Suspirou-se. — Eu ainda tenho tanto o que dizer para você…

Logan continuou a encará-lo silenciosamente. Havia um brilho peculiar naqueles olhos ferozes.

—  Por que você voltou? Por que você sempre volta? De onde você arruma motivos para estar aqui de novo? Depois que a Jean morreu, eu jamais pensei que tu voltaria para a mansão… Eu só queria ter um pouco da força que você tem para isso, mas...

— E ‘pra onde mais eu iria, elfo? — interrompeu-o. — Aqui é o meu lugar, xará. ‘Cê sabe disso. Então, enquanto continuarem me aturando pelas bandas de cá, eu vou continuar voltando. Este é o meu ponto de retorno, Kurt, a minha família ‘tá aqui… a nossa! Eu preciso de tempo para espairecer, mudar os ares de vez em quando, é verdade; mas é ‘pra cá que sempre acabo retornando… O nosso lugar… ‘Cê sabe disso. E a gente precisa  estar aqui quando precisam de nossa ajuda... 'Cê diz que queria ter forças para ir; eu queria ter forças para ficar.

O mutante azulado enxugou as lágrimas dos olhos e ficou calado. Encarava a expressão consoladora do companheiro.

— Era só isso que ‘cê tinha para me dizer? Um adeus?

A resposta demorou a chegar.

— Não.

— E ‘cê ‘tá esperando um cafezinho para desembuchar logo? É isso?

Houve uma gargalhada singela rompendo aquela ternura. Uma mão azul acariciou uma barba fria. A sensação fantasma daquele contato quase era capaz de acalmar Kurt. Ele permaneceu por mais alguns instantes sentindo os pelos arranhando-lhe a palma; mas optou por levantar-se da cama e pegar de volta sua bagagem.

— Quem sabe da próxima vez eu não tome coragem para dizer tudo, mein freund. — provocou-o.

Logan, sonolento, sentou-se no leito.

— ‘Cê ainda tá indo embora?

Kurt, que sequer pareceu dar atenção àquilo, não respondeu, continuou caminhando para fora do quarto.

— Orelhudo! — Outra vez tentou chamar-lhe a atenção. Kurt parou de caminhar e virou o rosto para ele. — ‘Cê, mais do que qualquer outro aqui, deveria saber… Valeu a pena. Sempre valerá... Eu acredito em você. Eu acredito em todos vocês…

— Eu sei… — murmurou.

— Adeus, meu amigo.

— Até, mein freund… Até! — corrigiu-o. — Eu estarei aqui esperando com os outros. Você sempre volta, não é mesmo? Sempre volta quando precisamos de você… E eu estarei aqui... esperando.

Não houve mais nenhum diálogo além de sorrisos cúmplices, fáceis e satisfeitos. O mutante azulado fez um gesto com a mão direita enquanto saía do lugar. Então a imagem física de Logan começou a falhar e desfazer-se em pixels sólidos, assim como todo o quarto.

Sala de Perigo, simulação finalizada.




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Notas finais do capítulo

Terminamos por aqui. Quem tiver gostado, ficaria agradecido se mandasse um review. Quem tiver críticas tbm será mais que bem vindo. Um abraço para todos.

Woof!