A neblina estava definitivamente densa, se insistisse a continuar, os voos teriam de ser cancelados. Estou realmente torcendo para que meu voo não seja cancelado, pois voltar para casa da minha mãe com a estrada coberta por uma grande nuvem cinza e melancólica como esta, seria um problema. Cinza, essa cor sempre me pareceu tão morta, só de observa-la me sentia como se toda minha felicidade tivesse se esvaindo, era mórbido.

     A sala de embarque estava parcialmente ocupada e calma, o que era ótimo considerando que detesto lugares cheios e barulhentos. Na sala haviam diversas famílias, possivelmente estariam embarcando em uma viajem de férias, homens vestidos com ternos caros, que poderiam ser empresários com destino a alguma viajem de negócios, casais aproveitando um tempo sozinhos para uma viajem romântica e havia eu, com meu jeans azul surrado e minha camisa branca sob uma jaqueta preta e meu gorro vermelho favorito, parecia comum. 

    Meu voo estava atrasado a exatamente 2 horas e 43 minutos e para ser sincero já havia escutado todas as músicas da minha playlist, então resolvi abrir minha mochila e apanhar meu caderno e lápis. Fui rabiscando, tentado criar um desenho que pudesse transmitir todo o clima que aquele ambiente estava oferecendo, a emoção nos olhares empolgados das crianças por voarem pela primeira vez, na tensão que os empresários exalavam pelo atraso de seus voos e no clima de amor e serenidade que os casais compartilhavam. 

    Após alguns minutos traçando linhas paralelas ali e pequenos sombreados aqui, estava pronto meu desenho. Havia feito diversos pássaros indo em direção ao horizonte, famintos por emoção e aventura, uns voavam alto e outros voavam mais baixo, alguns estavam entrelaçados uns com outros, porém todos ambiciosos e felizes, bom, nem todos na verdade, pois apenas um estava nos galhos mais altos de uma árvore, apenas observando e apreciando a coragem que aqueles tais pássaros possuíam por se aventurarem de maneira tão intensa, foi uma forma de representar o que aquelas tais pessoas estavam deixando para trás para que pudessem está aqui, indo em suas próprias jornadas. Irrompendo meus devaneios  uma sirene é acionada seguida por uma voz.

O voo com destino a Nova York sairá em 10 minutos

                                                                                                        ***

     Respirar o oxigênio de um lugar totalmente novo para mim era revigorante, assim como o cheiro dos biscoitos recém assados que minha mãe preparava para mim todas as sextas depois de um longo e cansativo dia de trabalho. Sally, minha mãe, sempre falava que o maior pagamento que poderia receber, após um dia de trabalho, era meu singelo sorriso ao inalar o doce aroma de biscoitos. O sorriso que me acompanhou uma pequena parte da infância estava novamente esboçado em meus lábios, porém desta vez era por admirar o que seria minha nova vida.

     A casa internamente era aconchegante,a direita se encontrava a sala, havia uma lareira e alguns dos móveis já estavam dispostos em seus lugares, mas ainda havia diversas caixas a serem abertas, a esquerda se encontrava a cozinha, tinha bonitos armários, um balcão com diversas caixas empilhadas e seguindo o corredor levava aos quartos e ao banheiro. A sacada havia uma linda vista para o Central Park, porém não seria admirando aquela vista que minhas caixas da mudança iriam se abrir...

Duas semanas depois 

     — Mãe, é sério estou bem. Não foi nada demais.

     - Percy, essa dor de cabeça que você anda sentindo pode se tornar algo sério.

     - Sim mãe, não se preocupe, irei marcar uma consulta se isso faz você se sentir melhor. Tenho que desligar, estou muito atrasado, tchau mãe.- falei apertando insistentemente o botão do térreo do elevador.

     Logo no meu primeiro dia de trabalho eu já estava atrasado, ótimo. Consegui um emprego temporário em um starbucks próximo, apesar de não ser o emprego ideal, o dinheiro que recebia do café mais o dinheiro da venda dos meus quadros conseguiam ser o suficiente para quitar minhas contas. 

    O dia havia sido bem produtivo, anotei diversos pedidos e até que gostava da correria nos horários de pico. Já estava quase na hora de fechar e ainda havia algumas pessoas sentadas em algumas mesas conversando e tomando seus cafés, aproveitei o momento calmo para deixar tudo limpo para o próximo dia, foi quando o sino da porta tocou, avisando que uma pessoa estava entrando.